domingo, 21 de dezembro de 2014

Miriam Leitão - As duas perdas

- O Globo

A queda do preço do petróleo e a crise da Petrobras mudaram completamente a equação do financiamento para a companhia. Ela tem dívidas de US$ 25 bilhões vencendo a cada ano e um programa de investimento de US$ 220 bilhões até 2018. Mesmo usando parte do seu caixa, a empresa teria que captar bilhões no mercado anualmente para rolar a dívida e investir. Tudo terá que ser revisto.

No discurso da diplomação, a presidente Dilma falou em defender a Petrobras como se pessoas estranhas ao governo tivessem ocasionado os problemas que a empresa enfrenta. É importante que ela fale do tema que tentava ignorar, mas não é aceitável mais que a presidente trate a crise como se ela tivesse sido criada por adversários. O que ameaça a petrolífera foi criado pelo grupo que está no poder.

Mesmo se ela conseguir divulgar seu balanço auditado antes do fim do mês que vem, que é o cenário otimista, terá que vencer a enorme desconfiança que enfrenta neste momento, em que está a um passo do rebaixamento da nota de crédito, para fazer as captações. Por outro lado, a mudança brusca do preço do petróleo torna vários investimentos inviáveis neste momento. Ela havia se preparado para uma queda do preço, mas não para esse derretimento. Até porque ninguém previu uma queda tão drástica.

Sem capacidade de captação nos mercados financeiros, nos níveis de antes, ela não poderá fazer todos os investimentos. Sua crise afeta também o governo, porque seus dividendos têm sido parte importante das receitas do acionista controlador, o Tesouro. Agora, o governo receberá menos e ainda terá que ajudar a empresa. No pior cenário, até a resgatá-la caso não se consiga divulgar um balanço auditado até o fim do mês que vem. Parte da sua dívida e dos bônus terá seu pagamento antecipado. E ela terá que honrá-los.

Como disse a presidente da empresa, Graça Foster, não haverá a curto prazo respostas para perguntas tão profundas quanto as que são feitas agora por credores, auditores e acionistas a respeito do valor dos ativos. A empresa sairá menor dessa reavaliação, isso já se sabe, mas não se sabe quanto encolherá.

A Petrobras é parte importante do investimento do próprio país, portanto seu necessário — e ainda não calculado — corte de investimento afetará a economia brasileira.

Por enquanto, o Brasil é importador líquido de petróleo, já que a autossuficiência proclamada em ruidoso período eleitoral de 2010 não era verdade. O déficit da conta petróleo tende a diminuir, e a empresa neste momento está vendendo gasolina no Brasil a um preço mais caro do que compra. Inverteu a situação em que estava. Há cálculos no governo de que, mesmo contando a alta do dólar, ela estaria com o preço 25% mais alto. O problema que impede a redução do valor interno é que durante anos foi o contrário: a empresa perdeu com a venda do combustível, seu principal produto.

Mesmo se não houvesse toda a corrupção que drenou a companhia, o país teria prejuízos a contabilizar pela administração que o PT fez. No auge do interesse no Brasil e na busca por petróleo, a Petrobras encontrou as reservas de pré-sal pelas quais a empresa tinha feito pesquisa por décadas. Aquele era o momento exato de fazer as licitações das áreas a serem exploradas.

O governo petista decidiu alterar o marco regulatório e isso encalacrou tudo. A discussão produziu um conflito federativo pelos royalties de petróleo. Foi criada nova estatal. Os leilões foram paralisados. Perderam-se cinco anos, que não são recuperáveis.

Agora o contexto é totalmente outro. Há desconfiança em relação ao Brasil, o preço do petróleo está no patamar de US$ 60, em vez dos US$ 100 que estava antes, a Petrobras enfrenta uma crise de confiança, e o modelo de partilha não deu certo. O único leilão feito sob o regime de partilha, o de Libra, teve apenas um grupo disputando e era liderado pela Petrobras. Enquanto a petrolífera era saqueada, o governo estava dando voltas para modificar o que havia dado certo, os leilões de concessão.

Quando se fizer a conta completa das perdas provocadas pela mudança do modelo, pela paralisia das licitações, pela corrosão da credibilidade da Petrobras e pelo assalto aos cofres da maior empresa se chegará a uma cifra astronômica. Enquanto a Petrobras estava sendo roubada, o governo estava perdendo uma oportunidade preciosa.

Elio Gaspari - Há dez anos, o juiz Moro disse tudo

- O Globo

O juiz Sérgio Moro, que conduz o processo das petrorroubalheiras, fala pouco e não polemiza para fora. O que ele está fazendo, todo mundo sabe. O que ele quer fazer, e como quer fazer, parece uma questão aberta. Em 2004, Moro publicou um artigo intitulado “Considerações sobre a Operação Mani Pulite” na revista CEJ, do Conselho da Justiça Federal. Está tudo lá.

A Operação Mãos Limpas italiana foi uma das maiores faxinas ocorridas na Europa. Começou em 1992, com a investigação de um gatuno banal. A magistratura, o Ministério Público e a polícia puxaram os fios da meada, investigaram seis mil pessoas e expediram três mil mandados de prisão. Caíram na rede 872 empresários (muitos deles ligados à petroleira estatal) e 438 parlamentares.

O serviço provocou a queda e o exílio voluntário do primeiro-ministro Bettino Craxi. Ele dissera o seguinte: “Todo mundo sabe que a maior parte do financiamento da política é irregular ou ilegal” (Craxi morreu anos depois, na Tunísia). A faxina destruiu a mística dos dois grandes partidos do país, o Socialista e a Democracia Cristã. Eles dominavam a Itália desde o fim da Segunda Guerra. Passados dois anos, minguaram. O PS teve 2,2% dos votos, e a DC, 11,1%.

A corrupção política italiana assemelhava-se bastante à brasileira na amplitude, na naturalidade com que era praticada e até mesmo na aura protetora e fatalista que parecia torná-la invulnerável.
No seu artigo, Moro mostra como a implosão da máquina de políticos, administradores e empresários levou à “deslegitimação” de um sistema corrupto: “As investigações judiciais dos crimes contra a administração pública espalharam-se como fogo selvagem, desnudando inclusive a compra e venda de votos e as relações orgânicas entre certos políticos e o crime organizado”.

O Moro de 2004 diz mais:

• “É ingenuidade pensar que processos criminais eficazes contra figuras poderosas, como autoridades governamentais ou empresários, possam ser conduzidos normalmente, sem reações. Um Judiciário independente, tanto de pressões externas como internas, é condição necessária para suportar ações dessa espécie. Entretanto, a opinião pública, como ilustra o exemplo italiano, é também essencial para o êxito da ação judicial”.

• Os juízes:
“Uma nova geração dos assim chamados ‘giudici ragazzini’ (jovens juízes), sem qualquer senso de deferência em relação ao poder político (e, ao invés, consciente do nível de aliança entre os políticos e o crime organizado), iniciou uma série de investigações sobre a má conduta administrativa e política”.

• A rua:
“Assim como a educação de massa abriu o caminho às universidades para as classes baixas, o ciclo de protesto do final da década de 60 influenciou as atitudes políticas de uma geração”.

“Talvez a lição mais importante de todo o episódio seja a de que a ação judicial contra a corrupção só se mostra eficaz com o apoio da democracia. É esta quem define os limites e as possibilidades da ação judicial. Enquanto ela contar com o apoio da opinião pública, tem condições de avançar e apresentar bons resultados”.

• As malas:
“A corrupção envolve quem paga e quem recebe. Se eles se calarem, não vamos descobrir, jamais”
.
• As confissões:
“A estratégia de investigação adotada desde o início do inquérito submetia os suspeitos à pressão de tomar decisão quanto a confessar, espalhando a suspeita de que outros já teriam confessado e levantando a perspectiva de permanência na prisão pelo menos pelo período da custódia preventiva no caso da manutenção do silêncio ou, vice-versa, de soltura imediata no caso de uma confissão”.

• A imprensa:
“As prisões, confissões e a publicidade conferida às informações obtidas geraram um círculo virtuoso, consistindo na única explicação possível para a magnitude dos resultados obtidos pela Operação Mani Pulite”.

• Serviço: O artigo de Moro está na rede. Não tem juridiquês.

Fernando Gabeira - 'Antes de morir me quiero'

• Com o reatamento das relações entre os EUA e Cuba, cumpre-se não só um desejo de cubanos, americanos, do Papa, mas também da maioria dos brasileiros

- O Globo / Segundo Caderno

Com o reatamento das relações entre os EUA e Cuba, cumpre-se não só um desejo de cubanos, americanos, do Papa, mas também da maioria dos brasileiros. Nossa política externa sempre foi contra o bloqueio econômico. No governos Lula-Dilma, é verdade, esse desejo foi mais intenso e profundo, culminando com a construção do Porto de Mariel, que deverá ter um papel estratégico.

Alguns cubanos e parlamentares americanos não gostaram da decisão.

Interpretaram como uma vitória do castrismo. No momento, a reaproximação é um jogo em que todos ganham, sobretudo o povo cubano, que precisa, urgentemente, dessa abertura para o mundo.

Algumas vozes do governo brasileiro sonham com uma China no Caribe. Um regime autoritário mas com grande atividade econômica. Começam aí nossas divergências.

O acordo entre Obama e Raúl Castro não prevê mudanças políticas na ilha. Mas concentra suas esperanças na difusão da internet, um instrumento que tem um enorme potencial, sobretudo num povo alfabetizado como o cubano.

A posição sobre Cuba no Brasil tem uma linha divisória clara: apoiar ou condenar o regime autoritário. Acompanho o drama dos intelectuais dissidentes no país, li sobre como uma geração de poetas e escritores foi dizimada por uma burocracia truculenta e impiedosa. Cheguei a criar um comitê virtual para defender a libertação de Raúl Rivero, um poeta e escritor, que acabou deixando a prisão e rumando para a Espanha.

Gostaria de visitar Cuba. Assim como gostaria de visitar os Estados Unidos e a China. Os americanos me bloqueiam por um sequestro no século passado. Os diplomatas chineses sabem que sou simpático ao Tibet e ao Dalai Lama.

Antes de morrer, gostaria de rever as paisagens cubanas, onde vivi um ano e meio de minha vida. Gostaria de levar a câmera e buscar os vestígios de uma geração de artistas talentosos esmagados pelo regime.

Não será ainda numa China do Caribe que esse sonho poderá se realizar. Aliás, os burocratas petistas não sonham apenas em reproduzir as características da China em Cuba. Se pudessem, também instalariam aqui um regime autoritário com crescimento econômico. É o seu sonho de consumo.

No Brasil, o buraco é mais embaixo, creio eu. Um fator essencial para isso é a liberdade de expressão. Considerando nossa tradição diplomática contra o bloqueio, a construção do Porto de Mariel é inteligível. No entanto, as verbas foram mantidas em sigilo.

A transparência é outro fator vital como a liberdade de expressão. Alberto Youssef, o doleiro, foi a Cuba em missão oficial. Nas suas anotações apreendidas pela PF, há uma cifra, 3,2, ao lado da palavra Porto de Mariel.

São apenas detalhes de pé de página, num grande acontecimento histórico — diriam os defensores do governo. Mas são esses detalhes, liberdade de expressão e transparência, que nos dividem. Assim como nos divide a tese de que a corrupção é legítima, diante do crescimento da renda.

A mais duradoura das divisões ainda se refere à natureza do regime cubano. Cantada em prosa e verso pelos intelectuais brasileiros, a revolução cubana maravilhou poetas e escritores por aqui, enquanto lá aniquilava poetas e escritores.

Nunca houve em nosso país um protesto articulado de intelectuais contra a repressão em Cuba. A ilha é um paraíso congelado na fantasia da esquerda. Lula chegou a comparar os prisioneiros políticos em Cuba aos bandidos do PCC presos em São Paulo.

Cada um celebra à sua maneira uma vitória da tolerância e da coexistência pacífica. Os que sonham com uma China no Caribe sonham também com um regime capitalista dominado por uma burocracia comunista.

Antes de morrer, gostaria de ver uma Cuba livre, passear pelo Malecón acreditando que, pelo menos, tanto sofrimento, tanta tortura e tanta perseguição tiveram um sentido histórico.

Claro que um sonho também importante era ver a esquerda brasileira reconhecer o descaminho do regime castrista e centrar sua energia na solidariedade com o povo cubano.

Sei que estou pedindo muito. A vida não é tão longa assim. Mas o processo inaugurado nesta semana é, no fundo, uma esperança para todos, não só para os que desejam um próspero regime autoritário.

A blogueira Yoani Sánchez considerou o reatamento uma vitória do castrismo. A própria Yoani, que obteve tanta repercussão com um fio de internet na ilha, poderá alcançar os cubanos com mais facilidade, conectar-se melhor com o mundo.

Ao ver o adversário festejando, temos uma certa dificuldade em festejar também. É difícil reconhecer o tema em que todos ganham. O fim do bloqueio a Cuba é um deles.

Uma vez no exílio, para justificar a luta democrática, escrevi que o melhor na contradição não é a supressão de um dos polos. O mais fascinante é mudar o quadro em que ela se move. E não é que se moveu?

Há sinceridade nisso? - O Estado de S. Paulo / Editorial

Antes tarde do que nunca. Dilma Rousseff valeu-se da solenidade de sua diplomação para o próximo mandato na Presidência da República para propor à sociedade brasileira um pacto contra a corrupção. A manifestação presidencial ocorreu simultaneamente a novas revelações sobre o escândalo da Petrobrás, desta vez relativas à participação de políticos, parlamentares e altas autoridades governamentais no esquema de propinas que abasteceram a campanha eleitoral de 2010, de acordo com a delação premiada do ex-diretor da estatal Paulo Roberto Costa.

Ninguém com um mínimo de boa vontade e apreço pelos valores éticos que devem imperar na vida pública pode deixar de reconhecer a importância da proposta de Dilma Rousseff. Mas o retrospecto político de 12 anos de governos petistas e recentes manifestações de líderes do partido do governo, especialmente o ex-presidente Lula, aconselham alguma cautela diante das expectativas que a exortação presidencial pode gerar, do ponto de vista da sua exequibilidade, nas circunstâncias de tempo e de lugar em que vivemos. Pode-se, no limite, chegar mesmo a um questionamento mais radical: há sinceridade nisso?

A questão central é que a corrupção que se alastra de modo alarmante pelo aparelho governamental, embora sirva, obviamente, para satisfazer o pantagruélico apetite por dinheiro de delinquentes disfarçados de servidores ou de mandatários públicos, é movida essencialmente pela ambição de poder - de médio e de longo prazos - de políticos que precisam manter permanentemente azeitadas, a um custo operacional cada vez mais alto, as engrenagens da máquina de fazer votos, no seu sentido mais amplo e diversificado.

Quando se fala em ambição de poder vem desde logo à mente o mais consistente, obstinado e despreocupado com valores éticos (em eleições faz-se "o diabo") projeto de poder que ocupa a cena política no País: o do Partido dos Trabalhadores. Esse é o partido que sustenta a presidente que agora proclama: "Temos que fechar as portas, todas as portas, para a corrupção". Como é fácil de entender que, mesmo que queira, jamais terá condições objetivas de fechar "todas as portas" às prioridades partidárias sobre as quais ela própria exerce escassa influência, a questão que se coloca é a seguinte: Dilma combinou com o PT, no que diz respeito à Petrobrás, por exemplo, "apurar com o rigor os malfeitos" e "implantar a mais eficiente estrutura de governança e controle que uma estatal já teve no Brasil"? Ou corre-se o risco de que, eventualmente condenados nos processos decorrentes do escândalo da Petrobrás, petistas de alto escalão sejam imediatamente elevados à categoria de "guerreiros do povo brasileiro" pelo comando e pela militância do partido?

A própria presidente, em seu discurso de diplomação, a pretexto de defender a Petrobrás, deixou claro que o escândalo das propinas é uma simples questão de ponto de vista: "Temos que punir as pessoas, não destruir as empresas. Temos que saber punir o crime, não prejudicar o País ou sua economia. Temos que fechar as portas, todas as portas, para a corrupção. Não temos que fechá-las para o crescimento, o progresso e o emprego". Traduzindo: quem é contra a corrupção deseja, na verdade, "destruir as empresas". Pretende, de fato, "prejudicar o País ou sua economia". Ambiciona, certamente, fechar as portas "para o crescimento, o progresso e o emprego".

Não por coincidência, no mesmo dia, ao discursar em solenidade no Ministério da Justiça, o criador de Dilma e desde já candidato à sucessão da pupila em 2018, recorreu a sua habitual sutileza na clara tentativa de desqualificar as investigações do escândalo da Petrobrás. Diante do presidente do STF, do ministro da Justiça e do procurador-geral da República, Lula acusou a imprensa de promover, na cobertura da Operação Lava Jato, um "linchamento midiático"; aos encarregados pela investigação, de praticar, obviamente com fins escusos, o "vazamento seletivo" de informações; e, a todos eles, de agir "com indisfarçável objetivo político-partidário".

Voltando, então, ao pacto contra a corrupção que Dilma propõe: há sinceridade nisso?

Ferreira Gullar - O garoto de Ipanema

• Infelizmente, não convivi tanto com Tom Jobim quanto com Vinicius. Mas reinava entre nós bom astral

Folha de S. Paulo / Ilustrada

Infelizmente, não convivi tanto com Tom Jobim quanto convivi com Vinicius de Moraes. Mas, sempre que nos encontrávamos --não por acaso em algum bar, na companhia de amigos-- reinava entre nós um bom astral.

De minha parte, porque curtia tudo o que ele compunha e pela simpatia natural que sua personalidade irradiava. Ele era, sem dúvida alguma, gente boa, frequentemente sorridente e sempre afetuoso.

O convívio não foi maior por várias razões e uma delas é que frequentávamos bares diferentes: o dele, de Vinícius e sua turma, entre outras figuras da noite carioca, era o Plataforma, enquanto o meu e de minha patota era o La Fiorentina, ali no Leme; e, depois, o Luna Bar, em Ipanema.

E não por acaso: enquanto o nosso grupo era gente de teatro e do teatro político, o de Tom era de compositores e músicos, ou seja, a geração bossa nova, que acabara de nascer. Fora isso, e talvez principalmente, eles bebiam uísque, nós bebíamos chope.

Pode parecer que não, mas a verdade é que o bebedor profissional de uísque não bebe em qualquer lugar. Necessita de silêncio, penumbra e maior privacidade. Quase digo que eles são a elite, ao contrário da turma do chope, menos profissional e mais perto do povão.

Mas isso é brincadeira, já que nem Tom nem Vinicius, cariocas de origem, nada tinham ou pretendiam ter de elite. Talvez a razão seja mesmo a sua ligação com a música --uma música que, embora popular, era sofisticada, que é o caso da bossa nova.

Digo isso porque nem Vinicius nem Tom alimentavam pretensões elitistas. Basta lembrar que Vinicius, diplomata de carreira, terminou a vida em mangas de camisa, cantando em shows de samba.

É certo que tinha sido cassado pela ditadura, mas nem por isso tinha que virar boêmio. Tom Jobim também fez shows, mas, pela natureza de sua música e por sua personalidade especial, havia nele uma sofisticação que independia de seus propósitos.

Diga-se também que Tom era um compositor no mais puro sentido desse termo, de um talento excepcional, apoiado no conhecimento profundo da arte musical, a qual pôs a serviço da música popular. Daí a mistura de erudito e popular, de simplicidade e sofisticação, que faz o encanto de suas composições, chamem-se elas "Garota de Ipanema", "Samba do Avião" ou "Águas de Março".

O nosso grupo --o Grupo Opinião-- também era chegado à música, particularmente à música das escolas de samba, com seus cantores e compositores dos subúrbios cariocas.

Isso se deve a Thereza Aragão, carioca da Tijuca, que se formou frequentando os ensaios das escolas e os desfiles carnavalescos.

Por isso mesmo, ao nos instalarmos no teatro Opinião (a que demos o nome), ela criou "A Fina Flor do Samba", encontro de sambistas às noites de segunda-feira, onde se revelaram nomes como o de Zé Keti e Martinho da Vila, entre tantos outros, além de cantores e passistas.

Foi assim que o samba das escolas ganhou a zona sul do Rio e a gente dessa área passou a ir aos ensaios e até mesmo a desfilar no Salgueiro, na Mangueira, na Portela...

Tom nunca se apresentou no Teatro Opinião; Vinícius, sim, num espetáculo que revelou, para o público carioca e para o país, a nova geração musical da Bahia: Gracinha (que se chamaria mais tarde Gal Costa), Caetano Veloso e Gilberto Gil. Maria Bethânia já havia sido revelada no show Opinião, em que substituiu Nara Leão, cantando com Zé Keti e João do Vale.

Todas essas coisas me vieram à lembrança ao saber que Tom Jobim estava de volta a Ipanema.

Ele, nascido na Tijuca, criara-se ali nas areias daquela praia, que se tornaria a mais famosa do planeta, graças à música que compôs com Vinicius de Moraes. Mas, a certa altura, trocou o marulho das ondas pelo soar das copas e o cantar dos passarinhos do Jardim Botânico. Agora, esculpido em bronze, mais jovem, com o violão no ombro, está de volta, como um garoto de Ipanema.

E de repente lembro-me de ele, no centro da cidade --o lugar menos apropriado para encontrá-lo--, na avenida Graça Aranha, de paletó desabotoado e uma pasta na mão, acenando para mim efusivamente e sorrindo. Disse algo que não deu para ouvir, mas também acenei para ele, com o mesmo entusiasmo. Foi a última vez que o vi. Era março de 1994.

Janaína Moreno - Lundu de Rapariga

Graziela Melo - Vidas desvividas

Quantas vidas
desvividas
passaram
no meu
caminho?

Revividas e
mal
vividas

sem afeto
sem afago
sem carinho!!!

Quantas vidas
divididas
pela estrada
deste mundo

e quantas almas
perdidas
neste abismo
tão profundo!

Neste universo
perverso,
oriundo
de outras
Vidas,

oriundo
de outros
mundos!!!

sábado, 20 de dezembro de 2014

Opinião do dia – Fernando Gabeira

O PT e seus aliados deveriam ler Fim de Jogo, de Samuel Beckett, no trecho em que o personagem diz: "Acabou, Clov, acabamos". Não é possível assaltar as estatais para financiar campanhas e enriquecer. Um ramo sofisticado caiu por terra na Petrobrás. Outros cairão.

Não sei o que virá adiante. Suspeito que criem o dia da maionese. Lula elaborou a palavra de ordem ao PT: cabeça erguida. Melhor seria bunda na parede. Não vão soterrar esse turbilhão de dados com historinhas como a de Marco Maia e sua CPI. Se depois de arruinar a Petrobrás o PT escolheu a cabeça erguida, confirma um pouco minhas suspeitas: depois dos punhos erguidos no mensalão, cabeça erguida no petrolão.

Quanta autoestima! Enrolam-se na Bandeira do Brasil, arrasam a maior empresa pública, comprometem a credibilidade internacional e acham que está tudo bem, exceto para uma elite mal-humorada e articulistas de direita.

O governo vive um bloqueio do tamanho do petrolão. Não tem outro caminho futuro exceto explicar suas responsabilidades. Até o momento, está dando velhas respostas para novas perguntas.

Fernando Gabeira, jornalista. Alguns sinais da existência do mundo. O Estado de S. Paulo, 19 de dezembro de 2014.

Lista de ex-diretor que cita políticos faz presidente reavaliar reforma ministerial

• Dilma revê nomes para o primeiro escalão do segundo mandato após ‘Estado’ revelar relação com 28 autoridades apontadas por Paulo Roberto Costa como beneficiários de esquema de corrupção na estatal; presidente da Câmara deverá ser preterido

Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff decidiu reavaliar os nomes que comporão o Ministério do segundo mandato, após tomar conhecimento da lista de 28 políticos citados pelo ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa como beneficiários do esquema de corrupção na estatal, conforme revelou o Estado. Antes cotado para o primeiro escalão do governo, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), deve ser a primeira vítima da “lupa” de Dilma.

Embora o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, só vá pedir a abertura de inquérito e oferecer denúncia contra políticos envolvidos na Operação Lava Jato em fevereiro de 2015, a presidente não quer chamar para a equipe nomes sob suspeita. Alves perdeu a eleição para o governo do Rio Grande do Norte e, até agora, tinha cadeira garantida no Ministério do Turismo ou na Secretaria dos Portos, a partir de 2015.

Na avaliação de Dilma, ignorar os depoimentos das delações premiadas à Polícia Federal seria o mesmo que arrastar o escândalo da Petrobrás para dentro do Palácio do Planalto. Em público, a presidente tem dito que é preciso aguardar as provas, mas, na prática, avisou que não vai correr os mesmos riscos de seu primeiro ano de governo, em 2011, quando sete ministros foram abatidos na “faxina” ética, seis deles no rasto das denúncias de corrupção.

Na lista dos políticos acusados por Costa de receberem repasses do esquema na Petrobrás, 8 são do PT, 8 do PMDB, 10 do PP, 1 do PSB e 1 do PSDB. O Planalto tem certeza de que os nomes divulgados pelo Estado compõem mesmo a lista sob análise de Janot, a ser reforçada com outras delações, como a do doleiro Alberto Youssef (mais informações na pág. A6).

O ex-ministro da Casa Civil Antonio Palocci (PT), coordenador da campanha de Dilma na eleição de 2010, e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), também foram mencionados no depoimento de Costa e negaram “com veemência” a denúncia.

Renan tem apadrinhados no governo, como o atual ministro do Turismo, Vinícius Lages. De acordo com auxiliares de Dilma, porém, a inclusão do aliado na lista de Costa não afetará a escalação do Ministério. Mesmo assim, há preocupação no Planalto com o impacto das delações na campanha de Renan para se reeleger presidente do Senado, em fevereiro de 2015.

O governo vive tempos difíceis no relacionamento com a base aliada no Congresso e, para piorar o quadro, o líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), é favorito para comandar a Casa. Desafeto de Dilma, Cunha disputará a sucessão de Henrique Eduardo Alves à presidência da Câmara contra os deputados Arlindo Chinaglia (PT-SP) e Júlio Delgado (PSB-MG).

A expectativa dos adversários de Dilma é a de que a Operação Lava Jato alveje muitos aliados até fevereiro. Na quarta-feira, a presidente não escondeu os problemas para montar a equipe ao ser questionada pela colega da Argentina, Cristina Kirchner, se anunciaria logo os novos ministros. “Você não sabe como é difícil no Brasil”, desabafou ela.

O vice-presidente Michel Temer, que comanda o PMDB, deve conversar com Dilma na segunda-feira sobre a composição do Ministério e já marcou uma reunião, no mesmo dia, com a bancada da Câmara.

O PMDB quer ampliar o espaço no primeiro escalão, de cinco para seis cadeiras. Atualmente, o partido controla Minas e Energia, Previdência Social, Agricultura, Turismo e Aviação Civil, mas está de olho no Ministério da Integração Nacional, também cobiçado pelo Pros - que já dirige a pasta - e pelo PP.

Henrique Eduardo Alves já havia dito que não queria ficar com o “abacaxi” da Previdência, ministério hoje dirigido por seu primo, o senador Garibaldi Alves (PMDB-RN). Diante de sua recusa, o governo planejava escalá-lo para Turismo ou Secretaria dos Portos.

O líder do PMDB no Senado, Eduardo Braga (AM), é cotado para ocupar Minas e Energia no lugar de Edison Lobão - outro citado por Costa e Youssef como beneficiários do esquema de desvio de recursos na Petrobrás. Até hoje, a senadora Kátia Abreu (TO) é o único nome do PMDB confirmado por Dilma para a equipe. Kátia controlará Agricultura, mas o PMDB alega que ela é da “cota pessoal” da presidente e não representa o partido na Esplanada.

Ex-gerente diz que diretoria foi omissa

• Em depoimento, Venina Velosa reitera versão de que alertou cúpula da Petrobrás sobre irregularidades; diz também que sofreu ameaças

Fábio Fabrini - O Estado de S. Paulo

CURITIBA - A ex-gerente executiva da Diretoria de Abastecimento da Petrobrás Venina Velosa da Fonseca prestou ontem depoimento ao Ministério Público Federal, em Curitiba, e denunciou irregularidades na estatal. Na oitiva, que durou cerca de cinco horas, ela contou ter recebido ameaças após revelar desvios na companhia e reiterou que a atual diretoria da estatal sabia dos problemas em ao menos três setores, mas não tomou providências.

Venina entregou aos investigadores da força-tarefa que investiga os crimes da Operação Lava Jato relatórios de auditorias, notas fiscais e comunicados internos da Petrobrás, além do computador de seu uso. O material indicaria as impropriedades na construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, em contratos da área de Comunicação e em processos de compra de óleo combustível por subsidiárias no exterior.

No pacote levado a Curitiba, também estão as mensagens enviadas por ela à atual presidente da companhia, Graça Foster, e ao diretor de Abastecimento, José Carlos Cosenza, nas quais alertaria para as irregularidades.

“É um conjunto probatório que, no meu entender, mostra que houve omissão dolosa por parte da diretoria”, afirmou o advogado Ubiratan Mattos, que acompanhou a ex-gerente no depoimento. “Com absoluta convicção, a diretoria sabia (das irregularidades). Tanto que ela foi ‘exilada’ para ficar longe”, acrescentou ele. O Ministério Público Federal vai avaliar se há elementos para novas investigações.

Venina foi gerente executiva da Diretoria de Abastecimento da Petrobrás de 2005 a 2009. No período, ela foi subordinada ao então diretor Paulo Roberto Costa, que confessou um esquema de pagamento de propina por empreiteiras, que abasteceria partidos da base aliada, em troca de contratos superfaturados de obras da estatal, entre elas a de Abreu e Lima. A ex-gerente diz ter relatado os problemas a integrantes da cúpula da estatal, por e-mail, a partir de 2009, incluindo a Graça Foster, então diretora de Gás e Energia, e Cosenza. Depois disso, foi transferida para a subsidiária da Petrobrás em Cingapura. O caso foi revelado pelo jornal Valor Econômico.

As irregularidades denunciadas envolvem o pagamento de R$ 58 milhões para serviços que não foram realizados na área de comunicação, além do aumento dos custos de Abreu e Lima, cujo orçamento saltou de R$ 4 bilhões para R$ 24 bilhões. Ela também relatou supostos prejuízos na compra de óleo combustível no exterior.

‘Retaliação’. A Petrobrás alega que os e-mails enviados por Venina a Graça Foster antes de 20 de novembro de 2014 não tratavam dessas irregularidades. Em entrevista, a presidente da estatal disse que a ex-gerente decidiu fazer denúncias após um relatório interno responsabilizá-la pelas não-conformidades que inflaram o valor das obras de Abreu e Lima. Por conta dessas acusações, ela foi destituída do cargo de chefe da Petrobrás em Cingapura em novembro e teve sua remuneração reduzida em cerca de 40%.

A estatal também argumenta que, quando Cosenza recebeu denúncias sobre Abreu e Lima, a responsabilidade sobre o projeto era da própria ex-gerente. E acrescenta ter tomado as providências adequadas quanto os negócios de comercialização de óleo no exterior.

‘Intimidações’. No depoimento, Venina reafirmou ter sofrido ameaças a partir de 2009 e descreveu episódio em que teria sido abordada, no Rio. “Botaram uma arma na cabeça dela e... ‘se abrir o bico, você morre”, contou o advogado. Segundo ele, também houve intimidações por telefone. “Algo como 'você não sabe com quem está mexendo.’”

As declarações e documentos de Venina podem ser usados pelo Ministério Público para embasar inquéritos e ações penais em curso, ou mesmo novas investigações. Ela também tem depoimento à Justiça marcado para fevereiro, quando será ouvida como testemunha de acusação nas ações já abertas pelo juiz Sérgio Moro.

Venina chegou a Curitiba na noite de anteontem. Para despistar a imprensa, foi ouvida pela força-tarefa num dia sem expediente na Procuradoria da República no Paraná - ontem era feriado na capital do Estado. Investigadores chegaram a dizer que a oitiva só ocorreria em janeiro.

Ex-gerente reafirma ter avisado sobre desvios

• Em depoimento à Procuradoria, Fonseca disse que Petrobras foi alertada sobre irregularidades, afirma advogado

• Estatal negou na terça ter sido omissa e afirmou ainda que só neste ano a funcionária fez denúncias

Flávio Ferreira – Folha de S. Paulo

CURITIBA - A geóloga e ex-gerente da Petrobras Venina Velosa da Fonseca apresentou ao Ministério Público nesta sexta-feira (19) novos documentos e alegações que confirmam que a presidente da empresa, Graça Foster, e outros diretores sabiam de irregularidades na estatal, afirmou o advogado Ubiratan Mattos, que representa Fonseca.

O depoimento da funcionária da estatal foi dado aos procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba na manhã de sexta e durou cerca de cinco horas.

A Petrobras negou, na terça, ter sido omissa. Afirmou ainda que os relatos de Venina foram genéricos e que, só neste ano, ela falou em irregularidades.

Segundo a avaliação de um dos investigadores, o testemunho de Fonseca foi " bastante completo" e apresentou nformações sobre irregularidades nas áreas de Abastecimento e Comunicação e na implantação da refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco.

A análise dos documentos entregues será feita somente a partir janeiro.

O advogado de Fonseca afirmou que a ex-gerente alertou a atual presidente da Petrobras sobre as irregularidades na empresa. Ela o teria feito inclusive verbalmente várias vezes desde 2007, em períodos em que Graça Foster ocupou outros cargos na estatal.

Ao ser indagado sobre as afirmações de Foster de que Fonseca estaria fazendo as acusações por ter sido responsabilizada por parte das irregularidades na Petrobras, o advogado afirmou que " estão querendo transformar a Sra. Venina de vítima a vilã".

"Estão em uma operação de desconstrução de imagem da minha cliente, mas o que foi apresentado hoje aos procuradores mostra que Venina não é a vilã desta história.

Fonseca veio de Cingapura, onde ocupava um cargo de direção em um escritório da Petrobras, passou pelo Rio de Janeiro e chegou a Curitiba na noite de quinta-feira.

Na capital paranaense teve escolta da Polícia Federal nos deslocamentos para prestar depoimento no Ministério Público Federal.

A exemplo do que ocorreu nesta sexta, Fonseca será ouvida na condição de testemunha nas ações criminais propostas neste mês contra executivos de empreiteiras e o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa.

Os depoimentos nas ações penais abertas pelo juiz federal Sergio Moro ocorrerão no início de fevereiro.

Fonseca foi indicada como testemunha de acusação pois há cerca de três semanas o advogado dela procurou a força-tarefa da Lava Jato e comunicou o desejo dela de falar às autoridades.

Como Fonseca havia sido subordinada de Costa na diretoria de Abastecimento da Petrobras, os procuradores consideraram que o depoimento dela poderia ser útil às investigações.

De acordo com Mattos, após ser destituída do posto de gerente executiva do escritório da Petrobras em Cingapura, Fonseca voltou para a função de geóloga sênior na estatal. Atualmente está de licença médica, segundo o advogado.

Mattos disse que ela confirmou ter recebido ameaças de morte em 2012.

Ex-gerente da Petrobras reafirma que toda a cúpula sabia de desvios

• Em depoimento de cinco horas ao MP Federal em Curitiba, Venina Velosa disse que está sendo ameaçada

Cleide Carvalho e Felipe Ribas - O Globo

SÃO PAULO e CURITIBA — A ex-gerente da Petrobras Venina Velosa da Fonseca prestou depoimento durante cinco horas ao Ministério Público Federal em Curitiba, contou que está sendo ameaçada e entregou milhares de documentos, principalmente cópias de emails e relatórios internos de auditoria, à força tarefa de procuradores que investiga o cartel de empresas e o desvio de dinheiro de obras da estatal. Segundo o advogado Ubiratan Mattos, que representa Venina, ela reafirmou que toda a diretoria da Petrobras sabia das irregularidades, incluindo Graça Foster, e os documentos devem ajudar a força tarefa nas investigações.

Mattos explicou que Venina manteve cópias dos emails porque sabia que estavam sendo cometidas irregularidades e decidiu ajudar nas investigações depois de ver seu nome incluído entre os responsáveis pelas irregularidades nas obras da Refinaria Abreu e Lima, ao lado de Pedro Barusco Filho, da diretoria de Engenharia e Serviços, que mantinha contas no exterior a serviço do esquema. Barusco, que assinou acordo de delação premiada e se prontificou a devolver cerca de R$ 100 milhões mantidos fora do país, era subordinado de Renato Duque.

- A vilã não é Venina. Ela está do lado da ética e sempre denunciou internamente. A diretoria toda sempre soube, incluindo a Graça (Foster) - disse Mattos.

O advogado afirmou que Venina passou a ser intimidada por telefone após a primeira denúncia, com recados como "você está mexendo com gente grande".

- Havia um processo de desconstrução da imagem da Venina. Colocar o nome dela ao lado de Pedro Barusco é um absurdo - afirmou Mattos.

O Ministério Público Federal apresentou à Venina a possibilidade de ela ser ouvida como "colabora", em acordo de delação premiada, mas o advogado Ubiratan Mattos afirmou que ela não considerou necessário.

- Em nenhum momento ela cogitou depor como colaboradora. Ela será ouvida como testemunha de acusação - explicou.

Venina deverá prestar novos depoimentos ao Ministério Público Federal e tem pelo menos três depoimentos marcados para fevereiro, a serem prestados ao juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara da Justiça Federal no Paraná, responsável pelos inquéritos da Operação Lava-Jato que não envolvem autoridades com foro privilegiado.

- Essa foi apenas a primeira conversa com o Ministério Público Federal. Mantivemos o sigilo por segurança. Ela tem sofrido ameaças por telefone - explicou o advogado, acrescentando que Venina é divorciada, tem duas filhas e teme pela segurança delas.

Para Mattos, a atitude de Venina da ex-gerente da Petrobras é essencial para mudar a forma como são feitos negócios no Brasil, que causa indignação a todos os cidadãos, inclusive a ele próprio.

O procurador Deltan Dallagnol, que lidera a força-tarefa do MPF na Operação Lava-Jato, também ressaltou que Venina depôs na condição de testemunha e não negou que ela possa ser ouvida novamente na sequência das investigações.

- Todos os elementos formais, como documentos e emails, foram entregues. Mas o teor deles e do depoimento vão continuar em sigilo - afirmou o procurador.

Comissão responsabilizou Venina ao lado de Duque, Costa e Barusco
Venina foi gerente executiva do Abastecimento-Corporativo entre 2005 e outubro de 2009 e integrou o Conselho de Administração da Refinaria Abreu e Lima ao lado de Paulo Roberto Costa e José Carlos Cosenza.

O relator da Comissão Interna de Apuração que investigou irregularidades nas obras da refinaria afirmou ela assinou em 2007, atendendo a pedido de Costa, o documento de antecipação de obras da refinaria, que teria causado problemas nas obras e a necessidade de vários aditivos contratuais com as fornecedoras,a maioria deles aumentando preços. Em 2008, ela e Pedro Barusco assinaram o documento que pedia a Duque e Costa a instauração de 12 licitações para a Refinaria. Segundo a Comissão, a diretoria executiva não foi comunicada sobre a mudança na estratégia para estas contratações. No mesmo ano ela assinou com Barusco Filho um pedido de inclusão de empresas na licitação (a vitoriosa foi a Engevix e a EIT) e não houve parecer jurídico para a finalização do processo licitatório.

O relator da Comissão foi Gerson Luiz Gonçalves, chefe da auditoria interna da estatal e gerente executivo mais antigo na empresa. Depois de finalizado o relatório, Venina foi demitida. Gonçalves também chamado a depor como testemunha de acusação pelo Ministério Público Federal.

Líder do PSDB diz que ‘listão’ de políticos é ‘prenúncio de terremoto’

• Oposição evita prejulgamentos e diz que irá aguardar divulgação oficial dos depoimentos para verificar veracidade das acusações

Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA - A oposição acredita que as novas denúncias de que o ex-diretor Paulo Roberto Costa citou pelo menos 28 políticos em seus depoimentos à Polícia Federal, dentro do processo de delação premiada, reforçam a necessidade de aprofundar as investigações e espera a divulgação oficial para evitar prejulgamentos. Mas admite que há consequências políticas. O líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (SP), disse que o aparecimento da lista "traz o prenúncio de um terremoto".

Aloysio disse, porém, que é preciso aguardar a divulgação oficial dos depoimentos para verificar a veracidade das acusações e em qual contexto os nomes foram citados. Nos bastidores do Congresso, a lista já foi batizada de "listão".

— Isso é o prenúncio do terremoto que está por vir. Mas queremos e esperamos o teor exato da delação premiada. O chamado petrolão, como foi o mensalão, é o resultado de um tipo de relação espúria entre partidos políticos, governo e Congresso. E os desdobramentos, tudo vai depender do teor oficial das declarações (de Paulo Roberto). Mas, sem dúvida, é preciso haver outra CPI — disse Aloysio.

Os partidos de oposição querem uma nova CPI Mista da Petrobras em 2015. E o PSDB, mesmo tendo o nome do ex-presidente Sérgio Guerra — que faleceu em março — citado nos depoimentos, divulgou nota afirmando que sempre defendeu investigações profundas e sem distinções partidárias.

O PSDB divulgou nota, afirmando que defende que “todas as denúncias sejam investigadas com o mesmo rigor, independentemente da filiação partidária dos envolvidos e dos cargos que ocupem”. Para o PSDB, o relatório paralelo da oposição apresentado na CPI Mista da Petrobras “reforçou essa tese, ao pedir o indiciamento de 59 pessoas e a abertura de inquérito policial contra outras 36, tratando os nomes citados da mesma forma, sem distinção de filiação partidária”.

O líder do DEM na Câmara, deputado Mendonça Filho (PE), também disse que é preciso aguardar a divulgação oficial para evitar prejulgamentos.

— É uma informação grave, merece apuração. Não vou fazer prejulgamento de ninguém. Delação exige comprovação de quem delata e caberá ao Ministério Público cumprir três opções: ou arquiva por entender que não há provas, ou abre inquérito para aprofundar investigação, ou faz a denúncia, se achar procedente — disse Mendonça Filho.

Já o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO) disse que há o risco de o Congresso ficar "engessado" no início de 2015.

— Não é questão de fazer prejulgamento, mas não podemos ficar nessa situação constrangedora com várias listas ainda sob sigilo e comprometer o funcionamento do Congresso Nacional. Não é hora de ‘fulanizar’ ou saber se é a lista do Paulo Roberto ou do Renato Duque. Precisamos saber o mais rápido possível a totalidade dos políticos citados para que as providências sejam tomadas. Vamos ter no início do ano que vem a eleição das Mesas Diretoras da Câmara e Senado. Imagina se um membro eleito da mesa é envolvido nesse escândalo desgastando o Congresso e engessando seu funcionamento? — questionou Caiado.

Candidato à reeleição no cargo, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), não compareceu a um café da manhã oferecido ontem pelos funcionários do Senado ao senador José Sarney (PMDB-AP). Já o senador Sarney aproveitou para defender a filha, a ex-governadora Roseana Sarney de acusações. Ela foi citada.

Depois de participar de um café da manhã oferecido por servidores do Senado, Sarney disse que “não acredita” no envolvimento de sua filha e insinuou que a inclusão do nome de Roseana foi “dirigida”.

Oposição reage a discurso de Toffoli de que não haverá ‘terceiro turno’ na Justiça eleitoral

• Líder do PSDB classificou declaração de presidente do TSE como ‘reprovável’

Isabel Braga – O Globo

BRASÍLIA — Líderes da oposição reagiram nesta sexta-feira ao discurso feito pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Dias Toffoli, na cerimônia de diplomação da presidente Dilma Rousseff. Após entregar o diploma à Dilma, Toffoli se referiu às ações da oposição para tentar impedir a posse como "página virada", acrescentando que não haverá "terceiro turno" na Justiça eleitoral. Antes de ser indicado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o Supremo, Dias Toffoli advogou para o PT e foi advogado geral da União.

Para o líder do PSDB na Câmara, Antonio Imbassahy (BA) a declaração de Toffoli é "reprovável" e ele deve se corrigir, retomando a postura de imparcialidade no comando da Justiça eleitoral que adotou durante o período eleitoral. O PSDB entrou com ação pedindo a cassação do registro de candidatura de Dilma por uso da máquina eleitoral

— Ele tem obrigação de cumprir os serviços jurisdicionais, receber requerimentos, processos de quem quer que seja e levar a julgamento. E não condenar isso, assim,fica desacreditado. A declaração de ontem é reprovável. Que ele se corrija, adotando um comportamento adequado para o cargo que ocupa, como vinha fazendo — disse Imbassahy, acrescentando:

— Juiz algum pode deixar que sua alma partidária prevaleça sobre o mérito.

Para o líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), o tom usado por Toffoli é mais adequado em debates políticos :

— É (uma fala) no mínimo inusitada, com todo respeito ao ministro Toffoli. Esse tom cabe mais aos debates políticos do que ao debate das Cortes que têm um caráter técnico jurídico. Ele tem liberdade de expressão. Mas, o melhor é deixar para o, PT, o PSDB e demais partidos o duelo no campo politico eleitoral.

Supremo homologa delação premiada de Alberto Youssef

• O ministro relator do caso na Corte, Teori Zavascki, também aceitou pedido para desmembrar depoimentos e assim agilizar o processo

Talita Fernandes - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A delação do doleiro Alberto Youssef foi homologada nesta sexta-feira, 19, pelo ministro Teori Zavascki, relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF). O teor da delação chegou às mãos do relator na última terça-feira, 16, após passar pela análise do procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Além da homologação, Zavascki aceitou também o pedido de Janot para que os depoimentos tanto de Youssef quanto do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras de Paulo Roberto Costa sejam desmembrados em procedimentos autônomos para facilitar a condução do caso.

O próximo passo será o desmembramento dos casos em que os réus não possuem foro privilegiado ou em que o julgamento não é de competência do STF, caso de quem não tem mandato, como parlamentares que não foram reeleitos.

Referência a Renan deixa em suspense sucessão no Senado

• Parlamentares avaliam que inclusão de peemedebista na lista de ex-diretor pode inviabilizar sua reeleição para presidência da Casa

Nivaldo Souza e Daiene Cardoso - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A revelação da lista com 28 políticos que teriam se beneficiado do esquema de corrupção na Petrobrás, conforme delação premiada do ex-diretor da estatal Paulo Roberto Costa ao Ministério Público Federal, publicada ontem pelo Estado, pode atrapalhar os planos do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN).
Peemedebistas afirmaram que, se for comprovada a relação de Calheiros com o esquema, o senador alagoano não terá condições de viabilizar sua reeleição para comandar o Congresso Nacional. Segundo um correligionário do senador, “Renan está enfraquecido” e “pode ficar ainda mais“ se aparecer na lista de acusados pelo doleiro Alberto Youssef.

A tentativa de reeleição de Calheiros já era contestada pela oposição, especialmente o PSDB. Agora, senadores do PT e outros partidos da base estariam articulando uma alternativa. Esse grupo teria até agora 30 dos 81 senadores.

O bloco começou a ser formado quando o presidente da Transpetro, Sérgio Machado, indicado por Calheiros, foi citado por Paulo Roberto Costa.

Já Henrique Alves, que foi derrotado na disputa pelo governo do Rio Grande do Norte, corre o risco de não se viabilizar como ministro no segundo mandato de Dilma. Ele negocia, com apoio do vice-presidente Michel Temer (SP), uma indicação para o Ministério da Previdência Social.

Alguns parlamentares se surpreenderam com a inclusão de Alves na lista. A menção ao nome do presidente da Câmara aumentou a cautela dos deputados peemedebistas ao comentar a revelação. “Por enquanto, prefiro achar que (a delação) não compromete ninguém. Logicamente é desconfortável, mas não tem nada efetivamente”, comentou o deputado Lúcio Vieira Lima (BA).

Reflexo. Deputados tentaram desvincular o líder da bancada peemedebista, Eduardo Cunha (RJ), de Henrique Alves. Cunha é favorito na disputa pela presidência da Câmara. Os peemedebistas consideram que denúncias contra Alves, que não tem mais mandato parlamentar, não terão reflexo sobre o líder. “O candidato é o Eduardo Cunha e não o Henrique”, disse Leonardo Picciani (RJ), enfatizando que “é preciso saber o contexto em que as pessoas estão sendo citadas” pelo delator.

Já o deputado Danilo Forte (CE) acredita que a nova legislatura começará sob a pressão. “Vai ter reflexo com certeza na eleição das Mesas Diretoras e na indicação para os ministérios.”

O assunto deverá entrar na pauta da reunião de Temer com a bancada do PMDB na próxima segunda-feira cujo tema será a reforma ministerial.

Contas públicas estão em situação pior que o esperado

• Avaliação é de Joaquim Levy, futuro ministro da Fazenda, em conversas reservadas

Martha Beck – O Globo

BRASÍLIA - A nova equipe econômica encontrou as contas públicas em situação pior do que esperava. Em conversas reservadas no gabinete improvisado no Palácio do Planalto, o futuro ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem dito a interlocutores que está impressionado com a “multiplicação de algumas despesas" que atingiram uma dimensão “impossível de ser sustentada”. Nessas avaliações, ele também questiona a efetividade de algumas das desonerações feitas nos últimos quatro anos para estimular o crescimento da economia e o emprego. Há incentivos cuja relação entre custo e benefício não se justifica, concluiu. Embora o futuro comandante da Fazenda não revele as medidas de correção de rota que estão em estudo, ele indicou a interlocutores que o corte de despesas que crescem sem sustentação é inevitável, assim como de incentivos. Também demonstrou o desejo de não carregar para o orçamento de 2015 despesas que estão sendo represadas, como a conta de energia.

O futuro comandante da Fazenda também tem indicado que o quadro atual precisa ser corrigido logo, o que não significa necessariamente provocar um baque na economia. Nas conversas internas, Levy tem dito que “diante dos números e das perspectivas, não seria produtivo deixar as coisas para serem todas resolvidas ano que vem”:

— A ideia não é passar uma foice em tudo. Tem lugares onde o mato está tão alto que mesmo cortando ainda continuará bastante grande. (O plano) É fazer um ajuste sem dar brecadas efetivas, sem causar desconfortos efetivos — disse, segundo fontes.

Sobre o aumento de tributos, Levy também tem demonstrado cautela, dizendo que “não é boa a ideia de carregar demais na carga de impostos”. Ao comentar as benesses tributárias dos últimos tempos, brinca:

— Há áreas em que o conforto é tão grande que ninguém vai notar (a retirada).

Sem esqueletos
Da atual equipe econômica, Levy tem cobrado que o resultado fiscal de 2014, não importa o tamanho, seja transparente e não deixe esqueletos. Um deles está no setor elétrico. A estratégia do governo de tentar desonerar as contas de luz em 2012 desequilibrou o setor de tal maneira que o Tesouro Nacional teve que colocar recursos orçamentários na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) e ainda negociar com o setor privado dois empréstimos às distribuidoras.

Os planos da nova equipe são que os custos da CDE voltem a ser cobrados na conta de luz. Levy tem defendido em reuniões internas que a medida “vai aumentar um pouco a inflação, mas parar de criar esqueletos”. O futuro ministro também é um defensor das chamadas bandeiras tarifárias, que entram em vigor em 2015. Esse sistema indica aos consumidores as condições de geração de energia no país. Quando os custos sobem, a diferença é repassada imediatamente para as tarifas.

A urgência em mostrar como a política fiscal mais austera vai ser executada em 2015 aumentou com o atual quadro internacional, de dólar em alta e preços do petróleo em queda.

— O que é ruim é a incerteza. Quanto mais rápido a gente der o rumo, mas rápido a gente começa a avançar. O importante é arrumar a regra do jogo. Quando arruma, as peças começam a se mexer — disse Levy a interlocutores.

Na nova estratégia, os subsídios aos bancos públicos serão reduzidos substancialmente. Com o aumento da TJLP, aprovado ontem, o BNDES terá que fazer mais escolhas na hora de emprestar seus recursos e deve “priorizar segmentos estratégicos”, disse uma fonte do Palácio do Planalto. Entre eles, pequenas empresas e setores inovadores, como o de etanol.

O discurso da transparência e uma boa comunicação com o mercado também são considerados essenciais pela nova equipe econômica. O futuro ministro da Fazenda tem demonstrado simpatia pela ideia de adotar um Focus fiscal como “ferramenta de disciplina". A pesquisa semanal Focus, feita pelo Banco Central com as principais instituições financeiras, traz hoje as projeções para indicadores como crescimento, inflação e câmbio.

Alta tensão antes da posse

• Denúncias se aproximam da classe política a dias de início do segundo mandato

Leonardo Guandeline - O Globo

SÃO PAULO — Analistas ouvidos pelo GLOBO disseram que a divulgação da lista com políticos que teriam envolvimento na corrupção da Petrobras provoca um dos momentos mais tensos politicamente antes de uma posse presidencial. Os cientistas políticos falam em desgaste da classe política, em todas as correntes. Para alguns dos especialistas, os nomes citados devem ficar sob os holofotes durante todo o início da nova gestão de Dilma Rousseff, causando um prolongamento da tensão já iniciada nas eleições.

O cientista político Fábio Wanderley Reis, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), acredita que o momento reflete “o terceiro turno que o Brasil vive desde o fim das eleições”, com o país dividido e o aumento da troca de farpas entre governistas e opositores:
— A repercussão (para a classe política) obviamente é negativa. Há uma tensão continuada desde as eleições e que prevalece num momento da inauguração de um novo mandato. Temos um caso singular, negativo, nunca visto na História recente brasileira no momento que antecede a posse.

Mesmo com a maioria de políticos citados pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa pertencendo à base governista, o cientista político faz questão de lembrar que o ex-senador Sérgio Guerra (PSDB), já morto, também está na lista e que a conta não deve ser paga apenas pelo governo.

— O nome do Sérgio Guerra está lá. É uma figura importante, já foi presidente do PSDB, ainda que o número de opositores citados seja reduzido — conclui.

Para o cientista político da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) Fernando Antonio de Azevedo, o escândalo “atinge frontalmente a classe política” e coloca o Brasil num dos momentos politicamente mais delicados antes de uma posse presidencial. O professor cita como episódios políticos tensos da História recente brasileira antes de um novo governo o golpe preventivo, em 1955, do então ministro da Guerra, Henrique Lott, para garantir a posse de Juscelino Kubitschek e a transição da ditadura para a democracia, em 1985.

— É um grande desgaste para a classe política. Os políticos supostamente envolvidos pertencem a várias siglas, há o nome de um ex-presidente do principal partido de oposição. Acredito que esses nomes devem ser denunciados e que, pelo menos até metade do mandato de Dilma, estarão sob os holofotes da mídia, que deve cobrir todo o processo.

O professor acredita também que a nova legislatura terá de discutir urgentemente o financiamento de campanhas eleitorais.

Já o professor Cláudio Couto, da Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP), fala em tensão política para o próximo mandato, não em instabilidade para a classe. Ele acrescenta que até o momento não há provas contra os nomes citados por Paulo Roberto Costa:

— Temos que aguardar para ver o que vai aparecer de mais consistente. Não existe ainda alguma evidência mais clara, são afirmações mais genéricas. Além do desconforto que isso causa a esses nomes, não vejo uma consequência mais séria no momento. Creio num momento de tensão, mas não de instabilidade política.

Couto complementa dizendo que é necessário aguardar um pouco mais os desdobramentos do caso:

— A lógica da delação premiada é sempre a de apresentar indícios que levem a descobertas. Eventualmente, há a apresentação de provas cabais. O desdobramento natural da deleção, uma vez apresentados os indícios, é de se investigar se aquilo é ou não verdade. Caso contrário, o benefício sequer é auferido. Temos de aguardar um pouco mais os desdobramentos.

Rombo nas contas externas é recorde e BC eleva projeção de déficit

• Déficit em conta corrente somou US$ 9,3 bilhões em novembro, o maior já registrado no mês; projeção para rombo em 2014 passou de US$ 80 bilhões para US$ 86,2 bilhões

Laís Alegretti, Victor Martins - O Estado de S. Paulo

O rombo nas contas externas em novembro foi de US$ 9,333 bilhões, mais do que o previsto para o mês pelo Banco Central (US$ 8 bilhões). Foi também o maior déficit já registrado no mês na série histórica do BC. O resultado ficou dentro das previsões coletadas pela AE Projeções, daAgência Estado, mas bem próximo da projeção mais pessimista. Em novembro de 2013, o resultado havia ficado negativo em US$ 5,101 bilhões.

De janeiro a novembro, o déficit em conta corrente está em US$ 80,030 bilhões, o que representa 3,98% do Produto Interno Bruto (PIB). Com isso, o BC elevou a projeção para o déficit em conta corrente neste ano de US$ 80 bilhões para US$ 86,2 bilhões. Em 2015, a autoridade monetária projeta um rombo de US$ 83,5 bilhões.

O chefe do Departamento Econômico do BC, Tulio Maciel, afirmou que o desempenho da balança comercial se destacou em novembro e que vem mostrando resultados negativos e crescentes. "Quando falamos de transações correntes e a diferença em relação a novembro de 2013, a perda da balança comercial explica boa parte disso. A diferença da balança comercial é de US$ 4 bi de novembro deste ano para novembro do ano passado", disse, comparando o saldo negativo do mês passado com o déficit em conta corrente de US$ 5,101 bilhões em novembro de 2013.

Maciel disse, ainda, que a queda dos preços de commodities nos últimos meses impactou a balança comercial. "Também se observa nos últimos meses uma queda expressiva dos preços de algumas commodities importantes, como minério de ferro, soja, milho", disse. Ele acrescentou que, na queda de 6,1% nas exportações entre janeiro e novembro, 4,5 pontos porcentuais se devem à baixa dos preços.

Investimento estrangeiro. Os Investimentos Estrangeiros Direto (IED) somaram US$ 4,644 bilhões em novembro, resultado que ficou bem abaixo dos US$ 8,334 bilhões registrados no mesmo período do ano passado. O resultado do mês passado ficou acima da estimativa apresentada por Maciel, de US$ 4 bilhões.

No acumulado do ano até o mês passado, o IED soma US$ 55,845 bilhões, o equivalente a 2,78% do Produto Interno Bruto (PIB). No mesmo período do ano passado, o IED acumulado era de US$ 57,520 bilhões (2,79% o PIB). No últimos 12 meses até novembro, o IED está em US$ 62,321 bilhões, o que corresponde a 2,85 % do PIB.

Para reduzir repasses do Tesouro, governo eleva juros de longo prazo

• Usada em 90% dos empréstimos do BNDES, TJLP tem 1ª elevação desde o início do governo Lula

• Objetivo é reequilibrar as contas públicas, visando recuperar a credibilidade da política fiscal

Eduardo Cucolo, Valdo Cruz - Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Em reunião nesta sexta (19) com Dilma Rousseff, o ministro Guido Mantega (Fazenda) e seu sucessor, Joaquim Levy, decidiram elevar as principais taxas de juros para empréstimos de longo prazo a empresas no país, a TJLP e a do PSI (Programa de Sustentação do Investimento).

A TJLP, adotada em 90% dos empréstimos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), será de 5,5% no primeiro trimestre de 2015. Hoje, está em 5% ao ano.

É a primeira elevação desde outubro de 2003, início do governo Lula (2003-2010), quando os juros de longo prazo estavam em 12% ao ano. Ela foi sendo reduzida até atingir 5%, em janeiro de 2012.

No caso do PSI, a taxa final ao tomador está entre 4% e 8% ao ano e passará para uma faixa entre 6,5% e 10% ao ano.

Essa linha, criada na crise de 2009, terá R$ 50 bilhões adicionais em 2015, recursos que já estão com o BNDES. Em 2014, foram repassados R$ 80 bilhões. O saldo hoje do programa está em R$ 378 bilhões. O percentual de financiamento dos bens vai cair de até 100% para até 70%.

Segundo o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Paulo Caffarelli, o governo considerou que era chegado o momento de reduzir o subsídio do governo a esse tipo de crédito e melhorar o resultado das contas públicas.

"São taxas atrativas comparadas com as de mercado, mas foram ajustadas para que se mantenha a premissa de subsídios zero", afirmou, acrescentando que as taxas são compatíveis com uma meta de superavit primário de 1,2% do PIB para 2015 e de 2% em 2016 e 2017.

Ao falar em subsídio zero, o governo se refere apenas ao fim da obrigação de o Tesouro remunerar o BNDES pelo risco desse crédito e da margem de ganho do banco. Essa despesa foi de R$ 18 bilhões desde 2009.

Segundo Caffarelli, o banco tem outros recursos, como retorno de empréstimos já concedidos, para usar no PSI.

Reportagem da Folha do dia 9 já havia antecipado o acordo entre as duas equipes em torno do assunto.

O percentual valerá até 31 de março, quando será revisto pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), formado por BC, Fazenda e Planejamento.

Caixa Econômica
A Fazenda também decidiu ontem que permitirá à Caixa repassar menos dividendos à União, respeitando o limite obrigatório de 25% do lucro, caso a instituição tenha perdas com o programa Minha Casa Melhor, que financia compra de eletrodomésticos e móveis para beneficiários do Minha Casa Minha Vida.

Aécio Neves - O lugar da oposição

• A vitória deu ao PT a oportunidade de corrigir erros, mas não lhe garantirá salvo-conduto para continuar atentando contra a ética e a inteligência dos brasileiros

O Globo

Uma coisa é preciso reconhecer: a retórica petista costuma ser muito bem ensaiada e orquestrada quando se trata de tentar impor uma “verdade” à opinião pública. Agora, o mantra parece um só: “A eleição acabou, é preciso descer do palanque.” É o que ouvimos, dia após dia, de políticos e autoridades ligados ao partido, numa tentativa de desqualificar a voz da oposição. Mas, afinal, o que incomoda tanto essas pessoas?

O fato é que eles estão perplexos diante do país novo que surgiu das urnas.

Como é de conhecimento público, ainda no fim do dia 26 de outubro, telefonei para a presidente para cumprimentá-la pela vitória. Não houve qualquer questionamento quanto ao resultado da votação. Cumpri, em nome da coligação que representava, o rito civilizado e democrático de cumprimentar o vencedor, embora, de forma surpreendente para muitos analistas, a presidente, em seguida, tenha optado por omitir da população essa informação como seria a praxe e tradição.

A eleição acabou, de fato, há quase dois meses. Apesar da utilização maciça de métodos pouco éticos, o grupo petista conquistou o direito de permanecer no comando do país. Outro resultado que merece o mesmo respeito é a constatação de que há uma oposição referendada por 51 milhões de brasileiros. O tamanho da derrota do PSDB parece incomodar profundamente o PT.

Esta parece ser a grande novidade da cena política. Pela primeira vez, nos últimos anos, se configura a existência de uma oposição ampla, profundamente conectada à opinião pública. Chega a ser constrangedora a posição do partido governista diante da dificuldade de lidar com esta realidade.

A agremiação que protagonizou a mais ferrenha, intransigente e sistemática oposição contra todos os avanços institucionais implantados no país desde a redemocratização, a começar pelo Plano Real, hoje prega a necessidade de uma oposição silenciosa e se ofende com a presença de brasileiros nas ruas, indignados com a corrupção.

A sociedade está dizendo, em alto e bom som, que não aceita mais os métodos utilizados pelo PT, mas há quem não queira ouvir, justamente porque ainda não desceu do palanque. Perplexo, o partido enxerga brasileiros mobilizados em defesa do país apenas como adversários do PT.

Sair do palanque implica reconhecer que há papéis distintos na democracia, e um destes papéis cabe à oposição exercer, fiscalizando o poder, denunciando erros e abusos, inquirindo as autoridades, apresentando alternativas.

Na lógica do PT, só têm o direito de ocupar as ruas os movimentos que defendem o partido. Para tentar tirar a legitimidade de milhões de brasileiros, de forma desrespeitosa, tentam associar todos os opositores a defensores de ditaduras. É importante que o partido aprenda a conviver com esse novo protagonista da cena política — o cidadão que democraticamente protesta e não se cala. Pois, ao lado dele, a oposição também não vai se calar.

A vitória deu ao PT a oportunidade de corrigir erros que não foram poucos, mas não lhe garantirá salvo-conduto para continuar atentando contra a ética e a inteligência dos brasileiros.

Aécio Neves é senador (PSDB-MG)

Merval Pereira - O STF tem pressa

- O Globo

Ao homologar a delação premiada do doleiro Alberto Yousseff e, ao mesmo tempo permitir que o Procurador-Geral da República Rodrigo Janot desmembre os depoimentos do doleiro e do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa para fazer denúncias individuais ou por pequenos grupos, o relator do processo do petrolão no Supremo Tribunal Federal , ministro Teori Zavascki deu uma demonstração de que quer adiantar ao máximo o andamento do processo, e também já indicou que sua tendência ė aceitar a abertura do inquérito quando chegar o pedido do Ministério Público no fim do recesso da Justiça, em fevereiro.

O processo do petrolão, ao contrário do do mensalão, será julgado pela 2 turma do STF, presidida por Zavascki e composta pela ministra Carmem Lúcia e pelos ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes, ficando faltando ainda o novo ministro que será indicado para a vaga aberta pela saída de Joaquim Barbosa.

Os políticos, no entanto, estão reagindo a essa mudança, e o presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves, que aparece na lista dos envolvidos denunciados pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa já havia entrado com com Ação Direta de inconstitucionalidade (Adin) questionando a reforma regimental que transferiu do plenário para as turmas do STF o julgamento de parlamentares em processos criminais.

Na verdade, o processo do mensalão paralisou as atividades do plenário do Supremo por diversos meses, e os ministros resolveram que o pleno só discutirá matérias constitucionais não penais, ou recursos que tenham repercussão geral.

Os parlamentares rebelaram-se por duas razões: nas turmas, formadas por cinco membros cada - o presidente do Supremo não participa das turmas - bastam três votos para a condenação de um réu, e também o novo regimento manteve o julgamento pelo plenário dos presidentes da Câmara e do Senado, o que mostra uma diferença de tratamento que não está prevista na Constituição.

No petrolão, por exemplo, estão na lista dos possíveis réus os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Henrique Eduardo Alves. Este, como não se reelegeu, se denunciado pelo Procurador-Geral e aceito pelo relator Teori Zavascki, deverá ter o processor transferido para a primeira instância na Justiça do Paraná.

Mas se o atual presidente da Câmara for indicado para o ministério do segundo governo de Dilma, como pretende o PMDB, manterá o foro privilegiado. Mas como nomear um ministro que provavelmente estará sendo julgado pelo Supremo meses depois da indicação? Certamente por essas e outras a presidente Dilma fez uma confidência à presidente da Argentina Cristina Krieger que foi captada por um microfone aberta em recente reunião do Mercosul: "Está difícil escolher os ministros", comentou.

Por essas e outras, também, o juiz Sergio Moro e o Ministério Público deixaram para a última etapa do processo a relação com os nomes do políticos envolvidos.

A capacidade de pressão dos congressistas é superior até mesmo à dos empreiteiros, e a partir de fevereiro veremos um desfile de políticos com mandato fazendo ameaças ao Supremo e pressionando o Palácio do Planalto, especialmente na escolha do novo ministro que comporá a 2 Turma.

A escolha desse novo integrante do STF estará cercada de interesses políticos, com a oposição também disposta a sabatiná-lo duramente. As sabatinas no Senado nunca mais serão iguais às anteriores, quando nenhum ministro indicado foi barrado e todos recebiam elogios até mesmo dos oposicionistas. Um caso como o do ministro Dias Toffoli, indicado para o STF depois de ter sido advogado do PT e do ex-ministro José Dirceu, hoje teria difficuldade de ser aceito pelo Senado.

O petrolão promete ser mais rápido que o mensalão, e com influência política mais forte. Se no mensalão o principal ministro do governo Lula foi condenado, no petrolão estará em jogo até a atuação da presidente Dilma, já que uma das acusações é de que ela é o ex-presidente Lula sabiam de tudo o que acontecia na Petrobras, e o ex-ministro Antônio Palocci está arrolado como um dos favorecidos com dinheiro desviado da Petrobras para financiar a campanha presidencial de 2010, em que foi um dos coordenadores da candidata Dilma Roussef.

Paralelamente, estará correndo o processo contra a Petrobras nos Estados Unidos, e certamente o resultado de lá influenciará o de cá, e vice-versa .