sexta-feira, 2 de outubro de 2015

César Felício - Velhas ferramentas, sempre disponíveis

• De crise em crise, subsiste a mesma moeda de troca

- Valor Econômico

Em meio a mais uma reforma ministerial, o deputado Miro Teixeira, parlamentar desde 1970, exceto por uma legislatura, comentava sobre o caráter circular da política. A roda da história gira lentamente, e no fundo subsiste a monotonia no vendaval constante.

Em 1993 o então governador do Rio de Janeiro Leonel Brizola estava diante de um problema: um escândalo na Secretaria de Saúde comprometia a imagem de sua administração e poderia levar à rejeição de suas contas de governo. A Assembleia Legislativa do Rio era presidida por um desafeto: o deputado José Nader, expulso do PDT no primeiro ano de gestão brizolista. Nader era uma figura cercada por suspeitas, que detinha um poder obscuro sobre um grupo de cerca de 30 deputados estaduais.

Chamado de caudilho até por aliados incondicionais, Brizola se notabilizou em seis décadas de atividade política pela tática do confronto e de ir ao limite da extrema tensão. Uma de suas biografias recentes mostra em sua capa uma foto do político sorridente, pulando sobre uma fogueira acesa. Naquele momento do embate com Nader, Brizola cedeu. Montou um governo de coalizão e doou exatamente a Secretaria de Saúde para o grupo influenciado por Nader. As contas terminaram aprovadas.

A Secretaria da Saúde entrou no bazar da negociação política no momento em que se estruturava no país o Sistema Único de Saúde, com problemas complexos como o da estadualização de hospitais federais, entre outros. Brizola preservou-se do ponto de vista institucional, mas sua gestão na área foi um dos vetores para a redução do seu prestígio no Estado, já na eleição de 1994.

O então presidente da Assembleia não fazia parte da oposição ao brizolismo, tampouco era aliado. Era um "independente", líder de um dos "centrões" da vida parlamentar, que sempre se formam diante de governantes que, por uma razão ou outra, se mostram frágeis. São caciques que tomam de assalto a máquina legislativa, em troca de favores comezinhos ou da viabilização de campanhas eleitorais.

Brizolista militante à época, Dilma Rousseff se viu na contingência de entregar o Ministério da Saúde ao PMDB, em uma reforma ministerial que tem como mantra o bloqueio do impeachment, tese que pode ser vitaminada caso as contas de 2014 sejam rejeitadas pelo TCU.

A Suíça tornou nebuloso o destino do deputado Eduardo Cunha, dirigente de um clube que não tem 30, mas 200 deputados. Até o momento em que se confirmou que o Ministério Público da Suíça o investiga, o grupo influenciado pelo parlamentar estava garantido à frente da pasta que cuida da área apontada como o principal problema do país pela maioria dos brasileiros.

Ainda é Cunha que pode despachar o pedido de impeachment assinado por Hélio Bicudo e patrocinado pela oposição nos próximos dias, como promete.

As relações pessoais construídas pelo presidente da Câmara entre seus pares lhe dão força suficiente para testar a blindagem contra cargas pesadas de artilharia. Mas seu cacife como um líder capaz de dar segurança institucional a Dilma pode diminuir com a correspondência que está chegando à Procuradoria-Geral da República.

Assim pelo menos pensa um líder pemedebista mais próximo ao Planalto. "No PMDB ninguém manda em ninguém", frisa esta liderança, que observa que a multiplicação de pastas pode ser mais um gesto tardio de Dilma. O novo ministro da Saúde, Marcelo de Castro (PI), era tido como aliado fiel até sua rebeldia contra Cunha na discussão da reforma política. Mas o presidente da Câmara não o vetou no momento em que se tornou um dos indicados da bancada. Indissociavelmente ligado a Cunha é o novo ministro da Ciência e Tecnologia, Celso Pansera, acusado na CPI da Petrobras pelo doleiro Alberto Youssef de ser um "pau mandado".

A manobra de Dilma em direção ao PMDB não difere essencialmente em seus propósitos de outra negociação, a de meados de 2005, na sequência do escândalo do mensalão, que teve a própria presidente como atriz coadjuvante. Na ocasião, José Dirceu foi forçado a abandonar a Casa Civil e substituído por Dilma, que estava no Ministério de Minas e Energia. Lula entregou a pasta que Dilma comandava ao PMDB do Maranhão, na figura de Silas Rondeau.

A crise política do mensalão ainda pioraria muito mais nas semanas subsequentes, mas o governo federal teve força suficiente para eleger Aldo Rebelo presidente da Câmara em setembro daquele ano, quando Severino Cavalcante teve que renunciar às pressas. O impeachment tornou-se uma hipótese descartada a partir daquele momento.

Curioso é notar que, na reformulação ministerial feita por Lula, o então presidente substituiu o petista Humberto Costa para entregar ao PMDB, na pessoa do deputado Saraiva Felipe, o Ministério da Saúde, espécie de moeda preferencial de troca em situações de apuro.

O traço distintivo entre a transação de agora e as feitas no governo do Rio nos anos 90 e na Presidência há dez anos é o calendário eleitoral. Vivia-se nas outras situações a perspectiva de uma eleição geral a se realizar no ano seguinte, em que a participação no governo garantia não apenas sua continuidade, mas a perspectiva de uma aliança eleitoral futura.

Uma mudança no primeiro ano do governo se justifica quando a conformação de forças que garantiu a eleição deixa de valer. A crise econômica, disputas de poder entre aliados e escândalos pontuais fizeram Fernando Henrique trocar os titulares de sete ministérios no sétimo mês de seu segundo mandato, em 1999. Mas o presidente era um eixo de poder: havia conseguido conter a tentativa da oposição de articular seu impeachment, semanas antes, e procurava reforçar o PSDB no Executivo, ante a disputa entre o PFL e PMDB pelo Legislativo.

Mais do que seus antecessores, Dilma depende do grupo pendular presente em todo Congresso. Coube à presidente mais avessa ao meio político e partidário da história recente brasileira mergulhar tão fundo como os outros nos desvãos do Parlamento.

Míriam Leitão - Preso na armadilha

- O Globo

A análise dos números do Tesouro Nacional divulgados esta semana mostra que o governo está numa armadilha difícil de sair. Há as dificuldades estruturais, as da recessão, e aquelas criadas pelas decisões tomadas no primeiro mandato. Receitas que o governo havia antecipado agora fazem falta aos cofres públicos. O corte de 37% no investimento este ano torna o ajuste de 2016 ainda mais incerto.

De janeiro a agosto do ano passado, o BNDES recolheu R$ 8,6 bilhões ao Tesouro como dividendo. Este ano, não pagou nada porque depois de vários anos antecipando receitas o banco não teve o que recolher. A Petrobras, que era outra fonte de antecipações de recursos ao Tesouro, não está pagando a nenhum acionista. O resultado é que as estatais, que nos oito primeiros meses do ano passado engordaram os cofres em R$ 17,5 bilhões, corrigidos pela inflação, este ano recolheram apenas R$ 5,4 bilhões.

O economista Mansueto Almeida acha que o governo não conseguirá continuar reduzindo investimentos. Este ano já cortou bastante e não poderá simplesmente zerar esse gasto. Isso torna mais difícil o ajuste fiscal no ano que vem, porque as despesas que tiveram a maior contração em 2015 não poderão mais continuar encolhendo.

O Ministério da Saúde cortou R$ 3,2 bilhões de despesas de janeiro a agosto, na comparação com o mesmo período do ano passado, em termos reais. A tesoura no Ministério da Educação foi maior: corte de R$ 4,3 bi. Os investimentos do Governo Federal, que já são baixos, caíram mais 37%, com uma redução de R$ 22 bilhões. O Ministério das Cidades cortou R$ 2,83 bilhões em investimentos, o dos Transportes reduziu em R$ 1,99 bi, e a Educação, em R$ 2,88 bilhões.

O Programa Minha Casa, Minha Vida, que financia moradias populares, ficou mais magro, assim como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Em ambos, o governo gastou R$ 23 bilhões a menos este ano. Já as despesas de custeio da máquina pública subiram R$ 4,2 bilhões por causa das desonerações da folha de pagamento.

Ao mesmo tempo, a conta de subsídios dados em anos anteriores chegou muito pesada. Os gastos com o Programa de Sustentação do Investimento, que ficaram congelados por 24 meses por conta de uma determinação do então secretário-executivo da Fazenda Nelson Barbosa, em 2012, estão disparando. Subiram R$ 7,3 bilhões este ano. A equalização de crédito agropecuário subiu R$ 1 bilhão. Ou seja, houve desembolso para reduzir os juros de empréstimos subsidiados para agricultura em anos anteriores. A mesma coisa acontece com a rubrica “Operações de Crédito e Reordenamento de Passivos”, que subiu R$ 13 bilhões. Tudo isso é conta antiga, do primeiro mandato, que está sendo paga no governo Dilma II. O governo está “despedalando”, depois de ter empurrado despesas e puxado receitas. Além disso, distribuiu subsídios cuja conta pesa agora.

O buraco fiscal que o governo cavou tem quatro elementos: há despesas do primeiro mandato que estão sendo pagas agora; há perdas de receitas porque elas foram antecipadas; há a queda da arrecadação que acontece em toda recessão; há os rombos estruturais que ficaram ainda maiores com decisões tomadas nos últimos anos, como as que se referem à Previdência. Por ação ou omissão, o governo piorou o que já era difícil, e o país está vendo uma escalada do déficit previdenciário.

Alguns problemas pioram a contabilidade pública, como os swaps cambiais, mecanismo através do qual o Banco Central oferece seguro contra a variação cambial. O gasto com os swaps entra no déficit nominal, mas o ganho das reservas só é contabilizado na dívida líquida — indicador do qual desconta-se da dívida os ativos que o país tem. O problema é que ninguém mais olha esse indicador porque o governo o desmoralizou ao incluir como ativos os empréstimos de baixa liquidez como os feitos ao BNDES.

Mansueto Almeida acha que é muito difícil reequilibrar as contas a curto prazo sem recriar a CPMF. Apesar de todos os problemas, ele se diz mais otimista hoje do que no ano passado porque acredita que agora o debate sobre a necessidade de medidas estruturais evoluiu no Brasil. Neste momento, no entanto, ele admite que qualquer proposta que dependa de consenso político para cortes profundos não conseguirá avançar.

Vinicius Torres Freire - Cada dia, sua batalha, perdida

• Mesmo com reforma ministerial, tumulto político e, pois, financeiro arde em outras frentes

- Folha de S. Paulo

Cada dia de ontem tem parecido um passado muito remoto. Faz uns dez dias, o governo mandou ao Congresso seu plano de recriar a CPMF, que levantaria metade do dinheiro do pacote fiscal do desespero, anunciado não faz nem três semanas. Em que pé está a tramitação da CPMF? "Por aqui, nada está dando pé, a pororoca está levando tudo", dizia um líder parlamentar petista e ainda governista (sic).

Na quarta-feira, em tese chegou-se ao arranjo de abdicação por meio do qual Dilma Rousseff teria abdicado parcial e explicitamente de seus poderes em troca da postergação da guilhotina. O acordão deve ser anunciado e promulgado hoje. Nesse ínterim, passou-se uma eternidade política, judicial e policial.

Antes de mais nada, não se sabia se os termos do contrato de concessão parcial mais imensa do governo ao PMDB incluía a cláusula de apoio aos vetos presidenciais a aumento de gastos lunáticos e menos ainda ao pacote de remendo fiscal de emergência. Agora, a incerteza parece ainda maior.

Considere-se o dia de ontem.

Primeiro, não se sabe o que será do comando e do ritmo dos trabalhos da Câmara, dado que seu presidente, Eduardo Cunha (PMDB), está à beira de ser acusado de evasão de divisas, sonegação fiscal, lavagem de dinheiro, corrupção e, parece menos importante mas não deveria, de ter mentido a uma CPI sobre o fato de ter contas no exterior, contas suas e de sua família, segundo promotores suíços. No caso de haver confirmação das contas suíças, Cunha será lentamente escanteado ou vai se imolar, se explodir feito um homem-bomba, no meio do Congresso?

Segundo, um terço dos deputados federais do PMDB afirmaram ontem que não ratificam o acordão com Dilma Rousseff, ao contrário, até. Isto é, ainda que a divisão peemedebista continue um empecilho ao impeachment, há grande risco de volta ao caos financeiro visto na semana passada, pânico que poderia ser revivido em caso de derrotas do governo na aprovação dos remendos mínimos das contas públicas.

Terceiro, policiais e procuradores chegam cada vez mais perto da família de Lula da Silva e dos rolos do financiamento da campanha eleitoral de Dilma. O que se passa no caso de prisão de um filho de Lula?

Quarto, está confirmado que o governo não vai conseguir privatizar os negócios de seguros da Caixa Econômica Federal. Seriam apenas alguns "poucos" bilhões em impostos, mas o governo está catando moedas no fundo de gavetas e no bolso de casacos a fim de reduzir seu deficit. Pelo jeito, fica para as calendas também a venda da resseguradora IRB. Mais importante, fica ainda mais nebulosa a possibilidade de levantar dinheiro com outras privatizações e concessões.

Quinto, soube-se nesta semana que é remota a hipótese de o governo atingir mesmo sua minimeta de superavit primário para 2015, dados os números de receitas e despesas de agosto. A julgar pelos resultados de vendas e produção, as perspectivas da arrecadação ordinária daqui ao fim do ano parecem ainda piores. Soube-se ontem que a venda de veículos continua a cair cada vez mais rápido, tendo decrescido 22,7% até setembro (em relação a igual período do ano anterior).

Sim, estamos falando apenas dos problemas novos de ontem.

Claudia Safatle - Ambiguidade alimenta incertezas

• Em nove meses houve consertos e avanços importantes

- Valor Econômico

Nove meses de notícias ruins na economia e na política, cuja degradação do governo Dilma Rousseff é a face visível da crise em que o país se meteu, dificultam um olhar desapaixonado sobre o que foi feito nesse período e que, em condições normais, estaria ajudando a economia a se reerguer. Nem tudo é tragédia. Houve consertos importantes da pesada herança recebida do primeiro mandato de Dilma.

A depreciação da taxa de câmbio no ano se equipara a uma maxidesvalorização do real frente ao dólar. A última cotação (Ptax) de 2014 foi de R$ 2,65 e ontem fechou a R$ 3,97. A moeda doméstica teve depreciação de 33,25% entre dezembro do ano passado e ontem. Com esse preço o país ficou barato e as importações se tornaram proibitivas, o que resulta em um rápido ajuste das contas externas.

Os preços monitorados de energia, gasolina, diesel e transportes urbanos, entre outros, que foram represados até 2014 para segurar a inflação, se encontram hoje alinhados, ainda que tenham levado a inflação para quase 10% em 12 meses e a taxa de básica de juros para 14,25% ao ano.

A desastrada reforma do setor elétrico, que custou ao país mais de R$ 100 bilhões, foi parar na conta de luz do consumidor, que teve aumento, este ano, de mais de 50%. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, promoveu um choque de preços para recuperar as defasagens. O reajuste da gasolina e do diesel, esta semana, seria uma demonstração de que haverá "realismo tarifário", segundo fontes oficiais.

A Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) - referência para os empréstimos do BNDES - após ficar estacionada em 5% ao ano em 2013 e 2014, teve quatro aumentos e é de 7% ao ano. Reduziu-se, assim, o tamanho do subsídio com o qual o Tesouro Nacional tem que arcar.

Uma das principais batalhas de Levy foi estancar a sangria de recursos do Tesouro Nacional para o BNDES emprestar a juros módicos. Foram transferidos R$ 571 bilhões para os bancos públicos, de acordo com o Banco Central. Desse total, o BNDES recebeu R$ 516,9 bilhões, cujos empréstimos vão, por anos, gerar uma conta exorbitante em subsídios.

O Programa de Sustentação do Investimento (PSI), que absorveu boa parte dos recursos do BNDES, passou por uma revisão geral no início do ano. A taxa média para as operações contratadas a partir de janeiro subiu de 3,93% para 7,93% ao ano. Eliminou-se, assim, o custo decorrente da equalização de taxa de juros. Foram aprovadas as medidas que restringiram o acesso ao abono salarial, ao seguro-desemprego e a pensão por morte, que cresciam aceleradamente e sem justificativa razoável.

A desoneracão da folha de salário para 56 setores da economia, que tornou-se permanente no ano passado como medida puramente eleitoral, teve que ser revista. Seu custo, como ficou claro, é totalmente desproporcional aos supostos benefícios.

O governo melhorou as taxas de retorno das concessões e ampliou o seu alcance; iniciou as conversas para um acordo comercial com o México, em um passo na direção de maior abertura da economia; e colocou ordem nos programas educacionais como Fies, Ciência sem Fronteiras e Pronatec. Até então esses programas não tinham um orçamento definido nem controles sobre o crescimento da despesa. Atendia-se à demanda.

A faxina promovida nas "pedaladas" das contas do Tesouro de janeiro para cá é notável. Até agosto foram pagos R$ 20,07 bilhões em subsídios e subvenções, sendo R$ 7,498 bilhões por conta do PSI. De janeiro a agosto de 2014, a Fazenda pagou apenas R$ 6,78 bilhões dessa despesa, sendo que, do total, somente R$ 117,2 milhões eram relacionados ao PSI.

No ano passado o Tesouro Nacional estava se apropriando de parte da complementação do FGTS, tanto que só repassou para o fundo R$ 439,4 milhões entre janeiro e agosto. No mesmo período de 2015, o repasse ao FGTS atingiu R$ 4,01 bilhões.

O total da despesa conhecida com a regularização dos pagamentos é de R$ 16,86 bilhões, ou 0,29% do PIB (estimado em R$ 5,797 trilhões). Esse montante é superior ao déficit primário de R$ 14,884 bilhões do governo central de janeiro a agosto. Haveria um pequeno superávit primário se o Tesouro não tivesse regularizado o fluxo de despesas.

Nem tudo, portanto, foi derrota. Avanços relevantes, embora insuficientes, foram obtidos mesmo diante de uma forte recessão que fez as receitas da União minguarem 4,8%, em termos reais. Falta, no entanto, parte importante do ajuste. Não há clareza sobre a trajetória da dívida/PIB nos próximos anos nem certeza de que o governo, que começou concordando com o programa do ministro da Fazenda, persistirá nesse caminho, ou se desviará dele.

Foram muitos os ruídos na direção da política fiscal, idas e vindas, mudanças de metas e a tormenta política que não deu trégua desde a abertura do ano legislativo, em fevereiro. Sem clareza de rumos, a confiança não veio e a recessão se aprofundou.

Nesse momento, o debate sobre buscar atalhos para o crescimento econômico está presente. Mesmo depois da experiência decepcionante que foi a política econômica de 2012 para cá, quando o "desenvolvimentismo" testou seu receituário e levou o país à crise de hoje.

Lula, que conduz as negociações da reforma ministerial em busca de apoio contra o "impeachment" de Dilma, no seu discurso dúbio estimula as incertezas. Fala em expansão do crédito e do consumo para o país sair da recessão. Como se as famílias já não estivessem por demais endividadas e os bancos públicos, usados como instrumento de oferta de crédito nos anos passados, já não estivessem transbordando os seus limites.

Foram as divergências na área econômica do governo e a indisposição do Congresso em garantir o ajuste para 2016 que levaram o país a perder o grau de investimento, segundo decisão da Standard & Poor's. O risco de as demais agências de rating fazerem o mesmo continua. O país não sairá do atoleiro enquanto prevalecer a ambiguidade.

Lula volta a ser ‘o cara’ – Editorial / O Estado de S. Paulo

Tudo indica que Lula da Silva conseguiu finalmente subjugar sua criatura e assumir o comando político do governo. Não chega a surpreender, diante da mais do que comprovada incompetência política de Dilma Rousseff, que vinha comprometendo o futuro de seu frustrado preceptor e do PT. Assim, volta ao proscênio da política nacional o maior responsável pela crise política, econômica e moral que infelicita o País.

Quanto mais em evidência estiver, tanto mais serão cobradas de Lula explicações sobre seu papel no mar de lama que inundou a administração pública federal sob seu comando direto e, depois, sob o desgoverno do poste que inventou para, deliberadamente, desmoralizar as instituições e o regime. A notícia revelada ontem com exclusividade pelo Estado, de que o governo Lula estaria envolvido num cabuloso esquema de lobby para favorecer a indústria automobilística com a edição, em 2009, de MP que prorrogou o desconto do IPI sobre veículos, é apenas mais um elemento a fortalecer a evidência de que o então presidente da República, a exemplo de José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares, tem explicações a dar à Justiça e ao País. Até porque aponta um dedo acusador para Lula a recomendação de que quem enriquece na política deve ser observado sempre com alguma desconfiança.

A partir de agora Lula deixa de ser apenas um líder partidário generosamente determinado a dar sua contribuição para tirar o Brasil do buraco para se tornar o protagonista da ação governamental. Ninguém mais se dará ao trabalho de cobrar soluções para a crise de uma presidente da República que foi forçada a abdicar de seu poder político, que transferiu em comodato. Agora mandam Lula e as raposas peludas do PMDB, por intermédio de homens de confiança colocados em postos-chave do governo. É claro que, por uma questão até de bons modos, a Dilma será sempre oferecida a opção de concordar com as medidas adotadas pelo governo que ela não pode mais chamar de seu. E o que isso significa?

A julgar pelo que o dono do PT tem dito a interlocutores e proclamado ao distinto público, é preciso impor rapidamente uma “agenda positiva” para o governo, o que significa, na linguagem lulopetista, dizer coisas que as pessoas gostam de ouvir. Lula deve continuar imaginando que o brasileiro é idiota. Como ainda não inventou nada de novo e interessante para anunciar, gastou todo o tempo de uma inserção publicitária do PT na TV dias atrás jactando-se de ter tirado o Brasil do “mapa da miséria da ONU”, de ter promovido à classe média “mais de 40 milhões de brasileiros” e criado fantásticos programas sociais. O que havia de verdade em toda essa jactância populista está se dissipando com a crise, pois o que Lula e Dilma fizeram foi assistencialismo elementar, sem as medidas adicionais que de fato promovem a ascensão social. Um discurso populista requentado não renderá aplausos.

Pior é o fato de que, para manter coerência com a determinação de criar uma “agenda positiva”, será necessário reduzir ao mínimo as medidas de austeridade do ajuste fiscal, quase todas elas impopulares. Isso acabará inviabilizando o ajuste, que é precondição para a adoção de qualquer medida eficaz para a retomada do crescimento econômico. Pois o que o chefão do PT está propondo é a pura e simples repetição da “nova matriz econômica” que funcionou enquanto o Brasil surfava nas águas tranquilas da bonança econômica mundial. Uma fórmula cuja overdose acabou resultando na crise que colocou a economia brasileira na beira do precipício.

O estado atual da economia não permite que o “novo governo” vá simplesmente empurrando a situação com a barriga. Diante da enorme incoerência representada pela promessa de conciliar o inconciliável, a pergunta inevitável é a seguinte: afinal, o que Lula tem de fato em mente? Agravar um impasse que, no limite, o libere para chutar o balde, botar toda a culpa em Dilma e no PMDB e virar oposição? É razoável supor que ele tenha fortes razões pessoais para obter as imunidades que imagina devidas a um salvador da Pátria. De quebra, presidiria o País, de novo, a partir de 2018. Que os céus nos protejam!

Cunha frágil ajuda Dilma, mas não é solução milagrosa – Editorial / O Globo

• A confirmação de que o presidente da Câmara tem contas na Suíça o enfraquece, e assim o governo pode cooptar baixo clero do PMDB sem maiores dificuldades

Deve-se reconhecer o esforço da presidente Dilma em defender o mandato, diante do cerco que lhe move a junção explosiva das crises econômica e política. Ficou para trás a catatonia das primeiras semanas do segundo mandato, quando se trancou em Palácio enquanto as pesquisas de opinião e redes sociais anunciavam o desmoronamento de sua popularidade.

A comparação entre as adesões a manifestações de rua contra sua permanência no Planalto e a passeatas de organizações ditas sociais não lhe foi favorável. As primeiras eram maiores. E a isso acrescentava-se o fato de os presidentes do Senado e da Câmara, Renan Calheiros (AL) e Eduardo Cunha (RJ), funcionarem como ponta de lança de um PMDB rebelado.

Os nomes dos dois foram encaminhados ao Supremo pela Procuradoria-Geral da República, para a abertura de inquéritos com base na Lava-Jato. Mas, à medida que o tempo passava, denúncias contra Cunha, feitas em delações premiadas, começaram a parecer bem consistentes, ao mesmo tempo em que Renan ensaiava uma reaproximação com o Planalto.

O presidente da Câmara se autodeclarou na “oposição”, Renan aposentou a postura de rebeldia e na quarta-feira divulgou-se a informação de que procuradores da Suíça descobriram contas bancárias em nome de Eduardo Cunha e familiares, cujos dados foram repassados ao Ministério Público brasileiro.

A fragilização de Cunha pode ter ajudado Dilma enquanto ela e Lula faziam os últimos acertos de uma reforma ministerial usada para, entre outros fins, atrair o baixo clero do PMDB, por meio de Leonardo Picciani (RJ), líder do PMDB na Câmara. A cooptação fisiológica deve vir a ser facilitada com Eduardo Cunha na defensiva.

Na sessão de ontem, o presidente da Câmara foi questionado por deputados sobre as tais contas. Nada respondeu, e o assunto deve ser levado à Comissão de Ética. Pode ser o primeiro passo de um processo que leve Eduardo Cunha a sair da presidência da Casa.

Será uma atitude coerente com seu estilo agressivo, se ele, como prometera, der sequência a pedidos de impeachment de Dilma que se encontram na gaveta. Se ele rejeitá-los, qualquer deputado poderá recorrer, para que o plenário decida. Mas Dilma, adulando baixos cleros, não apenas peemedebistas, poderá erguer a barreira anti-impeachment que pretende com esta reforma ministerial. Assim como para derrubar a rejeição pelo TCU das contas do último ano do primeiro mandato, 2014.

Dilma, porém, continua obrigada a propor ao Congresso as armas para enfrentar a grave crise econômica que apenas se forma. Se insistir em recriar a CPMF, em não fazer as reformas necessárias para conter o crescimento descontrolado de despesas, de nada terá adiantado reativar o fisiologismo na troca de ministros. Nem ter tido a sorte de Eduardo Cunha ser alvejado em pleno voo.

Dilma é uma unanimidade – Editorial / O Estado de S. Paulo

A mais recente pesquisa do Ibope para medir a popularidade da presidente Dilma Rousseff confirma que a alta rejeição à petista está consolidada em todos os quadrantes do País e em todas as faixas etárias e socioeconômicas. Já não se trata de um efeito do estelionato eleitoral cometido por Dilma, ao mentir descaradamente na campanha que a reelegeu. Passados nove meses desde sua posse, pode-se dizer que a opinião majoritária dos brasileiros acerca de seu desempenho se deve à percepção de que o governo foi entregue a uma amadora, incapaz de conduzir o País em meio à tormenta política e econômica criada em grande parte por sua extraordinária incompetência.

A popularidade de Dilma manteve-se estável entre junho e setembro, segundo o levantamento do Ibope, feito por encomenda da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Dos entrevistados, apenas 10% consideram o governo da petista “ótimo” ou “bom” – eram 9% em junho. Já aqueles que julgam o governo “ruim” ou “péssimo” subiram de 68% para 69% – embora a variação tenha ficado dentro da margem de erro, esse porcentual dos que rejeitam Dilma é inédito nos 27 anos em que essa pesquisa é realizada. Todos os demais indicadores também não tiveram alterações significativas entre as duas sondagens. A desaprovação do modo como Dilma governa está em 82%, enquanto 77% dizem não confiar na presidente.

A pesquisa foi realizada entre os dias 18 e 21 de setembro e já captou o clima de insegurança gerado pelo rebaixamento da nota de crédito do Brasil pela agência de classificação de risco Standard & Poor’s. Além disso, as entrevistas foram feitas sob o impacto da proposta de retorno da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), tábua de salvação de um governo que não consegue fechar as contas sem esfolar ainda mais o contribuinte. Ou seja, as dúvidas sobre a incúria de Dilma transformaram-se em certezas diante desses e de outros fatos que atestam a falência, inclusive moral, do governo da petista. A pesquisa só faz corroborar o ar de fim de feira que há meses emana do Planalto.

Não é à toa que chegam a 90% os que desaprovam a política de impostos de Dilma, fazendo desta a área com pior avaliação de seu governo, exatamente com o mesmo porcentual nas três últimas pesquisas. Em seguida vem a política de juros, com 89% de desaprovação. Também receberam muitas menções negativas a saúde (84%), o combate ao desemprego (83%), o combate à inflação (83%) e a educação (73%).

As áreas em que Dilma consegue desempenho um pouco melhor são justamente aquelas sobre as quais o marketing petista tanto martelou nos últimos anos. Para 29% dos entrevistados, Dilma vai bem no combate à fome e à pobreza, ainda que não se saiba, exatamente, como a inflação em disparada e o desemprego crescente, obras incontestáveis do governo Dilma, possam ser úteis para ajudar a enfrentar a miséria. No entanto, são cada vez menos encontradiços aqueles que ainda caem na esparrela da “justiça social” petista: saltaram de 34% em 2012 para 68% agora aqueles que criticam o governo de Dilma também nessa área.

Assim, na opinião quase unânime dos brasileiros, pouco se salva de uma administração fadada a passar à história nacional como a mais inepta de todos os tempos. Mesmo entre aqueles que votaram em Dilma, 62% dizem não confiar na presidente – eram 15% em dezembro de 2014, quando a petista ainda desfrutava das glórias de sua vitória. Também entre os eleitores da presidente, 70% desaprovam sua maneira de governar, ante 14% em dezembro.

A perspectiva para o restante de seu mandato é coerente com esse clima sombrio. Para 82% dos entrevistados, o segundo governo de Dilma está sendo pior do que o primeiro – e nada menos que 62% consideram que os próximos três anos, se a petista conseguir chegar até lá, serão de suplício.

Chacrinha: Stepan percorre o Brasil

Por: William Passos

Quase oito meses após deixar a Câmara dos Deputados, Stepan Nercessian volta a Brasília. Mas não vem para ocupar nenhum cargo público, também não participará de nenhuma atividade partidária. Ele é filiado ao PPS desde a época do PCB, o “velho partidão”. Nercessian chega aos palcos da capital federal para apresentar Chacrinha, o musical. O ator interpreta o Velho Guerreiro e estará no Net Live Brasília nos dias 09, 10 e 11 de outubro.

Depois do sucesso de público e de crítica nas apresentações ocorridas no Rio e em São Paulo, o espetáculo fará uma turnê pelo país. E antes de chegar a Brasília, o espetáculo passa por Recife a partir de hoeje. Veja calendário abaixo.

Há menos de 20 dias antes do desembarque no Distrito Federal, Stepan brinca com as semelhanças entre o personagem que interpreta e o que têm feito alguns no cenário político nacional.

“No palco mais importante da politica brasileira, volto como Chacrinha e fazendo o que muitos na política têm feito: ‘Eu vim para confundir e não para explicar”, ironiza o ex-parlamentar, parafraseando o próprio Chacrinha.

Em cena, Nercessian resgata os velhos bordões daquele que é considerado um dos maiores comunicadores que o país já teve. “Alô Terezinha” e “Quem não comunica se trumbica“ são apenas algumas das frases que ele levará ao palco, além de uma interação permanente com a plateia.

O musical é dirigido por Andrucha Waddington. O texto é de Pedro Bial e Rodrigo Nogueira.

Agenda do espetáculo Chacrinha – O Musical


 Recife nos dias 02, 03 e 04/10 no Teatro de Santa Isabel;


-Brasília nos dias 09, 10 e 11/10 no Net Live Brasília;


-Porto Alegre nos dias 16 e 17/10 no Teatro do Sesi;


– Curitiba nos dias 27 e 28/10 no Teatro Positivo

Edu Lobo - O trenzinho do caipira (Villa Lobos) - Verso de Ferreira Gullar

Fernando Pessoa - Quando olho para mim não me percebo

Quando olho para mim não me percebo.
Tenho tanto a mania de sentir
Que me extravio às vezes ao sair
Das próprias sensações que eu recebo.

O ar que respiro, este licor que bebo,
Pertencem ao meu modo de existir,
E eu nunca sei como hei de concluir
As sensações que a meu pesar concebo.

Nem nunca propriamente reparei
Se na verdade sinto o que sinto.
Eu Serei tal qual pareço em mim? Serei

Tal qual me julgo verdadeiramente?
Mesmo ante as sensações sou um pouco ateu,
Nem sei bem se sou eu quem em mim sente.

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna

Não é golpe. Impeachment está previsto na nossa Constituição. É algo perfeitamente assimilável pelas nossas instituições, elas estão maduras. Mas não sei se a nossa sociedade está; faz muito pouco tempo que vivemos um processo assim. O problema vai ser o dia após o impeachment, precisamos olhar por esse lado, para além da formalidade e da legalidade, porque o país, dividido como está, pode cair numa guerra de extremos. Se a sociedade se desequilibra, perdem tanto os que puxam mais para esquerda, tanto os mais para a direita.
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Luiz Werneck Vianna, cientista social, PUC-Rio. Entrevista ao jornal O Dia, Rio de Janeiro, 27 de setembro de 2015.

Documentos apontam ‘compra’ de medida provisória no governo Lula

Documentos apontam que MP editada na gestão Lula foi 'comprada' por lobby

• Empresas negociaram pagamento de até R$ 36 milhões a lobistas para conseguir da Casa Civil um 'ato normativo' que prorrogou incentivos fiscais de R$ 1,3 bilhão

Andreza Matais e Fábio Fabrini - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Documentos obtidos pelo Estado indicam que uma medida provisória editada em 2009 pelo governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria sido “comprada” por meio de lobby e de corrupção para favorecer montadoras de veículos. Empresas do setor negociaram pagamentos de até R$ 36 milhões a lobistas para conseguir do Executivo um “ato normativo” que prorrogasse incentivos fiscais de R$ 1,3 bilhão por ano. Mensagens trocadas entre os envolvidos mencionam a oferta de propina a agentes públicos para viabilizar o texto, em vigor até o fim deste ano.

Para ser publicada, a MP passou pelo crivo da presidente Dilma Rousseff, então ministra da Casa Civil. Anotações de um dos envolvidos no esquema descrevem também uma reunião com o então ministro Gilberto Carvalho para tratar da norma, quatro dias antes de o texto ser editado. Um dos escritórios que atuaram para viabilizar a medida fez repasses de R$ 2,4 milhões a um filho do ex-presidente Lula, o empresário Luís Cláudio Lula da Silva, em 2011, ano em que a MP entrou em vigor.

O roteiro para influenciar as políticas de desoneração do governo e emplacar a MP é descrito em contratos de lobby pactuados antes da edição da norma. Conforme os documentos, a MMC Automotores, subsidiária da Mitsubishi no Brasil, e o Grupo CAOA (fabricante de veículos Hyundai e revendedora das marcas Ford, Hyundai e Subaru) pagariam honorários a um “consórcio” formado pelos escritórios SGR Consultoria Empresarial, do advogado José Ricardo da Silva, e Marcondes & Mautoni Empreendimentos, do empresário Mauro Marcondes Machado, para obter a extensão das benesses fiscais por ao menos cinco anos. Os incentivos expirariam em 31 de dezembro de 2010, caso não fossem prorrogados.

IPI. Os contratos obtidos pelo Estado datam de 11 e 19 de novembro de 2009. No dia 20 daquele mês, o ex-presidente Lula assinou a MP 471, esticando de 2011 até 2015 a política de descontos no IPI de carros produzidos nas três regiões (Norte, Nordeste e Centro-Oeste). À época, a Ford tinha uma fábrica na Bahia e CAOA e Mitsubishi fábricas em Goiás. A norma corresponde ao que era pleiteado nos documentos. Em março do ano seguinte, o Congresso aprovou o texto, convertendo-o na Lei 12.218/2010. Suspeitas de corrupção para viabilizar a medida provisória surgiram em e-mails trocados por envolvidos no caso.

Uma das mensagens, de 15 de outubro de 2010, diz que houve “acordo para aprovação da MP 471” e que Mauro Marcondes pactuou a entrega de R$ 4 milhões a “pessoas do governo, PT”, mas faltou com o compromisso. Além disso, o texto sugere a participação de “deputados e senadores” nas negociações. Não há, no entanto, menção a nomes dos agentes públicos supostamente envolvidos.

Acordo. O e-mail diz que a negociação costurada por representantes das empresas de lobby viabilizou a MP 471. O remetente – que se identifica como “Raimundo Lima”, mas cujo verdadeiro nome é mantido sob sigilo – pede que o sócio-fundador da MMC no Brasil, Eduardo Sousa Ramos, interceda junto à CAOA para que ela retome pagamentos.

Diferentemente da representante da Mitsubishi no Brasil, a CAOA teria participado do acerto, mas recuado na hora de fazer pagamentos. Um dos lobistas não teria repassado dinheiro a outros envolvidos.“Este (Mauro Marcondes Machado) vem desviando recursos, os quais não vêm chegando às pessoas devidas (...) Comunico ao senhor do acordo fechado para a aprovação da MP 471, valor este do seu conhecimento. (...) o sr. Mauro Marcondes alega ter entregado a pessoas do atual governo, PT, a quantia de R$ 4 milhões, o qual (sic) não é verdade”, alega.

A mensagem, intitulada “Eduardo Sousa Ramos (confidencial)” foi enviada às 16h54 por “Raimundo” à secretária do executivo da MMC, Lilian Pina, que a repassou a Marcondes meia hora depois. O remetente escreve que, se o dinheiro não fluísse, poderia expor um dossiê e gravações com detalhes das tratativas. “A forma de denúncia a ser utilizada serão as gravações pelas vezes em que estive com Mauro Marcondes, Carlos Alberto e Anuar”, avisa, referindo-se a empresários da CAOA. “Dou até o dia 21 para que me seja repassada a quantia de US$ 1,5 milhão”, ameaça.

Os dois escritórios de consultoria confirmam ter atuado para emplacar a MP 471, mas negam que o trabalho envolvesse lobby ou pagamento de propina.

Ambos são investigados por atuar para as montadoras no esquema de corrupção no Carf. A MMC e a CAOA informam ter contratado a Marcondes & Mautoni, mas negam que o objetivo fosse a “compra” da Medida Provisória. Dono da SGR, José Ricardo era parceiro de negócios do lobista Alexandre Paes dos Santos, ligado à advogada Erenice Guerra, secretária executiva de Dilma na Casa Civil quando a MP foi discutida. Marcondes é vice-presidente da Anfavea, na qual representa a MMC e a CAOA.

Verba da Petrobrás foi doada a Dilma, diz PF

PF indica dinheiro da Petrobras como doação para Dilma

• Polícia Federal interceptou contatos entre empreiteiro Ricardo Pessoa e um dos executivos da UTC Engenharia em julho de 2014: "Acertado 2.5 dia 5/8 (até) e 2.5 até 30/8"

Por Mateus Coutinho, Fausto Macedo, Ricardo Brandt e Julia Affonso – O Estado de S. Paulo

Mensagens enviadas por celular pelo dono da UTC Engenharia, Ricardo Pessoa, e um executivo do grupo, no final de julho de 2014, sugerem que as doações da empreiteira para a campanha de reeleição da presidente Dilma Rousseff estavam relacionadas ao recebimento de valores dos contratos que ele detém na Petrobrás, revela análise feita pela Polícia Federal com base em material anexado aos autos da Operação Lava Jato.

Em um dos trechos do material analisado pela PF, o executivo subordinado de Pessoa na UTC sugere que repasses da empreiteira à campanha eleitoral do PT foram “resgatados” de dinheiro desviados da Petrobrás. Neste mês, o Supremo Tribunal Federal determinou a abertura de um inquérito para investigar o ministro Edinho Silva (chefe da Secretaria de Comunicação Social), que foi o tesoureiro da campanha da presidente no ano passado.

A troca de mensagens indica que o chefe de gabinete de Edinho Silva, Manoel Araújo Sobrinho, foi a ponte de cobrança desses valores, pagos em duas parcelas. Às 10h33 do dia 29 de julho de 2014, quando já estava valendo o calendário oficial da campanha eleitoral, Walmir Pinheiro Santana, um dos executivos da UTC, escreve para o Pessoa: “RP, vc acha que eu devo ligar para o contato que o bovino religioso passou???.”

A Polícia Federal não identificou quem seria “bovino religioso”. Porém, duas horas depois, Ricardo Pessoa responde que esteve com um interlocutor, cujo nome foi ocultado por tarja no documento da PF, e passa as orientações de quem procurar e o valor “acertado”: “A pessoa que você tem que ligar é Manoel Araújo tel: 16 (…). Acertado 2.5 dia 5/8 (até) e 2.5 até 30/8. Ligue para ele que está esperando. O problema é bem maior. Me dê resposta.”
Coincidentes. No Tribunal Superior Eleitoral (TSE) há o registro de duas doações de R$ 2,5 milhões para a campanha de Dilma em datas coincidentes com as comunicações de Ricardo Pessoa e o subordinado dele na UTC. Uma doação ocorreu no dia 5 de agosto, como indicado por Pessoa, e outra do dia 27 de agosto, três dias antes do combinado.

Do total de doações que a UTC fez nas eleições de 2014 – R$ 52,2 milhões – , R$ 14,7 milhões foram para os comitês de candidatos, dos quais a campanha da petista recebeu R$ 7,5 milhões. Houve um terceiro repasse de R$ 2,5 milhões no dia 22 de outubro em nome do comitê de Dilma.

O nome de Manoel Araújo caiu no radar da Lava Jato quando foram encontrados os registros de doação da UTC. Em um deles, o nome do chefe de gabinete aparece como contato do comitê da campanha de Dilma e o nome do ministro Edinho Silva, como responsável pela emissão do recibo. Em um dos registros, anotado à caneta, consta: “2.500 – 05/08 / 2.500 – 30/08”. Um dos números de telefone de contato de Araújo é o mesmo da mensagem mandada por Pessoa ao seu executivo, com código de área 16. O outro é o telefone do comitê da campanha presidencial, em Brasília.

A análise dos equipamentos apreendidos com os executivos da UTC mostra ainda que no dia 24 de julho de 2014, Pessoa recebeu um e-mail de um interlocutor agendando encontro no comitê da campanha presidencial em Brasília, às 11h do dia 29 – quando se dá a troca de mensagens. O nome do interlocutor da agenda marcada está encoberto com tarja pela PF, bem como o nome da presidente Dilma Rousseff, porque eles não podem ser investigado pela Justiça na primeira instância.

Petrobrás. Às 15h23, duas horas e meia após ser orientado por Pessoa a procurar Manoel Araújo, o executivo da UTC escreve para o chefe. “Já estive com ele. Abrs”. Os dois então seguem a troca de mensagens sobre os valores a serem pagos. “Ele pensa que é 5, mas é 4. Ele me pediu 1. Então só dei 1. Contorne ai pois ainda tem rescaldo”, orienta Ricardo Pessoa.

Na mensagem subsequente na análise da PF, o executivo da UTC sugere então o abatimento de valores doados e também relaciona os pagamentos à entrada de dinheiro da “PB”, que seria a sigla usada por eles para Petrobrás.

Walmir Pinheiro Santana foi preso com Pessoa em 14 de novembro de 2014, alvo da 7.ª fase da Lava Jato, batizada de Juízo Final.

“RP, posso resgatar o que fizemos de doações esta semana?? Tá pesado e não entrou um valor da PB que estava previsto para hj, +/- 5mm”, pergunta o executivo, na mensagem já no dia 1ª de agosto.
O dono da UTC concorda: “Ok pode. Você não resgatou nada ainda certo?”.

O executivo da UTC interlocutor de Pessoa, apontado pela PF como operador de pagamentos da empreiteira, fala em “contribuição” e resgates. Para investigadores, os resgates poderiam ser a compensação de valores pagos em propina.

“Esta semana já foi 6,35 de contribuição e não resgatamos nada”.

Pessoa fez acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República. Ele confessou ter repassado valores de propina para o PT e citou 18 políticos.

Dilma cede a Lula e retira Mercadante da Casa Civil

• Jaques Wagner (Defesa) assume pasta; presidente faz reforma para evitar impeachment

Dilma troca Mercadante por Jaques Wagner na Casa Civil

• Ela cedeu ao ex-presidente Lula, que pedia substituição há meses, e ao PMDB

• Petista deverá voltar para o Ministério da Educação, cujo atual titular, Renato Janine Ribeiro, foi demitido

Natuza Nery, Valdo Cruz, Gustavo Uribe e Flávia Foreque – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff cedeu às pressões do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do PMDB e decidiu afastar do coração de seu governo o petista Aloizio Mercadante, substituindo-o na chefia da Casa Civil por Jaques Wagner, hoje na Defesa.

A troca e a ampliação do naco do PMDB de seis para sete pastas devem garantir, na avaliação de assessores, o apoio de no mínimo 50 dos 66 deputados do partido para evitar abertura de um processo de impeachment contra Dilma.

Ela precisa de ao menos 172 deputados para barrar um pedido de impedimento, que, para passar, carece de 342 votos dos 513 da Câmara.

Mercadante, que volta à Educação, era citado por petistas e peemedebistas como desagregador. Lula defendia sua substituição desde o início do segundo mandato, mas reclamava de não ser ouvido.

O candidato do ex-presidente sempre foi Jaques Wagner, classificado como um petista mais habilidoso e com melhor trânsito no PMDB.

No início do governo, Mercadante tentou fortalecer o PSD e o Pros para minar o PMDB. Mas só conseguiu desagradar o principal aliado do governo no Congresso.

Agora, Lula contará com três petistas de sua confiança ao lado de Dilma: além de Wagner, Ricardo Berzoini, que vai assumir a nova Secretaria de Governo, e Edinho Silva (Comunicação Social).

Além disso, conseguiu, enfim, convencer Dilma a aumentar o poder do PMDB e, assim, tentar ao menos postergar um eventual desembarque do governo –em novembro, o partido fará um congresso para discutir a saída.

Dilma já definiu o nome de cinco ministros peemedebistas: Eduardo Braga (Minas e Energia), Kátia Abreu (Agricultura), Eliseu Padilha (Aviação Civil), Helder Barbalho (Portos) e Henrique Eduardo Alves (Turismo).

Ela está fechando os nomes dos indicados pela bancada da Câmara para a Saúde, hoje com o PT, e a Ciência e Tecnologia, da qual sairá Aldo Rebelo (PC do B) para substituir Wagner na Defesa.

Na Saúde, o mais cotado é o deputado Marcelo Castro (PMDB-PI). Para Ciência e Tecnologia, Celso Pansera (PMDB-RJ). Ambos sugeridos pelo líder do partido na Câmara, Leonardo Picciani (RJ).

Dilma continua sendo pressionada por aliados de Lula a trocar José Eduardo Cardozo (Justiça). Lula queria trocá-lo pelo ex-ministro Nelson Jobim, peemedebista e advogado que tem atuado na defesa de empreiteiros na Lava Jato.

Nesta quinta (1º), Lula deve avaliar com Dilma os últimos detalhes da reforma, na qual prometeu cortar dez pastas. Pelo último desenho, seriam eliminadas nove.

Segundo Temer, há a possibilidade da reforma ser anunciada apenas na sexta (2), já que Dilma cancelou viagem a Bahia nesse dia.

Nesta quarta, quando oficializou a saída de Mercadante, Dilma também recebeu o ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, para avisá-lo que ele deixará o governo.

Em dez meses, esta é a segunda troca na Educação, área que carrega o lema do segundo mandato de Dilma, "Pátria Educadora".

Janine é o segundo ministro da área social a ser demitido. Na terça (29), Dilma dispensou, por telefone, o ministro da Saúde, Arthur Chioro.

No campo petista, Dilma vai fundir os ministérios da Previdência, Trabalho e Desenvolvimento. Fará o mesmo com as três secretarias que têm status de ministérios: Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos formarão o Ministério da Cidadania.

Ela ainda tenta atrair o PSB e acertou com o PDT indicação para as Comunicações.

Lula diz ao PT para aceitar perda de cargos

• 'Dilma fez agora o que deveria ter feito em novembro', afirmou ex-presidente sobre reforma ministerial do governo

• Em reunião com dirigentes petistas, Lula sugere discurso para defender mudanças como resposta à crise

Bela Megale – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Com o PT ameaçado de perder espaço no governo após a reforma ministerial, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu com a executiva nacional do partido e pediu aos dirigentes petistas que aceitem a perda de ministérios e cargos do primeiro escalão para ajudar a presidente Dilma Rousseff a enfrentar a crise política.

No encontro que ocorreu nesta quarta-feira (30), na sede do diretório nacional do PT, em São Paulo, Lula afirmou que a reforma é necessária para garantir governabilidade à presidente, mas disse que "Dilma fez agora o que deveria ter feito em novembro", após se reeleger, segundo relataram participantes.

O ex-presidente disse aos aliados que Dilma e o PT precisam vender para a sociedade a ideia de que as mudanças no ministério não foram feitas para evitar a abertura de um processo de impeachment contra a presidente no Congresso, mas para ajudar o país a superar a crise econômica que atravessa.

Segundo relatos dos participantes, os membros da executiva reforçaram a insatisfação com a política econômica do governo e a necessidade de transformá-la para atender à base social petista.

O ex-presidente concordou com as críticas e sugeriu alternativas como o aumento de linhas de crédito do BNDES para financiar investimentos em construção civil, serviços e outros setores que poderiam reativar o consumo e a recuperação da economia.

Petistas relataram que Lula pediu para que os integrantes da executiva nacional se assumam como dirigentes da sigla viajando o Brasil, "de barco, de ônibus, de moto".Lula adiantou que vai almoçar com a presidente nesta quinta (1º), em Brasília, para debater a reforma ministerial.

Após a reunião, o presidente do PT, Rui Falcão, disse que a reforma "deve ser um momento de construção de estabilidade política para que o país possa retomar políticas de crescimento da economia".

A fala seguiu o tom do discurso feito por Lula na reunião, de mostrar que as mudanças na Esplanada não serão feitas com o intuito de barrar o impeachment. No entanto, boa parte dos petistas acreditam que a reforma é um dos últimos recursos que restaram à presidente para se manter no governo.

Lula abriu uma exceção ao participar da reunião desta quarta, porque raramente visita a sede nacional do PT. As conversas do ex-presidente em geral ocorrem no instituto que leva seu nome, na zona sul da capital paulista.

Dilma cede a Lula e ao PMDB

• Mercadante irá para a Educação, e Jaques Wagner deve assumir a Casa Civil

Para garantir a governabilidade, tentar conter o avanço de pedidos de impeachment e aprovar no Congresso as medidas de ajuste fiscal, a presidente Dilma decidiu ceder ao PMDB e ao ex- presidente Lula na reforma ministerial, além de reduzir o espaço do PT. Ontem, ela demitiu Renato Janine Ribeiro da Educação, para onde irá o hoje chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, criticado por aliados e por Lula. Para a Casa Civil foi convidado o petista Jaques Wagner, hoje na Defesa. O PMDB deve ficar com sete ministérios. Entre cortes e fusões, 13 ministérios devem deixar de existir no formato atual.

Dilma cede e amplia o poder do PMDB e do ex-presidente Lula

• De olho na governabilidade, presidente ainda precisa resolver impasses

Simone Iglesias, Júnia Gama e Fernanda Krakovics - O Globo

- BRASÍLIA- Em busca de uma estabilidade mínima para governar, a presidente Dilma Rousseff cedeu a pressões políticas e partidárias e deve anunciar hoje ou amanhã sua reforma ministerial com mudanças profundas no governo. Esperada inicialmente como uma mudança branda na Esplanada — que teria como principal trunfo a redução de 10 ministérios —, a reforma passou a ser tratada no Palácio do Planalto como uma “refundação” das relações com os aliados. A presidente ampliou o poder do PMDB, cedeu ao ex- presidente Lula que liderou uma cruzada pelo afastamento de Aloizio Mercadante da Casa Civil, e enxugou a representação da base social do PT.

O objetivo da série de mudanças, que envolve um terço dos atuais ministros, é garantir segurança no Congresso, onde nos próximos meses o governo precisa aprovar o segundo pacote de ajuste fiscal — com cortes de despesas e aumento e criação de impostos —, e conter o avanço dos pedidos de impeachment que tramitam na Câmara.

Mais uma vez, impasses internos no PMDB e no PT travaram algumas definições da reforma. Até ontem à noite, a pasta de Portos ainda era disputada pela bancada peemedebista na Câmara e pelo grupo do vice- presidente Michel Temer, que quer colocar o ministro da Pesca, Helder Barbalho, no cargo. No PT, há dúvida sobre o destino do ministro da Secretaria- Geral da Presidência, Miguel Rossetto, e sobre quais petistas comandarão os dois novos ministérios que surgirão de fusões de pastas sociais.

Com o impasse interno entre peemedebistas, a solução curinga encontrada pelo Planalto foi colocar como opção para o PMDB o Ministério de Ciência e Tecnologia. Temer chegou a ser sondado sobre uma eventual mudança de Eliseu Padilha ( Aviação Civil) para a pasta, mas a negociação não prosperou.

Superministérios
Independentemente de a bancada ficar com Portos ou Ciência e Tecnologia, o nome mais cotado até a noite de ontem era o de Celso Pansera ( PMDB- RJ), ligado à família Picciani, ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), e ao governador do Rio, Luiz Fernando Pezão. Para a Saúde, Marcelo Castro ( PMDB- PI) passou a ser o candidato mais forte, depois que chegou ao conhecimento da presidente que outro indicado, Manoel Júnior ( PMDB- PB), havia dado declarações aconselhandoa a renunciar ao cargo. Até ontem, entre fusões e cortes, 13 ministérios deixariam de existir em seu formato atual.

Há indefinição quanto aos nomes de dois novos superministérios que ficarão com o PT. O martelo será batido hoje pela manhã, em conversa entre Dilma e o expresidente Lula, no Palácio da Alvorada. As secretarias de Mulheres, Direitos Humanos e Igualdade Racial virarão um único ministério. Com a resistência ao nome de Rossetto pelos movimentos ligados a estas áreas, cresceu ontem a possibilidade da deputada Benedita da Silva ( PT- RJ) ocupar a pasta. A ministra do Desenvolvimento Social, Tereza Campello, também está no páreo para o posto. Os ministérios do Trabalho, da Previdência e do Desenvolvimento Social também se tornarão um só, e o nome mais forte é do ministro da Previdência, Carlos Gabas.

— A presidente decidiu enfrentar essa briga com as centrais, que não queriam a fusão. Mas para evitar mais problemas, a ideia é deixar alguém da área sindical — disse um interlocutor da presidente ao GLOBO.

Apesar da pressão dos funcionários da Controladoria- Geral da União, a presidente deverá retirar o status de ministério e vincular o órgão à Casa Civil. Dilma também definiu que a nova Secretaria de Governo, a ser comandada pelo petista Ricardo Berzoini, atual ministro das Comunicações, vai englobar a Secretaria das Micro e Pequenas Empresas, o Gabinete de Segurança Institucional, a Secretaria de Relações Institucionais e a Secretaria Geral, todos atualmente com status de ministério. A principal tarefa de Berzoini será a articulação política, função já exercida por ele no primeiro mandato de Dilma.

A relação do governo com os movimentos sociais, hoje de responsabilidade da Secretaria- Geral, será transferida para ministério que vai englobar as secretarias de Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos.

Wagner: troca contempla Lula
Ontem pela manhã, Dilma avisou ao vice Michel Temer sobre a substituição de Mercadante por Jaques Wagner. Desde o ano passado há sistemática pressão para que isso ocorra. No começo deste ano, quando Mercadante integrou a campanha contra Cunha à Presidência da Câmara, os peemedebistas voltaram à carga, assim como Lula que percebeu que o movimento era um tiro no pé do governo. Wagner sempre foi considerado dentro e fora do PT habilidoso e conciliador. O clima entre políticos dos partidos aliados quando se soube da mudança era de expectativa de uma melhora nas relações entre Congresso e Planalto.

Grupo de Lula volta ao centro do poder

• PT perde espaço para o PMDB, mas novo núcleo duro do governo é ligado a ex- presidente

Fernanda Krakovics - O Globo

- BRASÍLIA- Apesar de o PT ter perdido espaço na Esplanada em função da diminuição do número de ministérios e da ampliação do espaço do PMDB, o grupo ligado ao ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltará para o centro das decisões do governo Dilma Rousseff na reforma ministerial que está prestes a ser anunciada.

Depois de terem sido alijados do Palácio do Planalto na montagem da equipe do segundo mandato, em dezembro, os lulistas voltam agora a dar as cartas. O principal símbolo dessa mudança é a substituição, na Casa Civil, do ministro Aloizio Mercadante por Jaques Wagner, atualmente na Defesa. Essa troca era defendida por Lula desde o ano passado.

Mercadante era o braço- direito de Dilma, e sua transferência da Casa Civil para a Educação é uma espécie de refundação do governo em meio à crise política e à ameaça de um pedido de impeachment que paira sobre o Planalto. Considerado inábil, Mercadante era apontado pelo PT, pelo PMDB e pelos demais partidos da base aliada como uma das principais fontes de problemas na relação do governo com o Congresso.

Temor sobre Mercadante
Também próximo a Lula, o ministro Ricardo Berzoini ( Comunicações) volta ao Palácio do Planalto para assumir a nova Secretaria de Governo, que vai englobar a Secretaria das Micro e Pequenas Empresas, o Gabinete de Segurança Institucional, a Secretaria de Relações Institucionais e a Secretaria Geral. A principal tarefa do petista será a articulação política do governo, função exercida por ele no primeiro mandato de Dilma. Ex- presidente do PT, Berzoini foi ministro da Previdência no governo Lula.

O triunvirato palaciano se completa com o ministro Edinho Silva ( Comunicação Social), que deve permanecer no cargo e também é da confiança de Lula e da cúpula do PT.

O temor de petistas ligados ao ex- presidente é que, devido à proximidade com Dilma, e também à sua personalidade, Mercadante continue a interferir nas decisões do governo, mesmo no Ministério da Educação, e atropele Wagner na Casa Civil.

Buscando vender otimismo e indo na contramão, uma liderança petista próxima a Lula descartou essa possibilidade, confiando no rebaixamento da função de Mercadante:

— Não, não chove de baixo para cima, não.

Em reunião ontem com a Executiva Nacional do PT, Lula disse que a reforma ministerial deveria ter sido feita em novembro do ano passado, ainda na montagem da equipe para o segundo mandato.

— O que ela vai fazer agora deveria ter feito em novembro — disse o ex- presidente, segundo relato de um dos participantes da reunião. A fala de Lula também indica que o líder petista considera que o partido não deve manifestar contrariedade com a perda de espaço no primeiro escalão.

No final do ano passado, Dilma desagradou a Lula e à cúpula do PT ao tirar do Planalto os então ministros Gilberto Carvalho ( Secretaria Geral) e Berzoini, que comandava a Secretaria de Relações Institucionais, ambos da corrente majoritária do partido, a Construindo um Novo Brasil ( CNB), e ligados ao ex- presidente. Para seus lugares, Dilma escalou Miguel Rossetto e Pepe Vargas, respectivamente, ambos da corrente Democracia Socialista, minoritária no PT. Eles foram escolhidos por serem da confiança da presidente, embora não tivessem trânsito no partido nem na base aliada.

Pepe, que era responsável pela articulação política do governo, caiu depois de se engajar na campanha derrotada do deputado Arlindo Chinaglia ( PT- SP) para a Presidência da Câmara e virar persona non grata do presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ). Já Rossetto, de quem Dilma era próxima desde sua atuação política no Rio Grande do Sul, caiu em desgraça depois ter uma reação considerada desastrada às primeiras manifestações contra o governo, no início do ano.

Mesmo com o PT escalado de volta para o chamado núcleo duro do governo, a insatisfação no partido é grande com a perda do comando dos ministérios da Saúde e das Comunicações — este último, responsável pela discussão sobre a regulação da mídia, uma bandeira do partido. E também com a perda do status de ministério das secretarias das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos.

Defensor da maior participação do PMDB no governo para tentar dar estabilidade à gestão Dilma, Lula tem pedido compreensão aos petistas diante da crise política e alertado para a necessidade de o partido ir para o “sacrifício”.

— Vão- se os anéis e ficam os dedos — disse o ex- presidente a uma liderança do PT.

Presidente ganha tempo

Paulo Celso Pereira - O Globo

BRASÍLIA - O objetivo da reforma ministerial da presidente Dilma Rousseff é garantir oxigênio para atravessar a crise político- econômica em que se encontra. Após ser reeleita em outubro, a presidente decidiu montar o Ministério a seu bel- prazer, desprezando até os conselhos de seu padrinho político Lula. Agora, diante de uma crise econômica que exige sucesso em votações dificílimas no Congresso — incluindo a criação da nova CPMF —, ela finalmente se convenceu de que deveria seguir o receituário mais ortodoxo para salvar seu governo e seu mandato.

Repetindo o método adotado pelo ex- presidente Lula em 2005, no auge da crise do mensalão, Dilma retirou o Ministério da Saúde do PT e o entregou ao PMDB, ampliando o espaço do aliado na Esplanada, e reorganizando o núcleo do governo que cabe ao PT. A reforma de Lula em 2005 deu certo por uma série de motivos, entre eles o fato de a economia caminhar razoavelmente bem. No caso de Dilma, as incertezas são muitas, a começar pelo fato de ninguém saber ao certo quando a economia começará a se recuperar.

Sem a reação da economia, os cortes no Orçamento devem se acentuar. E sem orçamento, é difícil que a lua de mel com os deputados dure muito. Ontem, em Brasília, uma raposa peemedebista explicava de forma clara o porquê de seu ceticismo com a reforma: “Os deputados estão achando que vão chegar lá no ministério e vai ter um cofre de onde o ministro vai sair dando R$ 100 mil para resolver o problema de cada um. Na hora em que eles perceberem que não vai ter, vai recomeçar o berreiro”.

A reforma ministerial feita por Dilma lhe dará tempo e ela precisa disso. Tratase da grande cartada para salvar a si e ao projeto do PT. De agora em diante, o destino do governo dependerá muito da reconhecida habilidade política de Jaques Wagner, na Casa Civil; da liberdade que a presidente dará a seus ministros e de um tanto de sorte. Até para que, quem sabe dentro de um ano, o governo possa retomar as políticas públicas que acredita serem as melhores — com ou sem os ministros que devem ser anunciados hoje.

‘ Pátria Educadora’ tem terceiro ministro em apenas nove meses

• Dilma tira da Educação Janine Ribeiro, a quem comparou a Paulo Freire

Renata Mariz - O Globo

- BRASÍLIA- Antes de completar seis meses no cargo, o ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, foi demitido ontem pela presidente Dilma Rousseff, como parte da reforma ministerial que ela conduz para angariar apoio político. Aloizio Mercadante, que já ocupou a cadeira entre 2012 e 2014, deixará a Casa Civil para retornar como terceiro ministro da pasta no segundo mandato de Dilma, que tem como lema “Pátria Educadora”. Antes de Janine, o titular da Educação era Cid Gomes, ex- governador do Ceará que fez uma passagem ainda mais meteórica, de apenas dois meses e meio no ministério.

Janine foi chamado para uma reunião com Dilma na tarde de ontem, que começou por volta das 15h20 no Palácio do Planalto. De acordo com interlocutores do ministro, a conversa foi somente entre os dois, sem a presença de auxiliares. A presidente agradeceu a Janine pelos serviços prestados enquanto esteve à frente do MEC e, rapidamente, mencionou que o momento atual exige uma nova composição na Esplanada dos Ministérios.

A reforma para agradar aos setores do PMDB, em troca de apoio político, também culminou na saída do ministro da Saúde, Arthur Chioro. Com ele, porém, Dilma nem chegou a convocar uma reunião no Planalto. Ela demitiu Chioro por telefone, o que teria deixado o ministro chateado. O Ministério da Saúde será ocupado por algum indicado do PMDB, que tende a ficar com sete pastas. Hoje, o partido do vice- presidente, Michel Temer, está no comando de seis ministérios.

Enquanto Janine se reunia com Dilma, o secretário- executivo do MEC, Luiz Cláudio Costa, estava no Planalto conversando com Mercadante. Entre outros assuntos, eles trataram da volta do ministro à Educação e dos problemas que atingem a pasta. Desde o início do ano, programas que são vitrine da gestão Dilma vêm passando por contenções, como o Fies, Pronatec e Ciência sem Fronteiras. Houve atrasos em pagamento de bolsas, como as do programa de alfabetização. Greves atingem a maior parte das universidades federais.

Janine chegou ao posto, em abril, como “uma feliz novidade”. Foi essa a definição da presidente Dilma ao dar posse ao ministro, comparando- o com educadores brasileiros como Paulo Freire e Anísio Teixeira. Embora tenha sido diretor de Avaliação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior ( Capes), Janine foi escolhido mais pelo simbolismo de ser um nome importante da pesquisa na área de educação do que pela experiência gerencial.

Ironicamente, quem sugeriu à presidente Dilma o nome de Janine para o ministério foi Mercadante. Agora, no xadrez da política, o padrinho tomará o lugar do apadrinhado na condução de uma das mais importantes pastas da Esplanada, que só perde em volume de orçamento para a Saúde.

Relator indica rejeição de contas presidenciais

• Relatório do TCU que considera pedaladas do governo como ato irregular sustenta decisão do ministro Augusto Nardes

João Villaverde, André Borges, Fábio Fabrini - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Relatório da área técnica do Tribunal de Contas da União vai considerar irregulares as "pedaladas fiscais" realizadas pelo governo Dilma Rousseff no ano passado. Diante disso, o relator do processo no TCU, ministro Augusto Nardes, indicou aos colegas da corte que vai pedir ao plenário a rejeição das contas presidenciais.

Está definido também que a dívida gerada pela União ao atrasar repasses de recursos aos bancos públicos, por meio dessas manobras, deveria ser incorporada pelo Banco Central nas estatísticas fiscais, o que não ocorreu.

O documento técnico passa apenas por revisão final antes de ser encaminhado a Nardes, que deve distribuir hoje seu relatório aos demais ministros. A apreciação das contas presidenciais de 2014 está prevista para ocorrer na próxima quarta-feira. Cabe ao presidente da corte, ministro Aroldo Cedraz, marcar a sessão.

O TCU produzirá um parecer que será encaminhado ao Congresso. É responsabilidade dos parlamentares a decisão final sobre as contas - deputados e senadores podem seguir ou não o entendimento do TCU. Nos últimos 78 anos, o TCU sempre aprovou as contas federais. A oposição e setores rebelados da base aliada esperam uma rejeição das contas de 2014 pelo tribunal para abrir um processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.

A Lei de Responsabilidade Fiscal proíbe que uma instituição financeira pública conceda empréstimos a seu controlador, no caso, a União. O governo argumenta que os adiantamentos feitos pela Caixa não constituíram operações de crédito, mas sim uma prestação de serviços. Apesar dessa justificativa, o próprio governo tratou de apresentar ao TCU, na semana passada, uma proposta de mudanças nos contratos entre a Caixa e a União para evitar que as pedaladas, verificadas em 2014, prossigam no futuro.

O relator do processo no TCU já está preparado para uma eventual reação do governo à rejeição. Na quarta, Nardes afirmou que a possível apresentação de um recurso pelo governo contra a decisão do tribunal tem que ser encaminhada ao Congresso Nacional, e não mais à corte de contas. "O TCU cumpriu todas as etapas. Se o governo quiser questionar algo, tem que questionar no Congresso".

Julgamento de contas de Dilma no TCU deve ser na próxima semana

• As contas de 2014 contam com 15 'distorções' encontradas pela área técnica do TCU; A mais dramática delas é a 'pedalada fiscal', revelada pelo 'Estado' em julho do ano passado

João Villaverde, André Borges e Fábio Fabrini - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O esperado julgamento das contas de 2014 da presidente Dilma Rousseff pelo Tribunal de Contas da União (TCU) deve ocorrer na semana que vem. O ministro relator do caso, Augusto Nardes, disse nesta quarta-feira, 30, estar "pronto para votar" e pediu ao presidente da Corte, Aroldo Cedraz, responsável pela definição da sessão, que marcasse o julgamento para a próxima quarta-feira. O pedido de Nardes foi endossado pelos demais ministros do TCU na sessão que começou há pouco.

Cedraz, no entanto, disse que somente poderia marcar uma data quando estivesse com o relatório técnico sobre o parecer das contas de 2014 liberado - o que ainda não ocorreu. Em discussão quente entre Nardes e Cedraz, o relator disse que liberaria o relatório amanhã e Cedraz deu a entender que, com esse movimento, o julgamento estará livre para ocorrer na semana que vem. Não necessariamente na próxima quarta-feira, dia 7, mas ainda na semana que vem.

As contas de 2014 contam com 15 "distorções" encontradas pela área técnica do TCU. A mais dramática delas é a "pedalada fiscal", revelada pelo Estado em julho do ano passado. O governo enviou duas defesas, com mais de 2 mil páginas, para o TCU para tentar reverter uma provável reprovação das contas. Essa rejeição, pelo TCU, é aguardada pela oposição no Congresso para justificar a abertura de um processo de impeachment.

O caso no TCU é olhado por lupa pelo mercado financeiro e por agências de rating devido o potencial impacto político e fiscal sobre o governo Dilma Rousseff. Na semana passada, a equipe da agência Fitch teve reunião com Nardes no TCU para tratar das "pedaladas fiscais" e as contas de 2014. Nardes, na ocasião, disse que o julgamento será "técnico".

TSE retoma nesta noite julgamento de ação que pede cassação de mandato de Dilma

• Já há maioria formada na Corte para permitir que o caso seja reaberto, mas a conclusão do julgamento foi interrompida há um mês por um pedido de vista feito pela ministra Luciana Lóssio

Beatriz Bulla - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) incluiu na pauta da sessão extraordinária que acontece nesta noite o julgamento de uma das ações que pedem a cassação de mandato da presidente Dilma Rousseff. Os ministros irão discutir se abrem a ação de impugnação proposta pelo PSDB para permitir a investigação dos fatos relacionados à campanha petista de 2014. Já há maioria formada na Corte para permitir que o caso seja reaberto, mas a conclusão do julgamento foi interrompida há um mês por um pedido de vista feito pela ministra Luciana Lóssio.

No início do ano, a ação foi arquivada pela ministra Maria Thereza de Assis Moura, mas um recurso proposto pelo PSDB fez o caso ser levado ao plenário do TSE. Já votaram pela continuidade da ação os ministros Gilmar Mendes, João Otávio de Noronha, Luiz Fux e Henrique Neves. O único voto pelo arquivamento do caso até o momento é o de Maria Thereza, alvo de fortes críticas de Mendes. Restam os votos de Luciana Lóssio e do presidente da Corte, Dias Toffoli.

Se o TSE confirmar o indicado pela maioria dos votos até agora, poderão ser realizadas diligências de investigação para apurar suposto uso da estrutura pública pela campanha do PT na disputa eleitoral, com abuso de poder econômico. Já existem em tramitação na Corte três ações com objeto semelhante que podem gerar a cassação do mandato da presidente e do vice-presidente, Michel Temer.

Os ministros devem discutir ainda nesta noite se reúnem sob relatoria de um só integrante da Corte as quatro ações que questionam a legitimidade da campanha presidencial de Dilma. Atualmente, uma está sob relatoria da ministra Maria Thereza de Assis Moura, duas no gabinete do ministro João Otávio de Noronha e uma sob condução de Luiz Fux.

A sessão desta noite é a última da qual participa Noronha, cujo mandato na Corte se encerra a partir de amanhã. O ministro é visto pelo governo como um condutor duro das ações de investigação da presidente no TSE. Foi ele quem autorizou a colheita de depoimentos dos delatores da Lava Jato à Justiça Eleitoral. Já prestaram depoimento o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa. O empreiteiro Ricardo Pessoa, dono da UTC, permaneceu em silêncio protegido pelo acordado com o Ministério Público no acordo de delação premiada. Sem o depoimento de Pessoa, Noronha considera que a ação não pode ser encerrada.

A proposta de reunir todos os casos veio de Fux e agrada o governo, que vê a solução interna como uma chance de dar trégua na batalha vivida no TSE. Com só uma ação em curso, o desgaste da imagem da presidente diminui e a relatoria pode ficar a cargo de algum ministro com visão considerada menos rigorosa.