sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Protagonismo tardio – Editorial / O Estado de S. Paulo

Os tucanos não se podem queixar da sorte. No mesmo dia em que decidiram descer do muro e definir uma posição clara pelo afastamento de Eduardo Cunha da Presidência da Câmara e até mesmo pela cassação de seu mandato, por artimanhas do próprio Cunha cerca de uma dúzia de legendas partidárias que compõem a base de apoio ao governo – a metade, partidos nanicos – divulga documento em que manifesta “total apoio e confiança” no parlamentar peemedebista e na forma como tem comandado a Casa de representação dos brasileiros. O PT, por razões óbvias, não subscreve o documento, mas participou das articulações para sua elaboração: foi redigido no gabinete do líder do governo na Câmara, o petista José Guimarães (CE) – aquele que diz que nada entende de transporte de valores.

O êxito de iniciativas de protagonismo político depende em boa medida do contraponto estabelecido pelo eventual antagonista. A imagem negativa de Eduardo Cunha resulta de um amplo consenso, é praticamente unanimidade nacional, de modo que o conchavo urdido para oferecer-lhe “total apoio e confiança” é tudo de que os tucanos necessitavam para respaldar e valorizar aos olhos da opinião pública sua decisão tardia de posicionar-se contra os interesses de um político mendaz e autoritário que para escapar da Justiça tem usado e abusado de todo o poder que sua investidura lhe confere.

A atribulada experiência vivida nos últimos meses pelo PSDB – maior partido da oposição – na ânsia de acelerar um processo de cassação do mandato da presidente Dilma Rousseff talvez tenha ensinado aos tucanos que, embora a política seja considerada a arte de aliar meios a fins, os fins jamais justificam os meios. É o que demonstra na prática, aliás, o retumbante malogro do projeto lulopetista de promover justiça social e prosperidade por decreto governamental.

O PSDB perdeu precioso tempo, desde o início deste ano, perseguindo a ideia do impeachment – que, certamente, cabe na agenda política, mas não pode ser preocupação obsessiva – em vez de cumprir o verdadeiro papel da oposição, que é não apenas denunciar e combater os erros do governo, mas, principalmente, propor ao País projetos alternativos de condução política e recuperação econômica.

Foi o PMDB, ainda formalmente aliado do governo, que tomou a iniciativa de propor um projeto assim. Enquanto isso, os tucanos votavam no Congresso para derrubar propostas com as quais sempre se identificaram, apenas para causar embaraços ao Planalto. Felizmente, esse surto de voluntarismo amador vai sendo superado.

O confronto do PSDB com a base de apoio do governo – reforçada pelo “oposicionista” Solidariedade, do notório deputado Paulinho da Força – revela também a absurda contradição em que se debate o lulopetismo: aliar-se por baixo do pano com seu maior adversário para tentar salvar a pele de uma presidente da República que, na verdade, não apoia efetivamente. Também fica exposta a indecorosa atitude do amontoado de legendas politicamente insignificantes que se dispõem a apoiar Eduardo Cunha pelo que ele verdadeiramente representa: um modo de fazer política inescrupuloso, autoritário, amoral e retrógrado como visão de mundo.

O nível de hipocrisia dos petistas mal disfarçados sob o manto da neutralidade e de seus aliados na luta inglória pela preservação – pelo menos momentânea – dostatus e do mandato de Eduardo Cunha está claramente expresso nos termos do documento apresentado em nome de PMDB, PR, PSC, PP, PSD, PTB, PEN, PMN, PRP, PHS, PTN, PT do B e, de quebra, do Solidariedade: “As denúncias apresentadas (contra Cunha) seguirão o curso do devido processo legal, onde haverá condições de defesa e julgamento por instâncias próprias e o princípio da presunção da inocência. (...) Eventuais disputas políticas não podem prevalecer para paralisar o funcionamento da Casa”. Lido em plenário pelo líder do PSC, André Moura, esse documento foi subscrito pelos 13 partidos que representam mais de 230 parlamentares. Não se trata de simples coincidência o fato de expressões como “devido processo legal”, “condições de defesa”, “julgamento por instâncias próprias” e, muito especialmente, “presunção de inocência” serem truísmos frequentes nas manifestações do PT a respeito da corrupção que malbarata suas fileiras.

Aula de cinismo – Editorial / Folha de S. Paulo

Em termos incisivos, o PT deu a conhecer um documento no qual busca refrear, para consumo de sua militância, o processo de desmoralização que o acomete.

Os argumentos da cartilha são conhecidos. Teria sido criada uma mitologia em torno do mensalão, tendo alguns vereditos do caso sido inspirados por uma "teoria estranha à jurisprudência brasileira", a do domínio do fato.

O raciocínio nem sequer mereceria ser levado em consideração; a teoria é de aceitação inconteste quando uma organização complexa tem a dirigi-la personagens que não participam diretamente das operações ilegais.

Mas o PT não se anima a exumar as antigas teses que visavam inocentar, entre outros, Henrique Pizzolato, João Paulo Cunha e José Dirceu; quanto a este, com efeito, parece ter desistido de celebrá-lo como "guerreiro do povo brasileiro", dado o acúmulo de evidências de que seu comportamento equivaleria ao de um corrupto vulgar.

A propósito da Operação Lava Jato, que investiga os desvios bilionários na Petrobras, recupera-se o arcabouço conceitual que fazia do mensalão apenas um episódio de "recursos não contabilizados" transformado, por perseguição política, em "escândalo midiático".

Afirma-se que o PT não fez nada de diferente dos demais partidos ao aceitar doações de empreiteiras. Laboriosas tabelas são apensadas à cartilha, a fim de diluir o que há de específico no esquema.

O que caracteriza as práticas apuradas na Lava Jato, porém, é que um sistema de doações legais funcionou, ao que tudo indica, como simples etapa em sofisticado processo de lavagem de dinheiro.

Foram os cofres da estatal, e não de empresas particulares, a fonte utilizada para alimentar o caixa do PT, com "pixulecos" confessos e sobras milionárias servindo para desfrute particular de alguns.

A dinâmica da pilhagem, assim como o mensalão, é de resto suprapartidária: capitaneada pelo governo petista, a máquina de financiamentos e dilapidação do patrimônio público serviu a peemedebistas, pepistas e outros para constituir a base de Lula e Dilma Rousseff.

Mas o PT se faz de única vítima de uma conspiração de classe. Tende a diminuir cada vez mais, é claro, o número dos que acreditam nesse tipo de versão –e que esqueceram, talvez, a época em que a sigla se mostrava intransigente guardiã da moralidade pública.

A política do interesse ético geral substitui-se agora pela política da identidade: "somos perseguidos pelo que somos". Não se trata de ser ou não ser, de perseguir ou não perseguir. Trata-se do que o Partido dos Trabalhadores faz e fez, desde que se apoderou de um Estado a que destrói com voracidade, cinismo e prepotência.

Faltou governo na tragédia de Mariana – Editorial / O Globo

• Multas à empresa, anunciadas pela presidente, não eliminam a responsabilidade dos governantes sobre sua incapacidade de construir um sistema de defesa civil

O governo federal anunciou sanções à mineradora Samarco pela tragédia ambiental em Minas Gerais. Decisão legítima, baseada na legislação de proteção ambiental e nos danos à sociedade. A presidente Dilma Rousseff deu ênfase ao valor da sanção prevista: R$ 250 milhões em “multas preliminares", advertindo que “ainda poderão ser contempladas várias outras", conforme disse ontem, durante visita às regiões afetadas em Minas Gerais e no Espírito Santo, na companhia dos governadores mineiro, Fernando Pimentel (PT), e capixaba, Paulo Hartung (PMDB).

É bom que governantes abandonem o conforto de seus gabinetes em momentos de infortúnio coletivo. Se a iniciativa tem caráter político relevante, também condimenta o debate sobre o papel e a responsabilidade dos governos.

Regras não faltam, para os governos e as empresas privadas. Em 2010, por exemplo, tornaram-se mais rígidas as imposições às mineradoras. Minas Gerais possui 735 barragens de rejeitos de mineração, segundo a Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam). O estado concentra metade das barragens mapeadas no país e, em tese, deveria ser exemplo em defesa civil e fiscalização permanente.

No entanto, Minas registrou quatro tragédias por rompimento de barragens nos últimos quatro anos. O Banco de Declarações Ambientais da Feam registra 693 barragens com estabilidade “garantida”, enquanto outras 29 estão com estabilidade “não garantida" e 13 ainda sem conclusão de auditoria.

A frequência de rompimentos indica necessidade de revisão dos critérios de construção de barragens, assim como revela uma debilidade de ação do poder público na fiscalização.

Mostra ainda a incapacidade dos governantes na formulação e execução eficaz de uma política nacional de defesa civil. A área mais afetada pelo desastre da Samarco em Mariana (MG) não possuía um simples sistema de alarme — o que poderia ter poupado muitas vidas.

O panorama em todo o Vale do Rio Doce diz muito sobre a presidente, os governadores e prefeitos indecisos na construção coordenada de serviços emergenciais para proteção da população em situações de catástrofe.

Na esteira da lama tóxica, que a partir de hoje deve atravessar o Espírito Santo, veem-se também os sinais de incúria de sucessivos governos empenhados na atração de investimentos industriais, o que é salutar, mas a qualquer custo, o que é nefasto. Financiaram com incentivos fiscais e creditícios empreendimentos com escassa preocupação sobre o impacto das atividades na vida das comunidades e do meio ambiente.

A lição da tragédia da Samarco vai muito além das multas. É evidente a responsabilidade dos governos Dilma, Fernando Pimentel e Paulo Hartung. Deveria servir a uma ruptura, por iniciativa dos governantes, com práticas e políticas obsoletas. Para que não se repita.

Calendário político orienta nova onda de ataques a Levy – Editorial / Valor Econômico

Meses de impasse político e declínio econômico eliminaram as margens de manobra de um governo que se tornou impopular. A presidente Dilma Rousseff e o PT têm baixa capacidade de liderar a saída para as duas crises, enquanto que um inevitável desgaste mina os protagonistas. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, está de novo sob ataque dos petistas, liderados pelo ex-presidente Lula, e parlamentares de vários partidos que atribuem-lhe um fracasso que não é dele, mas da presidente e de todo o governo. O ajuste fiscal foi desidratado no Congresso, com o auxílio de 12 partidos da base governista que hoje na Comissão de Ética apoiam Eduardo Cunha, envolvido até o nariz em denúncias de corrupção.

Com exceção do PT, há quase consenso de que o ajuste fiscal é o primeiro passo para devolver dinamismo à economia. O PMDB tirou do colete uma agenda liberal pura que radicaliza o ajuste e o PSDB, apesar de igualmente solapar as medidas do governo nesse sentido, sabe que elas são um ponto de partida necessário, mas não suficiente. Joaquim Levy não mudou seu discurso desde que entrou no governo e esse discurso, que já não era agradável dentro do governo, onde sempre esteve isolado, não poderia ser agradável fora dele, onde os interessados revelaram-se mais preocupados em, por ação ou omissão, ver se o impeachment da presidente prosperaria ou não.

Esse fogo cruzado de forças sobre as quais Levy não tem a menor influência, exceto pela tentativa racional de persuasão, chamuscou o ministro, e, mais que isso, limitou o alcance de sua política e os meios de atingi-la. Dessa forma, os acertos devem ser debitados à sua persistência e os percalços, à fraqueza política do governo. No vale-tudo da disputa política, inverteu-se a lógica: os fracassos estão sendo atribuídos à política do ministro, que não pode ser testada em sua concepção original.

Nesse clima polarizado, as críticas de Lula se emaranharam nas de outros partidos para culpar Levy por não ter apresentado todos os passos de sua política econômica de uma só vez, o que é pura hipocrisia interessada. Os petistas, que não o apoiam, reclamam, como Lula, da falta de medidas para o crescimento em seus discursos, quando de fato não toleram é o ajuste. Senadores de diversos partidos que censuraram o ministro em jantar essa semana, não fizeram melhor: cobraram dele "reformas estruturantes" algum tempo depois de aprovarem pautas-bombas. Sem escoras políticas no governo ou fora dele, a nau de Levy está à deriva há algum tempo, assim como o ajuste fiscal que ele defende 24 horas por dia.

Como o calendário eleitoral desespera o PT - uma grande sova nas eleições municipais de 2016 é mais que provável - e o candidato ao Planalto em 2018, Lula, o ex-presidente resolveu tentar mudar o quadro político com fatos novos, unindo traços de um programa fracassado, como o da nova matriz econômica, a um improvável candidato a executá-la, Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central em seus dois governos. Lula associou o "falcão" dirigente de um BC ortodoxo a ideias como novos estímulos creditícios e moedas de troca irresponsáveis, como o aval a empréstimos externos a Estados e municípios. Em comum há o fato de que as duas medidas são prejudiciais à economia e que jamais passaram pela cabeça de Meirelles, a julgar pelos artigos que assina na "Folha de S. Paulo".

Levy está correto ao dizer que há muita afinidade entre ele e Meirelles. Ambos são ortodoxos e se distinguem talvez por nuances. Mas uma diferença relevante é que Meirelles gosta do poder e é um político com trânsito - elegeu-se pelo PSDB, transferiu-se para o PMDB e hoje é filiado ao anódino PSD de Gilberto Kassab. Além disso, o fato de chegar ao governo pelas mãos de Lula dá-lhe mais chances do que tem Levy de obter respaldo político. O diagnóstico para a solução da crise, porém, não é diferente do de Levy.

Meirelles é pragmático, a ideia de ser ministro da Fazenda o cativa, mas não a qualquer custo. Se não bastasse a gravidade das crises, não é visto com simpatia pela presidente Dilma. No BC, entregou a Lula o que prometeu porque tinha carta branca. Na Fazenda, ainda mais com Dilma, o jogo é bem diferente. Lula e mais gente reclamam da cantilena sempre igual de Levy, que não dá esperanças sobre o futuro. Com Meirelles, muda a melodia, mas não a letra. Como uma enorme crise de confiança trava a economia, Meirelles pode até ir para a Esplanada, mas essa não é uma negociação fácil nem de êxito garantido.

Sinfonia nº40 de Mozart

Carlos Drummond de Andrade: Consideração do Poema

Não rimarei a palavra sono
com a incorrespondente palavra outono.
Rimarei com a palavra carne
ou qualquer outra, que todas me convêm.
As palavras não nascem amarradas,
elas saltam, se beijam, se dissolvem,
no céu livre por vezes um desenho,
são puras, largas, autênticas, indevassáveis.

Uma pedra no meio do caminho
ou apenas um rastro, não importa.
Estes poetas são meus. De todo o orgulho,
de toda a precisão se incorporam
ao fatal meu lado esquerdo. Furto a Vinicius
sua mais límpida elegia. Bebo em Murilo.
Que Neruda me dê sua gravata
chamejante. Me perco em Apollinaire. Adeus, Maiakovski.
São todos meus irmãos, não são jornais
nem deslizar de lancha entre camélias:
é toda a minha vida que joguei.

Estes poemas são meus. É minha terra
e é ainda mais do que ela. É qualquer homem
ao meio-dia em qualquer praça. É a lanterna
em qualquer estalagem, se ainda as há.
– Há mortos? há mercados? há doenças?
É tudo meu. Ser explosivo, sem fronteiras,
por que falsa mesquinhez me rasgaria?
Que se depositem os beijos na face branca, nas principiantes rugas.
O beijo ainda é um sinal, perdido embora,
da ausência de comércio,
boiando em tempos sujos.

Poeta do finito e da matéria,
cantor sem piedade, sim, sem frágeis lágrimas,
boca tão seca, mas ardor tão casto.
Dar tudo pela presença dos longínquos,
sentir que há ecos, poucos, mas cristal,
não rocha apenas, peixes circulando
sob o navio que leva esta mensagem,
e aves de bico longo conferindo
sua derrota, e dois ou três faróis,
últimos! esperança do mar negro.
Essa viagem é mortal, e começa-la.
Saber que há tudo. E mover-se em meio
a milhões e milhões de formas raras,
secretas, duras. Eis aí meu canto.

Ele é tão baixo que sequer o escuta
ouvido rente ao chão. Mas é tão alto
que as pedras o absorvem. Está na mesa
aberta em livros, cartas e remédios.
Na parede infiltrou-se. O bonde, a rua,
o uniforme de colégio se transformam,
são ondas de carinho te envolvendo.

Como fugir ao mínimo objeto
ou recusar-se ao grande? Os temas passam,
eu sei que passarão, mas tu resistes,
e cresces como fogo, como casa,
como orvalho entre dedos,
na grama, que repousam.

Já agora te sigo a toda parte,
e te desejo e te perco, estou completo,
me destino, me faço tão sublime,
tão natural e cheio de segredos,
tão firme, tão fiel... Tal uma lâmina,
o povo, meu poema, te atravessa.

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Opinião do dia – Bernardo Mello Franco

A cartilha também diz que "no fim da linha está o objetivo de cassar o registro do partido, como ocorreu em 1947 com o antigo PCB". A comparação ofende a memória dos comunistas da época, como Jorge Amado e Carlos Marighella. Eles foram perseguidos e cassados por suas ideias, não por receber pixulecos.
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Bernardo Mello Franco, jornalista. ‘A cartilha do PT’, Folha de S. Paulo, 12 de novembro de 2015.

Ilusões perdidas na crise

Brasileiros que ascenderam nas últimas décadas sentem os efeitos da crise. A perda de conquistas, que pode devolver 3 milhões às classes D/E, provoca desencanto entre os eleitores da presidente Dilma, relatam

Efeitos da crise: Adeus às conquistas

• No Norte e no Nordeste, reduto do lulismo, eleitores lamentam o retrocesso e culpam políticos

Tiago Dantas, Renata Mariz e Silvia Amorim- O Globo

BELÉM (PA), PETROLINA (PE), SÃO RAIMUNDO NONATO (PI), JUAZEIRO (BA) e SÃO PAULO- Eles viram a vida melhorar nas últimas décadas. Na era Lula, experimentaram um inédito aumento do poder de compra. Adquiriram TVs, geladeiras, motos, carros, casa própria. Mas, agora, brasileiros que ascenderam socialmente sentem os efeitos da crise econômica e temem que a bonança tenha ficado para trás. Nos últimos dias, O GLOBO visitou dez cidades do Norte e do Nordeste do país e constatou como o desemprego e a inflação têm afetado a vida dessas pessoas.

A crise provoca um efeito político que fica evidente na conversa com eleitores. Representantes do lulismo e eleitores de Dilma Rousseff em cidades do interior de Pernambuco, Bahia e Piauí, onde a petista teve mais de 80% dos votos, dizem-se insatisfeitos com a presidente, embora alguns atribuam o agravamento do quadro à classe política como um todo.

Eles criticam o aumento dos preços e as mudanças nas regras de aposentadoria, e mencionam boatos sobre cortes no Bolsa Família — os cortes, até agora, só afetaram a verba de gestão do programa. A porcentagem de pessoas que avaliam o mandato de Dilma como ótimo ou bom na região caiu de 53%, no fim de 2014, para 10%, em agosto deste ano, segundo o Datafolha.

As regiões Nordeste e Norte devem registrar nos próximos dois anos ritmo maior de crescimento das classes D/E, segundo pesquisa da Tendências Consultoria. O estudo mostra que, até 2017, em todo o país, 3,1 milhões de famílias devem entrar para esse grupo, formado por quem tem renda média familiar mensal de até R$ 1.957. A maioria retorna da festejada classe C, que volta a minguar após a perda de bens e benefícios conquistados nos últimos anos.

— De 2004 a 2013 a gente teve um padrão de crescimento fortemente puxado pelos setores de varejo e serviços, conhecidos por empregarem a mão de obra de baixa qualificação. Só que a festa do consumo acabou, e esses setores estão puxando a derrocada para baixo agora — disse o coordenador da pesquisa, Adriano Pitoli.

Morador de São Raimundo Nonato, no interior do Piauí, o pedreiro Dilton Ferreira dos Santos, de 50 anos, viu reduzir os trabalhos na construção civil que antes sobravam na região. Pela primeira vez desde 2012, está desempregado há mais de três meses. A trajetória de Santos se confunde com a de muitos nordestinos: depois de passar boa parte da juventude trabalhando na lavoura sem salário fixo, conseguiu empregos que pagavam até R$ 1.000 mensais a partir de 2010. Construiu casa, comprou TV, geladeira e uma moto, que guarda na sala, já que o imóvel não foi projetado para ter garagem.

Na Grande Belém (PA), drama parecido é enfrentado pelo também pedreiro Antonio Furtado Costa, de 44 anos. Morador de Ananindeua, ele adotou o seu próprio “ajuste fiscal”: aposentou o ventilador e trocou as lâmpadas. Mesmo assim, a conta de luz passou de R$ 35,78 em setembro para R$ 57,92 em outubro. Seus ganhos semanais, que chegavam a R$ 1,8 mil até o início deste ano, caíram para cerca de R$ 800.

— Antes, eu passava serviço para colegas para não deixar o cliente esperando. Agora, faço orçamentos, espero o cliente ligar, e nada.

Com ensino fundamental, Antonio fala com desenvoltura sobre o momento político. Diz que, desde o impeachment de Collor, só vota nulo, por “falta de credibilidade” dos candidatos. Apesar de o filho ser beneficiário do Bolsa Família, critica o governo e outros políticos, como Eduardo Cunha, presidente da Câmara:

— A gente é simples, mas não é besta.

3,1 milhões de famílias devem entrar nas classes D/E até 2017, revertendo conquistas da era Lula

8,7% Taxa de desemprego do trimestre encerrado em agosto. Maior número desde o início da análise, em 2012

10,9% Recuo da produção industrial entre setembro deste ano e setembro de 2014

8,5% Inflação acumulada de janeiro a outubro deste ano, maior índice desde 2003. Taxa deve terminar o ano em torno de 10%

Casa mais cara

Governo deve retirar subsídio ao seguro no Minha Casa Minha Vida, o que vai encarecer a prestação. 

Gasto maior à vista para mutuário do Minha Casa

• Governo pode deixar de subsidiar seguro habitacional do programa. Recursos do Fundo Garantidor acabaram

Geralda Doca - O Globo

BRASÍLIA- Com o aperto no Orçamento, o governo pode deixar de subsidiar o seguro habitacional para os tomadores de empréstimos do programa Minha Casa Minha Vida, o que vai encarecer a prestação para os beneficiários. Criado em 2009, o Fundo Garantidor da Habitação Popular (FGHAB) recebeu R$ 29,49 milhões do Tesouro Nacional no período e realizou 1.923.524 operações, mas o dinheiro acabou. A meta da terceira etapa do programa é de três milhões de moradias, que já ficariam sem o seguro subsidiado.

Representantes do Ministério da Fazenda no Conselho Curador do FGTS informaram que as chances de alterar a lei que criou o Fundo, a fim de ampliar o limite para novos aportes, são mínimas, diante do cenário econômico adverso. Assim, caberá ao tomador do empréstimo contratar o seguro no mercado ou fazer uma compra casada com a Caixa Econômica Federal, principal operador do programa.

Procurada, a Caixa confirmou, em nota, que o Fundo já atingiu dois milhões de contratos e que, caso o governo não altere o limite, o mutuário terá de arcar com o custo do produto. A instituição não informou qual seria o impacto do fim do subsídio nas prestações da casa própria. Disse apenas que o valor é definido pelo mercado.

Segundo o vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac), Miguel de Oliveira, o custo do seguro é significativo porque incide sobre o preço total do imóvel. É diluído nas prestações e, se o governo deixar de subsidiálo, significa que o mutuário terá de arcar sozinho com o produto. Este varia de acordo com o valor do bem, a periodicidade e o risco do tomador: quanto maior a idade do mutuário, mais caro será o seguro.

— Todo o custo terá de ser arcado pelo mutuário. Significa que a prestação vai subir — destacou Oliveira.

A finalidade do Fundo é recuperar o imóvel em caso de danos físicos por causa natural e quitar a dívida em caso de morte ou invalidez do mutuário. Fontes do Conselho Curador lembram que, apesar de o governo ter elevado o limite do valor do imóvel e ampliado o montante do subsídio (desconto no contrato a fundo perdido), as condições para os tomadores na terceira fase do programa serão piores, porque as taxas de juros subiram substancialmente.

Realidade frustra projeções há 5 anos

Por Catherine Vieira e Flavia Lima – Valor Econômico

SÃO PAULO - O histórico mostra que a média das previsões dos analistas de fato nunca foi lá muito certeira. Mas desde o primeiro governo Dilma Rousseff observa-se um padrão pouco animador: ao fim de cada ano a realidade, tanto para a inflação quanto para atividade econômica, se revelou pior do que antecipavam os economistas no início de cada período.

Em 2015, ano que já começou com tom bastante pessimista, a dinâmica promete se repetir e já antecipa um início de 2016 com projeções consideravelmente negativas. Se os economistas consultados pelo Boletim Focus do Banco Central estiverem certos, a recessão em dois anos pode superar os 5% e a inflação encostaria em 17%. Um cenário que não se vê desde a virada de 2002 para 2003, devido às expectativas em torno da eleição de Lula. No caso da atividade, a comparação é ainda pior: não se vê uma recessão dessa magnitude desde 1930.

A questão que se coloca agora é se o padrão em 2016 vai repetir o que se verifica desde 2011 (ver quadro) - com os indicadores econômicos se mostrando ainda pior do que o antecipado - ou se voltará ao que se observava no período anterior, em que se alternavam frustrações das projeções para pior num ano, o que contaminava negativamente as expectativas, mas levava a realidade no ano seguinte a surpreender positivamente.

A má notícia é que não há quem se arrisque a endossar essa última possibilidade. Até mesmo os poucos economistas que resistiam a projetar o pior quadro até agosto ou setembro deste ano jogaram de vez a toalha e pularam para a ponta mais pessimista das projeções depois que o governo enviou ao Congresso o Orçamento deficitário para 2016 e perdeu em seguida o grau de investimento pela Standard & Poor's (S&P).

"Tinha algum grau de confiança para este ano de que o macro seria arrumado, de forma que chegaríamos no fim do ano com a sensação de que o pior já passou e seria mais fácil avançar na agenda estrutural", diz a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif. O "divisor de águas" para a mudança de opinião foi o Orçamento com déficit em 2016 e a consequente perda do grau de investimento pela S&P, marcada pela falta de convicção do governo acerca do ajuste.

"Quando isso aconteceu eu virei a chave para outro cenário", afirma. No novo horizonte traçado por Zeina, é difícil ver o que virá pela frente e neste contexto, 2016, pode, sim, seguir o padrão dos últimos anos: "A inflação esperada começa com 7% e sabe-se lá como termina". Para horizontes maiores, ressalta ela, a incerteza é grande e o potencial de retração para o ano que vem, diz, "não é brincadeira", igual ou até maior que este ano.

Carlos Kawall, economista-chefe do Banco Safra, afirma que começou 2015 achando que a saída da crise seria mais lenta, mas que ela não seria tão profunda quanto em crises anteriores. Hoje, estima que o desajuste é profundo e a saída será muito mais demorada do que se imaginava, com recuperação apenas em 2017. Kawall começou o ano esperando alta de 0,3% para o PIB em 2015 e avanço de 1% em 2016, mas revisou as projeções para um quadro de queda de 3,4% e de 1,9%, respectivamente. Já a inflação medida pelo IPCA começou o ano estimada em 7,2% para 2015 e agora encosta em 10%; para 2016, saltou de 5,8% para 7,2%.

Além de um cenário de curto prazo mais negativo, Kawall vê chances reais de 2016 se revelar pior do que quadro que vem sendo desenhado pelos economistas. "Ao contrário do que se diz, os economistas do mercado tem sido sistematicamente mais otimistas do que a realidade".

Era exatamente dessa maneira que se portava o Bank of America Merrill Lynch (BofA). Até meados do ano, o chefe de economia e estratégia do banco, David Beker, tinha uma visão que ele mesmo chamava de "mais construtiva" sobre a economia. Em julho, ou seja, antes de o governo reduzir as projeções de superávit primário para este ano, Beker se alinhava ao mercado ao esperar queda de 1,8% para o PIB deste ano, mas mantinha alta de 0,7% do PIB em 2016 - enquanto o Focus já apontava alta mais modesta, de 0,3% e alguns já apostavam em queda superior a 1%.

Após a perda do grau de investimento, Beker revisou suas projeções para o PIB para queda de 3,3% neste ano e de 1,4% em 2016. E em outubro deixou de vez a postura mais comedida para se colocar na ponta mais pessimista do mercado: a expectativa é de um 2016 pior do que 2015, com contração de 3,5% do PIB no ano que vem.

Outro que não duvida dessa possibilidade é José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator. Para ele, o fundo do poço para a economia - "se a gente entender isso como o nível mais baixo de PIB" - será atingido apenas no primeiro trimestre de 2017, em março.

Gonçalves espera queda de 3,3% para o PIB neste ano e de 2,1% para o ano que vem. Questionado se diante de um 2015 tão desafiador, o mercado não poderia importar um pessimismo exagerado para 2016, ele é taxativo: "Não dá para ser mais otimista para 2016 porque as razões que levam à queda do PIB neste ano permanecem".

Dentre essas razões, Gonçalves aponta pelo menos dois fatores que não estavam na conta no início de 2015 e devem continuar com desempenhos negativos: a forte contração do consumo e uma piora "brutal" do investimento. Levada pelo impacto da Lava Jato, queda dos investimentos da Petrobras, recuo dos desembolsos do BNDES e um programa de concessão que não deve sair do papel, a formação bruta de capital fixo (FBCF, a medida do que é investido na economia), deve recuar inéditos 17% em 2015, seguidos por outra retração de 11% em 2016.

Zeina, da XP, ressalta que a raiz da armadilha de recessão e inflação alta é a questão fiscal e que a sociedade vai ter que passar por um "teste de maturidade" e fazer escolhas. "Se não fizer ajuste fiscal, então teremos inflação alta e ficaremos sem crescer", diz.

Zeina conta que a todo momento se depara com clientes estrangeiros perguntando quando a economia brasileira vai estabilizar. A resposta é sempre, "não sei". Para sair disso, diz ela, o país precisa com urgência de uma agenda que contemple a realidade das contas públicas. "Por que se mexe no Fies, mas a universidade pública é intocável?", diz. "A política precisa dar essa resposta".

Um tanto mais otimista, Kawall, do Safra, já vê uma conscientização maior de que não é mais possível adiar essa agenda. "É possível dizer que está se construindo um consenso político em torno de propostas para agenda estrutural e essa é a saída para a crise", diz. (Colaborou Tainara Machado)


Base governista apoia Cunha após rompimento do PSDB

Abandonado pelo PSDB, Cunha recebe apoio de 13 partidos

• Líderes de bancadas aliadas a Dilma Rousseff divulgaram nota na qual defendem os prazos para a defesa do peemedebista

Adriano Ceolin, Daiene Cardoso e Igor Gadelha - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O PSDB formalizou nesta terça-feira, 11, seu rompimento com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Os dois representantes da sigla no Conselho de Ética dizem que votarão a favor da cassação do mandato do deputado acusado de ser beneficiário do esquema de corrupção na Petrobrás. Apesar do revés, Cunha recebeu o apoio de 13 partidos – 12 da base aliada e o Solidariedade –, que defenderem sua permanência no comando da Câmara.

Pela primeira vez, o líder do PSDB, Carlos Sampaio (SP), subiu à tribuna para cobrar o afastamento de Cunha do cargo de presidente. Até então, entre idas e vindas, o partido havia apenas assinado uma nota sobre o assunto. Em reação ao pedido de afastamento defendido pelos tucanos, o líder do PSC na Câmara, André Moura (SE), leu em plenário uma nota de apoio Cunha. O documento foi assinado por 13 partidos que representam mais de 230 parlamentares.

“Em nenhuma hipótese, a bancada do PSDB irá transigir com a ética exigida dos membros desta Casa, ainda que defenda uma causa nobre, como é o impeachment da presidente Dilma Rousseff” - Carlos Sampaio (PSDB-SP)

No documento, líderes de siglas como PR, PMDB, PSC, PP, PSD, PTB, Solidariedade, PEN, PMN, PRP, PHS, PTN e PT do B, dizem apoiar e ter total confiança na condução dos trabalhos de Cunha na presidência da Casa. “As denúncias apresentadas seguirão o curso do devido processo legal, onde haverá condição de defesa e julgamento por instâncias próprias e o princípio da presunção da inocência.”

Moura afirmou que ninguém pode ser condenado de forma antecipada e que o caso de Cunha não pode ser politizado. “Eventuais disputas políticas não podem prevalecer para paralisar o funcionamento da Casa no momento em que o País exige e espera que a Câmara dos Deputados delibere as matérias que o Brasil precisa para retomar o crescimento”, afirmou.

Segundo Moura, o grupo procurou o líder do governo, José Guimarães (PT-CE), para que os petistas apoiassem o documento. Ele afirmou que a nota chegou a ser encaminhada a Guimarães, mas os petistas não haviam se posicionado até o fechamento desta edição. “Se o PT resolver assinar mais para frente, será ótimo”, disse.

Pressão. O líder do PSDB afirmou que vai esperar a apresentação da defesa de Cunha no Conselho de Ética para definir uma posição sobre a possibilidade de pedir a cassação do mandato dele. Ele garantiu a permanência dos tucanos Betinho Gomes (PE) e Nelson Marchezan Júnior (RS). Nos bastidores, os dois já adiantaram que votarão a favor da cassação de Cunha. Por ora, contudo, não irão se manifestar publicamente. O DEM e o PPS devem seguir o posicionamento dos tucanos.

“As denúncias apresentadas seguirão o curso do devido processo legal, onde haverá condição de defesa e julgamento por instâncias próprias e o princípio da presunção da inocência (...) Eventuais disputas políticas não podem prevalecer para paralisar o funcionamento da Casa” - Documento de apoio a Cunha assinado por líderes de 13 siglas

Apesar das críticas mais enfáticas a Cunha, o PSDB ainda espera que ele delibere a favor da abertura de um processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. No seu discurso na tribuna, Sampaio usou toda a segunda parte de sua fala para defender um processo de afastamento da presidente.

O presidente da Câmara comprometeu-se a tomar uma decisão sobre impeachment até o fim deste mês. A aliados, Cunha demonstrou irritação com o PSDB. Integrantes do partido já temem sofrer retaliação, com a perda de relatorias de projetos relevantes. Como presidente, Cunha tem o poder de indicar nomes e, ao longo do ano, prestigiou o PSDB.

Outro receio dos tucanos é que Cunha desista de prorrogar a CPI do BNDES, comissão que tem causado dor de cabeça ao governo. Nesta quinta-feira, deve ser aprovada a convocação do ex-secretário do Tesouro Arno Augustin, que teve papel relevante no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff. O PT aceitou chamá-lo em vez de convocar o pecuarista José Carlos Bumlai, que é ligado ao ex-presidente Lula.

Cunha afirmou que a posição do PSDB “não altera em nenhuma vírgula” sua posição sobre os pedidos de impeachment. “Não tenho prazo determinado e jamais o farei sob pressão. Minha decisão será dada de forma técnica”, disse.

Oposição racha, e base apoia Cunha

A decisão do PSDB de pedir o afastamento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, levou a um racha na oposição. Ontem, líderes de 12 partidos, entre eles cinco da base governista, deram “total apoio” a Cunha.

Cunha recebe o apoio de 12 partidos

• Aliados do deputado reagem ao abandono da oposição, mas são menos que metade da Câmara

Isabel Braga, Chico Góis, de Maria Lima Letícia Fernandes- O Globo

BRASÍLIA- Depois do abandono dos principais partidos da oposição, os aliados do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) se mobilizaram ontem para dar uma demonstração de força em plenário. Conseguiram o apoio de 12 partidos, mas que não representam metade da Casa. Em fevereiro deste ano, Cunha foi eleito presidente da Câmara, logo no primeiro turno, com a maioria absoluta dos votos da Câmara.

O manifesto em apoio à Cunha foi proposto pelo líder do PSC, André Moura (SE), um dos aliados mais próximos do presidente, e apoiado por líderes de partidos da base aliada que costumam frequentar os almoços na residência oficial, como PMDB, PSD, PP, PR e PTB. Da oposição, mantém-se fiel a Cunha apenas o Solidariedade. A principal incógnita do apoio a Cunha continua sendo o PT, que não assinou o manifesto e tampouco saiu a público criticando o presidente.

— Aqui são mais de 230 deputados representados por seus líderes que ratificam a confiança na condução de Cunha — disse Moura.

Assim que ele acabou de falar, Rodrigo Maia (DEM-RJ) o corrigiu, dizendo que eram 231, dando seu apoio ao documento

No Conselho de Ética, o PT tem três deputados e poderá ser decisivo para dar continuidade ao processo contra o presidente da Câmara por quebra de decoro parlamentar. Aliados de Cunha avaliavam ontem que o PSDB, ao romper com o presidente da Câmara o jogou “no colo” do PT, e que o jogo se inverteu: o PT poderá ajudar Cunha no conselho e, em troca, ele não dar andamento ao pedido de impeachment de Dilma Rousseff. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem defendido que mais importante que derrubar Cunha, é garantir a governabilidade de Dilma.

Os petistas do conselho, no entanto, garantem que não há pressão sobre o voto a ser dado no próximo dia 24, quando o relatório do deputado Fausto Pinato (PRB-SP) será apresentado aos deputados. Zé Geraldo (PTPA) mantém a disposição de votar para continuar o processo e Valmir Prascidelli (PT-SP), quer esperar o relatório, mas diz que entende que há elementos para aprofundar as investigações.

— Não houve gestão sobre o voto. Vamos avaliar o processo — afirmou Prascidelli.

O líder do PT, Sibá Machado (AC) insiste que os conselheiros terão liberdade para votar:

— Acho errado pressionar os membros do Conselho de Ética. Eles vão agir conforme suas convicções.
Além de ratificar o apoio a Cunha, o manifesto defendeu a continuidade das votações na Câmara, o que é a principal preocupação do governo. Segundo o texto, mais importante que “eventuais disputas políticas” neste momento de crise econômica, é a Câmara votar.

— A oposição mudou de posição porque Cunha mudou o posicionamento em relação ao impeachment. O PR assina a nota, mas dará a seus membros no conselho toda autonomia — garantiu o líder do PR, Maurício Quintella Lessa (AL).

— Respeito o posicionamento do PSDB, mas se todo mundo romper com ele, o que será dessa Casa? Vamos tirar do presidente o direito de se defender? — justificou Rogério Rosso (DF), líder do PSD.

A decisão do PSDB de romper com Cunha foi tomada em reunião na noite da última segunda-feira, na qual a maioria foi a favor do afastamento de Cunha.

— Não elegemos o Eduardo Cunha. Ele nos ofereceu, às claras, um espaço legítimo que cabia à oposição, relatorias da reforma política e nas comissões. Veio a denúncia, demos o tempo para que viessem as provas e que ele se defendesse. Mas a defesa foi absolutamente insatisfatória e nós não seremos sócios desses delitos — disse o presidente do PSDB, Aécio Neves (MG).

Na Câmara, de forma meio envergonhada, sem citar enfaticamente a defesa do afastamento de Cunha da presidência da Câmara, o PSDB focou suas críticas ao peemedebista nas explicações apresentadas por ele para os recursos que mantém no exterior.

Cunha minimiza rompimento e lembra que PSDB não o apoiou para cargo

Débora Álvares – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Ao se posicionar publicamente sobre o distanciamento do PSDB, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), negou, ao fim da tarde desta quarta-feira (11), irritação e defendeu o direito de cada sigla "se posicionar como quer", contestando ainda o fato de tucanos serem seus aliados. Contra isso, argumentou que o partido apoiou o deputado Júlio Delgado (PSB-MG) nas eleições para a Presidência da Câmara no início deste ano.

"O PSDB não me apoiou na minha eleição de presidente. Inclusive teve um candidato, o Júlio Delgado, que está investigado na Lava Jato. Cada um tem o direito de se posicionar como quer. Não me cabe criticar", afirmou em entrevista à imprensa e completou: "Se eu tiver que criticar quem ficar contra mim, também vou ter que aplaudir cada um que ficar a meu favor".

Além de destacar o fato de o PSDB ter apoiado Júlio, Cunha alegou impedimento do deputado de participar de seu processo de cassação no Conselho de Ética. Delgado é membro da comissão que julga ilícitos de parlamentares e já declarou voto em desfavor do peemedebista.

"O candidato que o PSDB apoiou para presidente da Câmara, investigado na Lava Jato, é autor da representação contra mim e também é julgador, que é uma coisa que também deve ser questionada, não pode ser autor e julgador. Provavelmente os advogados irão fazê-lo (questioná-lo). O PSDB deveria falar do seu candidato", afirmou Cunha.

O presidente da Câmara se refere ao pedido de cassação apoiado por Delgado protocolado na Corregedoria da Câmara.

Cunha afirmou ainda que sua posição em relação ao impeachment de Dilma Rousseff não muda em nada com a postura do PSDB. "Não tenho prazo para fazê-lo. Minha decisão vai ser dada de forma técnica, baseada em razões técnicas".

Os tucanos já haviam manifestado, em nota divulgada há algumas semanas, posicionamento pelo afastamento do peemedebista da presidência da Casa. Contudo, nesta quarta, foram mais incisivos. Eles evitavam um embate direto com Cunha para não inviabilizar o impeachment. A avaliação, contudo, é que, para se salvar da cassação do mandato, o presidente acabou se aliando ao governo.

Em jantar, Levy 'foi massacrado', diz senador Jucá

Por Vandson Lima, Andrea Jubé e Fábio Pupo – Valor Econômico

BRASÍLIA - O ministro Joaquim Levy insistiu anteontem, em jantar com senadores, que as medidas de ajuste fiscal formam o "caminho natural" para a retomada do crescimento da economia e defendeu a recriação da CPMF. O encontro, organizado na casa do líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), foi duro para o ministro. Levy ouviu calado quase duas horas de críticas de senadores da base aliada e da oposição à política econômica. Nenhum deles - nem mesmo os cinco petistas presentes - saiu em sua defesa. "Levy foi massacrado", disse Romero Jucá (PMDB-RR).

Governistas se calam em jantar de ataques a Levy
Em sua peregrinação pela aprovação de medidas do ajuste fiscal, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy insistiu anteontem, em jantar com senadores, que estas formam o "caminho natural" para a retomada do crescimento da economia e afirmou que a recriação da CPMF é a "âncora fiscal" para garantir o reequilíbrio das contas públicas.

O encontro, organizado na casa do líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), foi árduo para o ministro. Levy ouviu calado quase duas horas de críticas de senadores da base aliada e da oposição à política econômica. Nenhum senador, nem mesmo os cinco petistas presentes, saiu em sua defesa. Ele não quis responder se poderia deixar o cargo em um futuro próximo.

"Levy foi massacrado", definiu o senador Romero Jucá (PMDB-RR). "Ele ficou ouvindo duas horas de massacre e no final defendeu o ajuste fiscal. Os senadores disseram a ele que a CPMF não passa porque só aumento de imposto não adianta, são necessárias medidas estruturantes", relatou. Segundo outros senadores presentes, partiram de Tasso Jereissati (PSDB-CE), Blairo Maggi (PR-MT) e Roberto Requião (PMDB-PR) as críticas mais contundentes ao ministro.

Em linhas gerais, os senadores reclamaram que a política restringe-se a "cortes e impostos", sem expectativa de futuro.

Em sua manifestação, Maggi ponderou que todas as medidas que Levy pediu ao Congresso na primeira fase do ajuste foram entregues, mas a economia não respondeu e ele fez novas demandas. Num complemento à fala de Maggi, o senador Reguffe (PDT-DF) observou que "não adianta vento bom se a nau não tem rumo". Roberto Requião disse que gosta "pessoalmente" de Levy, mas que detesta a sua política econômica.

Nenhuma liderança governista, nem senadores do PT, saíram em defesa de Levy. Compareceram o líder do governo, Delcídio Amaral (PT-MS), o líder do PT, Humberto Costa (PE), e os senadores Walter Pinheiro (BA), Gleisi Hoffmann (PR), Jorge Viana (AC) e Lindbergh Farias (RJ), da bancada petista.

Após ouvir as intervenções, Levy disse que a CPMF é necessária para garantir uma receita extra de R$ 32 bilhões, e que também poderá reforçar os cofres de Estados e municípios. Observou que o nível de endividamento das famílias brasileiras é baixo e que após completado o ajuste nos moldes que defende, a economia responderá "naturalmente".

Convidado, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), optou por um jantar com o líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos. Estiveram presentes 40 dos 81 senadores, sendo 11 do PMDB, que também levou o ex-presidente da República José Sarney.

Logo após circularem notícias sobre as dificuldades enfrentadas por Levy no jantar, o Ministério da Fazenda emitiu nota oficial em que o ministro agradece aos senadores pelos comentários feitos no jantar. "Obrigado pela oportunidade de ouvir o sentimento e avaliação de cada um e especialmente a receptividade com que fui brindado. O compromisso com o Brasil e o espírito de cooperação entre a mais alta liderança do país na busca de soluções nesse momento de tantas incógnitas foram as principais impressões que levei daqueles momentos", afirma o texto do ministro.

Ele aproveita para fazer mais uma defesa da segurança fiscal. Diz que é preciso garantia no curto prazo de receitas necessárias para o equilíbrio das contas públicas. Além disso, Levy cita a necessidade de reformas estruturais. "Os instrumentos mais habituais de estímulo à economia já foram usados à exaustão. Portanto, teremos que trabalhar para enfrentar questões estruturais, de forma a dar competitividade ao país", afirma o ministro, que defendeu ainda o enfrentamento da burocracia relacionada a impostos e ao ambiente de negócios que propicie a "modicidade dos juros".

Rumor faz dólar cair, mas Levy continua

O rumor de que Henrique Meirelles, ex-presidente do BC, substituiria Joaquim Levy no Ministério da Fazenda agradou ao mercado e fez o dólar cair. O PT pressiona pela troca, mas a presidente Dilma resiste.

• Dilma resiste à pressão do PT por Henrique Meirelles

Duelo pela Fazenda

• Levy Reage em meio a rumores de que deixaria ministério. Dilma resiste ao nome de Meirelles

Martha Beck, Catarina Alencastro, Gabriela Valente, Eliane Oliveira, Simone Iglesias e João Sorima Neto - O Globo

BRASÍLIA e SÃO PAULO- Em meio a rumores de que a presidente Dilma Rousseff poderia trocar o comando do Ministério da Fazenda, o ministro Joaquim Levy acabou se envolvendo num duelo velado com o ex-presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, candidato de Lula e do PT para assumir a pasta. E o encontro entre os dois ocorreu justamente num evento de empresários, que, da plateia, mostraram seu favoritismo por Meirelles. Além do setor produtivo, também no mercado financeiro cresce uma espécie de torcida pelo nome de Meirelles para ocupar a Fazenda. Os rumores de uma substituição fizeram o dólar cair ontem. Meirelles atualmente é presidente do conselho da J&F Investimentos, holding que controla entre outras empresas a JBS.

Levy, que na véspera ouvira críticas de senadores da oposição e da base aliada num jantar oferecido pelo líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), ontem acabou dividindo com Meirelles um mesmo painel no Encontro Nacional da Indústria (Enai). Levy, que trabalha para permanecer no cargo, defendeu o ajuste fiscal no evento dos empresários e fez questão de ressaltar que tem visões parecidas com as de Meirelles, indicando que uma troca no comando da Fazenda não mudaria a política econômica. Meirelles, contudo, ganhou pontos com o empresariado ao se manifestar contra a CPMF, defender o emprego e o crescimento.

Saída inevitável, mas não imediata
Fontes do Palácio do Planalto já admitem que a situação de Levy se deteriorou muito e consideram sua saída inevitável, mas não seria imediata, pois o ministro ainda teria como missão trabalhar pela aprovação da segunda etapa do ajuste fiscal no Congresso. Segundo fontes, a presidente Dilma não tem dado sinais de que irá substituí-lo antes desse prazo, mas cresce a pressão em torno do nome de Meirelles.

Ao discursar no encontro do Enai, Levy destacou que o primeiro passo para que a atividade econômica se recupere é o ajuste fiscal:

— A gente precisa de segurança fiscal. Ninguém vai colocar dinheiro se acha que a gente vai ter mais problema.

Já Meirelles, em discurso feito sob medida para agradar o setor produtivo e também o mercaLogo do, defendeu a necessidade do ajuste fiscal por meio do corte de gastos, mas disse que a CPMF “não é necessariamente um imposto positivo”, lembrando que existem diversas formas de tributação que são produtivas para a economia. Ele também ressaltou a importância de uma agenda para o crescimento e mostrou preocupação com o aumento do desemprego:

— Cada posto de trabalho perdido é gravíssimo — afirmou Meirelles.

Empresários que participaram do evento afirmaram ter preferido o discurso de Meirelles e disseram que, devido a sua experiência e passado político, preferiam vê-lo da Fazenda. O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, fez duras críticas à política conduzida por Levy. O dirigente fez questão de dizer que não defende a saída do ministro, mas disse que o empresariado não quer apenas o ajuste fiscal e sim medidas para a retomada do crescimento. Ele foi aplaudido quando criticou a recriação da CPMF, proposta considerada essencial pela equipe econômica para o reequilíbrio das contas públicas:

— Não tenho comentário algum contra o Joaquim Levy como ministro da Fazenda. (...) Mas o que nós precisamos hoje é de alguém que mostre que o Brasil tem uma política econômica suficientemente boa para permitir o crescimento do país. E isso nós não temos visto no Ministério da Fazenda — afirmou Andrade.

Desde cedo, o grande assunto do Enai foi o possível embate entre o atual e o possível futuro ministro da Fazenda. Levy, que deveria discursar pela manhã, comunicou que não poderia comparecer no horário previsto, porque tinha uma reunião com parlamentares da Comissão Mista de Orçamento. Com isso, sua participação teve que passar para a tarde e acabou coincidindo com a de Meirelles. Levy chegou na hora do almoço e acabou sendo convidado a sentar numa mesa com o ex-presidente do BC e Robson Andrade. Como não havia mais tempo para a palestra de Levy, Meirelles cedeu parte de seu tempo para que o ministro dissesse algumas palavras iniciais.no começo da fala, Levy destacou as afinidades com Meirelles.

— Temos afinidades de pensamento. Concordo com tudo o que ele vai dizer (Meirelles). Trabalhamos juntos — disse, se referindo ao tempo em que ocupava a secretaria do Tesouro e Meirelles chefiava o BC.

Perguntado se havia recebido algum convite para assumir a Fazenda, Meirelles disse que não recebeu nada “concreto”:

— Não há convite concreto e eu, como disse, não comento especulações, nenhum tipo de hipótese. Eu não sei o que as pessoas estão pensando ou decidindo.

Dilma é contra articulações
Meirelles disse que segue a vida normalmente e procura colaborar com todos os setores como teria feito com a palestra para a indústria. Questionado se faria algo diferente de Levy, ele se esquivou:
— Por causa desse barulho todo que está acontecendo, eu prefiro não responder. Uma postura adequada e correta é que eu evite comentários específicos.

Segundo fontes do governo, a presidente Dilma Rousseff não gosta das articulações em torno do nome de Meirelles e atribui, em conversas reservadas, esses movimentos ao próprio ex-presidente do BC. Assessores da presidente citaram as conversas com o mercado e as demonstrações de que ele seria o candidato de Lula como motivo de constrangimento. Outra crítica é em relação a notícias de que Meirelles estaria condicionando seu ingresso no governo a superpoderes.Um ministro atribuiu os boatos da saída de Levy ao próprio Meirelles:

— Marola. Meirelles fica espalhando boato para colar e Levy se desgastar e sair.

No encontro da indústria, Meirelles reagiu com tranquilidade a uma pergunta sobre a resistência da presidente Dilma ao seu nome. Disse que a relação com a presidente é boa e lembrou que trabalhou com Dilma quanto ela comandava a pasta de Minas e Energia e da Casa Civil.

— Sempre tivemos uma relação cordial e tranquila com convergência e divergências de ponto de vista, o que é normal.

Procurada, a assessoria de imprensa de Meirelles negou que ele esteja fazendo qualquer tipo de articulação política. Segundo a assessoria, Meirelles sempre tem e teve bons contatos com políticos.

Marina diz que Brasil elegeu presidente sem plano de governo

Bela Megale – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - A ex-senadora Marina Silva, idealizadora do partido Rede Sustentabilidade, fez críticas ao governo da presidente Dilma Rousseff destacando que não há um plano definido para tirar o Brasil crise econômica e defendeu a necessidade de definir uma agenda para o país.

"O governo tem um plano, o partido da presidente tem outro e o partido do vice-presidente (Michel Temer) tem outro plano. São três planos econômicos em curso", disse ela em entrevista ao jornalista Roberto D´Avila no canal GloboNews nesta quarta-feira (11).

"E o (plano) do governo não é do governo, é apenas do ministro da Fazenda. Como se ele tivesse se autonomeado", emendou Marina, referindo-se ao ministro Joaquim Levy que, apesar de permanecer no cargo, enfrenta grande resistência do PT e suas principais lideranças, como o ex-presidente Lula.

Marina, que foi candidata à presidência em 2014 ficando em terceiro lugar, também criticou o que chamou de "partidarização e fulanização de conquistas" ao defender que o Brasil não estaria vivendo a crise em que se encontra hoje se tivesse passado por uma alternância de poder.

"Não posso ter um projeto de país que só funciona comigo. Isso é partidarização e fulanização da conquistas". A ex-senadora comparou a situação atual com o final do segundo mandado do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e o primeiro ano de governo de Lula (PT), em 2002.

"Ali tivemos uma sinalização interessante. Não vamos fulanizar o Plano Real, ele é uma conquista da sociedade brasileira. Qual era o próximo passo? Não vamos fulanizar o Bolsa Família, ele é uma conquista da sociedade brasileira".

A ex-senadora também afirmou que o país elegeu uma presidente "sem plano de governo", que tinha "apenas peças de marketing".

Marina defendeu os ex-presidentes "Fernando Henrique sociólogo" e "Lula operário" devem dialogar no sentido de demonstrarem que estão preocupados não só "em apenas promover seus partidos" e "liderança pessoal". "Às vezes aquilo que nós processamos em palavras precisa ser concretizado em atos de humildade", disse ela.

Questionada se aceitaria assumir o papel de fazer um elo entre PT e PSDB por transitar entre lideranças das duas siglas, a ex-senadora afirmou não ter essa pretensão. "As coisas estão muito polarizadas. Por isso, acho que o empoderamento correto seria o da sociedade", enfatizou.

Marina lembrou que a última vez que se encontrou com Lula foi quando ele estava fazendo um tratamento de quimioterapia para se curar de um câncer de laringe. No entanto, disse que "esse é o momento que que ninguém tem o direito de dizer que não se dispõe ao diálogo".

Mais uma vez a ex-senadora criticou o atual sistema político brasileiro dizendo que não há mais condições de "continuamos com esse esse presidencialismo de coalizão que virou de confusão e agora já é de desmoralização".

Marina Silva defende o diálogo entre FH e Lula

• Em entrevista, líder da Rede critica desencontro entre Dilma, PT e PMDB

- O Globo

A ex-senadora Marina Silva, líder da Rede, saiu em defesa do diálogo entre os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva para buscar soluções para a crise econômica. Marina foi entrevistada pelo jornalista Roberto D’Ávila, em seu programa que foi ao ar ontem na GloboNews.

— As lideranças políticas do país têm que ter uma curva de aprendizagem. Se foi possível ao Fernando Henrique manter diálogo com o Antônio Carlos Magalhães, e o Lula manter diálogo com o Sarney, com o Collor, com o Renan Calheiros, com o Eduardo Cunha, por que não é possível o diálogo entre o Fernando Henrique sociólogo e o Lula operário? Esse é o momento de cada um daqueles que já cumpriram a sua função darem as mãos ao Brasil. Esse não é o momento de apenas promover o nosso partido, a nossa liderança pessoal — disse Marina. 

"É preciso uma agenda clara"
A líder da Rede também criticou a falta de entendimento entre a presidente Dilma Rousseff, o PT e o PMDB, partido do vicepresidente Michel Temer, sobre o melhor programa econômico capaz de tirar o Brasil da crise.

— É preciso uma agenda clara para que as pessoas digam: nós vamos pagar um preço por um certo tempo, mas aqui tem uma agenda. Nós vamos sair da crise maiores e melhores — afirmou Marina. — Não podemos ter uma situação em que o Brasil já perdeu o índice de investimento por uma agência, corre o risco de perder outro, e enquanto isso, o governo tem um plano, o partido da presidente tem outro plano, e o partido do vice tem outro plano. São três planos econômicos que estão em curso. E o plano do governo é apenas do ministro da Fazenda, como se ele tivesse se autonomeado.

Segundo Marina, a falta de credibilidade da classe política dificulta o apoio popular às medidas de ajuste fiscal propostas pelo governo.

— Onde está a preocupação de recuperar a credibilidade do país? Primeiro, se você está no governo, seja o partido da presidente ou do vice, não tem que ficar fazendo manifesto. Você tem que discutir e apresentar projetos.

PSDB diz que cartilha do PT é 'vergonhosa'

• Publicação afirma que esquema de corrupção revelado na Lava Jato teve origem no governo tucano de Fernando Henrique Cardoso

Valmar Hupsel Filho - O Estado de S. Paulo

A Executiva Nacional do PSDB afirmou ser “vergonhosa” a iniciativa do PT de, a pretexto de “defender o indefensável”, atacar instituições e a oposição na cartilha distribuída a partir desta quarta-feira à militância. “Chega a ser vergonhosa mais essa iniciativa do PT que, a pretexto de se defender do indefensável, acusa e afronta a própria democracia brasileira ao atacar nossas instituições, seus representantes, e a oposição”, afirmou o PSDB em nota divulgada na noite desta quarta-feira, 11.

No documento elaborado para fundamentar militantes petistas com argumentos de defesa às denúncias de coprrupção contra integrantes do partido, o PT acusa a força-tarefa da Operação Lava Jato, o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes e setores da imprensa de agirem deliberadamente, com base em mentiras, para “eliminar o partido da vida política brasileira”.

Com 34 páginas, a cartilha afirma que o esquema de corrupção revelado pela Operação Lava Jato teve origem no governo tucano de Fernando Henrique Cardoso. E acusa o ex-presidente de “engavetar” as denúncias.

O PT incluiu na publicação tabelas mostrando valores de doações de empresas investigadas pela Lavga Jato ao PSDB. Segundo o PT, as 17 empreiteiras investigadas doaram R$ 619 milhões ao PT e às campanha de Dilma Rousseff e R$ 601 milhões ao PSDB e à campanha de Aécio Neves em 2014.

“Se a origem das doações é a mesma, por que criminalizar apenas as contribuições ao PT?”, questiona o documento.

“As 17 empresas investigadas na Operação Lava Jato não têm contratos apenas com o governo federal, mas com governos estaduais e prefeituras controladas pelo PSDB e outros partidos. Por que investigar e criminalizar somente e relações dessas empresas com o PT?”. A cartilha cita ainda que outros partidos “incluindo os moralistas mais hipóicritas: PPS, DEM e Solidariedade” também receberam recursos destas empresas.

O texto cita como contraponto o caso de São Paulo. “Governado há 22 anos pelos tucanos, São Paulo é o paraíso das doações empresariais. Diferentemente do que ocorre em nível nacional, em que as contribuições são equilibradas entre PT e PSDB, em São Paulo os tucanos receberam 2 vezes mais dinheiro do que os candidatos do PT nas eleições de 2010 e 2014”.

Na nota divulgada nesta quarta, assinada pela Executiva Nacional, o PSDB afirma que melhor faria o PT se concentrasse suas energias em explicar à sociedade brasileira o conjunto de delitos e responsabilidades que lhe são imputados. “O PSDB se posiciona em defesa do aprofundamento das investigações da operação Lava Jato que, inclusive, já levou à condenação do tesoureiro do PT, conclui a nota.

PT atiça o formigueiro

Fernando Canzian – Folha de S. Paulo

O jogo duplo entre o PT de Dilma e Eduardo Cunha, visto como necessário para barrar um processo de impeachment no Congresso, está embaralhando a sociedade, os movimentos sociais e partidos que ainda dão sustentação à presidente pior avaliada do país.

A liderança do governo Dilma no Congresso patrocinou nesta quarta (11.nov.), dentro de seu próprio gabinete, a redação de documento dos partidos governistas ratificando "total apoio e confiança" a Eduardo Cunha. Até ontem, vale lembrar, o PSDB também sustentava Cunha.

No domingo, o presidente da Câmara foi alvo central, em nove Estados, de manifestações comandadas por entidades ligadas ou simpáticas ao PT (como CUT e MTST). As lideranças também criticaram a própria Dilma ao demandar a saída de seu ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

Nos últimos dias, caminhoneiros bloquearam estradas em 14 Estados pedindo a saída imediata de Dilma da Presidência.

Houve também manifestações de mulheres (e homens) contra Eduardo Cunha em várias cidades (há outra prevista para esta quinta, às 17h, no Masp).

Nesse caldo, CUT, MTST e movimentos espontâneos como dos caminhoneiros e das mulheres podem acrescentar o que faltou neste 2015 à "tempestade perfeita" prevista por analistas no início do ano.

A partir de uma reivindicação específica (o não aumento das tarifas de ônibus), o Brasil perdeu completamente a paciência em junho de 2013 e colocou para fora todas as suas frustrações. A ponto de tentar invadir o Congresso, sede de governos e de literalmente pôr fogo no Palácio do Itamaraty, em Brasília.

Em 2013 a situação econômica era muito melhor do que a atual. O país fechou aquele ano com a menor taxa de desemprego da série histórica (4,3%) e o PIB cresceu 2,3%. A inflação foi de 5,9%, abaixo do teto da meta do Banco Central.

Os protestos vieram mesmo com recordes no total de empregos com carteira assinada e aumentos na renda dos trabalhadores. Sintoma de que havia um mal estar profundo e difuso em relação a fatores inseparáveis do modo como o Estado toma e presta conta de suas ações perante a sociedade.

Agora, o PIB está caindo 3%, a inflação é de 10% e o desemprego caminha rapidamente para os dois dígitos. A renda média dos brasileiros sofre a maior queda desde 2003 e o varejo tem seu pior resultado em 15 anos.

2016 já está praticamente encomendado. E pode não ser muito diferente disso.

O comando do Brasil, de memória curta, parece simplesmente ter esquecido do que se passou há pouco mais de dois anos. Quando o Congresso foi sitiado e todos os políticos tiveram que se mexer rapidamente para aplacar um movimento que fugia completamente ao controle.

Com seus últimos movimentos, PT, CUT e MTST podem estar "dando ideias". E acendendo o fósforo que falta.

Protesto contra demissões termina em confronto com a PM

• Ato era contra desativação de unidade da Usiminas em Cubatão

Jaqueline Falcão - O Globo

-SÃO PAULO- Trabalhadores e policiais militares entraram em confronto ontem durante um protesto em frente à unidade da Usiminas, em Cubatão, na Baixada Santista, em São Paulo. A manifestação foi convocada por sindicatos para protestar contra a decisão da empresa de paralisar a produção de placas de aços planos na unidade. A desativação total das atividades na fábrica pode levar à demissão de até 8 mil empregados.

Em 29 de outubro, junto com o balanço do terceiro trimestre, a Usiminas anunciou que irá desativar gradualmente a produção da sua usina siderúrgica de Cubatão, a antiga Cosipa, como “medida de adequação à condição de mercado”. Um dos altos-fornos da unidade já havia sido desligado em maio. Em setembro, a empresa suspendeu a produção de chapas grossas usadas na produção de navios e máquinas pesadas. A previsão para a conclusão do processo de desativação da unidade é de três a quatro meses.

Grupo bloqueia entrada da fábrica
A Companhia Siderúrgica Paulista (Cosipa) foi inaugurada em 1963 pelo presidente João Goulart. Em 1993, foi privatizada e passou a integrar o conglomerado da Usiminas.

A Usiminas vive uma acirrada disputa entre seus acionistas controladores — a japonesa Nippon Steel & Sumitomo e a ítalo-argentina Terniun. O anúncio da intenção de suspender a produção aconteceu no mesmo dia em que a companhia divulgou um prejuízo de R$ 1,04 bilhão no terceiro trimestre, depois de já ter registrado perdas de R$ 780,8 milhões no trimestre anterior. De acordo com a empresa, a queda nas receitas e as perdas decorreram de um declínio de 1,6% nas vendas de aço no mercado interno, e de uma retração de 35,8% nas vendas de minério de ferro.

Na manifestação de ontem, houve confusão quando um grupo de sindicalistas tentou impedir a entrada de ônibus que chegavam com funcionários para o trabalho. Eles tentavam convencer os trabalhadores a aderirem ao movimento.

A Polícia Militar usou bombas de gás lacrimogênio, spray de pimenta e até balas de borracha para dispersar as cerca de 300 pessoas que estavam no local. A cavalaria da PM também foi acionada. Dois sindicalistas foram detidos. Participaram do ato representantes de cerca de 50 sindicatos.

Após o confronto, houve um ato nas ruas da cidade com a presença da prefeita de Cubatão, Marcia Rosa (PT), que criticou a ação da PM. A prefeitura chegou a decretar ponto facultativo a partir das 11h para incentivar os moradores a participarem da manifestação.

A siderúrgica é uma das maiores empresas da cidade, com forte peso na arrecadação — só no ano passado, a Usiminas foi responsável pela entrada de mais de R$ 100 milhões nos cofres municipais. A empresa emprega trabalhadores de diversas cidades da Baixada Santista. Em nota, a empresa declarou que lamentava o descumprimento pelos sindicalistas de decisão da Justiça do Trabalho que, na véspera dera garantia de livre manifestação aos sindicalistas, desde que estes não impedissem o acesso dos empregados à fábrica.

Números

R$1 BI DE PREJUÍZO Resultado da Usiminas no 3º trimestre

8 MIL DEMISSÕES É o total de trabalhadores que podem ir para a rua se a fábrica de Cubatão fechar

Petrobrás faz 'última proposta' de acordo trabalhista a sindicatos

• Reajuste proposto, de 9,53%, é maior que os 5,73% da primeira proposta, apresentada em setembro

Antonio Pita - O Estado de S. Paulo

RIO - A Petrobrás informou nesta quarta-feira, 11, que, em reunião com as federações de petroleiros responsáveis pela greve da categoria, apresentou uma "proposta definitiva" para acordo trabalhista. A estatal ofereceu reajuste de 9,53% nos salários e remunerações, além de manter benefícios e vantagens vigentes. A petroleira também indicou que aguarda "posicionamento favorável e encerramento das mobilizações."

"A companhia também se comprometeu a criar um grupo técnico, com representantes da Petrobrás, da Federação Única dos Petroleiros (FUP) e sindicatos, para elaborar um relatório sobre itens constantes na Pauta pelo Brasil. O grupo deverá elaborar um relatório para análise da direção da empresa", afirmou a estatal em comunicado divulgado há pouco sobre a pauta política da Federação, que é contrária à venda de ativos e corte de investimentos.

A primeira proposta para o Acordo Coletivo de Trabalho (ACT), apresentada em setembro, previa um reajuste de 5,73%. A empresa também propunha não rever os valores pagos para benefícios de alimentação e outros adicionais. No mês seguinte, a companhia propôs novo porcentual, de 8,11%. O valor da nova oferta apresentada hoje é equivalente à inflação acumulada em doze meses, segundo os sindicatos.

"Essa é a proposta definitiva da companhia e traduz o empenho máximo da empresa para atender às reivindicações dos empregados e seus representantes. A Petrobrás, diante dos avanços na proposta, aguarda um posicionamento favorável dos empregados e seus representantes e o encerramento das mobilizações promovidas pelas entidades sindicais", concluiu a nota da empresa.

Segundo a estatal, a proposta foi apresentada também à Federação Nacional dos Petroleiros (FNP), que reúne cinco sindicatos dissidentes da FUP. Ambas as federações informaram que ainda estão estudando os termos propostos pela Petrobrás para, então, emitir um parecer sobre a continuidade do movimento.

Portugal: PS terá de agradar a opostos

• Partido deverá conciliar expectativas de aliados radicais de esquerda, mercado e UE

Carolina Jardim - Globo

Após derrubar o governo de centro-direita do conservador Pedro Passos Coelho, o Partido Socialista (PS) enfrenta a difícil tarefa de agradar, ao mesmo tempo, a seus aliados da esquerda radical, ao mercado financeiro e à União Europeia (UE), provando ser possível romper com a política de austeridade sem pôr em risco a frágil recuperação econômica do país.

Liderados por António Costa, os socialistas se uniram ao Partido Comunista (PCP) e ao Bloco de Esquerda (BE) e, pela primeira vez em mais de 40 anos, conseguiram derrubar no Parlamento um governo de centro-direita recém-eleito. A coalizão de esquerda espera que o presidente Aníbal Cavaco Silva lhe dê o aval para a formação de um novo Executivo em breve, embora o conservador não tenha prazo determinado para fazê-lo.

Se Costa assumir como primeiro-ministro, ele terá rapidamente que apresentar o Orçamento de 2016 a Bruxelas, depois de Portugal perder o prazo no mês passado. Apesar de a aliança de esquerda prometer honrar os compromissos orçamentários assumidos com a UE, os investidores reagiram com desconfiança à queda de Passos Coelho — ontem, a agência de classificação de risco Fitch admitiu que poderia rebaixar a nota do país, citando a “instabilidade política”.

PS tenta barrar venda da TAP
O programa que põe fim à rota da austeridade será um teste para Portugal, que saiu somente no ano passado da crise da dívida e do programa de resgate internacional, após quatro anos de profundos cortes nos gastos públicos. Entre as prioridades dos socialistas estão restaurar os salários do setor público aos valores de antes dos cortes feitos durante a crise, aumentar as pensões públicas mais baixas, reintroduzir quatro feriados e aumentar o salário-mínimo.

Em uma medida que reafirma o compromisso com os comunistas de travar as privatizações, o PS moveu-se ontem para tentar reverter a venda da companhia aérea TAP — prevista para ser concluída em 12 de novembro — afirmando que a ação “seria contrária à posição da maioria do Parlamento”.

A aliança entre os três partidos de esquerda demandou concessões que, segundo o analista político Pedro Magalhães, da Universidade de Lisboa, resultaram num acordo mais sólido do que o esperado, apesar das diferenças ideológicas. A coalizão, no entanto, ficaria potencialmente ameaçada se os objetivos econômicos não forem alcançados, de acordo com o especialista.

— Do ponto de vista político, os partidos fizeram um acordo firme, sem esbarrar em assuntos que são incompatíveis para as legendas, como a continuação na zona do euro. Mas o principal risco é que, se o governo não conseguir alcançar o crescimento esperado, poderia ser forçado a aumentar os impostos, e dificilmente contaria com o apoio do PC e do Bloco de Esquerda, gerando um impasse — afirmou Magalhães ao GLOBO.

Presidente resiste a Costa
Boaventura Sousa Santos, professor da Universidade de Coimbra, destacou a proposta socialista como a ruptura de uma política de cortes “extremamente violenta que, nos últimos quatro anos, destruiu a classe média”. Ele chamou atenção, ainda, para uma mudança de perspectiva do próprio bloco europeu sobre o tema.

— A UE está passando por uma transformação no sentido de aliviar a política de austeridade — ressaltou Santos.

Para viabilizar um programa que visa, basicamente, a gastar mais sem prejudicar as finanças, o PS desistiu, por exemplo, de diminuir as contribuições para seguridade social, segundo Magalhães. O partido sustenta que medidas como o aumento do salário terão impacto nas receitas fiscais e no PIB.

Resistente à nomeação de um governo de esquerda, Cavaco Silva poderia exigir garantias adicionais aos dirigentes socialistas. Outra possibilidade é manter a coalizão de centro-direita no comando, limitada a um governo de gestão, até que novas eleições sejam convocadas. A realização de um pleito antecipado caberá ao próximo presidente, cuja eleição está prevista para janeiro.

Em referência velada à rasteira contra Passos Coelho — que amargou o governo mais curto da História do país, mas ainda não renunciou oficialmente — Cavaco Silva afirmou ontem durante uma premiação que, “no espírito científico, as disputas não são resolvidas pela força, mas pelo diálogo”.

Roberto Freire: O apagão científico do Brasil

- Diário do Poder

A grave crise econômica que abate o Brasil, agravada pela tremenda incompetência do PT e pelo desmantelo da corrupção, também afeta um setor determinante para o futuro de qualquer nação, mas que não parece atrair a atenção do governo de Dilma Rousseff. A área científica, capaz de mudar a realidade do país, é uma das que mais vem sendo penalizadas pela irresponsabilidade que marca a atual administração.

No intervalo de apenas um ano, entre 2013 e 2014, houve uma drástica redução no investimento destinado à ciência por meio dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, de R$ 2 bilhões para R$ 1,4 bilhão. Para piorar, enquanto a média mundial de investimento no setor é de 2,1% do Produto Interno Bruto, segundo dados de 2011 da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e do Banco Mundial, o Brasil reserva apenas 1,2% de seu PIB à pesquisa e à inovação científica, ocupando um modesto 30º lugar em uma lista de países encabeçada pela Coreia do Sul (4%).

O descaso com que o governo lulopetista trata uma área tão crucial fica evidenciado quando se observa com atenção alguns dos maiores problemas enfrentados pelos profissionais da ciência nos últimos anos. Houve, por exemplo, redução de recursos dos fundos setoriais, voltados a áreas mais específicas, com transferência irrisória de recursos para a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), uma empresa pública criada com o objetivo de investir em ciência, mas que tem repassado verba cada vez mais escassa para a pesquisa científica.

Os novos editais que deveriam garantir o pleno funcionamento dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs), criados em 2008 para desenvolver da pesquisa básica até os estudos mais avançados, não vêm sendo honrados porque é justamente a área científica aquela primeiramente atingida pelos cortes do governo em tempos de crise. Outro drama é vivenciado nos órgãos estaduais de ciência, duramente atingidos pela crise. No Rio de Janeiro, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado interrompeu momentaneamente a liberação de novos recursos, enquanto em São Paulo, apesar de não haver cortes, os institutos operam com apenas metade do número necessário de pesquisadores.

Infelizmente, há amplos setores do PT e do atual governo incapazes de enxergar a importância estratégica de o Brasil estar bem posicionado nesse campo. Prevalece entre eles uma visão dogmática, muitas vezes contaminada por matizes ideológicos, que encara o desenvolvimento tecnológico como uma ameaça aos trabalhadores, cujos empregos estariam em risco. Essa leitura anacrônica do mundo contemporâneo pode ser interpretada quase como uma espécie de “ludismo do século 21” – o que nos remete ao movimento ludista, datado do início da Revolução Industrial, quando trabalhadores quebravam as máquinas como forma de protesto contra a mecanização de suas atividades. Nos dias de hoje, trata-se, evidentemente, de uma visão obscurantista, infelizmente compartilhada por alguns setores mais reacionários e atrasados da esquerda, que se prendem ao passado e atuam contra o avanço da sociedade.

Se o Brasil quiser sair da crise e se desenvolver como nação, abrindo as portas para o desenvolvimento e se lançando com autonomia ao futuro, devemos enfrentar com urgência o apagão científico que o governo do PT deixa como um de seus mais perversos legados. Só nos libertaremos do atraso e nos firmaremos como uma sociedade plena de conhecimento, pronta para alcançar um novo patamar no cenário mundial, quando a ciência se transformar em absoluta prioridade. O futuro é agora e não pode mais esperar.
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Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS