quarta-feira, 3 de junho de 2015

Dora Kramer - Agendas postiças

- O Estado de S. Paulo

O ritmo acelerado que a gestão Eduardo Cunha imprime às votações na Câmara tem consistência parecida com a persona oposicionista recentemente assumida pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, em suas defesas de projetos ditos moralizantes.

Em matéria de artificialismo, os movimentos de ambos guardam semelhança com a decisão da presidente Dilma Rousseff de considerar o ajuste fiscal “página virada” nem bem as medidas entraram em vigor, e o início de uma agenda positiva que inclui fotografias em passeios de bicicleta ao redor do Palácio da Alvorada com o intuito de, segundo seus assessores, conferir à figura presidencial caráter “mais humano”.

Como não se tem notícia da pesquisa em que se baseou o Planalto para chegar à conclusão de que Dilma parece aos olhos do brasileiro um ser de outro planeta, resta-nos aguardar detalhes da estratégia antes de avaliar a chance de êxito nos resultados.

A respeito da agenda positiva, trata-se do mesmo de sempre: dar por encerrado um tema desagradável de maneira unilateral e inventar uma série de outros a fim de mudar de assunto e tentar mudar o humor do público.

Aqui é possível dizer com certeza: não há chance de dar certo. Pelo simples fato de que o sucesso da agenda depende dos fatos. E, estes, objetivamente, não se expressam no lançamento de novos planos de financiamento para a agricultura familiar, em mais uma etapa do programa Minha Casa, Minha Vida ou aumento de impostos para instituições financeiras.

Essas coisas estão distantes do dia a dia da população. Próximos estão problemas como o desemprego, o endividamento, a queda na renda, o aumento de preços, a roubalheira desenfreada. Isso é o que faz a presidente Dilma Rousseff não poder sair nem falar em público.

E, segundo avaliações de seus auxiliares feitas longe dos comunicados oficiais, a expectativa é a de que não poderá fazê-lo tão cedo. E o que seria por eles considerado “cedo”? Até pelo menos que a economia desse algum sinal “mesmo que medíocre” de recuperação. Algo que não se espera antes do fim do ano.

Portanto, saibam a senhora e o senhor que nem o Palácio do Planalto acredita na eficácia real da agenda positiva. Ou melhor, da agenda postiça.

Tão afetada e carente de substância quanto a espetaculosa pauta do Congresso sob o comando de um PMDB reinventado de valente agora que o governo está nas cordas – não por obra do partido nem da oposição, mas por ação da entrada em cena dos protestos populares.

Sim, a Câmara começou a votar a reforma política, mas não votou nada que prestasse nem discutiu coisa alguma que alterasse ou melhorasse a relação entre eleitores e eleitos. Renan Calheiros e Eduardo Cunha fazem barulho, demonstram poder, pressionam o Executivo, mas na hora do vamos ver – como as votações das medidas do ajuste – basta dar uma volta no Congresso para perceber que o debate de fundo ainda é sustentado no fisiologismo.

Os dois vão e voltam e a caravana do governo passa. No que interessa, o Planalto ganha. Não com a facilidade de antes, quando a popularidade era farta, mas ganha porque o sistema é presidencialista, e não parlamentarista, como parece querer fazer crer o espetáculo do fingimento proporcionado pela gritaria algo inconsistente.

De concreto o que se tem é a aprovação de um “contrabando” embutido em medida provisória autorizando a construção de um shopping no Parlamento. De resto, a cada hora é uma invencionice ao molde de factoide.

A última diz respeito à transferência do controle da escolha de dirigentes das estatais e bancos públicos ao Congresso. A justificativa, “abrir a caixa-preta das estatais”, melhorar a transparência e governança das empresas.

Para isso, suas excelências dispõem das comissões permanentes de fiscalização e controle. Basta fazê-las funcionar com eficácia, seriedade, lisura e independência.

Eliane Cantanhêde - Cascas de banana

- O Estado de S. Paulo

As imagens da presidente Dilma Rousseff andando de bicicleta, com capacete e tudo, remetem a dois tempos. Um, mais antigo, quando o então presidente Fernando Collor disparava por aí de moto, corria no Central Park, catava lixo na praia, essas coisas de garotão de bem com a vida. Outro, bem atual, quando o próprio primeiro governo Dilma recorria a “pedaladas” para encobrir a realidade fiscal e driblar o desequilíbrio das contas.

Mas vamos olhar com mais boa vontade as fotos de Dilma pedalando por Brasília, algo simpático, programado para ajudar na dieta fulminante e na “humanização” da figura presidencial. Certamente, Dilma tem todo o direito de sair de moto de vez em quando, de curtir o domingão em cima de uma bicicleta. Afinal, presidente ou não, ela é gente como a gente. E, com tantos problemas de todos os lados, bem que precisa espairecer.

O que não pode é a assessoria da presidente achar que uma simples pedalada não fiscal vai ajudar a fechar contas políticas que não fecham. Uma bicicleta é uma bicicleta. E, assim como o marketing até vence eleições, mas não muda a realidade, uma bicicletada dominical não apaga o rastro de problemas que Dilma, Lula e o PT criaram para Dilma, Lula e o PT. Nem melhora o humor dos “aliados”.

Enquanto a presidente curtia sua bike, os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Eduardo Cunha – sempre eles! –, já se apressavam para jogar mais cascas de banana no caminho de Dilma. A redução da maioridade penal é, definitivamente, uma questão da maior gravidade, mas não é um programa de governo e não gera um confronto entre Congresso e governo, mas entre PMDB e PT. Já a Lei de Responsabilidade das Estatais atinge diretamente o Planalto, coração do Executivo.

Eduardo Cunha usa a questão da maioridade penal para espicaçar o PT, já que ameaça votar logo em junho e recorrer a consultas populares – que, infelizmente, dão ampla margem de apoio à redução. O Planalto reage usando a questão para criar uma ponte com a oposição, sobretudo com o PSDB, ao defender o projeto alternativo do senador Aloysio Nunes Ferreira, que endurece as penas para crimes graves. Seria uma forma de Dilma tirar proveito da situação para dividir a oposição: a formal, tucana, de um lado; a real, pemedebista, de outro.

A questão central para o governo, porém, é a do projeto das estatais que, em resumo, reduziria o poder do Planalto para gerir e para nomear os diretores de empresas estatais e bancos públicos, como Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, BNDES e, óbvio, a Petrobrás, apontada como símbolo, e como troféu macabro, do aparelhamento das estatais na era PT. Maioridade penal é um tema da sociedade; gestão de empresas e bancos públicos é um tema do interesse direto do governo – além de ser, também, da sociedade.

Pelo projeto articulado em conjunto por Renan e Cunha, os dirigentes dessas instituições terão de passar por sabatinas no Senado, como já ocorre com ministros do Supremo Tribunal Federal, diretores das agências reguladoras e embaixadores do Brasil no exterior. Não custa destacar o enorme senso de oportunidade dos dois pemedebistas, que lançam a ideia algumas semanas após a aprovação a toque de caixa da Lei da Bengala, que retirou de Dilma a prerrogativa de indicar cinco ministros do Supremo, e apenas alguns dias depois de os senadores vetarem o embaixador indicado por Dilma para a OEA, Guilherme Patriota. Se eliminou Patriota, quantos presidentes de BB, CEF, Petrobrás... o Senado poderá eliminar?

Assim, a presidente passa a ideia de estar feliz e seus assessores apostam que o pior da crise já passou, mas isso pode ser mais um típico autoengano de quem ocupa o poder. Se depender de Renan e de Cunha, logo do PMDB, logo do Congresso, a crise continua. Nem o escândalo da CBF pode camuflar essa realidade, quanto mais uma mera bicicleta.

Luiz Carlos Azedo - Futebol e negócios

• Os “donos” da bola não assumem que seus verdadeiros objetivos estão muito distantes do espírito esportivo do Barão de Coubertin. As entidades esportivas padecem dos mesmos males da nossa política: fisiologismo, nepotismo e patrimonialismo.

- Correio Braziliense

Nas democracias ocidentais, grosso modo, há duas grandes definições de dualidade política: uma é a clássica divisão entre direita e esquerda, tão enfatizada pelo jurista italiano Norberto Bobbio, que vem da Revolução Francesa; a outra, tem origem no Segundo Império Alemão e na República de Weimar, é de autoria do alemão Max Weber, um dos pais da sociologia moderna, e separa a política entre os que a vêem como “negócio” e aqueles que a vêem como “bem comum”.

No Brasil, como tudo é mitigado, a direita não se assume como tal, a esquerda no poder adotou o programa social-liberal e todos os políticos dizem defender o bem comum. Ninguém admite que faz política como negócio, embora nos bastidores do Congresso não se faça outra coisa.

É mais ou menos o que também acontece com o futebol, a nossa grande paixão nacional, e com os demais esportes olímpicos, onde a política e os negócios se misturam. Os “donos” da bola não assumem que seus verdadeiros objetivos estão muito distantes do espírito esportivo do Barão de Coubertin. As nossas entidades esportivas padecem dos mesmos males da nossa política: fisiologismo, nepotismo e patrimonialismo. Mas tudo pode ser ainda pior.

Existe um engessamento do sistema partidário brasileiro, que obstrui a renovação e desconsidera a maioria da sociedade, mas as nossas eleições são democráticas e à prova de fraudes, o voto popular ainda consegue se impor diante do poder econômico nas eleições majoritárias. Nos esportes, porém, o sistema é completamente dominado pela cartolagem, atletas não têm direito de voto, a transparência não existe e a situação da maioria dos clubes é calamitosa. A democracia não chegou ao esporte, cuja estrutura atual é um entulho autoritário, tomado por relações mafiosas.

Sim, o futebol e outras modalidades são tratados como grandes negócios pelos cartolas. Essa é uma realidade da qual não se pode mais escapar, porque o esporte como entretenimento foi globalizado e virou uma indústria poderosíssima, que produz conteúdos multimídia para todos os veículos de comunicação de massa. A televisão a cabo, por exemplo, não seria capaz de ocupar sua grade de programação sem o esporte.

Na era digital, oferece beleza, criatividade, emoção, sensualidade e outros atributos positivos que o marketing esportivo procura associar aos bens de consumo de toda sorte, do material esportivo aos automóveis, dos alimentos à perfumaria. Seja pela promoção de eventos ou torneios, seja pelo apoio e patrocínio a clubes esportivos, grandes empresas e marcas líderes privilegiam o esporte, seus melhores atletas e clubes, para vender seus produtos. E a mídia, de um modo geral, tem no esporte conteúdo de produção relativamente barata e uma fonte quase inesgotável de financiamento.

O padrão Fifa
Os Estados Unidos lideram esse negócio, especialmente no basquete, futebol americano, beisebol e hóquei, com bilionárias ligas nacionais; seguido pelo futebol europeu, sobretudo o inglês, o espanhol e o italiano. No Brasil, o esporte também já é um grande negócio, mas padece de uma visão amadorística de dirigentes esportivos e empresários.

Os escândalos envolvendo clubes, federações, empresas de marketing esportivo e até atletas e treinadores são a prova de que ainda estamos no estágio da “acumulação primitiva”. Mesmo assim, nos projetamos como protagonistas do esporte globalizado, com a realização da Copa do Mundo de Futebol, no ano passado, e as Olimpíadas do Rio de Janeiro, marcadas para o próximo ano.

O escândalo da Fifa lança um foco de luz sobre o submundo desse grande negócio e suas relações com a política. Na medida em que o futebol começou a ganhar popularidade nos Estados Unidos, as autoridades americanas passaram a investigar seu modus operandi, o que resultou na prisão de sete dirigentes da Fifa, entre eles o ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol, José Maria Marín.

Ontem, o presidente da Fifa, Joseph Blatter, que havia sido reeleito pela quinta vez no sábado, renunciou ao cargo e convocou novas eleições para a entidade. Depois de acusar os Estados Unidos de tentar interferir indevidamente nas eleições da entidade, com o apoio ostensivo do presidente russo, Vladimir Putin — em razão da Copa do Mundo de 2018, que será realizada na Rússia —, Blatter jogou a toalha: soube que está realmente sendo investigado pelo FBI, que dispõe de ilimitado poder de fiscalização sobre operações financeiras realizadas nos Estados Unidos ou por empresas com sede naquele país, em qualquer lugar mundo.

Não será surpresa, portanto, se o atual presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, acabar no olho do furacão. O senador Romário está em vias de instalar a CPI que vai investigar a CBF e vibrou com a renúncia de Blatter. A presidente Dilma Rousseff já mandou recado de que Del Nero não conta com seu apoio. O cartola era homem de confiança de Marín e apoiou a reeleição de Blatter.

A pedido do FBI e da Interpol, a Polícia Federal já investiga dirigentes, empresários e empresas envolvidos no escândalo. Pode ser que isso resulte numa reforma estruturante do futebol e do mundo esportivo no Brasil, mas isso, como sempre, vai depender dos nossos políticos, que costumam proteger os cartolas que os apoiam, quando não são um deles.

Bernardo Mello Franco - É coisa nossa

- Folha de S. Paulo

Joseph Blatter é suíço, foi derrubado pela polícia americana e leu o discurso de renúncia em francês. Mas a origem de seu longo e corrupto reinado na Fifa é brasileiríssima. É coisa nossa, como cantaria Jorge Ben.

Blatter chegou ao topo da cartolagem mundial pelas mãos de João Havelange. O brasileiro assumiu a presidência da Fifa em 1974. No ano seguinte, escalou o suíço como escudeiro e comparsa. A dobradinha se estendeu até 1998, quando Blatter herdou a cadeira do chefe.

Na transição, Havelange foi nomeado presidente de honra da Fifa. Só perderia o título em 2013, após a confirmação, pela própria entidade, de que recebeu propina da empresa de marketing ISL. Um pedágio de R$ 45 milhões, cobrado em troca dos direitos de transmissão de várias Copas do Mundo.

Segundo a Fifa, o dinheiro da corrupção foi dividido em família. Parte para Havelange e parte para seu ex-genro Ricardo Teixeira, que comandou a CBF por 23 anos. Eles nunca comentaram as acusações.

Na Copa de 2014, a herdeira Joana Teixeira Havelange, neta de João e filha de Ricardo, virou diretora do comitê organizador. Ficou famosa ao debochar dos manifestantes que criticavam a farra de gastos com o campeonato. "Não vou torcer contra, até porque o que já tinha que ser gasto, roubado, já foi", escreveu, em uma rede social.

Se o que tinha que ser roubado já foi, quem tinha que pagar pelos roubos só começa agora a ser punido. Blatter caiu, e a Polícia Federal enfim indiciou Teixeira por suspeita de crimes financeiros. Havelange será salvo pela idade avançada, mas o país ainda pode se livrar de um vexame. A bola está com a Prefeitura do Rio, que precisa tirar o seu nome do estádio que receberá provas da Olimpíada de 2016.

Em tempo: Jorge Ben batizou a música citada no início desta coluna como "Cosa Nostra". Tudo a ver com a Fifa e a CBF.

Rosângela Bittar – O Poder e a conveniência

- Valor Econômico

Para acessá-la basta clicar no link abaixo:

José Nêumanne - ‘Bola suja’ poderá salvar Lava Jato?

- O Estado de S. Paulo

Só quem não prestou atenção total ao debate sobre os escândalos de corrupção no Brasil pode ter-se surpreendido com a espetacular prisão pelo americano Federal Bureau of Investigation (FBI) de sete “cartolas” da Fifa, entre os quais o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), José Maria Marin, em Zurique, na Suíça. Afinal, um dos melhores e mais bem informados especialistas na área do Direito que lida com esse tipo de fraudes no Brasil, Modesto Carvalhosa, vem há algum tempo advertindo para a possibilidade de intervenções remotas da Justiça americana, no exterior. Em artigos nesta página e entrevistas à imprensa e às emissoras de rádio e televisão, ele tem advertido que, sendo o Brasil signatário de um pacto internacional anticorrupção, acusados de fraude que não tenham sido justiçados aqui poderão sê-lo em qualquer outro país lesado, entre eles os Estados Unidos.

As advertências feitas pelo advogado dizem respeito especificamente à roubalheira que atualmente mantém o monopólio das manchetes dos jornais e dos noticiários de rádio e televisão e das capas de revistas: em troca de garantia de ganhar licitações e de poder superfaturar obras da Petrobrás, grandes empreiteiras pagaram propinas a gerentes e diretores da estatal e a políticos de partidos aliados do governo que os nomearam apenas para esse objetivo. Tramitam na Justiça americana ações movidas por investidores que acreditaram no perfil sério e competente de nossa petroleira e se sentiram logrados depois que tiveram notícia do mar de lama em que a companhia afundou, num caso de furtos sem paralelo na História da humanidade.

Petróleo, evidentemente, nada tem que ver com futebol. No entanto, ninguém precisa sequer acompanhar o noticiário esportivo para ficar sabendo que o esporte mais popular do mundo é administrado por uma federação cuja fama em matéria de malversação de recursos é enorme. Mas a Fifa passava incólume por processos judiciais, apesar de suspeitas, devassas e investigações.

Agora o que Carvalhosa diz, sem que ninguém dê atenção a seus avisos – nem o governo, nem a oposição ou a cúpula dos Poderes Legislativo e Judiciário tiveram a sabedoria de lê-lo e ouvi-lo –, se confirmou na ação do FBI, com ajuda da polícia suíça, no suntuoso hotel Baur au Lac. A ação policial não alterou o resultado previsto do pleito de que de novo saiu vencedor o suíço Joseph Blatter. Mas, além da temporada dos finórios “cartolas” nas prisões helvéticas, a batata do chefão torrou: ele teve de pular fora. Após a reeleição, tinha acusado os americanos de estarem se vingando pela escolha do Catar para sediar a Copa de 2022 em vez do país deles. Como dizia vovó, “desculpa de cego é feira ruim e saco furado”.

A versão de Blatter mostra que ele aprendeu esse truque no Brasil, onde foi disputado o Mundial da Fifa no ano passado. Pois essa sua tentativa de ficar de fora do episódio é similar às acusações feitas por Renan Calheiros, Eduardo Cunha, Fernando Collor e Antonio Anastasia contra o Ministério Público Federal (MPF), que investiga a eventual participação deles no esquema chamado de petrolão. A questão é que, tanto cá quanto lá, não importa a motivação, mas a consequência dos inquéritos. MPF aqui e FBI lá têm de provar a culpa dos acusados – alguns presos. Quem for inocente comemorará e quem não for purgará pena, como manda a lei.

O Brasil tem importância capital na ação judicial e na operação policial nos EUA. Um importante informante é o patrício José Hawilla, ex-repórter de campo, um dos nababos das negociações milionárias do futebol profissional, agora réu confesso em quatro crimes e delator premiado, que aceitou devolver parte do dinheiro devido ao fisco americano. A História registra que foi um Imposto de Renda mal declarado que levou o chefão mafioso de Chicago Al Capone à prisão. Impune pelos atos de violência, o chefão caiu por delito fiscal.

Por aqui a coisa é bem diferente. Em visita ao México, feita para incrementar relações bilaterais esfriadas pelo combate de seu antecessor à Alca, a presidente Dilma Rousseff disse que o futebol brasileiro “só se beneficiará dessa investigação”. Não contou como nem por quê. Além de ter omitido a obviedade de que nenhuma melhora na prática futebolística no País compensará a imagem negativa produzida para esta e para o Brasil pelo fato de ultimamente só ter merecido destaque no noticiário internacional a corrupção sem freios.

Antes de a chefona voltar, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, pôs a máquina do marketing policial para funcionar anunciando investigações da Polícia Federal (PF), cuja reputação anda em alta por causa da Operação Lava Jato. Sua intenção óbvia é fingir que o governo manda numa instituição de Estado que não precisa de ordens do Executivo para atuar.

Além da patacoada presidencial e da ordem cínica, o governo expôs à Nação uma das mais espetaculares provas de incompetência dadas por qualquer fisco: a Receita Federal anunciou que investiga fraudes no total de R$ 4 bilhões no futebol desde 2002. Dá para acreditar? Investigar por 13 anos fraudadores que o FBI levou meses para prender?

Romário de Souza Faria, o craque da Copa que o Brasil venceu nos EUA em 1994, conseguiu as assinaturas para abrir comissão parlamentar de inquérito (CPI) no Senado para investigar a CBF. Ótimo! A questão é: se a CPI da Petrobrás aguarda melancólico fim com cheiro de pizza depois de PF e MPF terem feito o trabalho pesado, o que esperar da repetição de uma CPI que já houve antes e teve fim igual?

Sem precisarem mais ler nem ouvir o aviso de Carvalhosa, os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário podem aprender com a ação do FBI contra a “bola suja” e abortar, se é que estão mesmo tentando sabotar a Operação Lava Jato, outra, que é chamada, em concessão à escatologia em voga, de “bosta seca”. Tempo de fazer justiça aqui mesmo há.

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*José Nêumanne é jornalista, poeta e escritor

Míriam Leitão - É dose de juros

- O Globo

Tudo indica que o Banco Central vai subir os juros de novo, hoje, para 13,75%, apesar da alta do desemprego e da contração do PIB. Até meados de fevereiro, a percepção era que a Selic não chegaria a 13%. Hoje, cresceu o número de projeções acima de 14%. A dificuldade do governo em aprovar o ajuste fiscal fez o BC endurecer o discurso. O tarifaço da energia e seus efeitos na inflação foram subestimados.

O economista José Júlio Senna, chefe do Centro de Estudos Monetários do Ibre/FGV, avalia que nos últimos dois meses houve uma forte mudança de postura do Banco Central no combate à inflação. Isso aconteceu a partir do momento em que o governo passou a ter mais dificuldade na condução do ajuste fiscal, com votações apertadas no Congresso, menor apoio político e queda na arrecadação. Diante disso, o BC repensou o ciclo de alta dos juros.

- Desde o anúncio de Levy para a Fazenda, o mercado apostou num ajuste fiscal forte, com ênfase no corte de gastos. Quando esse cenário ficou menos provável, aumentou a desconfiança. O BC, com medo de perder a condução das expectativas, adotou um discurso mais duro, indicando uma alta maior dos juros - explicou Senna.

O tarifaço da energia elétrica foi subestimado tanto pelo mercado quanto pelo Banco Central. Isso também ajuda a entender os motivos da alta maior da Selic agora. Em janeiro, o Boletim Focus estimava inflação de 6,56% para 2015. Hoje, prevê 8,39%. Já o BC só viu que o problema existia no Relatório de Inflação de março, quando subiu sua estimativa para 7,9%. Até dezembro, acreditava que o IPCA deste ano seria de 6,1%. O risco de uma taxa tão alta é que ela chegue à casa dos dois dígitos e dificulte ainda mais a recuperação da economia no ano que vem.

- Minha projeção é de IPCA entre 8,5% e 9% este ano, mas isso com um ciclo maior de alta nos juros. Se o BC não tiver mão firme agora e não conseguir conduzir as expectativas, a inflação pode perfeitamente ir a dois dígitos - disse José Júlio Senna.

O economista prevê que ainda haverá muitas revisões para baixo no PIB deste ano. Classifica como "freio nas quatro rodas" essa desaceleração e avalia que é fundamental destravar as concessões.

PT colhe o que plantou – Editorial / O Estado de S. Paulo

Um recurso de retórica de que Lula lança mão desde os tempos de militância sindical é a demonização das “elites”, também referida como “eles” em suas diatribes contra os “inimigos do povo”. “Eles” são a encarnação do mal, eternamente conspirando para perpetuar seus privilégios e manter a servidão dos pobres. Há 35 anos Lula & Cia. batem nessa tecla. Como não é possível enganar a todos todo o tempo, esse discurso populista, tendo a ajuda da incompetência demonstrada por Dilma Rousseff em seu primeiro mandato, acaba se esgotando. E o PT, que sempre fez oposição e chegou ao poder disseminando o ódio, começa a colher o que plantou.

Entre outras figuras destacadas do petismo, Guido Mantega, Alexandre Padilha e, no último fim de semana, Fernando Haddad, foram vaiados em lugares públicos onde se encontravam como cidadãos comuns. É lamentável. Manifestações de protesto e repúdio, como saudável exercício democrático, têm hora e lugares apropriados, que certamente não eram aqueles em que se encontravam os referidos cidadãos. A agressão verbal pode ser tão deplorável quanto a agressão física – que, felizmente, não chegou a ocorrer em nenhum desses casos –, pois ambas atentam contra a dignidade do agredido.

Mas eis que um petista de alto escalão – o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom), Edinho Silva – assume ares de pacificador e vem a público condenar exatamente a prática que seu partido consagrou. Declarou o ministro em entrevista ao Globo: “Vejo amigos brigando, famílias se dividindo, não é só a intolerância contra políticos. Temo que esteja mudando a cultura brasileira, sempre apaziguadora. Há lideranças importantes se manifestando com ódio”.

Sendo ele um líder petista com longa folha de serviços prestados a seu partido com a marca de um notável, digamos, aguerrimento, a atitude do chefe da Secom é, no mínimo, cínica. Poucos dias antes de se tornar ministro pacificador, Edinho Silva deu uma mostra da até então característica agressividade de seu discurso, ao tentar refutar as acusações de envolvimento do PT no escândalo da Petrobrás: “Nunca na nossa história assimilamos com tanta facilidade o discurso oportunista de uma direita golpista”. É possível que o ex-deputado estadual paulista tenha pesadelos com o propinoduto do petrolão, porque em 2014 foi o tesoureiro da campanha reeleitoral de Dilma Rousseff.

No momento, porém, a preocupação do chefe da Secom é com as ameaças que enxerga à “cultura de paz” dos brasileiros. E, para enfatizar essa percepção tardia, recorre ao surrealismo que povoa o imaginário popular: “Tem um monstro sendo alimentado dentro de uma lagoa toda vez que se dissemina o ódio. Esse monstro já colocou a cabeça para fora algumas vezes e, se sair por completo, vai ser incontrolável”. Só Deus sabe o que se passa pela cabeça do ministro quando fala em cabeças de monstros.

O fato é que, usando o poder de que dispõe, Edinho Silva determinou à Caixa e ao Banco do Brasil que promovam campanhas destinadas a “estimular a tolerância” entre os brasileiros. Explicou o ministro que campanhas institucionais com esse conteúdo não podem ser veiculadas pela Secom, que só trabalha com assuntos de utilidade pública. Por isso, “orientou” os bancos oficiais a assumirem essa tarefa. O Banco do Brasil está com uma campanha aprovada que será veiculada brevemente e a Caixa colocou no ar a sua em meados de maio, na qual aparece um menino usando uma camiseta com as cores de todos os times de futebol que a instituição patrocina, com a mensagem “todo brasileiro já nasce sabendo conviver com as diferenças”. Assim, Edinho faz com a mão esquerda o que não pode fazer com a direita.

Além dos objetivos altruístas de levar aos lares brasileiros o sentimento de paz e fraternidade que o PT sempre procurou destruir como meio de alcançar e se manter no poder, a iniciativa de Edinho Silva revela a falta de cerimônia com que os governos petistas contornam os obstáculos legais que encontram pelo caminho: se o governo não pode gastar dinheiro diretamente com propaganda que não seja de “utilidade pública”, as ricas empresas financeiras do Estado estão aí para quebrar o galho. E depois não querem que o povo fique com raiva.

Maria Rita - Alto Lá

Ascenso Ferreira - Minha escola

A escola que eu frequentava era cheia de grades como as prisões.
E o meu Mestre, carrancudo como um dicionário;
Complicado como as Matemáticas;
Inacessível como Os Lusíadas de Camões!

À sua porta eu estava sempre hesitante...
De um lado a vida... — A minha adorável vida de criança:
Pinhões... Papagaios... Carreiras ao sol...
Vôos de trapézio à sombra da mangueira!
Saltos da ingazeira pra dentro do rio...
Jogos de castanhas...
— O meu engenho de barro de fazer mel!

Do outro lado, aquela tortura:
"As armas e os barões assinalados!"
— Quantas orações?
— Qual é o maior rio da China?
— A 2 + 2 A B = quanto?
— Que é curvilíneo, convexo?
— Menino, venha dar sua lição de retórica!
— "Eu começo, atenienses, invocando
a proteção dos deuses do Olimpo
para os destinos da Grécia!"
— Muito bem! Isto é do grande Demóstenes!
— Agora, a de francês:
— "Quand le christianisme avait apparu sur la terre..."
— Basta
— Hoje temos sabatina...
— O argumento é a bolo!
— Qual é a distância da Terra ao Sol?
— ?!!
— Não sabe? Passe a mão à palmatória!
— Bem, amanhã quero isso de cor...

Felizmente, à boca da noite,
eu tinha uma velha que me contava histórias...
Lindas histórias do reino da Mãe-d'Água...
E me ensinava a tomar a bênção à lua nova.
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In: FERREIRA, Ascenso. Poemas: Catimbó, Cana Caiana, Xenhenhém. Il. por 20 artistas plásticos pernambucanos. Recife: Nordestal, 1981

terça-feira, 2 de junho de 2015

Opinião do dia - Carlos Siqueira e Roberto Freire

O avanço das tratativas em torno da fusão entre o PSB (Partido Socialista Brasileiro) e o PPS (Partido Popular Socialista), que resultará em uma nova força política no campo da esquerda democrática e oferecerá ao país uma alternativa real ao atual governo federal, representa mais do que simplesmente a união entre as duas legendas.

Trata-se, afinal, de um reencontro histórico entre o legítimo herdeiro do Partido Comunista Brasileiro e os socialistas, que têm uma trajetória de lutas em comum e estiveram juntos em vários momentos cruciais da democracia brasileira.

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Carlos Siqueira e Roberto Freire, presidente do PSB e PPS, respectivamente. ‘Um novo projeto para o Brasil’, artigo publicado no Jornal Folha de S. Paulo, edição de segunda-feira, 18 de maio de 2015.

A mesma tática do jogo de palavras depois de 12 anos

João Villaverde - O Estado de S. Paulo

Depois de passar cinco meses falando em aumento de impostos, em corte de gastos e investimentos públicos e em restrições a benefícios sociais, a ordem agora no governo Dilma Rousseff é evitar ao máximo a expressão "ajuste fiscal". A ideia é mudar a comunicação do governo - e da equipe econômica em especial - para uma espécie de agenda do crescimento.

Coincidentemente, foi também em junho, mas de 2003, que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva rompeu a retórica de controle fiscal da época para adotar o "espetáculo do crescimento".

A meta agora é destacar os esforços para os diferentes setores empresariais. O agronegócio e os agricultores familiares terão o Plano Safra. Em seguida, será a vez das empresas de infraestrutura, com pacote de concessões de aeroportos, rodovias e ferrovias. Como afirmou ao Estado o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, o plano do governo é realizar concessões de forma contínua e anual.

O governo ainda prepara o Plano Nacional de Exportação, voltado à indústria, e a terceira fase do programa habitacional Minha Casa Minha Vida.

No governo, trabalha-se com "apenas" duas notícias duras para este mês. A primeira é que a Fazenda manterá o foco sobre o projeto de lei que revisa a desoneração da folha de pagamentos.

O projeto desagrada a empresários de 56 setores hoje beneficiados. A segunda é que o governo conta com ao menos mais uma elevação, pelo Banco Central, da taxa básica de juros, de 0,5 ponto porcentual.

Dilma tenta dar início a uma 'agenda positiva'

• Presidente lança Plano Safra, que opôs Levy e Kátia Abreu na definição de taxas de juros

Victor Martins, Rafael Moraes Moura, Ricardo Della Coletta, Tânia Monteiro - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Numa investida para tentar "virar a página" do ajuste fiscal, emplacar uma agenda positiva e iniciar um processo de resgate de parte de sua popularidade, a presidente Dilma Rousseff lança hoje Plano Safra 2015/2016 em cerimônia no Palácio do Planalto.

Aguardado com ansiedade por produtores rurais e pelos bancos, o plano deve ser anunciado com juros maiores, cortes no financiamento para investimento, e um volume total de recursos de R$ 176 bilhões - a diferença para a safra anterior, de R$ 20 bilhões a mais, será nas linhas de crédito com taxas de mercado, mais caras que as subsidiadas.

Principal defensor das medidas do pacote de reequilíbrio financeiro, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, se opôs nos bastidores à ministra da Agricultura, Kátia Abreu, na definição das taxas de juros do plano. Levy tem sido alvo de ataques de petistas, que o consideram um economista alinhado em demasia às vontades do mercado financeiro.

O Ministério da Fazenda queria desembolsar um volume menor de subsídios nesta edição do Plano Safra e, com isso, tentava garantir uma taxa média de pelo menos 9,5% ao ano. A Agricultura, em contraponto, brigava por uma taxa mais favorável, entre 8% e 8,5% ao ano.

O titular da Fazenda já havia divergido de outro colega, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, na definição do tamanho do contingenciamento. Levy defendia um corte da ordem de R$ 78 bilhões, mas acabou derrotado - o contingenciamento ficou em R$ 69,9 bilhões.

"As medidas aprovadas na semana passada pelo Congresso (as MPs que endurecem as regras de concessão de benefícios previdenciários e trabalhistas) criam as condições para que o governo possa efetivamente desempenhar sua agenda positiva de desenvolvimento e retomada do crescimento da economia", disse o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva.

O anúncio do Plano Safra foi um dos principais temas discutidos na reunião de coordenação de ontem entre Dilma e auxiliares. Para reverter as más notícias que atingem o Palácio do Planalto, a presidente também discutiu a situação da Petrobrás. O governo não quer que as denúncias de corrupção, em meio aos desdobramentos da Operação Lava Jato, atrapalhem a divulgação de dados da estatal considerados positivos, como os de produção e exploração do petróleo.

Casa da Mulher. Ao tentar "virar a página" do ajuste fiscal e dar início à "agenda positiva" do Palácio do Planalto, a presidente se confrontará com velhos problemas de burocracia e planejamento que travam seus programas.

Hoje, Dilma inaugura em Brasília a segunda Casa da Mulher Brasileira, espaço que reúne os principais serviços para o atendimento integral de vítimas de violência. Quando lançou o programa "Mulher: Viver sem Violência", em março de 2013, a presidente havia prometido entregar 26 unidades até o fim do primeiro mandato, mas a primeira delas só foi inaugurada em fevereiro deste ano, em Campo Grande, Mato Grosso do Sul.

"A maioria das obras, todos nós sabemos, atrasa. Tem as condições do tempo, da realidade, da empresa, da licitação, você tem vários elementos que fazem com que toda obra atrase", disse ontem a secretária de enfrentamento à violência contra as mulheres, Aparecida Gonçalves.
Durante a campanha eleitoral do ano passado, a Secretaria de Políticas para as Mulheres havia prometido entregar a obra em dezembro de 2014.

O roteiro do Palácio do Planalto para reverter a maré negativa que abala o governo inclui ainda o lançamento nas próximas semanas do Plano Safra da agricultura familiar, do programa de concessões em infraestrutura e da terceira etapa do programa Minha Casa Minha Vida.

Auxiliares da presidente Dilma Rousseff também apostam na instalação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) no Senado para investigar denúncias de corrupção no futebol brasileiro para desviar os focos do escândalo da Operação Lava Jato.

Outra expectativa gira em torno da aprovação no Congresso de uma medida provisória que eleva de 15% para 20% a alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) recolhida por instituições financeiras - um recado de que não serão apenas os trabalhadores e aposentados que sofrerão com o ajuste fiscal.

Com aval do governo, juro pode subir mais para garantir inflação na meta

• Embora tema impacto na economia, Planalto avalia que é melhor concentrar sacrifício em 2015

• Objetivo é fazer IPCA convergir para 4,5% no final de 2016; mercado já espera Selic a 14% em dezembro deste ano

Valdo Cruz - Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A posição "irredutível" do Banco Central de levar a inflação para 4,5% ao final de 2016 deve provocar não só um novo aumento na taxa de juros de 0,50 ponto percentual nesta quarta-feira (03) como também ao menos mais uma alta ainda durante este ano.

Embora parte do governo se preocupe com o impacto de juros mais altos na atividade econômica, já em contração, o Palácio do Planalto avalia que a prioridade do BC é garantir a menor inflação possível no próximo ano.

Neste ano, o IPCA (índice de inflação oficial do sistema de metas) ficará acima de 8%, superando o teto estabelecido pelo governo, de 6,5%.

Ou seja, mesmo não gostando do forte aperto monetário, o governo não pretende pressionar o BC para que alivie na dose.

Expectativas
Em suas últimas sinalizações ao mercado, a equipe do Banco Central tem reforçado o discurso de que fará o que for necessário para levar a inflação ao centro da meta (4,5%) no final de 2016.

Como as expectativas de analistas ainda apontam uma inflação em dezembro do ano que vem de 5,5%, a previsão no governo é que o BC manterá o ritmo de alta dos juros de 0,50 ponto, levando a Selic dos atuais 13,25% ao ano para 13,75% nesta semana.

A dúvida seria quanto ao próximo encontro do Copom (Comitê de Política Monetária), no final de julho.

A previsão de economistas e instituições financeiras consultados semanalmente pelo BC no relatório Focus é que a taxa de juros Selic esteja em 14% ao ano no final de 2015.

Nessa leitura, o BC faria mais um aumento, de 0,25 ponto percentual, antes de interromper o ciclo de alta.

O receio de assessores presidenciais e de alguns analistas é que, para ancorar as expectativas, uma taxa de juros de 14% acabe se transformando num patamar mínimo, podendo ir além para garantir que a inflação baixe e chegue a 4,5% em dezembro de 2016.

Sacrifício
A avaliação interna no governo é que 2015, com corte dos gastos públicos e recessão, já será um ano de sacrifício. Por isso, será melhor concentrar todos os esforços agora, para tentar garantir que, ao final deste ano ou pelo menos no início do próximo o Banco Central comece a reduzir a taxa de juros para garantir a retomada do crescimento econômico do país.

Dentro do BC, a avaliação é que o banco não tem condições de flexibilizar sua política monetária neste momento, para não perder a batalha de expectativas.

Se houver dúvidas no mercado de que atingir a meta é prioridade, há o risco de não conseguir assegurar uma queda sustentável dos índices de preços nos próximos meses. A equipe de Tombini avalia, porém, que começará a ganhar neste ano a batalha para 2016.

Neste ano, a meta de inflação é considerada perdida, diante do choque de preços públicos, principalmente de energia, praticados no primeiro trimestre. O Banco Central terá que explicar oficialmente por que falhou ao não manter o IPCA na margem de tolerância do sistema de metas, de até 6,5%.

Entre economistas de mercado, a avaliação é que o BC errou no primeiro mandato ao tolerar um inflação sempre acima do centro da meta.

Congresso quer reduzir poder do Planalto sobre estatais

Estatais na mira do Congresso

• Renan e Cunha propõem redução de poder do Planalto sobre dirigentes de empresas públicas

Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA - Em mais um gesto de confronto com o Palácio do Planalto, os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), apresentaram ontem o anteprojeto da Lei de Responsabilidade das Estatais, que, na prática, reduz o poder do governo nas escolhas dos dirigentes de estatais e bancos públicos e sua influência na gestão dessas empresas. O texto foi elaborado por Renan e Cunha sem a participação do governo. Procurado, o Planalto não quis se pronunciar sobre o assunto.

Pouco mais de um ano depois do início da Operação Lava-Jato, que apura desvios na Petrobras, o texto prevê que os presidentes de empresas como Petrobras, Caixa Econômica, Correios, BNDES e Banco do Brasil terão de ser sabatinados e aprovados pelo Senado. Renan, Cunha e o presidente da comissão mista que analisará o anteprojeto, senador Romero Jucá (PMDB-RR), são alvos da Lava-Jato. A ideia é aprovar as propostas nas duas Casas antes do recesso de 17 de julho.

Ministros vetados
O projeto proíbe ainda que ministros participem dos Conselhos de Administração dessas estatais. Se aprovada, a medida vai pôr fim a uma prática comum do governo federal. A própria presidente Dilma Rousseff presidiu o Conselho de Administração da Petrobras quando era chefe da Casa Civil do ex-presidente Lula, e participou, inclusive, da decisão de comprar a refinaria de Pasadena, nos EUA. Os casos estão sendo apurados no escândalo da Petrobras. Até março deste ano, o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega integrava o mesmo órgão.

A restrição proposta atinge não só ministros como todos os "agentes políticos vinculados à União", em especial os que ocupem até o 3º escalão dos ministérios.

Ao todo, o anteprojeto da Lei de Responsabilidade das Estatais tem 45 artigos e está sendo apresentado como proposta para uma Lei de Responsabilidade das Estatais. Ao apresentar o anteprojeto, Renan e Cunha criaram uma comissão de quatro senadores e quatro deputados para analisar o anteprojeto e apresentar uma proposta final em 30 dias.

A ideia é que a comissão ainda faça mudanças importantes na proposta, como dar poderes ao Senado até para destituir os presidentes das estatais e tratar das operações de crédito do BNDES. No caso do banco de desenvolvimento, a ideia é incluir artigo que crie uma comissão que acompanhe as informações sigilosas sobre as operações de crédito.

- A questão do sigilo das operações do BNDES será trabalhada na comissão - disse Eduardo Cunha.

Outra proposta importante do anteprojeto é que os presidentes da Petrobras e de outras grandes empresas de economia mista terão, obrigatoriamente, que comprovar experiência anterior de um ano na gestão de empresas de porte semelhante. Na prática, isso acaba com as indicações políticas e impede que o chefe dessas empresas seja funcionário com carreira integralmente construída lá dentro. Foi o caso da ex-presidente da Petrobras Graça Foster, por exemplo. Essa regra, no entanto, não atinge as empresas exclusivamente públicas, como o BNDES.

Apesar de confrontar várias práticas do governo federal, Renan disse que a proposta de lei "não é contra ninguém".

- Evidente que não é um projeto contra ninguém, mas a opacidade das estatais não pode continuar. Elas precisam se submeter a regras de transparência, de controle público, de governança. Essa lei fortalecerá o Brasil e acabará com o mundo paralelo das estatais - disse Renan.

Para o presidente da Câmara, a Lei das Estatais seria algo semelhante à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

- Não estamos interferindo nas estatais, estamos colocando regras de transparência e de governança. O objetivo é esse (de reduzir a corrupção), é dar qualificação e transparência. É como a LRF, mas para as estatais - afirmou Eduardo Cunha.

Perguntado se as indicações políticas acabavam, Cunha disse que qualquer indicação é um "ato político".

O presidente da comissão mista, senador Romero Jucá (PMDB-RR), defendeu o papel do Senado na escolha dos presidentes das estatais e empresas de economia mista.

- As regras valem para estatais e bancos públicos. Qualquer empresa que tenha participação da União entra. E haverá um figurino a ser preenchido pelos futuros ocupantes - disse Jucá.

Outro ponto importante do anteprojeto é a proibição de que os administradores das empresas de economia mista, como Petrobras e Banco do Brasil, aleguem a existência de "interesse público" para fundamentar decisões que prejudiquem "de modo exclusivo ou preponderante" os acionistas minoritários.

Nos últimos anos, acionistas minoritários da Petrobras reclamaram da manutenção dos preços dos combustíveis em níveis artificialmente baixos, que causavam prejuízos à empresa. O texto propõe que o descumprimento dessa regra dê "causa à pretensão de perdas e danos aos acionistas que demonstrarem prejuízo". Caberia ao Conselho de Administração "assegurar a estrita separação entre os interesses da companhia e do acionista controlador".

Governo ainda espera mudanças
O relator da comissão será o deputado Arthur Maia (SD-BA). Além de Jucá e Maia, participarão da comissão os senadores José Serra (PSDB-SP), Walter Pinheiro (PT-BA) e Otto Alencar (PSD-BA); e os deputados Danilo Forte (PMDB-CE), Rogério Rosso (PSD-DF) e André Moura (PSC-SE).

Segundo integrantes do governo, como o anteprojeto está sendo apresentado agora no Congresso, o texto ainda pode ser bastante mudado.

Jucá disse que vários pontos do anteprojeto serão aperfeiçoados nos próximos 30 dias. No caso do BNDES, Jucá afirmou que a proposta é criar uma comissão que vai acompanhar as informações sobre as operações de crédito feitas pelo banco.

As regras para integrar os conselhos de Administração e as diretorias das empresas passam a exigir "comprovada idoneidade moral", além de graduação em curso superior e notória experiência em gestão ou na área de atuação das empresas. Além disso, passa a ser obrigatório ter cinco anos de atuação profissional em cargo semelhante.

O texto ainda prevê que o Congresso passe a ser informado anualmente sobre as conclusões dos conselhos de Administração das empresas sobre atendimento das metas e resultados do plano de negócios das empresas. Caso as metas e resultados previstos sejam descumpridos por dois anos consecutivos, o Conselho de Administração deverá destituir os diretores.

O anteprojeto obriga também que as contratações e compras das empresas públicas e de economia mista sejam feitas por licitação pública que guarde conformidade com a essência da Lei de Licitações. Seriam criados ainda comitês de auditoria, de riscos e de remuneração nas empresas de companhia mista. (Colaborou Catarina Alencastro)

Os principais pontos do projeto

Presidentes de empresas públicas.
O Senado terá de aprovar os escolhidos para presidir empresas públicas. No caso das empresas de economia mista, será preciso experiência prévia em outra empresa aberta. Diz o texto do projeto: "A nomeação do presidente da empresa pública será precedida de aprovação pelo Senado". Além disso, "os presidentes das sociedades de economia mista de capital aberto deverão comprovar o exercício prévio de cargo equivalente em sociedade anônima de capital aberto pelo período de pelo menos um ano, e sua nomeação será precedida de aprovação pelo Senado".

Ministros proibidos nos conselhos.
Pelo texto, será proibido nomear ministros e políticos para os conselhos das estatais. Diz o texto: "Não poderão integrar o Conselho de Administração agentes políticos vinculados à União, em especial ministros de Estado e titulares de cargos até o terceiro escalão no âmbito dos respectivos ministérios".

Proibição de prejuízo aos sócios minoritários.
O texto determina que "é vedado aos administradores da sociedade de economia mista de capital aberto fundamentar no interesse público que motivou sua criação decisões que causem prejuízos de modo exclusivo ou preponderante aos acionistas minoritários, preservando os interesses do acionista controlador". Isso afeta a manutenção do preço da gasolina artificialmente baixo, por exemplo.

Escolha de conselheiros e diretores.
Pelo projeto, os membros dos Conselhos de Administração e os diretores das empresas públicas terão de comprovar idoneidade moral, experiência prévia e graduação em curso superior. Diz o texto: "Os membros do Conselho de Administração serão eleitos por assembleia geral de acionistas, dentre pessoas que atendam as seguintes condições: A) comprovada idoneidade moral; B) graduação em curso superior ou notória experiência em gestão empresarial ou em área que integre o objeto social da companhia; C) comprovação de no mínimo cinco anos de atuação profissional efetiva em gestão empresarial ou atividade que integre o objeto social da companhia".

Regras mais rígidas para as licitações.
O projeto estabelece que "as sociedades de economia mista e empresas públicas que adotem regulamento próprio de licitações e contratos administrativos deverão enviar anualmente ao Congresso Nacional relatório detalhado relativos a sua execução". Além disso, o texto diz que contratações de obras "deverão ser precedidas de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, permitidas exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações".

Fiscalização interna.
O projeto cria uma série de instrumentos de controle interno para as empresas públicas. Afirma o estatuto: "As sociedades de economia mista de capital aberto deverão contar em sua estrutura administrativa, com: I - comitê de auditoria (...); II - comitê de riscos (...); III - comitê de remuneração, com atribuição de assessorar a diretoria sobre a política de remuneração de pessoal".

Cumprimento de metas e responsabilização por omissão.
O projeto estabelece punição para os conselheiros das empresas públicas. Diz que "compete ao Conselho de Administração, sob pena de seus integrantes responderem por omissão, promover anualmente o exame do atendimento das metas e resultados na execução do plano de negócios, fazendo publicar suas conclusões, e delas informando ao Congresso". E complementa: "Ocorrendo o descumprimento das metas e resultados objeto do plano de negócios, por dois anos consecutivos, caberá ao Conselho promover a destituição dos diretores responsáveis".

Renan quer mais restrições para doações e siglas nanicas

• Presidente do Senado classifica o atual sistema eleitoral de 'anacrônico'

• Ministros do TSE dizem que a unificação das eleições municipais com as demais poderá 'afogar' Justiça Eleitoral

Gabriela Guerreiro e Ranier Bragon – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), cobrou nesta segunda (1º) uma reforma política mais profunda que a conduzida pela Câmara. Ele disse que o atual sistema eleitoral é "anacrônico" e "ultrapassado".

Renan defendeu uma cláusula de barreira mais dura contra a proliferação de partidos nanicos e a fixação de um teto mais restrito de doações para os candidatos.

"É importante fixar cláusula de barreira que proíba a criação das 'nanolegendas' e se colocar fim na promiscuidade do público com o privado, fixando um teto de contribuições para que o candidato não tenha dono e o eleito não tenha patrão", disse.

Com exceção do fim da reeleição, as ideias aprovadas até agora tendem a provocar pouca alteração no funcionamento do atual modelo.

Os dois temas citados, já apreciados pela Câmara, seguirão para o Senado após os deputados encerrarem a discussão sobre a reforma.

A cláusula de barreira acabou sendo abrandada devido a um acordo entre as médias e pequenas siglas e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Ele buscava o apoio à manutenção do financiamento privado das campanhas, o que conseguiu, e mudança do sistema eleitoral para o chamado distritão, que acabou derrotada.

A cláusula aprovada estabelece restrições financeiras e de acesso à TV apenas às legendas que não conseguirem eleger nenhum congressista. Hoje só PSTU, PCB, PCO e PPL estão nessa situação. A ideia original era que a restrição valesse para quem não elegesse cinco congressistas.

Já o teto para financiamento privado de campanhas está previsto no texto da Câmara, para ser regulamentado em lei posterior. Para empresas, a legislação já estabelece teto de 2% do faturamento.

Vice-presidente do Congresso, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) disse que o Legislativo precisa aprovar a reforma política "que a sociedade cobra" e que os partidos não podem ser "negócios".

"Um partido tem que ser a representação da vontade expressa da sociedade, e não um negócio para uma empresa ou um negócio para vender tempos de TV, caminhos alternativos para mascarar o resultados das eleições. Esse desafio não está na Justiça Eleitoral, mas no Congresso."

Os senadores fizeram as declarações ao lado do presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Dias Toffoli, em sessão especial do Senado sobre os 70 anos da reinstalação da Justiça Eleitoral no país.

Em outro ambiente, Cunha afirmou: "A reforma não terminou, só dá pra dizer se ficou aquém ou não no fim. Aprovamos a cláusula que foi possível aprovar. Quando a Câmara decidiu manter o atual sistema eleitoral, ela decidiu manter tudo como está".

Cunha disse acreditar que mudanças relevantes serão tomadas na discussão de projetos que não derivem de emenda à Constituição.

Dificuldade
Os ministros Toffoli e Gilmar Mendes, presidente e vice do TSE, são contrários à unificação das eleições em uma mesma data, tema a ser votado na Câmara, com tendência de aprovação.

Apesar de afirmarem que a decisão final será do Congresso, eles disseram que a unificação poderá "afogar" a Justiça Eleitoral e dificultar a realização do pleito.
Hoje são escolhidos o presidente da República, governadores, senadores e deputados em um pleito. Dois anos depois, são escolhidos prefeitos e vereadores. A Câmara discute unificar todas as disputas numa mesma data.

Renan: 'ficou branda a cláusula de barreira'

• Presidente do Senado diz que vai "melhorar" reforma aprovada na Câmara

Cristiane Jungblut - O Globo

BRASÍLIA - O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), afirmou ontem que a Casa vai "melhorar" a reforma política aprovada pela Câmara, e mencionou, especificamente, a cláusula de barreira, que considerou "branda", e o financiamento de campanha, para o qual defendeu regras mais claras. Para Renan, só com um limite para as contribuições é que se evitará que o candidato tenha "dono ou patrão".

- Em relação a dois pontos o Senado tem como ajudar bastante na reforma política. Quanto ao financiamento de campanha, entendo que tem que ser muito transparente e que tem colocar um limite para que não haja o patrocinador, o dono do candidato. Isso é muito ruim para a democracia. E quanto à cláusula de barreira, parece insuficiente um deputado por partido. Ficou branda a cláusula de barreira, porque, na prática, pode estimular o aparecimento de novos partidos. É preciso fixar uma cláusula que iniba a proliferação das nano legendas - disse Renan, após sessão comemorativa à reinstalação da Justiça Eleitoral.

Renan também se posicionou contrário à coincidência das eleições. Para ele, isso se torna desnecessário quando se define a questão do financiamento de campanha.

- Essa coisa da coincidência da eleição está no bojo da falta de regra clara para o financiamento das campanhas eleitorais. Na medida em que você tenha regras claras, transparência, coloque uma limitação para que nenhum financiador possa se tornar dono, patrono de nenhuma candidatura, acho que isso democratiza e diminui um pouco a necessidade de se ter uma eleição única, geral - defendeu.

Cobrança da sociedade
Para o presidente do Senado, há uma grande oportunidade de reformar o sistema político:

- Nosso sistema político, eleitoral e partidário é anacrônico. E esta é uma grande oportunidade que temos para reformá-lo. Urge que atuemos no fortalecimento dos partidos com mais nitidez programática e mais vida partidária

Vice-presidente do Senado e autor do requerimento para a realização da sessão, Romero Jucá (PMDB-RR) ressaltou que é preciso fazer uma reforma política que responda aos anseios da sociedade. Além disso, disse ser preciso evitar que os partidos se transformem em "empresas ou negócios".

- A sociedade cobra uma reforma política, regras claras, transparência, seriedade na atuação política e na atuação dos partidos. Os partidos têm que ser a representação da vontade expressa da sociedade e não uma empresa, um negócio para vender tempo de TV e caminhos alternativos para mascarar o resultados das eleições. Esse desafio está no Congresso, na Câmara e no Senado - disse Jucá.

Unificação de eleições criticada

Presidente e vice do TSE se opõem à coincidência de eleições

• Para Toffoli, Tribunal ficará sobrecarregado; Gilmar vê lógicas diferentes

Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA - Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli e Gilmar Mendes, que também são presidente e vice do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), manifestaram-se ontem contrários à coincidência de eleições, um dos aspectos da reforma política ainda em debate na Câmara. O relatório do deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), que ainda está em discussão, sugere a realização das eleições para presidente, governadores, senadores, deputados, prefeitos e vereadores no mesmo ano a partir de 2022.

Para Gilmar Mendes, há uma "lógica" para manter as eleições com intervalo de dois anos, como ocorre atualmente.

- (A coincidência de mandatos) é uma questão que se tem colocado. Outro argumento que se tem posto é de que as lógicas que presidem uma e outra eleição, ou seja, a lógica da eleição de governador e presidente da República não é a mesma lógica que preside a eleição de prefeitos e vereadores. Portanto, se recomenda, inclusive, essa separação. Mas essa é uma questão que terá que ser decidida pelo Congresso - disse Gilmar, acrescentando que Câmara e Senado têm que construir um "consenso" sobre as propostas.

Excesso de trabalho
Toffoli usou um argumento de ordem prática para questionar a realização de todas as eleições ao mesmo tempo: o excesso de trabalho para a Justiça Eleitoral num mesmo período.

- Uma questão que temos conversado muito é a respeito da unificação da eleição. A questão é, para a Justiça Eleitoral, a concentração de trabalho. É a única questão que a Justiça Eleitoral coloca. Evidentemente que dilui a demanda a cada dois anos tendo eleições. Por exemplo, as eleições de 2012, entre prefeitos e vereadores, tiveram 535 mil candidaturas. A unificação pode levar esse número à casa de milhões. Mas, de qualquer sorte, a Justiça Eleitoral cumpriu sempre e sempre irá cumprir as determinações e aquilo que o Congresso estabelecer em lei - disse Toffoli.

O ministro defendeu que o STF espere a posição final do Legislativo para definir a questão do financiamento de campanha, questionada na Corte.

- Uma questão não exclui a outra. Sem dúvida nenhuma, penso que é de cautela aguardar o Congresso a respeito do tema - disse Toffoli, acrescentando:

- A primeira avaliação é que é extremamente positivo o Congresso estar debatendo e votando sobre reforma política. Há muitos anos se fala sobre a necessidade da reforma política, mas não se colocava em votação. Uma avaliação final só será possível quando for concluída essa reforma.

Em abril de 2014, o ministro Gilmar Mendes pediu vista do processo sobre financiamento de campanhas por empresas. Seis dos 11 ministros do Supremo já tinham se posicionado contra as doações privadas.

Doação de empresas
Gilmar disse que apresentará seu voto até agosto. Para ele, o Supremo poderá aguardar ou não a decisão do Congresso para julgar o caso.

- Devo submeter no final de junho (antes do recesso), ou já no início de agosto essa matéria ao Plenário. Mas o Tribunal saberá como encaminhar o assunto - afirmou o ministro.

A Câmara rejeitou o financiamento exclusivamente público de campanha e aprovou a proposta que inclui na Constituição Federal a doação de empresas privadas a partidos políticos.

Socialista de PE reagem à moção de repúdio do PT contra governo Paulo Câmara

• Deputados afirmam que Estado é vítima dos erros da presidente Dilma na condução da economia

• Socialista Aluísio Lessa diz que governo do PT levou o País "à corrupção, inflação, crise econômica, sensação de obras superfaturadas e obras paradas"

Ayrton Maciel - Jornal do Commercio (PE

Líderes do governo na Assembleia Legislativa reagiram, nesta segunda-feira (1), à moção do PT ¬ - aprovada no encontro de domingo (31) preparatório ao 5º Congresso de Salvador, de 11 a 14 deste mês ¬- com duras críticas ao governo Paulo Câmara (PSB). Deputados governistas contra-atacaram acusando o governo da presidente Dilma (PT) de ser responsável pelas dificuldades esconômicas e financeiras e dos Estados e do País que não permitem o atendimento de reivindicações salariais.

A moção de apoio à greve dos professores estaduais, divulgada domingo, encerrava com acusações de retaliações e perseguições aos professores grevistas e de proibições de acesso do Sintepe e sindicalistas às escolas estaduais. No plenário, a deputada Teresa Leitão (PT) reforçou as acusações, nesta segunda, revelando que escolas e Gerências Regionais receberam da Secretaria da Educação "comunicados oficiais proibindo a afixação de cartazes do Sindicato dos Trabalhadores em Educação (Sintepe) nos murais e faixas nas partes externas dos muros das unidades escolares".

Uma das lideranças do PSB na Alepe, o deputado Aluísio Lessa acusou o PT de ir de encontro a decisões do TJPE que decretaram a greve dos professores como "ilegal" e definiu o partido como "arrogante" por contribuir a levar aidante uma paralisação que pode "comprometer o ano letivo". Segundo Lessa, o PT estaria usando seus encontros para "destilar mágoas ao PSB" e deveria fazer moção "contra ele próprio" pela situação em que o governo Dilma teria levado o Brasil.

"O PT levou o Brasil à situação atual, com o leque de corrupções, inflação, crise econômica, sensação de superfaturamento de obras e obras paralisadas. O PT não toma para si esse quadro de coisas", disparou Lessa. O socialista descartou, porém, que as críticas petistas ao governo Paulo Câmara se tornem um impedimento ao diálogo com o PSB. "Não dificulta nem impede. O PSB sabe separar as coisas", ponderou Lessa.

Vice-líder governista na Alepe, Tony Gel (PMDB) discordou do aliado socialista, considerando que gestos e posições como a moção retirada no encontro estadual do PT podem sim dificultar e impedir o diálogo entre ex-aliados. "É uma dificuldade ao entendimento, ao diálogo. Foi uma posição extremada, sem levar em conta que as dificuldades de Pernambuco são resultado da política econômica do poder central, que é um governo do PT. É não querer reconhecer seus próprios erros. É uma grande contradição do PT", assinalou Tony Gel.

No encontro estadual, o PT aprovou uma moção de apoio à greve dos professores com protesto contra o governador Paulo Câmara (PSB) e repúdio às medidas adotadas para punir os grevistas.

“A postura do governo Paulo Câmara (PSB), para além da contra-proposta indecente apresentada, tem sido de retaliação e perseguição aos professores grevistas, através de descontos dos dias parados, ameaça de demissão dos professores com contrato temporário, transferência e retirada de professores das escolas integrais, acionamento judicial do Sintepe, com aplicação de pena de multa e bloqueio das contas do Sindicato. O PT em PE se coloca em apoio à luta legítima dos professores e exige que o governador pare imediatamente com as retaliações, retome as negociações para se buscar uma solução para a greve, que passa pelo atendimento das reivindicações”, destaca trecho da moção.

Manifestantes protestam contra Fernando Pimentel em frente ao Palácio da Liberdade

• Integrantes do movimento "Fora Dilma" fizeram barulho durante o lançamento de um programa de culinária na noite desta segunda-feira, mas o governador não estava presente

Marcelo Ernesto – Estado de Minas

Manifestantes fizeram um apitaço contra o governador Fernando Pimentel (PT) na noite desta segunda-feira em frente ao Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte. O protesto seria por causa de denúncias que envolvem a primeira-dama de Minas, Carolina Oliveira. Segundo a PF, a jornalista teria uma empresa de fachada, a Oli Comunicações e Imagens, que foi usada pela organização do empresário Benedito Rodrigues de Oliveira, um dos presos na sexta-feira, durante Operação Acrônimo.

Populares do movimento “Fora Dilma” apitam e batem panelas no portão lateral do local, onde ocorre um jantar de lançamento do “Projeto Fartura 2015”, com a presença de chefs e autoridades. O governador, no entanto, não ouviu os gritos e nem viu as faixas contra ele. Pimentel não participa do evento.

Sobre as denúncias contra Carolina, os investigadores relataram que no local em que funcionava a Oli, em Brasília, nenhum dos funcionários conhecia Carolina. Na sexta-feira, a PF fez buscas no apartamento em que Carolina morava, no Distrito Federal, antes de se casar com Pimentel. Ainda segundo a PF, Fernando Pimentel não está sendo investigado na operação.

Carolina Oliveira divulgou em um site na internet documentos da Oli Comunicação e Imagens, que comprovam que a empresa não funcionava desde julho do ano passado no endereço onde hoje está localizada uma das firmas do empresário Benedito Rodrigues Oliveira.

No endereço eletrônico (comunicadoimprensa.com.br), há cópia do termo de encerramento do contrato de aluguel da sala, datado de 20 de julho de 2014 e assinado pela Rafael Souza 

Empreendimentos Imobiliários. “A Oli Comunicação nunca dividiu seu endereço comercial com qualquer outra empresa. O documento abaixo registra o fim do contrato de locação no edifício Brasil 21, em Brasília, em 20 de julho de 2014. A imobiliária Rafael Souza Empreendimentos Imobiliários foi a responsável pelo contrato de locação. A outra empresa apontada pela investigação passa a ocupar o imóvel apenas no dia 28 de agosto, conforme alteração contratual registrada na junta comercial. O documento consta nos autos do processo”, diz o texto, que apresenta o documento.

Mercado já trabalha com juros acima de 14% com viés de alta

• De acordo com pesquisa do BC, o mercado espera aumento de 0,50 ponto porcentual, para 13,75%

- Brasil Econômico

A taxa básica de juros, a Selic, deve subir pela sexta vez seguida, amanhã. A estimativa é de analistas do mercado financeiro ouvidos pela Pesquisa Focus do banco Central (BC), que projetam mais uma alta de 0,5 ponto percentual, com a taxa indo a 13,75% ao ano. Para o final de 2015, a expectativa é de que a Selic esteja em 14% ao ano. A reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), responsável por definir a Selic, começa hoje e termina amanhã, dia 3. 

As elevações da Selic são tentativas do BC de conter a inflação, que deve estourar o teto da meta para o ano. A meta de inflação é 4,5%, com margem de dois pontos percentuais para mais ou para menos. Na avaliação dos analistas ouvidos pelo BC, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deve chegar a 8,39%, em 2015. Essa projeção sobe há sete semanas seguidas. Na semana passada, estava em 8,37%. A projeção do próprio BC indica inflação este ano acima da meta, em 7,9%. Para o Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGPDI) a expectativa permanece em 7,03%, este ano, e em 5,50%, em 2016.

Para o Índice Geral de Preços - Mercado (IGP-M), passou de 6,97% para 6,87%, este ano, e segue em 5,50%, em 2016. Já produção industrial deve encolher 2,80% em 2015 - mesma projeção da semana anterior. Para 2016, as apostas de expansão para a indústria seguem em 1,50% há oito semanas consecutivas. 

Para o mercado financeiro, a economia deve ter retração de 1,27%, este ano. A estimativa anterior para o Produto Interno Bruto (PIB) estava em queda de 1,24%. Essa foi a segunda piora consecutiva na projeção. Os analistas esperam que a relação entre a dívida líquida do setor público e o PIB encerre 2015 em 37,90%, mesmo patamar da edição anterior do boletim Focus. Um mês antes estava em 38,00%. Para 2016, as expectativas ficaram em 38,50% como na semana anterior. Um mês antes, estavam em 38,70%. A pesquisa do BC também mostra que dólar deve chegar a R$ 3,20 no final do ano e a R$ 3,30 no fim de 2016. ABr

Lula e PT pressionam Dilma a não vetar mudança no fator previdenciário

• Governo criou comitê para propor alternativa ao sistema atual e encontrar justificativa para o veto

Fernanda Krakovics – O Globo

BRASÍLIA - Emparedado entre a defesa do governo e de sua base social, no momento em que enfrenta baixa popularidade e mais um escândalo de corrupção, o PT deu apoio com ressalvas ao ajuste fiscal proposto pela presidente Dilma Rousseff. O partido marcou posição com críticas feitas em documentos oficiais, apresentação de emendas por deputados e senadores, mas, no final, votou majoritariamente a favor da restrição de benefícios trabalhistas e previdenciários, depois que foram feitas mudanças que atenuaram o texto original das Medidas Provisórias.

Agora, o ex-presidente Lula e o PT pressionam a presidente Dilma a não vetar a flexibilização do fator previdenciário, incluído pelo Congresso, argumentando que é preciso fazer um aceno para a base social do partido. O governo criou um comitê para propor uma alternativa ao sistema de aposentadoria atualmente em vigor. O objetivo é encontrar uma saída política que justifique o veto.

— Defendi que incluíssemos no texto que a cada cinco anos fosse corrigido o 85/95, de acordo com a expectativa de vida da população, mas o governo não quis, não queria que fosse aprovado nada. Se ela (Dilma) simplesmente vetar, o veto vai ser derrubado aqui — disse o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), que foi relator da Medida Provisória 664, que mudou as regras para aposentadoria, pagamento de pensões por morte e auxílio-doença.

A fórmula 85/95 acaba com os descontos na aposentadoria para aqueles cuja soma do tempo de contribuição com a idade seja 85 anos, no caso das mulheres; e 95 anos, dos homens. O governo estuda tornar essa fórmula flexível, corrigindo-a de acordo com a expectativa de vida da população.

O discurso do PT é que o Congresso, com a contribuição do partido, melhorou o ajuste fiscal enviado pelo governo, que, segundo os petistas, penalizava só “o andar de baixo”. O PT utilizou esse debate para tentar se reaproximar de sua base social e ressuscitar bandeiras históricas como a taxação de grandes fortunas. Em meio a essa queda de braço, os petistas ficaram satisfeitos com o aumento da taxação sobre os bancos feita pelo governo durante as negociações do ajuste fiscal.

— O ajuste foi aprovado com as mudanças que a Câmara fez e o Senado confirmou. A CUT (Central Única dos Trabalhadores) não queria que aprovasse nada, mas a Câmara aprovou um texto que tem mais ganhos do que perdas para o trabalhador. O 85/95 não é ganho? — questionou Zarattini.

Até o líder do governo no Congresso, senador José Pimentel (PT-CE), que já foi ministro da Previdência, defendeu a flexibilização do fator previdenciário, que reduz o benefício conforme aumenta a expectativa de vida. O custo estimado dessa mudança, caso seja sancionada pela presidente Dilma, vai ser de R$ 40,6 bilhões em dez anos e de R$ 2,5 trilhões em 35 anos.

Também ex-ministro da Previdência, o senador Garibaldi Alves (PMDB-RN) manifestou opinião diferente durante a votação da MP 664:

— No mundo inteiro são pouquíssimos os países, é coisa de se contar nos dedos, onde não há a idade mínima. Esse fator, isso que estamos discutindo aqui é uma herança, porque nós queremos ser mais realistas do que o rei. Não temos a idade mínima e apelamos para esses subterfúgios.

Ao contrário do que houve na reforma da Previdência promovida no início do governo Lula, desta vez o PT não vai punir os que votaram contra o ajuste fiscal promovido pelo governo. Na Câmara, dos 64 deputados petistas, 55 participaram da votação da Medida Provisória que restringiu o acesso ao seguro-desemprego e só um votou contra.

No Senado, a bancada do PT deu orientação favorável às Medidas Provisórias, mas não fechou questão. Os senadores PauloPaim (RS), que tem como plataforma de seu mandato a defesa dos aposentados; Walter Pinheiro (BA) e Lindbergh Farias (RJ) votaram contra.

Lindbergh, que chegou a defender a demissão do ministro Joaquim Levy (Fazenda), aproveitou o debate do ajuste fiscal para tentar fortalecer a ala desenvolvimentista do governo, no caso o ministro Nelson Barbosa (Planejamento). A presidente Dilma não gostou e rebateu afirmando que não há divergências na equipe econômica.

— Não dá mais para fazer discussão de política econômica intramuros. Queremos que o governo dê certo. A saída é crescimento econômico —disse Lindbergh.

O senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) acusou a base do governo de fugir do debate sobre o ajuste fiscal:

— Nós não vimos o governo discutir a (MP) 665 hora alguma. É impressionante, não vi um orador para defender a 665 na tribuna. Então, é jogo subterrâneo. Eles têm uma maioria impressionante, uma maioria que não tem coragem de assumir a tribuna para defender aquilo em que estão votando favoravelmente — afirmou Caiado, em referência à MP que restringiu o acesso ao seguro-desemprego e ao abono salarial.

Assessor da liderança do governo no Congresso, o ex-senador João Pedro (PT-AM) minimizou a atuação de seu partido na discussão das medidas do ajuste:

— O que importa é que votou. É um remédio amargo, mas a oposição não está de brincadeira, quer atingir o governo, o PT e o Lula — disse