quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Luiz Carlos Azedo - O cerco se fecha

• Para os procuradores, os contratos de consultoria dos ex-diretores com as empreiteiras mascaravam a propina, e a origem do esquema seria o financiamento das campanhas eleitorais

- Correio Braziliene

O cerco aos políticos envolvidos no escândalo da Petrobras está se fechando. Ontem, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, determinou a criação de uma força-tarefa com oito procuradores do Ministério Público Federal para comandar apurações sobre o envolvimento de políticos no esquema de corrupção e desvios em contratos da Petrobras. Os nomes de dezenas deles foram citados nas delações premiadas do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto da Costa e do doleiro Alberto Youssef.

A decisão coincide com a viagem dos procuradores federais do Paraná, que já investigavam o caso, à Suíça em busca de documentos que comprovem operações financeiras dos envolvidos no exterior. O Ministério Público suíço comprometeu-se com o fornecimento dessas provas em troca da continuidade das investigações pelos colegas brasileiros aqui no Brasil. Para o juiz federal do Paraná Sérgio Moro, esses documentos são necessários para julgar os executivos das empreiteiras e funcionários da Petrobras envolvidos no caso. Os políticos com mandato serão julgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Os procuradores federais também pretendem oferecer ações de improbidade administrativa contra seis empreiteiras que atuavam no esquema de corrupção da Petrobras. A denúncia deve atingir as empresas Camargo Corrêa, Engevix, Galvão Engenharia, Mendes Júnior, OAS e UTC, e deve agravar a crise instalada no setor da construção pesada. Mais de 20 construtoras, incluindo a Odebrecht, maior empreiteira do Brasil, deverão ser denunciadas criminalmente por formação de cartel. Caso sejam condenadas, serão consideradas inidôneas e não poderão prestar serviços para o setor público.

Tiroteio
A preocupação com a situação da Petrobras e das construtoras é crescente no Palácio do Planalto. Embora procure manter a maior distância possível do caso, a presidente Dilma Rousseff tem dado orientações no sentido de evitar a paralisia dos projetos em execução, mas os problemas legais para que isso ocorra são cada vez maiores. É o caso, por exemplo, da Sete Brasil, fabricante de sondas para o pré-sal, que está em colapso.

Fala-se na necessidade de um grande acordo político e institucional para salvar as empresas e punir os responsáveis pelos desvios, mas uma solução desse tipo está se tornando cada vez mais difícil. Instalou-se um tiroteio entre as partes envolvidas. Na narrativa governista, as empresas corromperam os funcionários e os políticos para obter mais lucros. Nessa linha, a atual diretoria da Petrobras procura responsabilizar as empreiteiras pela formação do cartel e tirar o corpo fora, ao responsabilizar os antigos diretores pelas irregularidades.

A prisão do ex-diretor da Área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró gerou certo pânico entre os envolvidos. O ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli, ao pedir o desbloqueio de seus bens pelo Tribunal de Contas da União (TCU), com outros 10 integrantes da Diretoria Executiva da estatal, solicitou que, em caso de negativa, os membros do Conselho de Administração também sejam atingidos. O processo trata da compra superfaturada da Refinaria de Pasadena, nos EUA, em 2006. À época, a presidente Dilma Rousseff presidia o conselho que autorizou a aquisição.

Preso desde a semana passada, Cerveró não pretende recorrer à delação premiada, mas sua linha de defesa vai mais ou menos na mesma direção da de Gabrielli. Como teve a prisão decretada porque transferiu os bens para os filhos e tentou sacar R$ 500 mil da previdência privada, seus advogados alegam que a presidente da Petrobras, Graça Foster, também deveria estar presa, pois adotou o mesmo procedimento. Cerveró já havia responsabilizado Gabrielli pela compra, sem licitação, de um navio-sonda de perfuração marítima. Segundo os procuradores federais, a operação teria rendido propina de US$ 30 milhões aos envolvidos no caso.

O ex-presidente e sócio majoritário da UTC Ricardo Pessoa, que está preso, é acusado de comandar o cartel, mas afunda atirando: disse à Polícia Federal que pagou um total de R$ 2,2 milhões ao ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, por consultorias. E alega que o cartel foi formado por exigência da direção da Petrobras, que detinha o monopólio dos contratos de prestação de serviços, obras e compras de equipamentos sem licitações, além dos aditivos. Para os procuradores, os contratos de consultoria dos ex-diretores com as empreiteiras mascaravam a propina, e a origem do esquema seria o financiamento das campanhas eleitorais dos partidos envolvidos.

Eliane Cantanhêde - Saco de maldades

- O Estado de S. Paulo

É sempre assim: quanto mais os governos erram, mais você, consumidor e contribuinte, paga a conta. Ou melhor, paga o pato.

Enquanto economista, Dilma Rousseff tirou uma nota sofrível no primeiro mandato, com crescimento praticamente zero, inflação no teto da meta, juros estratosféricos, balança comercial desbalanceada, desempenho fiscal mais do que constrangedor.

Enquanto ministra das Minas e Energia, chefe da Casa Civil e presidente do Conselho de Administração da Petrobrás no governo Lula, ela não soube, não viu e não ouviu que a maior e mais simbólica companhia do país estava indo para o buraco, arrastando as maiores empreiteiras do país e ameaçando milhares de empregos.

Enquanto expert no setor elétrico, a presidente conseguiu, com uma canetada arrogante e voluntariosa, desestruturar todo o setor e deixar geradoras, transmissoras e distribuidoras tontas, desorientadas e com a contabilidade de pernas para o ar. Resultado: conta mais cara e apagão.

Mas, enfim, Dilma foi reeleita com os votos de pouco mais da metade dos eleitores e eleitoras e chegou ao segundo mandato diante de uma escolha de Sofia: cortar gastos, aumentar impostos ou as duas coisas simultaneamente.

Estava escrito nas estrelas que faria as duas coisas, apesar de todas as negativas na campanha e de ter acusado Armínio Fraga - eleito o vilão da história - de costurar o saco de maldades que ela mesma já alinhavava e agora joga na cabeça e nos ombros de quem consome e de quem paga impostos. E que impostos!

Sobram, portanto, irritação e indignação, mas não há um pingo de surpresa em todos os anúncios que a equipe de Dilma vem fazendo desde a eleição, enquanto ela mesma se esconde num silêncio ensurdecedor: "flexibilização" de direitos trabalhistas e previdenciários, tesourada até mesmo nos recursos da educação da "pátria educadora", agora os aumentos de impostos e de tarifas e veto na correção da tabela do IR.

Os juros continuam arremetendo, ameaçadores, e sobem a tarifas de energia, de ônibus e da gasolina.

Então, ficamos assim: quando o barril de petróleo disparava internacionalmente, a Petrobrás represava politicamente o preço interno da gasolina; agora que o barril só despenca lá fora, a gasolina vai subir aqui dentro. Uma lógica para lá de curiosa.

Do ponto de vista político, contudo, Dilma Rousseff não precisa se preocupar muito. A indignação é generalizada entre os bem informado e que já estão sentindo as maldades pipocando dentro da bolsa ou do bolso, mas esses não têm articulação nem disposição para botar a boca no trombone.

Contentam-se em ler ou ouvir um artigo ácido daqui, uma entrevista crítica dali.

Quem teria condições de catalisar a irritação, dizer poucas e boas verdades e pressionar o governo seriam CUT, UNE, MST e MTST, esse novo movimento paulistano dos sem-teto. Mas a cumpanheirada está na palma da mão de Lula, do PT, de Dilma, de verbas generosas de órgãos e empresas. É mais provável que justifiquem e até aplaudam aumento de impostos e tarifas! Sinal dos tempos. Tudo que seu mestre e sua mestra mandarem...

E o Congresso? Bem. O PT sozinho não dá para o gasto, mas o PMDB é forte e experiente, daqueles que choraminga, ameaça e pressiona, mas no final assegura as vitórias dos projetos, quaisquer projetos, do governo.

A isso some-se a saia justa da oposição. Como condenar as medidas que o tucano Aécio Neves, a sonhática Marina Silva ou qualquer um que vencesse a eleição teria que tomar, querendo ou não?

Levy armou-se até os dentes, o Congresso é dócil, a oposição está de mãos atadas, os movimentos sociais parecem saciados, ou cooptados. Dilma segue muda e incólume, como se não tivesse a menor culpa no que Marta Suplicy chama de "fracasso" da política econômica. Quem leva a pior? Você, claro. E vem mais por aí...

João Bosco Rabello - O apagão é a luz

– O Estado de S. Paulo

Na história humana a verdade é associada à luz, seja no plano espiritual, seja no material. O melhor desinfetante é o sol, máxima de um século atrás, do juiz Louis Brandeis, da Suprema Corte americana, é a que indica a assepsia mais recomendável em estruturas viciadas, com problemas crônicos, onde se inserem a corrupção e o corporativismo, em alguma medida, sinônimos.

Porém, no caso do governo Dilma, considerando o que ocultou na campanha da reeleição, a verdade ironicamente se fez enxergar na escuridão. O apagão de ontem, por ordem do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) sintetiza a má gestão do primeiro mandato presidencial que tem as outras más notícias no pacote recessivo anunciado em doses diárias pela nova equipe econômica.

A frase do magistrado norte-americano se referia à necessidade de transparência do sistema financeiro que para ele anistiava os capitalistas causadores de crises e penalizava a classe média. A causa aqui se inverte, mas a receita a aplicar é a mesma, pois a população começa a pagar a conta de uma gestão que brigou com as regras capitalistas , perdeu a batalha, e agora emprega um discurso de autoanistia, terceirizando a culpa para o contexto internacional.

É o resultado de erros que vão desde um governo permanentemente em campanha, o que torna tabus temas como racionalização do consumo e estimula medidas populistas – como a redução forçada da conta de luz e tarifas administradas- à teimosia em um modelo econômico exatamente centrado no consumo.

Hoje emerge a realidade de inadimplência alta, crédito mais caro, conta de luz de custo dobrado em relação à redução anterior (de 20% reduzidos ontem se pagará hoje 40% a mais), restrições para direitos trabalhistas e para financiamento estudantil, gasolina e impostos mais altos – uma crise energética sem saída em curto prazo devido ao atraso no cronograma de obras das hidrelétricas e de linhas de transmissão.

Os bloqueios de ordem ideológica que respondem, em parte pelo atraso das obras no setor, também foram alimentados pelo partido do governo que estimula movimentos organizados em confronto com a política de desenvolvimento, como acusam operadoras do norte do Estado. Licenças ambientais demoram anos e quando saem sofrem contestação de grupos com liberdade de ação para boicotar, amparados, em muitos casos, pelo Judiciário.

Os especialistas advertiram seguidamente, pelo menos, desde 2012, para a necessidade de se adotar uma relação clara com a população sobre a necessidade de reeducação de consumo. Mas o governo, sempre em campanha, estava empenhado em fazer o contrário e mostrar que a redução da conta de energia era questão de vontade política que faltara à oposição quando no poder.

A gravidade da situação está demonstrada na forma do apagão de ontem. Ele foi determinado pelo ONS escancarando o desequilíbrio entre demanda e oferta que o governo não pode mais deixar de reconhecer. Quando era preciso uma campanha de racionalização, reduziu a conta estimulando o consumo (mais barato, mais usado), estourou os cofres das distribuidoras e agora faz o corte seletivo que não gera consumo consciente.

“O corte já era esperado com a queda do nível dos reservatórios e consumo maior que a oferta. Tinha de ser feita uma política de racionalização, com campanha de eficiência energética e de esclarecimento”, pontua a consultora para o setor, Elena Landau.

Não há como minimizar os efeitos. Em São Paulo, mais de 2 milhões de consumidores ficaram sem luz, produzindo cenas de metrôs parados subitamente e passageiros a pé, nos trilhos, onde rodam os trens. Foram afetados, nas mesmas proporções, a Capital da república, mais o Rio, Espírito Santo, Minas Gerais, Goiás, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Rondônia e Amapá.

A frase do juiz mencionada anteriormente se aplica também ao sistema financeiro que a inspirou no contexto norte-americano de quase um século. A contabilidade criativa derrete como cera ao calor da erupção das contas públicas, cujo deterioramento foi sempre negado. O modelo “rudimentar” que a presidente Dilma resolveu substituir por um de sua própria lavra, exige agora antibiótico de largo espectro para revertê-lo.

O atraso nas obras e as dificuldades econômicas não apontam saída estrutural em curto prazo, o que agrava a situação de um governo acuado e pobre em recursos técnicos, humanos e materiais – e ao qual, portanto, falta também luz para gerir a crise.

Míriam Leitão - Assumir o comando

- O Globo

O ministro Eduardo Braga definirá nesta crise se assumirá mesmo a pasta de Minas e Energia ou se o poder será exercido pelo secretário executivo Márcio Zimmermann, como foi com Edison Lobão. Braga pode aceitar as explicações miúdas, pontuais e escapistas sobre a crise ou enfrentá-la. Culpar um circuito que desligou, uma linha que caiu é fácil; difícil é admitir que há uma crise.

O setor de energia errou demais nos últimos anos. Se virar o porta-voz das explicações e soluções propostas pelas autoridades que permanecem em postos-chave do poder no setor, o ministro Eduardo Braga terminará como Edison Lobão. O Brasil viu o que aconteceu. Zimmermann despachava diretamente com a presidente Dilma, enquanto Lobão repetia que tudo estava certo com o sistema. E assim foi se acumulando o passivo que agora será transferido para o consumidor em forma de tarifaço.

O ministro aceitou dizer que foram "falhas", assim de forma vaga, e não um desequilíbrio entre oferta e demanda. Quem acompanha a área sabe que há uma crise complexa com vários pontos de estrangulamento. Nos últimos anos o governo fez o que não devia e deixou de fazer o que era recomendável. Isso se acumulou, e agora abrem-se duas frentes de problemas. De um lado, um aumento já contratado da tarifa, que será maior do que o governo tem admitido; de outro, uma instabilidade de fornecimento.

O ministro precisa seguir na linha que inaugurou no ano passado, de alertar que a energia que existe é cara e que o consumidor precisa economizar. Isso é bom para o orçamento das famílias e para a segurança do sistema. Se Eduardo Braga se deixar convencer pela cúpula do setor elétrico, não agirá a tempo. E há pouco tempo para agir.

Há uma sucessão de problemas a resolver. Há o risco de outros apagões. O novo ministro tem que escolher se ficará procurando o "raio de Bauru" da vez ou se admitirá que há um risco de abastecimento causado pelos erros gerenciais no setor e uma forte crise hídrica. Não deve se deixar tranquilizar por aqueles que dizem que amanhã choverá. Este ano está mais seco do que o ano passado, que foi mais seco do que em 2013. Nem deve aceitar que tudo é apenas culpa da chuva que não choveu. Os que vão aconselhá-lo são os mesmos que tomaram decisões que levaram o setor a estar como ele está.

O quadro é este: obras atrasadas na Amazônia, pontos de geração sem linhas de transmissão, parques eólicos mal aproveitados, intervenções indevidas no sistema de preços, geradoras com graves desequilíbrios financeiros e distribuidoras endividadas. Nada disso é culpa do clima. A falta de chuva agravou tudo o que já tinha sido feito errado pelos que garantirão ao ministro que o sistema elétrico é sólido e que cada apagão é apenas um evento fortuito.

Repetir tudo o que era dito no governo passado seria equivalente ao ministro Joaquim Levy entregar as contas públicas para serem geridas por Arno Augustin. O ex-secretário do Tesouro saiu do cargo dizendo que o país era sólido do ponto de vista fiscal. A nova equipe já suspendeu um terço dos gastos discricionários do governo, eliminou subsídios, e acaba de elevar impostos. Mesmo assim, está no meio do caminho do morro que tem que subir até o superávit primário prometido de 1,2% do PIB. Joaquim Levy optou por não repetir a mesma ladainha da equipe anterior. Ele pode não acertar em tudo - há vários pontos discutíveis no seu novo pacote tributário - mas com ele há chance de evitar erros. Eduardo Braga será, de fato, o novo ministro da Energia se não repetir os velhos métodos e escolhas. Do contrário, ficará tudo como está.

Elio Gaspari - ‘Selma’ forçou a mão, sem precisar

• Quem for ver o filme aprenderá a história de um grande momento, mas será picado pelo veneno da mistificação

- O Globo

A partir de sexta-feira o filme “Selma” poderá ser visto no Brasil. Conta a história de um grande momento da história americana: a marcha de negros e brancos liderados por Martin Luther King a partir da cidade de Selma, no coração racista do Sul dos Estados Unidos. No dia 7 de março ela completará 50 anos. De lá para cá, um negro elegeu-se presidente, e a data de nascimento de King tornou-se feriado nacional. Os sapatos que Juanita Williams calçava durante a marcha podem ser vistos no Museu da História Americana, com seus saltos corroídos. É uma história emocionante.

Centenas de negros na cabeceira de uma ponte querendo começar uma marcha até a capital do Alabama pedindo o fim da discriminação racial eram um desafio inaceitável para o poder local. O pau comeu, a televisão mostrou as cenas de violência e, três semanas depois, a passeata chegou ao seu destino. O resto da história está no filme.

“Selma” foi maltratado pela Academia do Oscar, e está debaixo de chumbo pela maneira como retratou o presidente Lyndon Johnson. Para quem participou de marchas contra a Guerra do Vietnã, bem feito. Aquele texano enorme de maus modos, que assumiu depois do assassinato de John Kennedy, não merece sossego. Falso. Johnson destruiu-se pela paranoia que o jogou no Vietnã, uma guerra iniciada por Kennedy, mas foi um grande presidente, sobretudo na questão dos direitos civis.

O filme mostra Johnson querendo evitar a marcha de Selma. Afinal, numa peça de heróis negros, nada melhor que um presidente branco fazendo o papel de vilão. Na vida real deu-se o contrário. Já na noite de 27 de novembro de 1963, quatro dias depois do assassinato de Kennedy, Johnson reuniu seus assessores mais próximos para preparar seu primeiro discurso ao Congresso e levantou o tema dos direitos civis dos negros. Quando lhe disseram que isso significaria um desgaste político, ele respondeu: “Bem, e para que diabos serve a Presidência?” Mestre da costura política, Johnson não quis conter Luther King, aliou-se a ele para prevalecer no Congresso. Sem King e sem Selma, é possível que a aprovação da lei dos direitos civis demorasse algum tempo, mas, sem Johnson na Casa Branca, ela não teria sido aprovada em 1964.

“Selma” não precisava demonizar Johnson. Tudo bem que é um filme, mas a influencia desse meio produz mistificações. Até hoje tem gente que guarda a imagem dos bolcheviques subindo heroicamente as escadarias do Palácio de Inverno de São Petersburgo em 1917. Genial lorota do diretor Sergei Eisenstein no seu filme “Outubro”, de 1927. Ele acaba enganando a memória, pois não há registro do episódio de 1917. O palácio estava desguarnecido e uns poucos bolcheviques entraram por janelas e portas laterais. Nas horas seguintes, quando acharam a adega do czar (uma das melhores do mundo), começou o maior porre da história da cidade. A única barricada da ocasião foi montada dias depois, pelos bolcheviques, para proteger as garrafas que restavam. É possível que tenham morrido mais figurantes durante as filmagens de Eisenstein do que na tomada do palácio. A cena da escadaria é uma alegoria, mas a descaracterização de Johnson em “Selma” é um veneno simplificador para a alma de quem vê o filme.
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Elio Gaspari é jornalista

Um remédio perigoso – Editorial / O Estado de S. Paulo

Com o aumento de impostos começou a parte mais dolorosa do ajuste fiscal. O ideal seria cortar o gasto, mas essa hipótese está descartada. Seria muito difícil, ou mesmo impossível, segundo alguns analistas, arrumar as contas públicas, nesta altura, somente com a redução do dispêndio. O governo pode ter tido bons motivos e razões técnicas ponderáveis para sua decisão, mas uma ressalva é necessária. O aumento efetivo será maior do que pode parecer inicialmente. O assalariado, mais uma vez, terá de suportar uma elevação disfarçada do Imposto de Renda.

A mudança da tabela será insuficiente para compensar a inflação e os ajustes de salários. Muitos trabalhadores terão de pagar mais simplesmente porque conseguiram, em suas negociações, uma compensação para a alta de preços. A presidente Dilma Rousseff decidiu vetar a atualização de 6,5%. A correção defendida pelas autoridades, de 4,5%, será bem inferior à necessária - quase um confisco. Mas isso faz parte, há muito tempo, da política fiscal.

É mais fácil de defender os demais aumentos anunciados pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, mas com algumas condições. Além de buscar maior arrecadação, o governo deve fazer um esforço real e perceptível para conter e racionalizar gastos. Além disso, a elevação de tributos tem de ser provisória. No Brasil, os governos tendem a se acomodar e a tornar permanentes medidas justificáveis apenas como soluções de emergência. O exemplo mais notório é o da malfadada CPMF.

O aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) cobrado sobre empréstimos a pessoas físicas poderá reforçar a arrecadação, mas, ao mesmo tempo, funcionará como desestímulo à procura de crédito. A medida servirá para conter a demanda de consumo, reforçando a política de juros do Banco Central (BC), e para aumentar a arrecadação do Tesouro, porque, apesar do custo maior, parte dos consumidores continuará buscando financiamento.

A elevação da Cide sobre combustíveis deverá pressionar a inflação e, ao mesmo tempo, estimular maior parcimônia nos gastos com transporte pessoal. O aumento do diesel afetará também os custos de produção e de transporte de mercadorias e atingirá, portanto, a oferta de bens e serviços. É uma saída ruim, num país dependente do transporte rodoviário.

Num país com produtividade estagnada e baixo poder de competição, todo aumento de custos é especialmente prejudicial à economia - bem mais do que seria num cenário de muita eficiência produtiva e elevado poder de competição. Além disso, o problema da tributação mal aplicada é agravado, no Brasil, pelo peso do imposto estadual incidente sobre a circulação de combustíveis e de energia elétrica.

O aumento da tributação sobre cosméticos pode parecer pouco danoso, por afetar os preços de uma classe de produtos considerados supérfluos. Talvez se possa consolar o consumidor com esse argumento meio moralista, mas bens e serviços classificados como supérfluos também resultam de atividades produtivas e geradoras de emprego tanto nas fábricas quanto nos serviços de logística e de comercialização. Para o funcionário de uma fábrica de cosméticos, seu emprego e seu salário estão longe de ser dispensáveis ou menos importantes que quaisquer outros. De toda forma, pelo menos para o consumidor, essa elevação de imposto pode ser menos danosa do que outras.

A elevação de tributos sobre importados pode até ser aplaudida por uma parte do público, mas também produz importantes efeitos negativos. Torna mais fácil a majoração de preços e, se mantida por muito tempo, contribui para a acomodação dos setores mais protegidos. Tanto empresários quanto assalariados tendem a apoiar medidas protecionistas e a trabalhar por sua manutenção, pressionando o governo e os políticos capazes de influenciar a formulação da política econômica.

Promover o aumento da eficiência produtiva e favorecer os ganhos de competitividade foram objetivos anunciados pelo ministro Joaquim Levy logo depois de oficializada sua escolha pela presidente Dilma Rousseff. Será difícil de atingir essas metas com o atual sistema tributário. Sua reforma, adiada há muito tempo, é cada vez mais necessária. O quadro ficará bem mais complicado se as novas medidas forem mantidas por inércia ou por pressão e certos setores se incorporarem a um esquema já muito ruim.

Populismo tarifário, obras atrasadas e seca – Editorial / O Globo

• Não se pode atribuir a crise anunciada do setor elétrico apenas à falta de chuvas. Os governos Lula e Dilma plantaram essa crise com extrema competência

Há uma crise anunciada no sistema elétrico brasileiro. Razões climáticas, sem dúvida, estão entre as principais causas, pois a matriz elétrica do país está calcada no aproveitamento de quedas d’água. Se, por um lado, esse aproveitamento fez com que o Brasil seja uma das nações que menos contribuem para o efeito estufa na geração de eletricidade, por outro é um sistema que vem se mostrando mais vulnerável em um quadro climático adverso, com índices pluviométricos muito aquém das médias históricas nas regiões que abrigam as bacias hidrográficas que abastecem os principais reservatórios do Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste.

No entanto, não se pode culpar apenas a má vontade de São Pedro pela crise anunciada. As autoridades ignoraram essa possibilidade ao banir dos investimentos a construção de novas hidrelétricas capazes de armazenar água exatamente para enfrentar anormalidades. A pretexto de evitar a formação de grandes lagos que possam ter impactos sociais e sobre o meio ambiente, a legislação só passou a admitir construção de hidrelétricas a fio d’água, que são aquelas que somente utilizam a vazão natural dos rios. Nos períodos de cheia, podem atingir seu potencial, mas nos meses de pouca chuva chegam até a ser desligadas.

Com isso, a única opção para se “armazenar” energia passou a ser a instalação de usinas térmicas, que utilizam combustíveis fósseis não disponíveis no Brasil. Poluem e geram uma energia cara, mas se tornaram indispensáveis. Mesmo que não funcionem, as usinas térmicas precisam ser remuneradas para serem mantidas como reserva das hidrelétricas.

O governo Lula — com Dilma Rousseff à frente do setor, em Minas e Energia e na Casa Civil — esboçou um modelo tarifário que ignorou esse novo desenho da matriz elétrica. E no seu primeiro mandato, a presidente Dilma deixou o setor em polvorosa ao promover uma demagógica redução de tarifas, a pretexto da renovação de concessões de hidrelétricas ditas amortizadas. O populismo tarifário desfigurou ainda mais um modelo com muitas falhas. Com raras exceções, as empresas do setor elétrico perderam capacidade de investimento, o que se reflete no atraso de obras em curso, que poderiam ser bem úteis hoje, na escassez de energia. O Tesouro precisou injetar dezenas bilhões de reais no setor, ampliando o desequilíbrio das finanças públicas sem que ao menos a questão financeira pudesse ser equacionada.

Diante de uma conjuntura que se aproximava do caos, Dilma felizmente resolveu ouvir seu novo ministério, e a política de populismo tarifário foi abandonada. O preço da eletricidade passará a ter uma relação direta com o aumento dos custos de geração, transmissão e distribuição. O consumidor sentirá no bolso agora o efeito retardado da demagogia político-eleitoral. E, como na crise de 2001-2002, acabará fazendo sua parte, ajustando o gasto da energia com o orçamento doméstico. É o que o próprio governo deveria ter feito, e não fez, deixando a situação chegar onde chegou.

Dias difíceis – Editorial / Folha de S. Paulo

• Semana começa com apagão e aumento de impostos, consequências há muito antecipadas dos erros do primeiro mandato de Dilma

Não foi uma segunda-feira (19) fácil para os brasileiros. Por volta das 15h, um apagão deixou dez Estados e o Distrito Federal sem energia por cerca de 90 minutos. Pouco depois, o governo federal anunciou um pacote de aumento de impostos para recompor o caixa.

São as consequências, há muito antecipadas, dos erros de gestão do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff (PT).

No caso da eletricidade, a mão pesada do Planalto, que tentou forçar artificialmente a queda das tarifas, levou à desorganização do setor e ao colapso dos investimentos.

A estiagem prolongada desde o ano passado só agrava a situação. O apagão até pode ter sido pontual, como alegam as autoridades --pois derivado de um pico momentâneo de consumo ligado ao calor extremo--, mas revela o quanto o sistema opera no limite.

Dado que os reservatórios das hidrelétricas sairão da estação chuvosa ainda mais vazios do que em 2014, há risco real de racionamento nos próximos meses.

A circunstância atenuante, se cabe a expressão, é que o consumo começa a ser contido, tardiamente, com a elevação das tarifas, que já subiram 17% em 2014 e devem ter nova majoração de pelo menos 30% ao longo deste ano.

Se ocorrer de fato um racionamento, ele será menos drástico que o de 2001, mas não menos custoso para famílias e empresas. Não se vislumbra ainda, por outro lado, uma estratégia para superar os problemas atuais de forma definitiva.

É distinto o quadro em relação ao reequilíbrio das contas públicas. A alta do imposto para operações de crédito de pessoas físicas, o aumento no PIS/Cofins para produtos importados e a volta da cobrança da Cide sobre combustíveis, entre outras medidas, elevarão a arrecadação em R$ 20 bilhões.

Considerando todas as iniciativas de elevação tributária, cortes de gastos e redução de subsídios, a nova equipe econômica já entregou uma boa parte do ajuste prometido para 2015, que ampliará o superavit primário (o saldo de receitas e despesas antes do pagamento de juros) para 1,2% do PIB.

Verdade que a consequência imediata de todas essas correções, por necessárias que sejam, é mais inflação e menos crescimento.

Mas, se o ajuste der certo a ponto de restaurar o ânimo empresarial e amainar a desconfiança em relação às contas públicas, será possível vislumbrar um ambiente melhor a partir de 2016.

Faria bem à biografia da presidente da República que ela própria, e não apenas seu ministro da Fazenda, viesse a público para explicar aos brasileiros os motivos da guinada de 180 graus que agora, felizmente, promove na economia.

Crise na produção industrial persiste e é muito abrangente – Editorial / Valor Econômico

O detalhamento dos indicadores desastrosos da produção industrial em novembro não deixa qualquer margem para dúvida: o setor vive uma crise séria e abrangente. São poucos os segmentos que conseguiram escapar do cenário de desaceleração prolongada e que se aprofunda há meses. E o que é ainda pior, é que são poucas as esperanças de que o cenário mude de forma substantiva - para melhor - a curto prazo, diante da necessidade de aperto fiscal encampada pela equipe econômica do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff.

Senão, vejamos: o setor industrial apresentou uma queda de 3,2% na produção nos 11 meses terminados em novembro em relação ao mesmo período do ano anterior. As quatro grandes categorias econômicas estudadas pelo IBGE tiveram retrocesso, assim como 19 dos 26 ramos, 61 dos 79 grupos e 63,7% dos 805 produtos pesquisados. Em vários setores, a queda superou 10% - veículos automotores, reboques e carrocerias (-17,3%) e produtos de metal (-11,1%).

Em novembro, especificamente a produção industrial mostrou queda de 0,7% em relação a outubro. No confronto com novembro de 2013, o conjunto da indústria apontou redução de 5,8%. Foi a nona taxa negativa consecutiva nesse tipo de comparação e a mais intensa desde junho, quando o IBGE havia registrado um recuo de 6,9%. Assim, o setor industrial acumulou queda de 3,2% nos 11 meses do ano.

Esses dados foram analisados por especialistas de forma simples. Novembro foi a continuação de uma tendência que predominou de forma ampla no ano passado. "O resultado de novembro foi fraco e decepcionante, mas não é muito diferente do quadro geral que vimos ao longo de 2014", disse ao Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, Rodrigo Nishida, da LCA Consultores. "A indústria está fragilizada há anos e não há alguns meses. Desde 2011 vem registrando quedas", afirmou Fernanda Consorte, do Santander. "Isso em um cenário já desfavorável. Há aumento de juros, aperto monetário e agora teremos também contração fiscal. Ao longo de 2015 inteiro teremos resultados ruins."

Para dezembro, as projeções dos analistas indicam crescimento da produção pouco acima de zero. No ano, teria havido queda da ordem de 3%. Ou seja, de novo, a indústria vai ter um desempenho bem pior do que a economia de forma geral já que há um certo consenso entre governo e mercado financeiro de que o ano passado não fechou com queda no Produto Interno Bruto (PIB). As últimas pesquisas do boletim Focus (em que o Banco Central recolhe as opiniões de especialistas) indicam que as previsões são de que a economia brasileira cresceu algo como 0,14% ou 0,15% no ano passado. Isso significa, portanto, que a participação da indústria na composição do PIB vai perder importância mais uma vez abrindo mais espaço para o predomínio do setor de serviços.

Para alguns analistas, este início de ano poderá não ser tão ruim quanto o último trimestre de 2014 porque existem indicações de que o setor industrial ajustou seus estoques em dezembro. Entre novembro e dezembro, segundo a Sondagem da FGV, a diferença entre estoques excessivos e suficientes caiu de 13% para 10%, e em nove setores houve queda no indicador de mercadoria parada.

Se isso se confirmar, seria um bom sinal de que o setor privado está tentando se adequar a um cenário de menor demanda interna já que esperar medidas salvadoras do governo não teria sentido no segundo governo Dilma. Ficaram para trás, aparentemente, decisões como desonerações tributárias para segmentos industriais já que o momento agora é de ajuste das contas públicas.

E essa é uma prioridade do governo e não apenas da equipe econômica liderada por Joaquim Levy, da Fazenda. Em entrevista a Sergio Leo, colunista do Valor, ficou claro que o novo ministro do Desenvolvimento, Armando Monteiro Neto, está consciente de que há restrições orçamentárias sérias e ajustes a serem feitos. Mas vê espaço para um consistente programa de apoio às exportações, que pretende esboçar até fevereiro, quando o levará para debate com representantes do setor privado, e em seguida, em consulta aos outros membros do governo. "Só a exportação representa a perspectiva de animação da atividade econômica em um ano de baixo crescimento interno", defende.

Manobra contra PMDB degrada quadro partidário – Editorial / O Globo

• Governo trata de estimular a criação de mais partidos — como se já não bastassem 30 — para atrair oposicionistas e, em especial, peemedebistas

Abaixo da superfície do discurso a favor de uma reforma política alegadamente moralizadora, transcorre, no subsolo do campo político do governo, uma dessas manobras cujo desfecho resulta no oposto — em maior pulverização partidária e mais combustível para o fisiologismo.

À frente da operação está um especialista em prestidigitação, o ex-prefeito paulistano Gilberto Kassab, aquele que não se coloca no centro, nem na direita nem na esquerda, responsável pela ressurreição da sigla PSD — nenhuma semelhança com aquela fundada por Vargas para abrigar os getulistas conservadores —, partido feito sob medida para apoiar o governo petista de Dilma.

Atingido o objetivo, o ágil e também metamorfósico Kassab foi premiado, no segundo governo Dilma, com o Ministério das Cidades, estratégico para quem se dispõe a trocar verbas por votos. E já se lança em nova missão, também para ajudar o Planalto.

Kassab aplica seus conhecimentos no ramo para criar mais uma legenda, outra exumação, o PL, Partido Liberal, sigla que já teve como um dos principais nomes o falecido Álvaro Vale, do Rio de Janeiro. A manobra ocorre em paralelo a uma outra, idêntica, deflagrada pelo PR do senador Alfredo Nascimento (AM), defenestrado do Ministério dos Transportes quando a palavra de ordem no Planalto era “faxina ética”. Nascimento trabalha para fundar o Muda Brasil, seja lá o que isso signifique.

O objetivo de ambos, com a criação de dois “novos” partidos, é, aproveitando uma falha da legislação supostamente anti-infidelidade partidária, fundar legendas para atrair oposicionistas que desejam bandear-se para o bloco de apoio ao governo. Há sempre alguém, eleito pela oposição, que não consegue sobreviver fora do regaço do poder. O próprio PSD já cumpriu esta função. Como a legislação permite sair de partido para uma legenda nova, criaram-se as condições para esta farra. O objetivo principal, porém, é reduzir o peso do PMDB, o qual, com todas as mazelas, é barreira contra aventuras petistas no Congresso.

Ao estimular Kassab e o PR, o Planalto ajuda a ampliar a já excessiva pulverização partidária. Hoje, há 30 legendas reconhecidas pela Justiça eleitoral, das quais 28 têm representação no Congresso. Não espanta que haja negociatas nada republicanas de troca de apoio parlamentar por acesso a dinheiro público, e funcione um balcão de venda de tempo no programa eleitoral dito gratuito. O absurdo só faz aumentar, porque há mais legendas na linha de montagem. Entre elas, o Partido Piratas do Brasil (Piratas).

Não se deve parar de insistir: o caminho é o inverso, ou seja, a criação de cláusula de desempenho e o fim da coligação em eleições proporcionais, para que só tenha representação no Congresso e demais prerrogativas legenda que atraia votos, e só se eleja político com apoio efetivo.

Beth Carvalho - O Mundo é um moinho & As rosas não falam (Cartola)

Fernando Pessoa - Tenho tanto sentimento

Tenho tanto sentimento
Que é freqüente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.
Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.
Qual porém é a verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar.

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Opinião do dia – Luiz Sérgio Henriques

O bloco no poder tem lá sua parcela bem maior de responsabilidades pelo terceiro turno permanente que possivelmente viveremos ou já estamos a viver. É, no mínimo, duvidoso que o partido hegemônico - e valha aqui o sentido negativo do termo "hegemonia" - tenha conduzido uma campanha classista, a não ser que tenhamos rebaixado o conceito de classe ou aceitado a redução da ideia de esquerda ao velho receituário do nacional-estatismo. Uma classe ou conjunto de classes que se afirma politicamente e oferece soluções para os problemas de todos, para o conjunto da população, é algo muito diverso de um conflito publicitariamente encenado entre "ricos" e "pobres", entre "corações valentes" e "filhotes da ditadura" ou do "capital financeiro" - o que, a bem da verdade mais acaciana, Aécio Neves, Marina Silva e o falecido Eduardo Campos nem remotamente são.
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Luiz Sérgio Henriques, tradutor e ensaísta, é um dos organizadores das 'Obras' de Gramsci no Brasil. ‘O terceiro turno’. O Estado de S. Paulo, 18 de janeiro de 2015.

Governo aumenta imposto sobre gasolina

• Ministro Joaquim Levy anuncia quatro medidas que podem elevar arrecadação em R$ 20 bilhões em 2015; pacote inclui retorno de taxa sobre os combustíveis, imposto para importado e IOF maior

João Villaverde - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O governo Dilma Rousseff anunciou nesta segunda-feira, 19, um grande pacote de aumento de impostos ao consumidor e às empresas dos setores de combustíveis, cosméticos e importadoras para elevar a arrecadação em R$ 20,6 bilhões, recuperar a confiança na economia e fechar suas contas este ano.

Uma das medidas é a volta da Cide, taxa sobre os combustíveis. O governo elevará tributos sobre a comercialização de gasolina e óleo diesel nos postos de combustíveis do País.

O governo também decidiu dobrar a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), de 1,5% para 3%, que incide sobre os empréstimos bancários contratados pelas pessoas físicas. A medida entra em vigor nesta terça-feira.

O aperto tributário do governo foi anunciado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, no início da noite. Depois de rejeitar, na semana passada, que um “saco de maldades” estivesse a caminho, Levy anunciou o aumento de tributos com um duplo objetivo: ampliar a arrecadação federal, de forma a equilibrar as combalidas contas públicas, e reduzir o ímpeto dos consumidores, para controlar a inflação, que neste ano pode se aproximar de 7%.

A decisão de frear o consumo doméstico em uma conjuntura onde o Produto Interno Bruto (PIB) beira uma recessão é delicada. Mas foi bancada pelo Planalto. Para completar a série de medidas impopulares, está semana o Banco Central deve aumentar a taxa básica de juros em 0,5 ponto porcentual, levando a Selic a 12,25% ao ano.

“São medidas para trazer o reequilíbrio fiscal, com objetivo de aumentar a confiança na economia brasileira, de forma a termos a retomada. Queremos isso com o menor sacrifício possível”, afirmou Levy. Ele disse também que a proposta da Fazenda para a correção da tabela de Imposto de Renda da Pessoa Física este ano é de 4,5%, mas não deixou claro se a presidente Dilma Rousseff vai vetar a proposta aprovada no Congresso, de 6,5%.

Gasolina. Sobre combustíveis, o governo vai reinstituir a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide). A taxa estava zerada há quase três anos e, dentro de três meses, voltará efetivamente. Serão R$ 0,22 sobre o preço da gasolina e R$ 0,15 sobre o diesel. A medida renderá arrecadação de R$ 3,6 bilhões este ano, segundo informou o Estado. Além disso, o governo também elevará as alíquotas do PIS/Cofins sobre o setor.

Questionado se esse aumento, que vale para as refinarias, chegará às bombas, Levy tergiversou: “Isso vai depender da Petrobrás. Essa não é uma decisão do Ministério da Fazenda”. Por volta de 22h30, a Petrobrás anunciou que o aumento de impostos será repassado para os preços da gasolina e do diesel ao consumidor, "ficando o preço líquido para a Petrobrás inalterado", afirma a empresa em nota.

O governo anunciou também o aumento de impostos para produtos importados e a comercialização de cosméticos. Os importadores terão de pagar, a partir de junho, alíquota de 11,75% de PIS/Cofins. Até maio, a alíquota permanecerá em 9,25%. “Ajustamos a alíquota para não prejudicar a produção doméstica”, disse Levy.

Para o setor de cosméticos, o governo vai equiparar o atacadista ao produtor, ao introduzir o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) no atacado. “Agora o atacadista, ao adquirir o cosmético da indústria, vai ser creditado do IPI e ao passar a frente, vendendo ao varejista, ele vai ser debitado”, explicou o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid.

O governo está diante de missão complexa. Depois de descumprir por três anos sua meta fiscal, entende ser crucial este ano poupar R$ 66,3 bilhões, o equivalente a 1,2% do PIB, para o pagamento dos juros da dívida pública. Com o PIB próximo a zero, o governo precisou buscar mais receitas.
Uma frase de Levy exemplifica o estado de espírito do governo. Quando questionado sobre a razão para o aumento do IOF, respondeu: “O objetivo é aumentar a confiança na economia.” /

Colaboraram Adriana Fernandes, Renata Veríssimo, Nivaldo Souza e Victor Martins

Falhas no sistema e consumo podem causar novos apagões

Verão de apagões

• Falha de transmissão e pico de consumo deixam 11 estados e DF sem luz. Previsão é de mais cortes

- O Globo

Sem energia

RIO, SÃO PAULO e BRASÍLIA - Um apagão no início da tarde de ontem atingiu 11 estados e o Distrito Federal (DF), prejudicando mais de 4,2 milhões de consumidores. O total de pessoas atingidas deve ser ainda maior, pois as distribuidoras de Minas Gerais, Goiás, Espírito Santo e parte do interior de São Paulo não informaram o número de afetados. Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), a interrupção de energia - que, segundo relatos, durou de 30 minutos a duas horas, conforme a localidade - afetou as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. O estado de Rondônia também foi atingido. De acordo com o ONS, a falta de energia ocorreu em razão do recorde de consumo no horário de pico, por volta das 14h, e problemas na transferência de energia das regiões Norte e Nordeste ao Sudeste. Analistas disseram, porém, que o "corte seletivo" de luz, que já era esperado devido ao forte calor nos principais mercados consumidores e à falta de chuvas, voltará a ocorrer durante todo o verão.

Durante a campanha eleitoral, a presidente Dilma Rousseff havia afirmado que o país não teria mais apagões por causa dos investimentos em geração e transmissão de energia. Na semana passada, o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, porém, afirmara que os brasileiros deveriam reduzir o consumo de energia. Ontem, atribuiu a falta de luz a uma falha na linha de transmissão:

- O pico de consumo houve. No entanto, se não tivesse havido esse problema técnico, não teríamos tido (apagão). Esse pico de consumo aconteceu na semana passada todos os dias e não tivemos nenhum problema, porque a linha Norte-Sul não tinha apresentado nenhuma (restrição).

Para o ministro, somente após a reunião marcada para hoje pelo ONS será possível explicar o que causou a variação de frequência de energia.

O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves, disse, em nota, que faltou responsabilidade à Dilma na campanha e que a população pagará pelos erros do PT. O partido Democratas pedirá no Congresso a convocação de Braga para dar explicações em fevereiro.

Angra 1 e mais dez usinas foram desligadas
Em nota, o ONS destacou que, em razão do aumento do consumo e da oferta restrita de energia, onze usinas no país foram desligadas automaticamente por segurança, o que significa um corte de 2.200 megawatts (MW) - 5% da carga do sistema nacional. Mas, segundo fontes do governo, a interrupção teria chegado, no total, a cerca de 4 mil MW. Na lista, está a usina nuclear Angra 1, no Rio de Janeiro. O ONS afirma que o corte ocorreu entre as 14h55 e as 15h45, apesar dos relatos de um prazo mais longo de falta de energia. O último recorde de consumo de energia, no horário de pico, nas regiões Sudeste e Centro-Oeste ocorreu no dia 13, de 51.295 MW médios. No dia seguinte, foi a vez do Nordeste, também no horário de pico, de 11.999 MW médios.

O problema ocorre em meio à falta de chuvas no país e ao nível crítico dos reservatórios das usinas hidrelétricas. No dia 18, último dado disponível pelo ONS, as usinas das regiões Sudeste/Centro-Oeste estavam em 18,27% de sua capacidade. No Nordeste, o índice é de 17,57%, e de 35% na Região Norte. Segundo analistas, trata-se do menor nível da História, exceto na Região Sul (68,96%).

- Se o calor continuar nessa magnitude, os cortes seletivos vão durar o verão inteiro. As chuvas em janeiro estão em 45% da média histórica - disse Mikio Kawai, diretor executivo da Safira Energia.

No Estado do Rio, 580 mil ficaram sem luz
Analistas mencionam o atraso nas obras de expansão da rede de geração e transmissão de energia como um dos fatores que diminuem a confiabilidade do sistema interligado nacional, especialmente num momento de escassez de água nos reservatórios de hidrelétricas. Algumas das principais usinas em construção, como Jirau, no Rio Madeira, e Belo Monte, no Rio Xingu, estão com os cronogramas atrasados. A demora na construção de linhas de transmissão também manterá fora do sistema, em parte deste ano, usinas de geração eólica e a hidrelétrica de Teles Pires, entre o Mato Grosso e o Pará.

Relatório da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) indica atraso em 59% dos 388 projetos de linhas de transmissão.

Para a consultora de energia Elena Landau, advogada do escritório Sérgio Bermudes, além de não trazer estímulos à economia, o corte seletivo de energia não promove o consumo consciente:

- O corte seletivo de energia é a pior política que existe. O corte já era esperado, com a queda no nível dos reservatórios e o consumo crescendo mais que a oferta. É mais uma demonstração da falta de transparência do governo. Tinha de ser feita uma política de racionalização de energia, com campanha de eficiência energética e de esclarecimento.

Os cortes afetaram, além de DF, Rio, São Paulo, Espírito Santo, Minas Gerais, Goiás, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Rondônia. No Estado do Rio, 580 mil clientes, cerca de 6,4% dos consumidores, ficaram sem luz. Desse total, 400 mil são da área de atendimento da Light e 180 mil, da Ampla.

No estado de São Paulo, ao menos 2,45 milhões de consumidores ficaram sem luz. Na capital paulista, os passageiros do metrô foram surpreendidos por um corte de energia e pela paralisação parcial da Linha 4, que circula entre a Luz (Centro) e o Butantã (Zona Oeste). Os usuários tiveram de acionar botões de emergência para abrir as portas dos vagões e caminharam pelos trilhos e passarelas para retornar às plataformas. As estações Luz e República, duas das mais movimentadas, chegaram a ficar fechadas ao público. Rafhaela Martins, de 18 anos, era uma das que estavam no metrô durante a queda da energia:

- Ficamos entre 20 e 30 minutos dentro do vagão lotado, sem ar-condicionado. Saímos guiados pelos guardas do metrô, andando pelos trilhos, e demoramos cinco minutos para chegar à estação.

A concessionária Via Quatro informou que a saída pelos trilhos ocorreu de forma segura. Mesmo assim, algumas pessoas passaram mal com a situação, agravada pelo calor excessivo. A falha no sistema de alimentação elétrica foi detectada às 14h35 e corrigida às 16h29. A AES Eletropaulo, que atende 20,1 milhões na capital e Grande São Paulo, atribuiu o problema à determinação do ONS de reduzir a distribuição em 700 megawatts. O montante representa 10% do que a empresa distribui.

João Carlos Mello, presidente da Thymos Energia, diz que é necessário planejar no longo prazo para atender à alta do consumo e à redução das chuvas:

- Só vejo duas soluções: ou ocorre um milagre e temos um dilúvio bíblico ou o governo terá que fazer campanha para reduzir o consumo.

Apagão atinge 10 Estados e DF

• Operador desliga sistema para evitar problema maior; em SP, passageiros ficam presos no metrô

Uma combinação de alto consumo por causa do calor e uma falha no sistema de transmissão de energia provocou um apagão em ao menos dez Estados e no Distrito Federal por volta das 15h desta segunda (19). Os cortes duraram em média uma hora e meia.

Com a demanda sobrecarregada por causa das altas temperaturas, o sistema teve de ser desligado pelo ONS (operador do sistema) para evitar o risco de um blecaute de maiores proporções. Especialistas veem risco de novas interrupções no curto prazo.
Em SP, passageiros que estavam no Metrô chegaram a ficar 50 minutos presos em um trem com o ar-condicionado desligado. Alguns desceram do vagão e caminharam pelos túneis ente as estações.

Falha e pico de consumo causaram corte

• Sem queima de capacitor em linha de transmissão, demanda de energia não levaria ao problema, afirma ministro

• Operador não informa claramente as razões nem sabe informar se já ocorreu desligamento semelhante no país

Lucas Vettorazzo – Folha de S. Paulo

RIO - Uma falha no sistema de transmissão de energia elétrica e o alto consumo no início da tarde em razão do calor causaram o apagão que atingiu ao menos dez Estados e o Distrito Federal na tarde desta segunda-feira (19).

Por volta das 15h, várias cidades do país tiveram cortes seletivos de luz. que duraram em média uma hora e meia. Foram atingidos os Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina, além do Distrito Federal.

Segundo a Folha apurou, a falha no sistema ocorreu pelo elevado nível de consumo devido ao calor intenso. A demanda teria sobrecarregado o sistema, que teve de ser desligado para evitar o risco de um apagão de maiores proporções e com mais dificuldades para o religamento.

Quase quatro horas depois dos cortes no fornecimento, o ONS soltou uma nota sucinta que não esclareceu completamente o que ocorreu.

Informou que "restrições na transferência de energia das regiões Norte e Nordeste para o Sudeste, aliadas à elevação da demanda no horário de pico, provocaram a queda da frequência elétrica" do sistema, causando o desligamento automático de 11 usinas geradoras de energia no país, que produzem um total de 2.200 MW (megawatts).

A maior das unidades desligadas foi a usina nuclear de Angra 1, com 640 MW de capacidade, e que até a conclusão desta edição não havia sido religada.

O ONS informou que, "visando restabelecer a frequência elétrica às suas condições normais", atuou em conjunto com as distribuidoras das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, "impactando menos de 5% da carga do sistema".

Ministro
O ministro Eduardo Braga (Minas e Energia) afirmou que houve queima de um capacitor na linha de transmissão Norte-Sul, de Furnas.

Isso ocorreu em momento de pico de consumo no Sudeste. Ao mesmo tempo, houve alteração de frequência na rede da região, por motivo ainda incerto.

Braga disse que o problema não ocorreu devido à demanda dos usuários.

"O pico de consumo houve; no entanto, se não tivesse havido esse problema técnico, não teria tido [o apagão]. Esse pico de consumo aconteceu na semana passada todos os dias e não tivemos problemas."

O ONS informou que a determinação para que haja cortes no fornecimento de energia "eventualmente acontece", mas o órgão não soube informar se já ocorreu um desligamento como o de ontem.

Especialistas no setor afirmam que, quando o sistema está no limite, como é o caso, falhas ocorrem com maior frequência e descontrole.

"Não foi coincidência que isso não ocorreu às 3h da madrugada, quando o sistema está mais aliviado, e, sim, às 15h, durante o pico de calor", afirma Cristopher Vlavianos, presidente da comercializadora Comerc.

Segundo o empresário, restrições de linha podem acontecer por estresse do sistema. "A verdade é que, se houvesse a falha numa situação de nível de reservatórios normais, o resultado seria totalmente diferente", diz.

Atingidos
Pelo menos 2,8 milhões de clientes foram atingidos pelo apagão em todo o país.

Na Eletropaulo, que fornece para a capital paulista e chegou a cortar 700 MW de sua energia distribuída, 854 mil unidades consumidoras foram atingidas, ou 2 milhões de pessoas.

A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) considera que 1 MW é suficiente para abastecer uma residência durante um mês.

Na Light, que distribui para a capital do Rio, o corte foi de 500 MW, enquanto na Ampla, que atende a região metropolitana fluminense, foi de 100 MW, com 180 mil clientes de 13 cidades atingidos.

O forte calor que atinge principalmente a região sudeste tem feito, desde o verão passado, com que o pico de consumo de energia no país seja registrado no meio da tarde, entre as 14h30 e as 15h30, e não mais à noite.

As altas temperaturas e o comércio a todo vapor têm feito disparar o uso do ar-condicionado nas cidades brasileiras.

Colaboraram Brasília e Joana Cunha, de São Paulo

Oposição critica 'aparelhamento' do setor

- Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A oposição cobrou nesta segunda-feira (19) explicações do governo Dilma Rousseff sobre o apagão que provocou a queda da energia elétrica em dez Estados e no Distrito Federal.

Para congressistas oposicionistas, o setor enfrenta problemas devido ao aparelhamento político promovido pelo governo.

A interrupção no fornecimento de energia atingiu São Paulo, Rio de Janeiro, Minas, Rio Grande do Sul, Paraná, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina e Distrito Federal.

Quando o Congresso retomar suas atividades, em fevereiro, o DEM promete apresentar um pedido de convocação para que o ministro Eduardo Braga (Minas e Energia) apresente esclarecimentos aos parlamentares sobre o episódio.

O partido também vai apresentar convites ao diretor-geral da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), Romeu Rufino, e ao diretor-geral do ONS (Operador Nacional do Sistema), Hermes Chipp.

"Precisamos cobrar providências imediatas para reparar os efeitos que a desestruturação, o desmonte e aparelhamento político no setor elétrico têm produzido. Com apenas 19 dias do segundo governo Dilma já sofremos o primeiro apagão. Precisamos de explicações mais claras do que apenas alegar "razões operacionais", como fez o ONS", afirmou o líder do DEM na Câmara dos Deputados, Mendonça Filho (PE).

Para o senador eleito Ronaldo Caiado (DEM-GO), o setor vive um caos devido a "opção desastrada da presidente Dilma em provocar uma redução artificial na tarifa de energia em 2013".

"O setor energético não aguentou a barbeiragem de Dilma. Agora ela tem o dever de vir a público fazer o mesmo e esclarecer a real situação do setor energético", disse Caiado.

Oposição ataca 'incompetência' do governo

• Parlamentares dizem que vão convocar o ministro de Minas e Energia ao Congresso para explicar apagão da tarde de ontem

Daniel Carvalho, Isadora Peron - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A oposição ao governo na Câmara e no Senado criticou a presidente Dilma Rousseff, lembrando que ela já foi ministra de Minas e Energia, e afirmou que, assim que o Congresso retomar os trabalhos, em fevereiro, vai pedir a convocação do atual titular da pasta, Eduardo Braga, para explicar às duas Casas o apagão que atingiu na tarde de ontem dez Estados e o Distrito Federal.

O senador Aécio Neves (PSDB-MG), derrotado por Dilma nas eleições, aproveitou o apagão para criticar outros aspectos do governo. Em uma nota intitulada "Onde está a presidente", o tucano afirmou que faltou "responsabilidade" à petista durante a campanha e agora lhe falta "coragem" para admitir os erros.

"O Brasil está assustado com o tamanho da herança maldita que o primeiro governo Dilma deixou para o País. Apagão, racionamento de energia, aumento de impostos, cortes de direitos trabalhistas já preocupam e demonstram como milhões de brasileiros foram enganados durante a campanha eleitoral", afirmou o senador.

Além de questionar o apagão que atingiu São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e o DF, os congressistas querem discutir o aumento de tarifas.

"O sistema elétrico do Brasil não aguenta nem sequer uma onda do calor", disse o líder do DEM, senador José Agripino Maia (DEM-RN). O democrata afirmou que faltou planejamento de longo prazo e comparou o apagão de ontem a um "fusível" que queima e acende um alerta de que problemas maiores ainda estão por vir.

"O governo está com 19 dias do segundo mandato da Dilma e logo tem como grande fato o primeiro grande apagão de proporções nacionais. Mostra a desarrumação, a desestruturação do setor energético brasileiro por conta do populismo, do aparelhamento do sistema e da incompetência", disse o líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho, que está no Recife, onde não houve apagão.

Para o senador eleito Ronaldo Caiado (DEM-GO), "o caos no sistema elétrico tem origem na opção desastrada da presidente Dilma em provocar uma redução artificial na tarifa de energia em 2013 e ela agora deve repetir o mesmo procedimento adotado à época, quando convocou um pronunciamento oficial para defender o reajuste".

Em nota, Caiado disse que Dilma cometeu uma "barbeiragem" há cerca de dois anos e cobrou que a presidente venha a público para esclarecer a "a real situação do setor energético".
Seca. A base aliada do governo procurou atribuir o corte de fornecimento às consequências da seca no País. "É uma estiagem um pouco prolongada. Os reservatórios estão muito abaixo dos níveis normais", afirmou o senador Valdir Raupp (PMDB-RO).

Dilma veta correção da tabela do Imposto de Renda em 6,5%

• Com isso, persiste o descompasso entre a correção da alíquota de cobrança do imposto e o ritmo de avanço da inflação

- O Estado de S. Paulo

A presidente Dilma Rousseff vetou nesta terça-feira, 20, a correção de 6,5% no Imposto de Renda para pessoas físicas, aprovada no fim do ano passado pelo Congresso Nacional. A decisão consta na sanção da Lei 13.097, com vários vetos. A lei é resultado da aprovação da Medida Provisória 656..

"A proposta levaria à renúncia fiscal na ordem de R$ 7 bilhões, sem vir acompanhada da devida estimativa do impacto orçamentário-financeiro, violando o disposto no art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal", justifica o despacho.

O Planalto deverá editar nova Medida Provisória sobre o tema. Ontem, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirmou que a proposta da Fazenda é de que a correção da tabela do IRPF seja de 4,5% este ano.

O reajuste de 6,5% no IR contrariava os interesses do governo. O descompasso entre o reajuste do IR e o avanço da inflação, que fechou 2014 em 6,41%, coloca pessoas com salários cada vez menores na base de contribuição.

Cálculos do Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional) mostra que o imposto acumula uma defasagem de 64,28% desde 1996, ano em que a tabela foi convertida de unidades fiscais para o real.

O estudo dos auditores fiscais mostra que a defasagem crescente pune, sobretudo, os contribuintes de mais baixa renda. Quem ganha até R$ 2.936,94 por mês deveria ser isento de IR, de acordo com os cálculos, mas acaba sendo tributado atualmente pela alíquota de 7,5%.

Governo eleva impostos, e gasolina vai subir

Governo aumenta imposto de combustíveis, e gasolina sobe

• Tributo sobre crédito dobra. Impacto na arrecadação será de r$ 20,6 bilhões

Cristiane Bonfanti, Danilo Fariello, Cássia Almeida, Clarice Spitz, Ramona Ordoñez e Bruno Rosa – O Globo

BRASÍLIA e RIO - Em mais uma etapa do ajuste fiscal prometido para equilibrar as contas públicas, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, anunciou ontem um pacote de aumento de impostos que deve elevar em R$ 20,63 bilhões a arrecadação do governo este ano. As medidas incluem a alta da alíquota do PIS/Cofins e o retorno da cobrança da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), que estava zerada desde 2012, sobre os combustíveis. A partir de 1º de fevereiro, haverá aumento, na refinaria, de R$ 0,22 para o litro da gasolina e de R$ 0,15 para o do diesel, somando PIS/Cofins e Cide. A Petrobras anunciou, em fato relevante para a Comissão de Valores Imobiliárias (CVM), que vai repassar a nova tributação para os preços, e a gasolina e o diesel vão aumentar na refinaria. Estima-se que o reajuste fique entre 5% e 7% nas bombas, com impacto na inflação.

Levy também anunciou o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) incidente sobre todas as operações de crédito para o consumidor. A alíquota vai dobrar: de 1,5% para 3% ao ano. A alíquota de 0,38% que incide na abertura das operações de crédito continuará sendo cobrada.

Especialistas em contas públicas consideram o ajuste forte. Os R$ 20,6 bilhões representam 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil e quase um terço do esforço fiscal fixado pelo governo para este ano de 1,2% do PIB.

- É bastante, esperava um pouco menos. O negócio é para valer mesmo. É um aumento de impostos sobre o consumo, penaliza o consumo. Vai gerar alguma pressão inflacionária e a carga tributária vai crescer novamente. Mas o ajuste se tornou imperativo - afirmou o economista Raul Velloso.

O Ministério da Fazenda elevou, ainda, a alíquota do PIS/Cofins sobre a importação, de 9,25% para 11,75%. Segundo o governo, a medida proporciona isonomia na tributação sobre a produção doméstica e a estrangeira, uma vez que o ICMS está na base de cálculo do PIS/Cofins apenas sobre a produção nacional. Também igualou alíquota na cadeia de cosméticos de atacadista e industrial.

Levy não quis fazer qualquer projeção sobre o impacto do aumento do imposto na gasolina

- Não tenho envolvimento com a política de preços da Petrobras. O preço da gasolina não sei como vai evoluir. Não me compete decidir. Não é uma decisão minha, do Ministério da Fazenda. Eu acho que é da empresa.

A declaração do ministro foi dada horas antes de a Petrobras informar à CVM que repassará o aumento: "Petrobras informa que em decorrência da decisão do Governo Federal de elevação de tributos sobre a gasolina e diesel, os preços desses derivados nas refinarias serão acrescidos dos valores de PIS/Cofins e CIDE, ficando o preço líquido para a Petrobras inalterado."

Imposto novo na gasolina vale em fevereiro
A nova tributação dos combustíveis começa a valer em fevereiro. O aumento de PIS/Cofins sobre importação e de IOF sobre crédito para pessoa física vale a partir de hoje. Já a alta do IPI sobre o setor de cosméticos entrará em vigor em 90 dias. Com o aumento, o governo prevê um estímulo maior aos biocombustíveis, que vinham pleiteando as medidas.

O pacote anunciado ontem integra a estratégia da equipe econômica de elevar a arrecadação para atingir a meta de superávit primário - a economia para o pagamento de juros da dívida pública - de R$ 66,32 bilhões ou 1,2% do PIB no fechamento deste ano.

Na semana passada, o GLOBO mostrou que, com apenas 15 dias no cargo, a nova equipe econômica já contava com medidas que correspondiam a R$ 30,8 bilhões, o equivalente a 46% do esforço fiscal prometido para 2015. Com as medidas de ontem, esse valor subiu para R$ 51,4 bilhões.

- O principal efeito do conjunto dessas medidas - é difícil ver o efeito de uma medida individualmente - é aumentar a confiança, a disposição das pessoas de investir no Brasil, de tomar riscos, fazer o empresário começar a pensar novas coisas - disse Levy.

A economista e professora do Coppead/UFRJ Margarida Gutierrez, disse que as medidas são impopulares, mas necessárias para tentar equacionar "a bagunça fiscal".

- Fica mais factível chegar à meta de superávit fiscal, embora ainda não seja possível garantir a manutenção do grau de investimento. Por trás do IOF, acredito que houve um aumento forte também para tentar conter a demanda por conta da inflação - afirma.

Dobrar a alíquota de IOF pode facilitar o trabalho do Banco Central ao calibrar os juros. O crédito já ficou mais caro, sem mexer na taxa Selic, que será definida amanhã.

Segundo Velloso, mesmo representando quase um terço do esforço fiscal decidido para este ano, as medidas são necessárias para evitar que o Brasil perca o grau de investimento e haja uma fuga de capitais.

Gabrielli diz ao TCU que Dilma tem de ser responsabilizada por perdas de Pasadena

• Em defesa enviada em dezembro ao tribunal, ex-presidente da Petrobrás afirma que Conselho de Administração da estatal à época da compra de refinaria dos EUA deveria ter o mesmo tratamento de Diretoria Executiva: todos têm de ter bens bloqueados

Ricardo Galhardo - O Estado de S. Paulo

SALVADOR - Em defesa apresentada ao Tribunal de Contas da União, o ex-presidente da Petrobrás José Sergio Gabrielli pede para ser excluído, junto com outros dez ex-integrantes da Diretoria Executiva da estatal, do processo que determinou que o bloqueio de bens dos executivos responsáveis pela compra da refinaria de Pasadena, nos EUA. Caso o pedido não seja aceito, solicita que o Conselho de Administração que autorizou o negócio em 2006 seja responsabilizado pelo prejuízo da compra e tenha o mesmo tratamento dos ex-diretores: todos precisam ser ouvidos no processo e ter o patrimônio congelado.

Dilma Rousseff era presidente do Conselho de Administração da estatal à época. O argumento da hoje presidente da República para ter aprovado o negócio é que o conselho se baseou em um resumo técnico “falho” e “incompleto” a respeito do negócio.

Em decisão preliminar de julho do ano passado, o tribunal isentou o Conselho de Administração. Na segunda, em resposta ao Estado, o TCU não descartou a possibilidade de arrolar Dilma e os demais ex-conselheiros no processo sobre a compra da refinaria (mais informações abaixo).
Segundo concluiu o tribunal, o prejuízo da Petrobrás com o negócio foi de US$ 792 milhões.
A defesa de Gabrielli argumenta que o Conselho de Administração teve tanta ou mais responsabilidade do que a Diretoria Executiva na compra da refinaria.

Justificativa. No texto de 64 páginas, entregue no dia 5 de dezembro, Gabrielli diz que não se sustenta a justificativa de Dilma de que o relatório de Néstor Cerveró – então diretor de Internacional – era falho por omitir que o contrato tinha as cláusulas Marlim (que garantia rentabilidade mínima de 6,9% à Astra Oil, parceira da Petrobrás na refinaria) e Put Option (que obrigava a Petrobrás a comprar a parte da sócia se houvesse divergência de gestão).

De acordo com a defesa de Gabrielli, o Conselho tinha “obrigação de fazer uma avaliação criteriosa” de todos elementos do contrato antes de autorizar a compra, e contava com “os mesmos elementos fornecidos pelas mesmas pessoas” com os quais a Diretoria tomou a decisão.

Diferença. Conforme o documento assinado pelo advogado Antonio Perilo Teixeira, ao contrário de outras empresas nas quais as funções dos conselhos se limitam a planejamento e estratégia, o estatuto da Petrobrás confere ao Conselho de Administração poderes executivos. “Esse fato é demonstrado na própria aquisição de Pasadena, tendo visto que a Diretoria havia aprovado sugestão de Cerveró de adquirir a segunda metade da Astra mas essa posição foi rejeitada pelo Conselho”, diz o texto.

É com base no estatuto que Gabrielli pede que os integrantes do Conselho também sejam responsabilizados. “Caso este tribunal entenda que não é possível afastar a responsabilidade dos integrantes da Diretoria Executiva, que sejam então chamados para manifestar-se todos integrantes envolvidos na aprovação dos contratos, incluindo os membros do Conselho de Administração.”

Ao final, a defesa de Gabrielli sustenta que caso o TCU se negue a excluir a Diretoria Executiva do processo, “que os integrantes do Conselho de Administração sejam citados para integrar a lide, tendo seus bens bloqueados em igualdade de condições com os atuais requeridos”.

No documento, a defesa cita Dilma explicitamente ao lembrar da primeira conclusão do TCU. “Essa posição (de que os conselheiros são responsáveis), que implicaria a oitiva da Presidenta da República e de outras altas autoridades do atual governo, recém reeleito, foi descartada.”

Além de Dilma, faziam parte do Conselho o atual ministro da Defesa, Jaques Wagner, o ex-presidente do PT e da Petrobrás José Eduardo Dutra, o ex-ministro Antonio Palocci, o atual presidente da Abril Mídia, Fábio Barbosa; o economista Cláudio Haddad, presidente do Insper, os empresários Jorge Gerdau e Arthur Sendas (falecido) e o ex-comandante do Exército Gleuber Viana.

Em julho do ano passado, logo após o TCU dar sua decisão preliminar, Cerveró e Ildo Sauer, ex-diretor da área de Gás e Energia, também tentaram responsabilizar o Conselho. Cerveró encontra-se atualmente preso na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba. Ele é acusado pela Operação Lava Jato de receber propina em contratos da Petrobrás.

‘Erro médico’. No documento de sua defesa, Gabrielli aproveita para defender a compra de Pasadena. Diz que os lucros já cobriram os gastos, contesta os critérios e números apontados pelo TCU e diz que em momento algum foi demonstrado dolo ou culpa da direção da Petrobrás. Para fins legais, o ex-presidente da estatal compara o negócio a um erro médico, “no qual a relação com o paciente é de meio e não de fim”. Para Gabrielli, a compra de Pasadena “não foi, certamente. a maior barganha realizada pela Petrobrás, mas tampouco foi a maior venda da Astra”.

Gabrielli aproveita para provocar a desafeta Graça Foster, atual presidente da estatal, dizendo que a Petrobrás não forneceu uma série de documentos que poderia ajudá-lo na defesa.

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