quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Reflexão do dia - Marco Aurélio Nogueira

“Amado e odiado indistintamente, o poder perturba, leva pessoas à loucura, corrompe e alucina, mas também serve para que se movam montanhas e para que multidões dispersas se organizem. O poder reprime e prejudica, mas também acalenta, protege, incentiva e beneficia. Costuma ser utilizado tanto para conservar quanto para revolucionar, tanto para promover mudanças quanto para preservar o status quo.
É visto como instrumento e como fim ultimo, como recurso e como meio de vida”.


(Marco Aurélio Nogueira, no livro Potência, limites e seduções do poder, pág. 9 – Editora UNESP, São Paulo, 2008)

Merval Pereira:: Título de cidadania

DEU EM O GLOBO

O Morro do Cantagalo, fincado entre Copacabana e Ipanema, no coração da Zona Sul do Rio, tem tudo para se transformar no laboratório de uma medida pioneira, que seria uma consequência concreta da ação do governo do estado de retomar o controle territorial com as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs).

Durante quatro meses do ano passado, com o financiamento do Instituto Gerdau e o apoio de escritórios de advocacia e de engenharia, o Instituto Atlântico, entidade apartidária cuja missão é propor, e testar na prática, políticas públicas inovadoras, desenvolveu um projeto de cadastramento geral dos moradores e o levantamento da topografia detalhada do morro, com o objetivo de conceder a titulação plena dos possuidores de lotes e unidades residenciais.

São 1.456 domicílios e cerca de 5 mil moradores, 79% dos quais vivem lá há mais de 20 anos. O economista Paulo Rabelo de Castro, presidente do Instituto Atlântico, esteve ontem com o prefeito Eduardo Paes para tentar viabilizar um acordo para a concessão dos títulos.

O projeto de demarcação do Instituto Atlântico já estava sendo tocado independentemente da ação dos governos estadual e municipal, e esta é a segunda ocasião em que a iniciativa privada e a governamental se cruzam.

Na primeira vez, houve uma parceria que pode indicar o melhor caminho para a resolução dos problemas burocráticos e legais. Terminada a etapa de levantamentos e conferências de dados, o Instituto Atlântico entrou com uma Petição Inicial da Ação de Usucapião Especial Coletiva, inédita no meio jurídico, que está em tramitação na 7aVara da Fazenda Pública Estadual.

Ao mesmo tempo, o governo do estado se interessou pelo projeto, e o vicegovernador, Luiz Fernando Pezão, passou a coordenar os esforços, que resultaram no projeto de Lei Complementar 27, que autoriza o Poder Executivo a tomar iniciativas de alienação de áreas do estado hoje ocupadas por favelas, em benefício de seus atuais possuidores, mediante determinadas condições.

Para Paulo Rabelo, a decisão do governo de retomar o controle territorial do complexo de favelas do Cantagalo e Pavão-Pavãozinho “é uma ação paralela”, mas a ocupação fundiária poderia anteceder a ocupação territorial. “Agora, a questão fundiária passa a ser uma exigência”, avalia.

O território, que antes era dominado pelos traficantes, precisa ter dono, e o trabalho inicial já foi todo feito. O que está sendo negociado com a prefeitura é o “auto de demarcação”, que pode ser feito por meio de um convênio não oneroso com o Instituto Atlântico, desde que aceitem a demarcação já feita.

Como o estado já aprovou a lei complementar que permite a doação, pode se antecipar e conceder o título, em cerca de 90 dias. Segundo Paulo Rabelo, a organização fundiária de uma comunidade é parte essencial de um amplo projeto de segurança para os próprios moradores e bairros circunvizinhos.

O Instituto Atlântico desenvolveu o que chamam de “tecnologia social”, conjunto de técnicas de intervenção comunitária baseado no princípio da auto-organização.

Por meio da associação dos moradores, toda a população do Cantagalo participou das discussões do projeto desde o início, e todos os moradores deram autorização por escrito para o levantamento.

O aumento dos encargos tributários e de tarifas de serviços públicos que acontecerá com a regularização e o título definitivo, por exemplo, foi muito debatido.

Um dos objetivos será conseguir do estado cobranças reduzidas durante um período de transição, até que a comunidade esteja adaptada à nova situação.

A comunidade do Morro do Cantagalo tem as mesmas características básicas das demais favelas da cidade.

Um estudo recente sobre as favelas do Rio do Instituto de Estudos de Política Econômica — Casa das Garças — mostra que “o ciclo de urbanização básica terminou.

A infraestrutura essencial não é significativamente diferente de outras partes urbanizadas da cidade”.

Tomando por base os dados do Censo de 2008 da Rocinha, complexos do Alemão e Manguinhos, Parada de Lucas e Vigário Geral, o estudo mostra que a residência típica das favelas seria de alvenaria (95%) e teria energia elétrica (100%); água da Cedae ( 99%); rede de esgoto (96%); coleta de lixo (96%); e iluminação na rua (93%).

No Cantagalo, os números encontrados pelo Instituto Brasileiro de Política Social (IBPS), que fez o cadastramento dos moradores, são semelhantes: 94% têm água e esgoto; a coleta de lixo é feita em caçamba para 69% dos moradores e 23% têm coleta regular; 86% têm telefone e 75% têm medidor de luz.

Nas favelas do Rio, quase todos os imóveis são próprios, com exceção da Rocinha, onde 33% são alugados.

No Cantagalo, 77% dos imóveis são próprios.

Esse estudo da Casa das Garças diverge do diagnóstico do economista Paulo Rabelo de Castro quanto à prioridade de ações, concordando com a estratégia do governo do estado.

“Devido à existência do controle territorial armado por narcotraficantes e milícias, a retomada definitiva, com a retirada das armas, é uma questão estratégica e não tática”, afirma.

O trabalho chegou à conclusão de que “o estado e a sociedade civil estão presentes nas favelas. A ausência do estado ocorre apenas em uma função: o policiamento ostensivo. Porém, este é o ponto primordial para que todos os demais direitos e equipamento sejam acessados”.

O estudo indica como ação prioritária após a “retomada definitiva e a pacificação”, entre outras, a formalização dos negócios e a regularização da situação fundiária e de habite-se. O mesmo grupo prepara-se agora para analisar as experiências de regularização de títulos em diversos países.

Dora Kramer:: Transgressão continuada

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Contrariando a impressão geral, o presidente Luiz Inácio da Silva não acha que as cenas do escândalo que mostra uma quadrilha de corruptos em ação em Brasília sejam autoexplicativas.

"As imagens não falam por si", declarou o presidente, sem explicar por quem, então, falariam. A declaração não foi feliz, embora se entenda que na posição dele qualquer juízo mais rigoroso seria interpretado como incongruência em relação à posição sempre condescendente para com transgressões de toda natureza.

Uma exposição desnecessária a esse tipo de cobrança, visto que do ponto de vista político-eleitoral o serviço está feito, independentemente do julgamento do presidente. Justamente porque as imagens falam por si e Lula sabe disso.

Se pôde dizer que não sabia das atividades da organização - "criminosa" no dizer do Ministério Público - que atuava em seu próprio partido, sobre as falcatruas ocorridas na casa do adversário é que não tem mesmo a menor responsabilidade, embora pudesse talvez uma vez na vida censurar malfeitorias no lugar de procurar sempre amenizá-las.

Mas fato é que o abacaxi da vez cabe à oposição descascar. Pode fazê-lo com maior ou menor competência.

A ala mais esperta do DEM sentiu logo o frio do perigo a rondar as respectivas nucas. Optou pela redução de danos, tratando de considerar as acusações "consistentes", na expressão do prefeito Gilberto Kassab, e a situação do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, "insustentável", na avaliação dos senadores Agripino Maia e Demóstenes Torres.

Não obstante os conselhos da voz da experiência, o partido preferiu chafurdar no pântano das evasivas. Consta que a cúpula teria ficado impressionada com a "firmeza" da defesa de Arruda e intimidada com a rudeza da ameaça de "radicalizar" com o partido caso o partido resolvesse radicalizar com ele. Vale dizer, expulsá-lo ou convidá-lo a se retirar.

As ameaças foram relatadas pelos participantes da reunião e, 24 horas depois, negadas. Ou seja, o DEM pôs panos quentes em uma tentativa de chantagem.

Por parte de um correligionário com histórico de transgressão continuada. Há oito anos violou o sigilo do painel de votação do Senado.

Depois disso mentiu com direito a simulação de indignação de choro no plenário, além de juras em nome dos filhos. Em seguida, admitiu a fraude, declarou arrependimento e enganou o eleitorado do Distrito Federal a quem convenceu de que o episódio fora apenas um tropeço.

Eleito deputado e, na condição de parlamentar e candidato ao governo de Brasília, prevaricou ao distribuir alimentos em troca de votos. Governador eleito, prevaricou de novo ao se tornar herdeiro voluntário das operações escusas do antecessor Joaquim Roriz. Ao ponto de abrigar o operador - hoje denominado "o denunciante" - do esquema, dono de fornida folha corrida de processos, na Secretaria de Relações Institucionais.

Coisa que não pode ser chamada de ironia do destino por ser uma zombaria premeditada.

Governador em exercício, Arruda continuou prevaricando como se vê pela gama de corruptos filmados que o cercam no governo e na base parlamentar.

Ameaçado pelo tal secretário, Durval Barbosa, prosseguiu transgredindo, curvando-se à pressão do bandido e ao mesmo tempo permitindo que ele agisse, já que, se foi chantageado, sabia do conteúdo das potenciais denúncias.

Poderia, se pudesse ou quisesse, ter explodido o esquema. Acabou carbonizado por ele.

Isso posto e exposto, José Arruda não se deu por satisfeito. Depois de fraudar, mentir e prevaricar, partiu para a chantagem, ameaçando seu partido de cair atirando, revelando que os dutos de desvio de dinheiro público sob sua jurisdição haviam servido para irrigar outras paragens no cenário nacional.

Fosse apenas por isso, o DEM já não teria outra saída a não ser a expulsão. Sob pena de repetir a submissão de Arruda à chantagem de seu secretário de Relações Institucionais e acabar junto com ele habitando as profundezas do mar de lama.

Antes da reunião em que examinaria ontem a questão, o partido tendia a dar dez dias para o governador "se explicar", alegadamente com receio de que a expulsão sumária pudesse dar margem a contestação judicial sob o argumento da supressão do direito de defesa.

Juridicamente pode até ser o mais prudente, mas politicamente são dez dias de hesitação, e esperança de que o caso "esfrie", que destruirão os já abalados alicerces do partido.

E com eles as estruturas de quem estiver por perto.

Jurisprudência

A surpresa do presidente Lula pela inexistência de cópias piratas do filme sobre a sua vida poderia ser vista como uma brincadeira, não fosse o antecedente de ter requisitado um DVD clandestino para assistir a Dois Filhos de Francisco a bordo do avião presidencial, antes do lançamento oficial.

Zuenir Ventura:: O pastelão do DEMsalão

DEU EM O GLOBO

Vendo e revendo os incríveis vídeos de Brasília, é inevitável o espanto de se ter mais um mensalão. Depois de tudo o que aconteceu em 2005, quando estourou o escândalo do PT, manchando uma até então bela história de 25 anos (e sem falar no do PSDB mineiro), acreditava-se que, quando nada por precaução, nenhum partido iria repetir o episódio, pelo menos em igual escala e desplante. Pois a reprise veio em dose maior, quanto ao volume de dinheiro e à visibilidade.

Em matéria de cinismo e de humor involuntário, o mensalão do DEM — ou DEMsalão, como está sendo chamado — apresentou novos ingredientes que transformaram o que deveria ser um drama moral num impagável pastelão, com cada personagem mais cara de pau do que o outro.

Não há como não rir das desculpas esfarrapadas como as do advogado do governador alegando que o dinheiro arrecadado era para comprar panetones (o que provocou um “haja panetones!” do ministro Ayres Britto, do STF). Igualmente hilária foi a cena do presidente da Câmara Legislativa tentando esconder meio desajeitado maços de dinheiro por todo o corpo, inclusive nas meias, por medida de segurança: “Eu não uso pasta.” Vejam se não parece piada ele se chamar Leonardo Prudente.

Mais prático foi o empresário Alci Colaço, que usou a cueca. E o espetáculo da oração da propina? Nem um grande humorista conseguiria inventar um número como o daqueles três cínicos agradecendo a Deus por Durval, “bênção em nossas vidas” (o Senhor não deve ter ouvido, porque a “bênção” saiu pela culatra e virou castigo). Diante desse quadro, o desânimo atinge até figuras como o senador Pedro Simon, peça ímpar de resistência moral.

No debate do GLOBO, ele manifestou todo o seu ceticismo. Acha que não se deve esperar nada do Congresso. Só a mobilização popular seria capaz de mudar a situação. Seu desencanto é maior devido ao fato de que até “24 horas antes” ele era fã do governador José Roberto Arruda, considerado “um administrador exemplar”, com 75% de aprovação popular.

A socióloga Maria Aparecida Fenizola, porém, defende a tese de que a corrupção não aumentou, “apenas ficou mais transparente e nós, mais informados”. De fato, graças à moderna tecnologia audiovisual, é mais difícil esconder as trapaças. As chances de serem descobertas são muito maiores hoje. Isso é confirmado pela ONG Transparência Internacional, segundo a qual o Brasil melhorou cinco pontos no ranking geral, passando da 80ª posição em 2008 para a 75ª de agora, com um índice de 3,7 numa escala de 10. Na verdade, o nosso problema maior é a impunidade.

Basta ver o que aconteceu com os personagens dos mensalões passados. Algum está preso?

Assim como os outros, o escândalo de agora corre o risco de terminar em pizza. Ou em panetone.

Celso Ming:: A ruptura perde espaço

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A oposição está chegando às eleições sem bandeira e sem discurso, como esta coluna tem mostrado, mas talvez isso signifique mais do que simplesmente um apagão político.

Talvez seja a manifestação de algo mais profundo, como a impossibilidade de se fazer uma administração do Estado em contraste com as anteriores, como ocorreu tantas vezes no passado.

Segunda-feira o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, defendeu que já não é possível mudar radicalmente a política macroeconômica, que se baseia num tripé: forte superávit primário para assegurar a redução da dívida e o equilíbrio orçamentário; câmbio flutuante; e sistema de metas de inflação.

Meirelles pode ser contestado, mas, pelo menos num sentido, pode ter razão. A hipótese de confrontação ficou mais difícil. Seria preciso uma catástrofe econômica para justificar o sepultamento da que hoje é considerada uma receita bem-sucedida.

O governo Lula se preparou no início desta década para uma administração de rompimento radical "com tudo o que está aí". O Congresso do PT realizado em Olinda em 2001 emitiu um documento que pretendia definir as diretrizes do que seria um governo de mudança. Seu título dizia quase tudo: A Ruptura Necessária.

Mas, à medida que se consolidou sua candidatura, a realidade exigiu manobras que conduziram as forças políticas a direções opostas. Em junho de 2002, o então candidato Lula entendeu que seria imprescindível assinar a Carta ao Povo Brasileiro, por meio da qual "o PT beijou a cruz". Lá disse que, uma vez investido do mandato popular, seu governo se comprometia a respeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal, a cumprir o superávit primário e a puxar os juros para garantir o controle da inflação. Foi o que fincou as bases dos oito anos de sua administração. Até onde os compromissos foram cumpridos ou não é outra conversa.

O importante é entender que a ideia de ruptura não teve curso. Apesar da retórica sobre a "herança maldita", a administração Lula foi de relativa continuidade, com Palocci e Meirelles garantindo o respeito à ortodoxia econômica.

Ainda sobrevivem, no governo Lula e na oposição, rompantes de ruptura. A atual orientação do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) insiste em que está tudo errado no câmbio e nos juros e que é preciso adotar uma política econômica mais parecida com o modelo chinês do que com o dos países ricos. Paradoxalmente, é mais ou menos o que tem dito o principal pré-candidato da oposição à Presidência, o governador José Serra, que pede um rigor fiscal até agora não visto em governos anteriores.

Depois que a economia passou incólume pela maior crise global desde os anos 30, fica difícil sustentar o modelo de ruptura. O que se pode dizer é que provavelmente chegou o momento em que não há mais divergências profundas de programa. A administração do Estado brasileiro chega a uma fase similar ao que ocorre na Europa e nos Estados Unidos, em que os partidos se sucedem no governo, mas a forma de administrar não muda muito.

A partir do momento em que a novidade for percebida e aceita pelos partidos e pela sociedade, ficará mais fácil compreender o quadro eleitoral. A defesa de uma plataforma de mudanças se parece mais com a da campanha de Barack Obama: é mais sutil.

Confira

Em novembro, a política externa do Brasil emplacou três grandes fiascos.

O primeiro foi a realização da reunião de cúpula da Amazônia, que deveria trazer 10 chefes de Estado, mas só trouxe 3.

O segundo foi sustentar o insustentável: a necessidade da volta de Manuel Zelaya ao governo de Honduras, mesmo depois do término do seu mandato, previsto para 27 de janeiro.

E, finalmente, tolerar que a Argentina barre os brinquedos brasileiros. O Mercosul é o único bloco comercial que reconhece os brinquedos como produtos comercialmente sensíveis.

O QUE PENSA A MÍDIA

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Paulo R. Haddad:: 3 concepções de um New Deal brasileiro

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O New Deal foi um programa de investimentos maciços em obras públicas que o presidente Roosevelt concebeu e executou com grande sucesso para retirar a economia norte-americana da Grande Depressão. Que concepções de um New Deal se pode observar entre os que defendem essas políticas no atual contexto da crise econômico-financeira no Brasil?

Em primeiro lugar, tem-se o que se pode denominar a concepção de um keynesianismo ingênuo, que defende a expansão do gasto público e da redução da carga tributária sem se preocupar com sua focalização, sua composição e seus impactos de médio e de longo prazos.

De fato Keynes chegou a afirmar que, se o governo autorizasse o emprego de pessoas para encher velhas garrafas com dinheiro, enterrasse-as bem fundo em minas de carvão desativadas, enchesse essas minas com lixo da cidade e deixasse as empresas privadas desenterrarem o dinheiro, poderia não haver mais desemprego. Ora, interpretando ao pé da letra, todo o gasto público com custeio de pessoal e com políticas sociais compensatórias se justificaria à medida que a elevada propensão a consumir desses grupos sociais ajudaria a alavancar a demanda agregada com seus efeitos multiplicadores. Esses efeitos poderiam reduzir a ociosidade da capacidade produtiva disponível na economia e estimular a aceleração de novos investimentos, provocando a interação do multiplicador com o acelerador, com seus efeitos benéficos para os mercados de trabalho.

Na verdade, a principal mensagem de Keynes não recomendaria o gasto público adicional em formas bizarras de desperdício dos recursos dos contribuintes. Sua proposta era a de que o déficit público deveria ser usado para construir habitações ou executar obras do mesmo gênero. Mas é o gasto em si, e não o tipo da atividade, que iria contribuir para a retomada do crescimento.

Assim, tem-se uma segunda concepção, de um New Deal que enfatiza o gasto público e os incentivos colaterais para eliminar os gargalos ou pontos de estrangulamento da economia, visando a acelerar o seu crescimento. Incorpora-se, nessa concepção, uma visão de longo prazo para orientar a composição do gasto público e a direção dos incentivos fiscais e financeiros.

No Brasil, o início da recessão encontrou um programa de obras públicas (o PAC) bem concebido e estruturado, e com muitos grandes projetos de investimento sendo realizados em diferentes setores. De fato, o que se necessita é acelerar o próprio PAC com mais recursos fiscais e financeiros, com mais flexibilidade operacional e com mais convicção política de que esse tipo de gasto público é, no longo prazo, qualitativamente superior aos gastos correntes que não param de crescer atualmente, uma vez que os interesses das futuras gerações não estão sendo devidamente representados pelo Estado no processo decisório.

Uma terceira concepção poderia denominar-se "New Deal da sustentabilidade ambiental". Muitos países (China, Coreia do Sul, Austrália, Dinamarca, Reino Unido, EUA), ao desenhar os pacotes de recuperação do seu processo de crescimento econômico, deram particular atenção aos estímulos e investimentos para a segurança energética, às infraestruturas de baixo carbono, à proteção e à preservação ecológica.

Dois exemplos são ilustrativos no caso brasileiro. Será imensa a geração de empregos que resultará dos investimentos de modernização ou de reestruturação dos atuais padrões de produção e de consumo do País para atender às metas de redução das emissões de carbono, se estas forem expressivas. Da mesma forma, os investimentos previstos no Plano Nacional de Recursos Hídricos serviriam para equacionar a questão dos conflitos no uso múltiplo da água, um bem que tende a ser mais escasso do que o petróleo no Brasil de 2050.

Trata-se de um passo à frente na concepção de um "New Deal Verde", visando a proteger e a promover os ecossistemas, o que é vital para a produtividade da economia e o bem-estar das populações no futuro. Mais do que uma visão de longo prazo, essa concepção incorpora um novo paradigma de desenvolvimento, com suas tecnologias limpas, agricultura sustentável, cidades sustentáveis, etc., e, principalmente, com suas preocupações distributivas quanto aos benefícios do progresso econômico e social entre as gerações presentes e as gerações futuras.

*Paulo R. Haddad, professor do IBMEC/MG, foi ministro do Planejamento e da Fazenda no governo Itamar Franco

Vinicius Torres Freire:: Brasil, Dubai e paraísos exóticos

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

"Crise da dívida" de Dubai afeta mais países do Oriente Médio, da periferia europeia e revela mais inépcia de bancos

A NOVELA EXÓTICA das finanças destes dias, Dubai, ainda não acabou. Os títulos da dívida de uma empresa da holding estatal Dubai World vencem de fato no dia 14 deste mês (US$ 4 bilhões). Ainda está por ser definido o que o emirado entende pela reestruturação de US$ 26 bilhões da sua dívida. Dubai é um dos sete Emirados Árabes Unidos, que ficam no leste da península da Arábia. Endividou-se nos últimos cinco anos para construir ilhas artificiais cheias de empreendimentos imobiliários caros e para se tornar um centro financeiro e o maior entreposto comercial da região. Com o colapso imobiliário, o emirado foi à breca. Bancos do emirado vizinho de Abu Dhabi e do Reino Unido estão entre as principais instituições financeiras credoras. Ainda pouco se sabe das conexões da dívida de Dubai, mas os entendidos acreditam agora que o potencial de danos seja pequeno. Temia-se até o calote dos US$ 59 bilhões da dívida total da Dubai World.

Os mercados financeiros estiveram bem nervosos quando o emirado anunciou de forma confusa uma espécie de moratória, na semana passada, em especial porque era feriado nos EUA. As praças americanas abriram, tomaram seus tombinhos de susto, tropeço que "estava no preço" dadas as perdas em mercados asiáticos e europeus. Mas, depois, nada. A ameaça de tempestade do deserto se dissipa em quase todo mundo. Quase. Países da região começam a apanhar, como o mercado egípcio, embora não se saiba se isso seja apenas a paranoia regular de investidores.
Países pequenos, periféricos e superendividados da Europa, como Irlanda e Grécia, também veem subir os custos de financiamento de suas dívidas.

Mais relevante para o Brasil é que nós, desta vez, não parecemos os mercados exóticos. A Bolsa brasileira reagiu por mímica e devido ao estereotipado "medo de contágio". E, depois, nada.
Mesmo neste período em que os "estrangeiros" diminuíram bem seus negócios por aqui, em parte devido ao IOF, em parte devido a uma ligeira redução do chamado "apetite por risco" que sobreveio à imensa alta dos mercados financeiros. Ressalte-se o motivo da nossa "normalidade": temos dívida pública que, agora, é relativamente pequena, dadas as despesas que as economias centrais fizeram para salvar seus financistas e sua pele.

A lição restante do caso é que os bancos europeus não se cansaram de fazer besteira, de alocar capital de maneira inepta, quando não corrupta, nos anos de boom. Os bancos americanos foram o centro de criação da tecnologia financeira que provocou a crise de 2008/9, mas, pelo jeito, cometeram a maior parte de suas incompetências em casa. Os europeus ocidentais se enrolaram no Leste Europeu, nos países menores da Europa, nos Estados Unidos e, vê-se agora, também fizeram lambança ao dar crédito ao excesso de investimento da ilha da fantasia de Dubai. Note-se que alguns dos bancos mais expostos são instituições britânicas que apenas não faliram porque foram estatizadas e/ou receberam favores do governo. Mas o risco de calote de Dubai não piscava forte nos radares financeiros.

Sabe-se lá quanta inépcia ainda está escondida nos livros obscuros da banca euroamericana.

Rosângela Bittar:: Sem vencedores

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Difícil estabelecer um quadro clássico de vantagens e desvantagens que se evidenciam a cada escândalo de corrupção nos poderes constituídos a partir deste mais recente, o protagonizado pelo governador José Roberto Arruda (DEM), do Distrito Federal. À primeira vista, tudo é negativo, e para todos. Nem o PT, maior adversário do grupo desnudado em praça pública nos últimos três dias, exposto em vísceras nas redes de TV, para todo o Brasil, tem razões para comemorar.

O mensalão candango do DEM, descoberto depois do mensalão mineiro do PSDB e do mensalão federal do PT, reaviva no partido do presidente Lula as lembranças de agonias políticas recentes. Exatamente em um momento que já julgava superada, totalmente, a fase aguda de sua redução moral, pois vinha entrando, com tudo, no esforço de reabilitação dos seus processados e seus dirigentes que comandaram o declínio.

Para a campanha presidencial do PT pode-se vislumbrar uma nuance apenas levemente positiva na perda do discurso oposicionista contra a corrupção, todos agora flagrados nas práticas condenadas, mas não se vê aí grande alívio, dado que este discurso, por inócuo, estava praticamente fadado ao ostracismo, não empolgava mais o eleitorado, como se viu em campanhas também recentes.

O DEM, óbvio, é o partido que mais perde, e o que já foi embora na lama é irrecuperável, sabe bem disso. Tem um único governador - por sua vez já eleito numa superação de escândalo por falta de decoro no Senado Federal - e um único Estado, o Distrito Federal, a que ligou seus principais políticos, formuladores, técnicos, ex-governadores, ex-prefeitos, ex-ministros. A vitrine administrativa do partido, o governo do Distrito Federal, fez água, como foi para o ralo, neste momento, a imagem do guerreiro contra a corrupção, contra a alta de impostos, contra a velha política dos coronéis, que seria agora superada por um partido renovado no nome e na liderança de jovens a quem foi entregue seu destino.

Arruda estava nesse grupo, o dos modernos do DEM, que para demonstrar autonomia e independência se deram ao luxo de rachar o partido, já pequeno, coadjuvante na aliança, em torno das duas hipóteses de candidatura do PSDB a Presidente da República, Aécio Neves (PSDB), o governador de Minas Gerais, e José Serra, o governador de São Paulo. É verdade que, por ser o dono do poder de que o partido desfrutava, Arruda parecia um tanto ambíguo nesta divisão, ora pendendo para um lado, ora para outro. Mas seu grupo fechou com um dos lados e seguia em frente.

Os candidatos do PSDB perdem muito com a neo-decadência do DEM. Formando com os tucanos a aliança que construirá a candidatura presidencial de oposição, o DEM deixa o PSDB sem condições de tirar do partido o candidato a vice, esta é uma dificuldade real, embora seja um assunto que, nos escalões decisórios desta campanha, passará a existir apenas depois de maio ou junho de 2010. Não que o vice fosse necessariamente o governador do Distrito Federal, que chegou a ser citado vez ou outra, ou que o partido fizesse questão de indicar o vice, mas qualquer um integrante da legenda terá sua biografia atrelada agora à rapidez e asserção com que a legenda providenciará a solução do caso. No momento, parece lenta a reação. Cassar direito de defesa a torto e a direito, não é o que se propõe, mas evidências tão gritantes às vezes sugerem processos políticos mais rápidos.

A questão central, porém, não é o vice, e nem mesmo a falta de um palanque para o candidato da oposição em Brasília, onde o popular Arruda se candidataria a uma reeleição que no momento parece condenada. O PSDB não tem a mais leve possibilidade de prescindir do DEM na sua aliança, pelo tempo de televisão do partido no horário eleitoral gratuito. Portanto, esta aliança não corre riscos, mas será mantida, nitidamente, por uma necessidade vital, como de resto é a aliança que o presidente Lula busca, para o PT, no PMDB. O Democratas, em sua nova fase de partido moderno, não poderia se imaginar nesta comparação.

Perde imensamente a política. O revés sofrido pelo DEM comprova que sair dos grotões, tentar uma sobrevivência política longe dos velhos coronéis para lançar âncoras no meio urbano, não é por si uma garantia de modernidade, probidade, ética, alta política. O que se vê, nos sucessivos últimos escândalos, todos urbanos e sem a liderança da viciada caciquia, é uma massa política amorfa, sob o império de comandos evangélicos, corporações, grileiros, estranhos em geral, que ainda não disseram qual é a sua, a não ser transformarem-se em artistas principais de vídeos gravados às escondidas para flagrar o farto recebimento de propina.

A evolução da política não melhorou a representação da sociedade, vítima maior e maior perdedora, sempre, da ação do político predador.

By the way

Provou-se mais uma vez acertada a decisão do governador José Serra de deixar para o ano que vem a definição e lançamento de sua candidatura, se por ela decidir. A ansiedade política não tem levado a absolutamente nada, a não ser à armação de arapucas.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

CHARGE - Natal antecipado em Brasília

Fernando Rodrigues:: A insignificância de Brasília

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Se o mensalão do DEM ficar circunscrito aos políticos locais apanhados nos vídeos já apresentados, o impacto sobre a disputa presidencial de 2010 será zero ou muito perto disso.

Brasília é uma anomalia na organização geopolítica brasileira. Deveria ser só uma cidade administrativa no interior de Goiás. Aos poucos, ganhou todos os benefícios de um Estado. Tem três senadores, oito deputados federais e até uma espécie de Assembleia Legislativa, a quase inútil Câmara Legislativa.

A capital federal tem destaque na mídia por ser a sede dos três Poderes. Na prática, sua relevância como plataforma política é ínfima. Com 1,7 milhão de pessoas aptas a votar, responde por apenas 1,3% do eleitorado brasileiro.

Fosse o Piauí (1,7% dos eleitores brasileiros) o palco do mensalão do DEM, a visibilidade do escândalo tenderia a ser menor.

Um fato inescapável é Brasília ter sido inaugurada em 1960. Em 50 anos de existência, nunca produziu um único político de expressão nacional. Seu governador mais bem-sucedido talvez tenha sido Cristovam Buarque. Eleito pelo PT em 1994, popularizou o Bolsa Escola.

Civilizou o trânsito (motoristas respeitam a faixa de pedestres). Mesmo assim, não se reelegeu. Em 2006, candidato a presidente pelo PDT, teve 2,7% dos votos.

Do ponto de vista do Democratas, o partido já tem uma imagem depauperada. Rumará com mais rapidez para o oblívio, ampliando sua tucano-dependência -com poder reduzido na formação da chapa presidencial. Mas o tempo de TV para o PSDB continua garantido.

Tudo considerado, a insignificância política de Brasília minimiza o impacto do mensalão do DEM sobre a eleição presidencial. Exceto se o escândalo transbordar para outros Estados e houver aspersão de lama em políticos de maior calibre.

Uma hipótese ainda remota, embora não improvável.

'As imagens não falam por si'

DEU EM O GLOBO

Lula diz que é preciso esperar resultado de investigações sobre Arruda e propinas

Deborah Berlinck*, Cristiane Jungblut e Gerson Camarotti ESTORIL (Portugal) e BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que as imagens de gravações mostrando o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (DEM), além de assessores e deputados aliados, recebendo maços de dinheiro de um suposto esquema de corrupção investigado pela Polícia Federal “não falam por si”. Lula inicialmente se esquivou de comentar o escândalo já chamado de mensalão do DEM, dizendo que vai esperar o resultado das investigações.

Argumentou que presidente da República “não dá palpite”, apesar das defesas veementes que fez recentemente de aliados como o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), por exemplo.

Quando uma repórter perguntou se as imagens de Arruda e seus assessores recebendo dinheiro não falavam por si, o presidente respondeu: — A imagem não fala por si. O que fala por si é todo o processo de apuração e investigação — disse.

Lula insistiu na necessidade de se esperar o resultado das investigações: — Quando tiver toda a apuração e toda a investigação terminadas, a Polícia Federal vai ter que apresentar um resultado final do processo. Aí anuncia e você pode fazer juízo de valores. Mesmo assim, quem vai fazer juízo de valores final é a Justiça.

O presidente da República não pode ficar dando palpites se é bom ou se é ruim. Vamos aguardar a apuração.

O presidente cobrou do Congresso a votação da reforma política que, segundo ele, poderá evitar que “problemas como este continuem ocorrendo no Brasil ”. Ele lembrou que o governo mandou duas propostas ao Congresso, uma delas sobre financiamento público das campanhas eleitorais. Apesar disso, porém, em seus sete anos de governo, sua base no Congresso jamais trabalhou de fato pela aprovação de uma reforma política.

— Eu espero que o Congresso Nacional tenha maturidade para compreender que grande parte dos problemas que acontecem com dinheiro é a questão da estruturação partidária no Brasil. Vamos mudar urgentemente e fazer uma reforma política. Ela é condição fundamental para que a gente tente evitar que problemas como este continuem ocorrendo no Brasil — disse o presidente.
PT, em tom moderado, diz que não será ‘oportunista’

O presidente nacional do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), adotou tom parecido com o do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e disse que o partido — arrastado pelo escândalo do mensalão em 2005 — não agirá de forma oportunista em relação às denúncias de práticas semelhantes de corrupção envolvendo o governador José Roberto Arruda (DEM).

Segundo Berzoini, e outros petistas, o PT quer a apuração de todos os fatos e considera a situação de Arruda muito grave, mas, como diziam dos dirigentes petistas e de Lula em 2005, alegam que não se pode generalizar e cobrar que o comando do DEM soubesse de todas as supostas irregularidades de Arruda.

Na verdade, a estratégia do Palácio do Planalto e do PT de evitar agora ataques contundentes ao DEM tem o objetivo de mostrar postura diferente da do então PFL (hoje DEM) em 2005, e, com isso, demonstrar que todos os partidos possuem graves defeitos éticos. E tentam também reduzir o impacto, em 2010, dos efeitos do mensalão do PT, de 2005.

A avaliação política do PT sobre a fala de Lula é que, quanto mais tempo demorar uma solução sobre Arruda no DEM, maior será o prejuízo eleitoral para a oposição. Se o DEM tivesse decidido pela expulsão imediata de Arruda, teria mostrado uma atitude diferente da que teve o PT em 2005.

No Congresso, as declarações de parlamentares e dirigentes petistas oscilam da cautela ao ataque a Arruda, mas todos concordam que o PT local será o beneficiado em 2010.

— O PT tem que ser firme, mas não como agiram alguns opositores do governo federal. O PT não agirá de maneira oportunista. Temos que exigir (a apuração), até porque o Arruda ficou numa situação muito delicada em função das imagens.

Isso não é cautela, é uma postura de serenidade — disse Berzoini, afirmando não ter conversado com Lula. — É muito grave. As imagens de Arruda, mesmo quando não era governador, são incompatíveis com às de um homem público. Ele perde capacidade de se manter no governo.

Mas não achamos correto generalizar.

Que é (um mensalão ) do DEM, está claro.

Mas não pode cobrar do presidente do DEM que ele saiba de tudo o que acontece no DEM.

O lider do PT, deputado Cândid o Vaccarezza (SP), também cauteloso, disse que sempre teve essa posição: — Temos indícios de corrupção de dinheiro público, o que não é comprovação. Assim, não é porque as evidências são marcantes que vamos fazer um discurso político. Não acho que é o DEM (como um todo) que está sendo acusado.

Num tom diferente, o secretário-geral do PT, deputado José Eduardo Cardozo (SP), pediu a saída imediata de Arruda.

— É um escândalo de grandes proporções.

Embora ele (Arruda) tenha direito a se defender, pela contundência das provas, parece caso de impeachment. Parece evidente que não se tratam de despesas não contabilizadas em ano eleitoral. As provas acerca da autoria dos delitos parecem irrefutáveis — disse Cardozo

CHARGE- Video cassetada

Jornal do Commercio (PE)

Alvo de suspeita, PPS desqualifica antigo aliado

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Leandro Colon, BRASÍLIA

Suspeito de cobrar propina no governo do Distrito Federal, o PPS optou por desqualificar o governo de José Roberto Arruda (DEM) e Durval Barbosa, ex-secretário de Relações Institucionais. O partido evitou responder ao conteúdo do vídeo - revelado ontem pelo Estado - em que uma empresária acusa a cúpula da sigla de chantagear e pedir propina para manter um contrato de R$ 19 milhões com a Secretaria de Saúde, comandada pela legenda por meio do deputado federal Augusto Carvalho.

De acordo com a gravação, a empresária Nerci Bussamra, diretora da Uni Repro Serviços Tecnológicos Ltda, diz a Barbosa que o dinheiro seria enviado a São Paulo para ajudar o presidente do PPS, ex-deputado Roberto Freire.

Ontem, o dirigente partidário divulgou uma nota, em que acusa Barbosa e a empresária. "O bandido grava a si mesmo em conversa com a empresária e acredita que isso vá virar verdade? Um jogral de bandidos cita meu nome com a expectativa de produzir evidência? Repilo", disse.

No diálogo, Nerci diz que Fernando Antunes, subsecretário de Saúde e presidente do PPS-DF, foi quem fez uma auditoria nos contratos para achacar a empresa e pedir propina para ajudar a sigla.

"Na última conversa que eu tive com ele, ele pediu dinheiro para o partido dele, né, para ajudar o Freire em São Paulo e eu não disse não pra ele", disse.

"REPRESÁLIAS"

Carvalho, que pediu demissão do cargo de secretário, divulgou nota ontem em que não faz menção ao conteúdo do vídeo. Ele apenas negou ligação com propinas e o "mensalão do DEM" no Distrito Federal.

"As acusações infundadas são nada mais que represálias às ações tomadas durante a minha gestão na Secretaria de Saúde", disse Carvalho. "É ação criminosa de quem, não tendo seus pleitos atendidos, buscou delação premiada, como se ele mesmo não tivesse totalmente envolvido com os ilícitos. É bom lembrar que pesam contra o delator 37 processos", afirmou.

Além do vídeo revelado ontem pela reportagem, a investigação da Polícia Federal, apelidada de Caixa de Pandora, inclui gravações em que José Roberto Arruda e Durval Barbosa - demitido na sexta-feira passada, após a revelação de que colaborou com a polícia - criticam a ação do PPS de montar um esquema de desvio de recursos.

Para o delator, o partido estaria atrapalhando os planos do DEM de arrecadação de recursos.

Durval também acusa políticos do PPS do DF

DEU EM O GLOBO

Ex-secretário de Saúde, apontado como um dos beneficiários do esquema, nega participação

Evandro Éboli

BRASÍLIA. O deputado federal Augusto Carvalho (PPS-DF), que deixou anteontem a Secretaria de Saúde do Distrito Federal, foi apontado por Durval Barbosa Rodrigues como mais um beneficiário do esquema de corrupção que atingiu o governo, deputados distritais e outros políticos.

Durval, que delatou as negociatas, disse aos procuradores do Ministério Público que parte do dinheiro embolsado pelo empresário Alcir Colaço, flagrado pelas imagens guardando maços de notas de R$ 100 na cueca, foi destinado a Carvalho e ao seu então subsecretário, Fernando Antunes, presidente do PPS no DF.

Deputado diz que denúncias são fruto de represália João Luiz, ex-subsecretário de Recursos Humanos da secretaria, também foi filmado recebendo R$ 20 mil de Durval. Esse dinheiro seria referente a contrato da Unirepro, uma empresa de software de impressão, reprografia e de gráfica. Esse montante seria para o próprio João Luiz. Uma diretora da Unirepro aparece numa das imagens entregando dinheiro a Durval e afirma que o destino é Augusto Carvalho e Fernando Antunes.

Freire vai à Justiça exigir retratação de empresária que o acusou

DEU NO´PORTAL DO PPS

Freire diz que denúncia parte de "um jogral combinado de bandidos".

Por: Valéria de Oliveira

O presidente nacional do PPS, Roberto Freire, anunciou, nesta terça-feira, que vai entrar na Justiça contra a diretora comercial da Uni Repro Serviços Tecnológicos Ltda, Nerci Soares Bussamra. Ela afirmou que o ex-senador recebeu ajuda financeira do esquema de "compra de políticos" instalado no governo do Distrito Federal. Freire repeliu as afirmações da empresária e anunciou que seus advogados já estão elaborando ação judicial para que ela se retrate.

Freire afirmou ainda que está à disposição da Justiça, da Polícia Federal e do Ministério Público para prestar quaisquer esclarecimentos. Disse também que suas contas estão disponíveis, abertas para as investigações que essas instituições julgarem necessárias. Em nota divulgada hoje, o ex-senador lembrou que tem 40 anos de vida pública, pautados pela ética, e disse que seu nome não pode ser jogado na lama porque alguém, "em um jogral combinado de bandidos, grava a si próprio e à sua cúmplice" e envolve o nome do presidente do PPS, tentando transformar isso em prova factual ou evidência. Leia a íntegra da nota.

"Jogral de bandidos

Com tantas imagens contundentes no caso que passou a ser conhecido como "mensalão do Distrito Federal" – numa paródia ao mensalão do PT –, não faltou quem aproveitasse a ocasião para tentar atirar a honra alheia na sarjeta. Foi o caso da senhora Nerci Soares Bussamra que, em um vídeo com o comparsa Durval Barbosa, citou o meu nome como beneficiário desse esquema imoral.

Entretanto, minha vida pública não está à disposição desta senhora e de Barbosa, dono de uma ficha corrida da qual constam 37 processos judiciais. Ao contrário, tenho 40 anos de vida pública marcados pela correção, pela seriedade de propósito e pelo zelo com a ética. Não seria uma gravação de um bandido com uma empresária insatisfeita com a atuação de meu partido à frente de uma secretaria do Distrito Federal que iria manchar minha história. O PPS não aceitou participar de nenhuma prática ilegal, conforme deixou claro o diretório regional. Isso desagradou aqueles que têm negócios com o governo.

A reação dos descontentes não poderia ser mais ordinária. O bandido grava a si mesmo em conversa com a empresária e acredita que isso vá virar verdade? Um jogral de bandidos cita meu nome com a expectativa de produzir evidência? Repilo.

Vou à Justiça com a certeza de que essa farsa cairá por terra.

Roberto Freire
Presidente do PPS
Brasília, 1° de dezembro de 2009."

Deputado diz que denúncia contra ele é represália contra medidas moralizadoras em secretaria

DEU NO PORTAL DO PPS

Por: Redação

O deputado federal Augusto Carvalho (PPS-DF) divulgou, nesta terça-feira, nota na qual repudia a denúncia de irregularidade envolvendo sua gestão à frente da Secretaria de Saúde do Governo do Distrito Federal. No documento, o parlamentar diz que o depoimento do Senhor Durval Barbosa é “totalmente falso” e o atribui à represália às medidas moralizadoras tomadas na secretaria. Segundo ele, o contrato com a UNI REPRO, prestadora de serviço de reprografia, objeto das acusações de Barbosa, apresentava valores acima dos praticados pelo mercado. “Por isso, afastei o gestor do contrato e determinei a adesão do mesmo à Ata de Registro de Preços do Comando do Exército”, relatou Carvalho, informando que mandou ainda suspender o pagamento das faturas à empresa.

Na nota, o parlamentar do PPS informou que vai ingressar com ação na justiça contra seus detratores e lembra seus trinta anos de vida pública. “ Meu passado e meu presente públicos, em defesa dos interesses da população, me obrigam a buscar a reparação na esfera judicial dos que injuriam, denunciando fatos que jamais ocorreram”, concluiu Augusto Carvalho. Leia, na íntegra, a nota:


NOTA DE ESCLARECIMENTO

Sinto-me no dever de esclarecer à população do Distrito Federal a respeito das mentiras contidas no depoimento do Senhor Durval Barbosa, reproduzidas em inquérito que tramita no Superior Tribunal de Justiça, com referência ao contrato firmado entre a Secretaria de Saúde do Distrito Federal e a empresa UNIREPRO.

Em nome da confiança que sempre me foi depositada por meus eleitores em trinta anos de vida pública, REPUDIO tais calúnias imputadas a minha administração à frente da Secretaria de Saúde. O tal depoimento é inteiramente falso!

1 - Ao contrário do que disse o Senhor Barbosa, tão logo assumi o cargo de Secretário de Saúde, constatei que o contrato mantido com a UNI REPRO apresentava valores acima dos praticados no mercado. Por isso, ordenei a adesão do contrato à ATA DE REGISTRO DE PREÇOS do Comando do Exército, o que resultou em substancial economia de recursos ao erário.

2 - Recentemente, após ter observado indícios de irregularidades na execução do novo contrato, determinei, em setembro, a realização de auditoria, que, ao final, comprovou a existência de ilícitos, como o pagamento por serviços não prestados. Imediatamente, afastei o executor do contrato, determinei a suspensão do pagamento das faturas e enviei formalmente pedido de explicação à UNI REPRO.

3 - Como não foi dado nenhum tipo de esclarecimento por parte da empresa, solicitei também parecer da Assessoria Jurídica da Secretaria de Saúde para embasar as decisões a serem adotadas com relação ao referido contrato.

4 - Diante disso, fica claro que as acusações infundadas são nada mais que represálias às ações tomadas durante a minha gestão na Secretaria de Saúde.

5 - No depoimento de Durval Barbosa está a origem dos interesses contrariados pelo esquema investigado pela Polícia Federal. É ação criminosa de quem, não tendo seus pleitos atendidos, buscou delação premiada, como se ele mesmo não tivesse totalmente envolvido com os ilícitos. É bom lembrar que pesam contra o delator 37 processos, o que o descredencia a fazer injúrias a quem sempre atendeu aos princípios de moralidade e transparência, norteadores da minha vida pública.

6 - Não recebi, em qualquer momento, recursos de origem ilícita. Também não autorizei quem quer que fosse a fazê-lo em meu nome. Esta é a verdade!

7 - Meu passado e meu presente públicos, em defesa dos interesses da população, me obrigam a buscar a reparação na esfera judicial dos que injuriam, denunciando fatos que jamais ocorreram, para tentar fazer valer interesses inconfessos.

8 - Finalmente, informo que o pedido de exoneração da honrosa posição de secretário de Estado da Saúde do Distrito Federal decorre de decisão tomada por meu partido, o PPS, e da convicção política de que as irregularidades supostamente praticadas por ocupantes de cargos públicos no Governo do Distrito Federal precisam ser minuciosamente apuradas.

Brasília, 1º de dezembro de 2009.
Deputado federal Augusto Carvalho (PPS-DF)
Ex-Secretário de Saúde do Governo do Distrito Federal

Bom dia! - Live Performance: Mazurka - Choro by Villa-Lobos

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Reflexão do dia - Enrico Berlinguer

"Os partidos de hoje são sobretudo máquinas de poder e clientela:pequena ou mistificada consciência da vida e dos problemas da sociedade, das pessoas; poucas ou vagas ideais, programas; sentimentos ou paixão civil, zero. Os partidos ocuparam o Estado e todas as suas instituições, a partir do governo. Ocuparam as instâncias locais, os institutos de previdência, os bancos, as empresas públicas, os institutos culturais, os hospitais, as universidades”.


(Enrico Berlinguer, La Repubblica, 28 de julho de 1981, - citado por Massimo D’Alema, em Questão moral como questão democrática, no livro Democracia valor universal, pág.18 – Fundação Astrojildo Pereira / Contraponto, - Rio de janeiro, 2009)

Merval Pereira: Caixa de Pandora

DEU EM O GLOBO

Desde que a Polícia Federal começou suas operações de repressão à corrupção, com forte apelo midiático, um dos componentes mais importantes para torná-las populares foram os nomes com que as batizavam. Já houve de tudo: nomes mitológicos, como o da deusa Temis, quando se investigou corrupção no sistema judiciário; Operação Curupira, contra a extração e comercialização ilegal de madeira da Amazônia, em homenagem ao ser com os pés virados para trás para despistar quem o segue; Navalha na Carne, que investigou agentes públicos, inclusive da própria Polícia Federal; e Operação Azahar, nome árabe que simboliza a pureza da virgem, contra uma quadrilha internacional de pedofilia.

Agora temos a Operação Caixa de Pandora, que investiga o escândalo de corrupção no governo do Distrito Federal. A caixa que Pandora abriu quando seu amado dormia liberou todos os males que acometem a vida humana: doenças, inveja, decadência, guerra, morte. Apavorada, Pandora conseguiu fechar a caixa antes que o mal dos males pudesse se espalhar: o desencanto, a desesperança.

A julgar pela reação dos participantes do debate ocorrido ontem no auditório do GLOBO, nossa caixa de Pandora deixou escapar também a desesperança. O deputado federal Chico Alencar, professor de História, acha que a denominação da operação reflete a desesperança que ele constata nos cidadãos nas ruas.

Esse desencanto esteve refletido na reação dos presentes ao auditório do GLOBO, e nas perguntas enviadas pela internet. Mas houve também demonstrações de esperança na solução.

O senador Pedro Simon, único político presente ao debate, foi de um ceticismo chocante depois de uma vida pública de mais de 30 anos no Congresso: de lá, não sairá nada para conter a corrupção na política, garantiu ele. Simon, referindo-se ao mais recente caso de corrupção, fez um resumo curioso: "Há poucos dias, o governador José Roberto Arruda estava reeleito. Estava fazendo um governo muito bom, reconhecido pela população.

Hoje, está afastado da política com vídeos e fotos que não deixam dúvida sobre a existência de um mensalão em Brasília".

O senador do PMDB do Rio Grande do Sul disse que tanto o governo Lula quanto o de Fernando Henrique Cardoso aceitaram o jogo político do fisiologismo, e por isso esses escândalos todos aparecem.

Ele fez uma ressalva quanto ao governo do expresidente Itamar Franco, do qual foi líder no Congresso.

Para Simon, o governo Itamar mostrou durante dois anos e meio que é possível governar sem casos de corrupção, e até mesmo aprovar um Plano Real, que alterava todo o nosso sistema econômico, sem precisar comprar votos.

Claudio Abramo, diretor da ONG Transparência Brasil, também tem uma postura que considera realista diante do problema da corrupção: não conseguiremos mudar essa situação rapidamente, “não é para amanhã”, ressaltou.

Adepto de medidas objetivas para tentar conter a corrupção, ele desacredita de movimentos que tentem resolver a questão pelo lado damoral e dos bons costumes. Para ele, o que é preciso fazer é criar dificuldades para que a corrupção aconteça e denunciar as medidas utilizados pelas autoridades, em todos os níveis, para encobrir suas falcatruas.

Ele ressaltou que o acesso à informação pública, projeto levado à frente pela sua ONG que resultou em uma legislação federal, é um dos fatores mais importantes para a contenção desses atos ilegais.

Abramo não considera viável a aprovação do projeto de lei da ficha-limpa, uma iniciativa popular levada ao Congresso por 1,3 milhão de assinaturas. Ele lembrou que em quase todos os países do Ocidente existe a prática de que somente os processos em última instância é que podem impedir a candidatura de uma pessoa.

Rosangela Giembinsky, Coordenadora da ONG Voto Consciente, e Maria Aparecida Fenizola, vice-presidente do instituto de desenvolvimento de estudo político-sociais, estão, ao contrário, engajadas nessa campanha e consideram possível viabilizar a idéia, mesmo que ela seja combatida internamente no Congresso e, como garantiu o senador Pedro Simon, não saia da gaveta do Presidente da Câmara.

Rosangela Giembinsky citou diversos exemplos de processos pelo país que estão em curso e garantiu que o processo de informação do cidadão, que se dá hoje com muito mais rapidez graças aos avanços da tecnologia, fazem a diferença na hora de votar.

Já Maria Aparecida Fenizola, incluída no debate na qualidade de cidadã engajada por ter sido uma das líderes do recolhimento de assinaturas para o projeto de iniciativa popular contra os candidatos que têm fichasuja, mostrou-se entusiasmada com os avanços que detecta, e descartou ser uma ingênua aos 78 anos, depois de uma vida inteira dedicada à educação e ao aperfeiçoamento da cidadania.

Ela citou os muitos processos que inviabilizaram a continuidade na vida política de centenas de vereadores e prefeitos como um sintoma da vitalidade dos movimentos sociais engajados na luta por uma política menos corrupta e mais ligada ao bem-estar da população.

E foi muito aplaudida quando garantiu que se todo mundo achar que nada pode ser feito, aí é que nada mudará mesmo. E fez o senador Pedro Simon mandar um recado: "Depende mesmo de vocês a mudança na política, a pressão dos movimentos é imprescindível, por que do Congresso é que não virá a solução. De onde menos se espera, daí é que não sai nada mesmo", disse, decepcionado, o senador.

Dora Kramer:: Brasília cai de podre

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

"Se tiver filme é o fim", dizia o líder do DEM no Senado, Agripino Maia, no fim da tarde de sexta-feira quando Brasília se alvoroçava sem ainda distinguir o que era verdade ou boato no forrobodó que acabava de explodir na capital do País: o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, pela segunda vez em oito anos era protagonista de um escândalo.

E não só há filme, como as imagens exibidas são as mais impressionantes já vistas em matéria de flagrante de corrupção num caso em que, se dúvida houver, é se existe alguém direta ou indiretamente ligado ao governo que esteja fora do esquema.

Na sexta-feira, a capital federal caiu de podre. Governador, vice-governador, presidente da Câmara Legislativa, deputados, secretários de Estado, empresários, jornalistas, presidentes de estatais, administradores regionais e sabe-se lá mais quantos integrantes de instâncias de decisão, sem cuja colaboração os crimes não poderiam ter sido cometidos com tanta desenvoltura, fazem parte de uma quadrilha de assaltantes do dinheiro público.

Nunca se viu nada parecido. Um escândalo que não se resolve com o impeachment do governador. Não só Arruda está impedido de continuar à frente do governo do Distrito Federal. Seu vice, Paulo Otávio, não pode suceder-lhe porque tinha um homem da mala preta encarregado de transportar a sua parte. O presidente da Câmara Legislativa tampouco: foi filmado enfiando dinheiro nas meias, nas calças e nos bolsos do paletó.

O denunciante, Durval Barbosa, centralizava a distribuição no próprio gabinete de trabalho e, não obstante carregasse dezenas de processos nas costas e integrasse a turma do antecessor Joaquim Roriz, de estripulias conhecidas na área - a mais vistosa, a partilha de R$ 2,2 milhões com Nenê Constantino, o levou à perda do mandato de senador - foi nomeado secretário de Relações Institucionais.

Fazia tudo institucionalmente, na hora do expediente, sem grandes mistérios e nenhuma cerimônia. Deputada até então das mais respeitadas como educadora, Eurides Brito entra na sala cheia de pressa e muita prática: pergunta por Durval e 19 segundos depois já enche a bolsa com maços de dinheiro. O deputado Júnior Brunelli leva 14 segundos.

Rápidos e rasteiros.

Três dias depois de conhecidos os fatos a partir da operação da Polícia Federal na busca e apreensão de documentos, Arruda estava "pronto" ontem para dar explicações ao seu partido, o DEM.

A ala mais jovem e antes interessada em fazer de Arruda o vice na chapa presidencial do PSDB dava um crédito de confiança. Sem dizer baseada no quê exatamente.

O grupo mais experiente - escaldado de outros carnavais e imagens de dinheiros que lhes dizimaram uma candidatura presidencial - não queria nem conversa. Convidado a se retirar do PSDB em 2001, Arruda, no que dependesse deles, seria agora convocado a fazer o mesmo.

Como sempre, os mais velhos têm razão. O episódio presente nem pode ser comparado aos tradicionais mensalões.

É muito pior. Não se limita a financiamento ilegal de campanha ou pagamento à base aliada: é corrupção explícita e generalizada.

Segunda chance

José Roberto Arruda jogou no lixo o perdão que recebeu em 2002 do eleitorado que o elegeu deputado federal, permitindo sua sobrevivência na política depois de ter sido pego no delito de violação do painel de votação do Senado.

Ali estava delineado um caráter. O desdobramento foi uma variação sobre o mesmo tema.

Marca registrada

Assim como o então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, orientou o presidente Luiz Inácio da Silva a assumir a versão do caixa 2 de campanha para justificar o mensalão petista, o advogado de José Roberto Arruda aconselhou seu cliente a tentar transformar a rapinagem brasiliense em crime eleitoral.

Rende penas brandas e antigamente se rendia ao fato consumado - a eleição do infrator. Agora tem produzido cassações, embora tardias e contestadas pelos defensores do "voto do eleitor".

O abuso da máquina pública na eleição antecipa quais serão as bases de atuação do candidato quando governante.

O preço

O risco que se corre com a realização de uma obra - filme, livro, peça, vídeo -, assumidamente para fazer de um homem um mito, é acabar despertando o descontentamento de testemunhas de versões menos edulcoradas da mesma história.

Como César Benjamin e Paulo Vidal - o antecessor de Lula no Sindicato dos Metalúrgicos - vão aparecer outras pessoas que conviveram com Lula o homem normal, não com o herói sem defeitos da fábula assinada pela família Barreto.

Um Lula mais próximo da realidade é mostrado no documentário Entreatos, de João Moreira Salles, que vale de novo conferir.

João Bosco Rabello:: Corrupção como base política

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O governador José Roberto Arruda costuma dizer que ganhou a eleição para o governo do Distrito Federal "por dentro". Talvez não haja expressão melhor para refletir o modus operandi político brasileiro comum a todos os governos, governantes e partidos.

Arruda sempre usou a expressão em defesa dos que lhe cobravam a permanência em seu governo de auxiliares de seu antecessor e adversário eleitoral, Joaquim Roriz. "Por dentro" se traduz como a garantia de alianças entre o governo que sai e o que entra, pela preservação dos interesses comuns. Sem essa aliança, o risco eleitoral de Arruda era bem maior do que sugere a sua folgada vitória contra Maria de Lourdes Abadia, a Dilma Rousseff de Roriz, "cristianizada" por uma base aliada previamente comprada (agora resgatam as promissórias).

Nesse contexto, o elo entre Roriz e Arruda foi exatamente o ex-policial Durval Barbosa, operador de ambos, que tinha o hábito preventivo de gravar e filmar seus parceiros para "eventualidades futuras". Seu poder de chantagem o manteve em dois governos, de adversários que hoje se odeiam, mas que o dividem.

"Por dentro" foi uma escolha pela corrupção como sustentação política, com balcão para os negócios, gerente financeiro e uma clientela de políticos e empresários numa rede público-privada operante há mais de uma década.

Se descrita sem vídeos espetaculares, a operação em curso no DF seria mais uma candidata à impunidade, com seus atores sendo reabilitados em curto prazo pelos respectivos partidos, como ocorre agora no PT.

É certo que esse episódio servirá de munição em palanques adversários do DEM em 2010. O PT, por exemplo, comemora o surgimento do "mensalão do DEM" e dá-se por desagravado pelo fato de não estar mais só no banco dos réus. Isso lhe basta até porque o partido já absolveu seus "mensaleiros" e conta com o tempo elástico da advocacia e do Judiciário para que prescrevam seus crimes.

Mas, como há vídeos e o strip-tease continua nas telas das televisões, o DEM pagará mais caro que seus adversários pelo crime que é comum à política brasileira. A campanha política acaba para o eleitor com a contabilização dos votos, mas a arrecadação do dinheiro prossegue nos governos eleitos.

Nada de novo, pois, no horizonte de 2010, o eleitor já está anestesiado para a troca de denúncias e o País, pelas reações ao novo escândalo, se pergunta "quem não faz", numa alusão aos partidos e políticos em geral. Na internet percebe-se, em maior volume, o desencanto que gera sempre a proposta de voto nulo.

Não haverá partido livre de flagrantes de negociatas sem uma ampla reforma política.

O QUE PENSA A MÍDIA

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CHARGE - RORIZ E ARRUDA


Diário do Nordeste (CE)

Raymundo Costa:: Cai um palanque da oposição para 2010

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Caiu o palanque do PSDB em Brasília. A desgraça do governador José Roberto Arruda terá repercussão na aliança tucano-demista para 2010. Mas nem José Serra, nem Aécio Neves, um dos dois o candidato da oposição à sucessão de Lula, acreditam que ela terá influência na eleição presidencial, daqui a dez meses. Desde que PSDB e DEM saibam reagir com presteza à crise que se instalou no território da oposição.

As notícias que chegam de trás das linhas tucano-pefelistas, no entanto, não parecem muito animadoras. Ainda não caiu a ficha do governador José Roberto Arruda, pilhado no comando de um suposto esquema de de pagamento a deputados aliados e bolsos afins. O governador resiste à ideia de renunciar ao mandato para não perder o foro privilegiado de julgamento, o STJ.

Arruda teve uma segunda oportunidade e a deixou escapar entre os dedos. É um boxeador nocauteado em pé. Inexplicável é a divisão do Democratas. Os líderes do DEM no Congresso, acostumados ao calor do dia a dia dos embates parlamentares, querem a expulsão sumária de Arruda do partido. O presidente do Democratas, deputado Rodrigo Maia (RJ), ainda resistia à ideia, embora tivesse claro em mente que seria atropelado pelos fatos.

Sete em cada oito demistas ouvidos por Rodrigo Maia, inclusive experimentados deputados e comunicólogos que trabalharam para o partido estavam horrorizados com o que pensavam ter visto: a imagem de Arruda recebendo dinheiro, refestelado num sofá residência oficial de Águas Claras.

Só que a imagem não é de Águas Claras e nem Arruda era então governador. Era candidato. O problema é que o tempo político é diferente do tempo legal, e por mais que tentasse se apegar a esse argumento, Rodrigo Maia já entrou na reunião de ontem do DEM com Arruda sabendo que não tinha como sustentar essa posição.

Gilberto Kassab, líder efetivo em ascensão no Democratas por sua vitoriosa campanha à prefeitura da maior cidade do país, desde o início não teve ilusões sobre o desfecho político do episódio: caíra o palanque presidencial de Brasília e não havia mais como se manter Arruda no Democratas. Para a campanha de 2010 será preciso criar uma outra opção.

Nos bastidores, Kassab dizia ontem que as denúncias eram graves, preocupantes e "consistentes". Mas no oficial recomendava cautela - "aguardar e pedir que as sindicâncias da área de segurança sejam as mais rápidas possíveis para, caso confirmadas, tenhamos punições exemplares para o sujeito".

O problema é que não haverá sindicância nem julgamentos rápidos e o tempo político exige do DEM algo mais que evasivas. E Kassab sabe disso. O prefeito de São Paulo é hoje o político do DEM em condições de tentar colar os cacos demistas.

A velha guarda ou está sem mandato, caso de Jorge Bornhausen, o ideólogo da mudança de geração na guarda partidária, ou em dificuldades para se reeleger, como o senador Marco Maciel (PE), que ao longo dos anos controlou o partido junto com Antonio Carlos Magalhães.

O DEM está numa encruzilhada. Defenestrado do poder em 2002 com a chegada do PT ao Palácio do Planalto, o partido tentou um passo grande demais para suas pernas, ao buscar guarida nos grandes centros urbanos, quando sua natureza era a dos grotões. Ganhou São Paulo, numa circunstância especial de aliança vitoriosa com José Serra, mas perdeu o Rio; nos Estados, ficou circunscrito ao Distrito Federal.

Expressões nacionais do partido foram abrigadas no governo, seja em cargos efetivos, seja na condição de consultores.

O "mensalão do DEM" é a mais grave crise da nova geração de dirigentes demistas. Não é a única, como demonstra a trajetória do partido, desde 1998. O ano da reeleição de Fernando Henrique Cardoso foi o apogeu do Democratas, então PFL, a frente que se formou de uma dissidência do PDS (ex-Arena) para compor com Tancredo Neves na transição democrática.

Naquele ano, elegeu 105 deputados. Na eleição de 2002, apesar da "onda vermelha", ainda mandou 84 representantes para a Câmara, mas só 75 tomaram posse. Em 2006 elegeu 65, e perdeu três até a posse. As comportas só não se abriram de vez e o DEM escapou da ação predatória dos outros partidos por causa da interpretação da Justiça Eleitoral sobre a fidelidade, pela qual os mandatos pertencem aos partidos e não ao deputado.

O PSDB convocou uma reunião da Executiva Nacional para hoje, depois que o DEM tomar sua decisão. Discretamente, fez pressão pela saída de Arruda. Os tucanos avaliam que uma decisão rápida e exemplar pode dar uma desculpa a ser dada aos eleitores em 2010. Mas também sabem que o PT tem agora em mãos uma imagem poderosa, a mesma montanha de dinheiro que fez desandar a candidatura presidencial da atual governadora do Maranhão, Roseana Sarney, então no PFL, em 2002

O colégio eleitoral do Distrito Federal - Brasília e as cidades que a circundam - é pequeno, com pouco mais de 1,6 milhão de eleitores. Mas é importante não só por se tratar da capital política e administrativa do país, como também pelo suporte estrutural que poderia fornecer ao candidato presidencial da oposição e dos aliados nos Estados. A fonte secou.

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

Eliane Cantanhêde:: Estouro da boiada

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - A profusão de panetones, vídeos e dinheiro vivo é um golpe profundo no PFL, ops!, DEM, mas não é muito menos grave na própria chapa de oposição, liderada pelo PSDB. Por isso, é até curiosa a discrição do PT.

O efeito sobre o DEM é óbvio. José Roberto Arruda era uma grande vitrine, o único governador do partido, e a Executiva Nacional decide hoje não se, mas como vai expulsá-lo: com ou sem direito a defesa. Restam só o prefeito Gilberto Kassab e algumas dezenas, minguantes, de deputados e senadores.

Já o efeito sobre a candidatura de oposição, seja ela de José Serra ou de Aécio Neves, se dará na construção dos palanques e do discurso.

Enquanto Dilma Rousseff montou um leque de alianças que vai do PC do B ao PMDB, com o dobro de tempo na TV, Serra ou Aécio têm um DEM de perna quebrada, um PPS no ocaso, pedaços do PMDB e promessas -ora do PTB, ora do PP.

O mensalinho do DF também subtrai dois trunfos da oposição: já não é mais possível encenar a ira contra o mensalão do Planalto, que, de resto, já estava mesmo surrado; e vão para o lixo as fortes imagens de obras, viadutos, metrôs e coisas do gênero que o engenheiro Arruda cederia da sua gestão à campanha tucana -na qual ele vinha se insinuando como candidato a vice.

Trata-se de um golpe e tanto, e é em momentos assim que o que é ruim só pode piorar: cobranças, acusações mútuas, ameaças, racha.

Se demos, tucanos e velhos comunistas já andavam arrancando os cabelos com a diferença de ritmo entre Lula-Dilma e Serra-Aécio, devem estar todos, a esta altura, à beira de um ataque de nervos, ou da calvície profunda.

Em 2010, não estarão em jogo quatro ou oito anos, mas 12. Se Dilma vencer, ela vem primeiro e Lula de volta em seguida. No caso do DEM, partido alimentado pela máquina, é a morte por inanição, ou o estouro da boiada. O que resta do PSDB sem poder e sem o DEM?

Janio de Freitas:: Um rombo na sucessão

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

A figura mais eminente que o DEM construiu para a eleição só pode ser candidato a votos de uma sentença criminal

O efeito político mais importante da ilustrada e ilustrativa presença do governador José Roberto Arruda no novo mensalão é o seu reflexo, direto e traumático, no esquema previsto pelo PSDB para disputar a sucessão presidencial.

Há mais de cinco anos José Serra desenvolve um trabalho de atração do PFL, lá atrás, hoje DEM. Essa investida não lhe custou pouco, inclusive dentro do PSDB, com a repulsa à relevância dada ao pefelista/demista como vice-prefeito e, nos últimos tempos, com os indícios de disposição de fazer o mesmo Gilberto Kassab seu sucessor no governo paulista. Daí vem, aliás, uma das causas mais sérias do racha na bancada peessedebista na Câmara, que mal supera a cisão para dar ares de vida.

O menor dos êxitos esperáveis por Serra nessa investida seria o apoio, em âmbito nacional, do enfraquecido mas bem organizado DEM. A rigor, os demistas já vinham e vêm condenados a apoiar um candidato do PSDB, por falta de alternativa entre as possibilidades de candidaturas de razoável viabilidade. À parte tal circunstância, a estratégia de Serra deu o resultado que ele poderia esperar.

E foi além, de fato. No desempenho bem conceituado de José Roberto Arruda como governador do Distrito Federal, Serra e os demistas encontraram uma perspectiva nova e comum, por motivos diferentes, aos dois lados. O DEM obteve, com a valorização de Arruda, um motivo para exigir de Serra e do PSDB uma compensação por seu apoio: a vice, na chapa presidencial, para o seu único governador. Serra, de seu lado, na lista de estudos para a vice incluiu, em condições especiais, uma figura que, ao fortalecimento da aliança, traria um suporte eleitoral expressivo na Brasília tão adversa à sua candidatura.

O estrelato de José Roberto Arruda nos vídeos da bandidagem política reabre a vaga mais proeminente nas considerações de Serra para a sua possível chapa. E o desastre nem se limita a esse rombo. Arruda enfraqueceu muito o apoio eleitoral do DEM, ao presentear os candidatos e partidos contrários com uma arma eficaz contra os demistas: a figura mais eminente que construíram para as próximas eleições, no plano local como no federal, só pode ser candidato aos votos de uma sentença criminal.

Continuidade

Se nem desta vez, em que está explicitamente comprometido, as investigações policiais se voltarem para o ex-governador Joaquim Roriz, assim mantendo a prática de uns 20 anos e apesar de tantas motivações evidentes, então é o caso de mudar-se a investigação: esta, para explicar por que, e como, Roriz é tão intocável. Mesmo que essa investigação fique para depois das eleições em que, outra vez, ele se lança candidato ao governo do DF. Como sucessor de Arruda, o que é uma garantia da continuidade que, segundo Lula, todas as eleições devem proporcionar.

Perfeito

Fraude em concurso para perito policial.

CHARGE - Panetone Brasília

Jornal do Commercio(PE)

Para Serra, denúncias da PF são 'gravíssimas'

DEU EM O GLOBO

Dilma afirma que ficou surpresa após a divulgação das imagens do governador do DF e defende apuração

Adauri Antunes Barbosa e Tatiana Farah

SÃO PAULO. Provável candidato à sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no próximo ano em aliança com o DEM, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), afirmou ontem que são “gravíssimas” as denúncias contra o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (DEM). Arruda foi pego em flagrante por uma investigação da Polícia Federal que filmou farta distribuição de dinheiro entre deputados distritais e outros aliados políticos.

— A opinião pública requer mais explicações a respeito daquilo que aconteceu, por parte do governo e da Assembleia Legislativa (Câmara Distrital).

Acredito que a justiça será feita porque o Judiciário está trabalhando de maneira muito efetiva — disse Serra.

O tom foi o mesmo usado pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, presidente do Conselho Político do DEM: — As denúncias são gravíssimas, têm consistência, e todos aguardam esclarecimentos e pedem uma ação célere dos órgãos de investigação.

Se forem ratificadas, que os responsáveis sejam exemplarmente punidos — defendeu Kassab, depois de participar de um almoço-debate com o Grupo de Líderes Empresariais (Lide).
Quando um repórter perguntou se o escândalo no Distrito Federal prejudicaria a imagem do DEM, Kassab preferiu ser lacônico: — Prejudica — disse Kassab, que nos bastidores tem sido um dos principais defensores da expulsão de Arruda do partido.

Dilma se diz “surpresa e triste” com as denúncias A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, précandidata do PT à Presidência, se disse surpresa com as denúncias de corrupção contra o governador Arruda. Para ela, os petistas não devem usar o caso para atacar o DEM. Em entrevista à Rádio Bandeirantes ontem de manhã, Dilma disse que é preciso evitar a condenação “pura e simples”. Para ele, no entanto, as imagens complicam a situação do governador.

— Eu tinha uma impressão muito respeitosa em relação ao governador Arruda. Fiquei surpresa e triste. É muito ruim a gente ver episódios como este acontecerem. É inexorável que se apure e, havendo delito, que os responsáveis sejam punidos. Não concordo também que a gente parta para a condenação pura e simples.

No caso específico, é muito difícil, né, gente, porque tem imagens, e contra imagem não tem argumento — disse a ministra, que concluiu: — Não vejo que isso deva servir de capitalização política.

A ministra disse que as imagens mostradas pelas investigações do caso Arruda são “escandalosas” e defendeu a atuação do Judiciário nos casos de corrupção.

Miriam Leitão:: Os mensalões

DEU EM O GLOBO

As cenas são demolidoras da confiança de qualquer pessoa na política. O país se espanta, depois de achar que nada mais o espantaria. Não que se pudesse dar crédito aos protestos éticos do Democratas, mas as imagens do que houve em Brasília superaram as piores expectativas. Agora, cada partido tem seu escândalo. Existe o mensalão do PT, o do PSDB e o do DEM. São todos, tristemente, iguais.

Tão iguais que já se pode dizer que existe uma tecnologia conhecida, causas identificadas e um caminho previsível da corrupção no Brasil. Se há um padrão, pode-se ter uma metodologia de combate ao crime.

— Nos três mensalões, o dinheiro ilegal foi alimentado por empresas fornecedoras do governo ou de estatais, o que foi possível pela falta de transparência nos contratos. O remédio é aumentar o acesso da sociedade às informações — diz o jornalista Fabiano Angélico, diretor de projetos da Transparência Brasil.

Claudio Weber Abramo, que falou ontem aqui no jornal na campanha “São dois gritando”, acha que uma das causas já identificadas dos desvios é o excesso de cargos em comissão e a ocupação da máquina pública por estes nomeados, ainda que não haja garantia de que isso não ocorra com funcionário de carreira.

Fabiano Angélico explicou que no Brasil o número dos cargos que o presidente pode distribuir é desproporcional ao que acontece em outros países: — O presidente americano nomeia pessoas para novecentos cargos. No Brasil, o presidente nomeia mais de sessenta mil cargos. É uma verdadeira usina de corrupção.

Nos Estados Unidos, a pessoa indicada é investigada antes de ser confirmada.

Na montagem do governo Obama houve casos de pessoas que não puderam ser nomeadas por dúvidas quanto ao seu passado.

Na opinião de Fabiano Angélico, o país precisaria de mais ONGs especializadas em combate à corrupção, e a imprensa deveria tratar menos da briga política e mais de como combater o crime.

O novo presidente do PT, José Eduardo Dutra, disse que em toda eleição há risco de caixa dois, porque isso é “inerente ao modelo” de financiamento eleitoral.

O argumento é que se houver financiamento público exclusivo de campanha isso não acontecerá. O financiamento público exclusivo não garante nada. O que poderia ajudar seria o incentivo do governo às doações de pequena quantia por pessoas — como existe na Costa Rica — o que aumentaria a relação do eleitorado com o partido, e deixaria os partidos mais independentes em relação às empresas.

Um erro que está ocorrendo é a naturalização do caixa dois, como se fosse um crime menor. Ao garantir que não houve pagamentos mensais à base para votar com o governo, José Eduardo Dutra disse ao “Estado de S.Paulo”: “O fato da existência do caixa dois é notório e comprovado.” O atual escândalo é mais corrosivo porque é possível ver as cenas, mas não há mensalão melhor ou menor.

Todos são inaceitáveis. No federal, há 39 denunciados e ele movimentou pelo menos R$ 55 milhões. No do PSDB de Minas Gerais saíram das empresas públicas R$ 3,5 milhões e houve empréstimos de R$ 11 milhões feitos por Marcos Valério no Banco Rural para irrigar o sistema.

O mesmo esquema com o mesmo personagem e no mesmo banco ocorreu no mensalão do governo Lula.

No mensalão do DEM, o país está vendo uma quantidade industrial de cenas de corrupção através dos vídeos gravados por Durval Barbosa.

No federal, houve também uma farta distribuição de recursos em quartos de hotéis ou na boca do caixa.

Estava tudo na contabilidade da diretora financeira do SMP&B ou nos registros do Banco Rural. Só não foi visto.

No federal, o país foi informado do dinheiro na cueca do assessor do deputado estadual José Nobre Guimarães, irmão do então presidente do PT; mas agora, o país viu o dinheiro abarrotando os bolsos e as meias do presidente da Câmara Distrital, Leonardo Prudente.

E a cueca voltou a aparecer como local-depósito, num vídeo exibido pelo site IG ontem à tarde.

Essa trágica equalização confirma a impressão de que política é assim mesmo: de que isso é feito “sistematicamente” neste país.

Diante da notícia do que aconteceu em Brasília, José Eduardo Dutra disse: “Quem com mensalão fere, com mensalão será ferido.” A frase é muito ruim. Sugere que ninguém denuncie ninguém? Ou sugere que isso é a vingança de quem foi ferido no primeiro mensalão? Outra causa da repetição dos mesmos crimes é a falta de punição. No Peru, o homem de confiança de Alberto Fujimori gravou a si mesmo distribuindo dinheiro para os deputados. O governo caiu, Fujimori fugiu, Vladimiro Montesinos está preso e agora Fujimori foi condenado. O Peru criou regras de mais transparência e um judiciário especializado em crimes de corrupção.

Os escândalos vão, em camadas, se sobrepondo.

Diante de um novo caso se esquece o anterior. Esta semana deve voltar ao Supremo o caso do senador Eduardo Azeredo, no mensalão mineiro, ofuscado pelo novo escândalo. Do mensalão federal nem se fala, e o PT faz esforço para apagá-lo da história. E os três são terrivelmente parecidos.