sábado, 8 de janeiro de 2022

Dora Kramer: Nós e a brisa

Revista Veja

Vaticínios sobre a inviabilidade da chamada terceira via são feitos sem que se dê a esse caminho ao menos o benefício da dúvida

Três ideias rondam o ambiente político neste início do ano eleitoral de 2022: Luiz Inácio da Silva voltará à Presidência, Jair Bolsonaro lançará mão de ilegalidades para resistir à derrota e nenhuma alternativa a tal cenário é possível. Fala-se disso como se o inesperado não pudesse nos fazer uma surpresa, conforme descrito por Johnny Alf em Eu e a Brisa, nos idos de 1967.

Pois no imprevisível junto às artes do acidental é que residem a graça e a essência de uma eleição sob as regras da democracia, onde o que vale é a vontade de milhões de pessoas envolvidas num processo que só acaba quando termina.

Portanto, aos arautos das convicções inamovíveis conviria flexibilizar as respectivas mentes de modo a não se tornarem reféns de profecias que se autorrealizam.

De algum modo já vivemos isso desde quando forças políticas começaram a se mobilizar em torno de outra hipótese que não a repetição de velhos erros. De de lá para cá, o que se vê são vaticínios sobre a inviabilidade da chamada terceira via.

Isso sem que se dê a esse caminho ao menos o benefício da dúvida. Uma chance real, não meramente retórica, expressa em frases do tipo “…caso subam nas pesquisas” acompanhadas de toda sorte de desqualificações porque ninguém ainda foi capaz de ameaçar a dianteira de Lula e Bolsonaro. A oito meses da eleição.

Marco Antonio Villa: Por uma eleição com ideias

Revista IstoÉ

As bandeiras políticas de Bolsonaro são frágeis. Servem apenas para mobilizar sua militância e, especialmente, os robôs nas redes sociais

Como será 2022? Teremos o processo eleitoral mais violento desde 1989. Isso é mais que uma previsão, é uma certeza. O cenário dos três anos de governo Bolsonaro aponta para uma eleição marcada não pela disputa de ideias, mas pela brutalidade, pela selvageria, pela bestialidade. Por um lado, porque Bolsonaro fomentou o ataque sistemático às instituições, aos valores consagrados na Constituição de 1988. Foram meses e meses de ameaças ao Estado democrático de Direito, culminando no trágico 7 de setembro de 2021. Por outro, porque o governo não tem nada a mostrar, nada realizou, não tem o que se chama popularmente de “vitrine”. Desta forma, só pode apostar na violência, na desqualificação pelo ódio dos adversários. Teremos, certamente, confrontos de rua, que vão servir, para o extremismo bolsonarista, como instrumentos de mobilização de suas bases e para justificar o discurso de hostilidade à democracia.

Bolívar Lamounier: Nossa eterna e vil tristeza

Revista IstoÉ

A eleição do sr. Jair Bolsonaro foi o reflexo perfeito de um País carente de elites capazes de balizar o processo político

A crise que ora assola o Brasil deve-se a problemas acumulados ao longo de décadas e a outros de ocorrência recente, entre os quais cumpre destacar os efeitos da recessão econômica iniciada no governo Dilma Rousseff, a pandemia Covid-19, o péssimo desempenho das instituições políticas, nos três Poderes e, não menos importante, a ascensão à presidência do sr. Jair Bolsonaro. Essa é, digamos assim, a parte visível do iceberg político, acima das elites e dos eleitores em geral. Hoje quero discorrer brevemente sobre as elites, fator raramente considerado. Entendo que sem elites robustas e bem preparadas, dificilmente as instituições políticas formais terão um bom desempenho.

Ricardo Rangel: A prioridade para 2022

Insistir em candidatura sem chances ajuda a matar a terceira via

Há muitas prioridades para 2022. A vacinação. O combate à fome, à miséria e à desigualdade, que recrudesceram por causa da recessão e da pandemia. Recuperar o tempo perdido na educação. Retomar o crescimento econômico e as reformas do Estado e reduzir o desemprego.

Combater o desmatamento (e estipular que a meta é zero). Recuperar os investimentos em ciência e tecnologia. Discutir como reduzir o impacto da revolução tecnológica nos empregos. Reconstruir a democracia e suas instituições.

E, claro, retirar Bolsonaro do poder.

Com exceção do último item (que ele quer impedir), nada disso é prioridade para Jair Bolsonaro. E é por isso mesmo que a maior prioridade do Brasil para 2022 é remover Jair Bolsonaro do poder.

Hélio Schwartsman: Sim, sou um tarado da vacina

Folha de S. Paulo

Fato raro, reconheci-me numa fala de Bolsonaro

Fato raro, reconheci-me numa fala de Bolsonaro. Sim, sou um dos tarados da vacina. E tenho motivos para sê-lo. Só três conquistas do engenho humano pouparam, cada uma, no acumulado dos anos, mais de 1 bilhão de vidas. São elas fertilizantes artificiais, esgotamento sanitário e vacinas. Outros "milagres" da ciência como antibióticos e a pasteurização salvaram "apenas" centenas de milhões. A anestesia, sem a qual Bolsonaro não teria sobrevivido a tantas intervenções cirúrgicas, fica na casa dos milhões. Se tivéssemos de escolher uma única tecnologia biomédica para conservar para o futuro, a imunização seria seriíssima candidata.

Ignorância não é crime —ninguém sabe tudo o que há de relevante para saber sobre um assunto—, mas militar em favor dela é. Especialmente o presidente da República precisa informar-se antes de propagar asneiras pelas ondas hertzianas. Não é verdade, por exemplo, que crianças não morrem de Covid-19. Pelas contas do acapachado Ministério da Saúde, até o dia 6 de dezembro, o Brasil registrava 301 óbitos pelo Sars-CoV-2 na faixa dos 5 aos 11 anos.

Cristina Serra: Aula de humanidade com os zoés

Folha de S. Paulo

Imagem que vem da floresta amazônica é um raio de luz para o Brasil atual

Vem da floresta amazônica uma imagem que é um raio de luz neste momento em que o presidente volta a atacar as vacinas e, de forma especialmente cruel e criminosa, tenta sabotar a imunização de crianças.

Uma fotografia que circula intensamente nas redes sociais mostra o jovem indígena Tawy Zoé levando o pai, Wahu Zoé, nas costas, para tomar a vacina contra a Covid. O idoso não enxerga bem e tem dificuldades de locomoção. Como os nomes indicam, eles são da etnia zoé, que vive nas matas do noroeste do Pará, perto da fronteira com o Suriname.

O autor da foto é o neurocirurgião Erik Jennings, que há quase 20 anos trabalha na assistência de saúde aos zoés. A foto foi feita quase um ano atrás, quando começou a vacinação. Jennings conta que decidiu divulgá-la agora, em seu perfil no Instagram, para incentivar a vacinação num momento em que o mundo enfrenta mais uma onda de contágio.

Demétrio Magnoli: Gina e o resto

Folha de S. Paulo

Chefe de diversidade de Biden passeia por São Paulo e questiona maioria branca

"Ok, cadê todo o resto?", perguntou-se Gina Abercrombie-Winstanley, chefe de Diversidade e Inclusão no Departamento de Estado do governo Biden, durante sua visita ao Brasil. Gina viu que "a maioria das pessoas era branca, com certeza mais claras do que eu" e, "sabendo que a população é próxima do 50%-50%", emergiu a dúvida sobre o paradeiro do "resto".

A diplomata passeou por São Paulo, não por Salvador, o que explica parte do mistério. Mas, para além da geografia, sua perplexidade decorre de um erro de informação.

A população brasileira não se descreve como "50%-50%". Segundo a última Pnad, 43% declaram-se brancos, 47% pardos e 9% pretos. A noção de uma divisão quase meio a meio entre "brancos" e "negros" decorre, exclusivamente, de uma decisão político-administrativa de unificar os autodeclarados pardos e pretos na categoria "negros".

João Gabriel de Lima: Há algo de bom no reino da Dinamarca

O Estado de S. Paulo.

Confiança traz investimento e bem-estar. E, como, mostra a Dinamarca, traz felicidade

Os pré-candidatos à Presidência da República João Doria (PSDB) e Sérgio Moro (Podemos) criticaram ontem o “revogaço petista”, que, como mostrou o Estadão, planeja rever a reforma trabalhista, as privatizações e o teto de gastos caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva volte ao Palácio do Planalto.

“O emprego não voltará ressuscitando leis ultrapassadas, mas, sim, com crescimento econômico”, disse Doria, em nota. O “revogaço petista”, afirmou o governador de São Paulo, “vai aumentar o desemprego e manter a inflação elevada”. “E com desemprego e inflação altos, quem mais sofre são os mais pobres.”

Moro, por sua vez, comparou sua proposta de reforma com as dos líderes nas pesquisas de intenção de voto: Lula e Jair Bolsonaro (PL). “Há três propostas postas na mesa da pré-campanha presidencial”, escreveu o ex-juiz, no Twitter. “Uma que fará as reformas necessárias ao País (a nossa); outra de um governo que desistiu completamente de implementar reformas (governo atual); e a terceira que quer revogar reformas já consolidadas (PT)”, disse o ex-ministro, que está em viagem pelo Nordeste.

Adriana Fernandes: Governo faz lambança jurídica

O Estado de S. Paulo.

Se quisesse, o presidente poderia ter escolhido acabar com algum dos incentivos deletérios

O governo vetou o Refis das micro e pequenas empresas alegando que a lei aprovada pelo Congresso de parcelamento dos débitos tributários com descontos de juros e multas precisava de compensação por conter renúncia de receitas.

Depois, integrantes do governo e lideranças parlamentares justificaram que a razão era outra: a lei eleitoral que impediria a concessão de benefícios em ano de eleições.

Por essa interpretação, a lei deveria ter sido sancionada antes da virada do ano. Artigo da lei eleitoral diz que a distribuição gratuita de bens, valores e benefícios é proibida no ano de realização do pleito, exceto nos casos de calamidade pública e de estado de emergência.

Ascânio Seleme: PT sendo PT

O Globo

Estranho seria se Lula apresentasse agora uma pauta liberal, sobretudo depois do fracassado governo de direita e falso liberal de Bolsonaro. Por isso, não tem por que se comover com os sinais do PT e do próprio Lula em torno de uma agenda de centro-esquerda para um provável novo governo petista. Pode não dar certo, tem tudo para dar errado, mas este é o seu caminho natural. Não dá para pedir algo diferente ao candidato que lidera as pesquisas dez meses antes da eleição presidencial. Só se quiséssemos engolir uma farsa eleitoreira, e o eleitor está farto de farsas.

Vamos ver os pontos que suscitaram o debate. O primeiro e mais óbvio é o da reforma trabalhista. Lula parabenizou o governo espanhol por reverter alguns pontos da reforma trabalhista de 2012, insinuando que poderá ir pelo mesmo caminho se for eleito. A reforma promovida pelo governo Temer mexeu em 117 artigos da CLT com a promessa de aumentar empregos no país. Obviamente não houve melhora na oferta de vagas, mais em razão da economia precária do que reflexo das mudanças. Se a reforma não é popular, mudá-la não será mera trivialidade. Lula vai precisar do Congresso para dar a guinada. E se der, ninguém garante que a vida do trabalhador vai melhorar. Pode se dar o contrário, já que a tendência natural é o enxugamento de vagas pelos empregadores.

Claudio Ferraz: O que pensam os economistas dos presidenciáveis?

O Globo

Quase todos, mesmo os que representam candidatos de centro-direita, falam da necessidade de gerar crescimento econômico com redução da desigualdade

Nesta semana, o jornal Folha de S. Paulo publicou uma série de artigos de economistas que assessoram alguns potenciais candidatos à Presidência em 2022. Apesar de os artigos não serem planos de governo completos, eles nos permitem entender as visões e prioridades de alguns dos economistas que assessoram os candidatos.

Confesso que acho um pouco prematuro um exercício desses. Tenho certeza de que muitas coisas escritas nem foram conversadas com os candidatos presidenciais. Mas, mesmo assim, há coisas interessantes neste conjunto de artigos.

A primeira delas é uma preocupação generalizada com a redução da desigualdade. Quase todos os economistas, mesmo os que representam candidatos de centro-direita, falam da necessidade de gerar crescimento econômico com redução da desigualdade de renda.

Mas as propostas e prioridades que aparecem são bastante diferentes. Enquanto Henrique Meirelles e Nelson Marconi deixam claro que a redução da desigualdade social depende do crescimento sustentado de empregos de melhor qualidade, Affonso Pastore fala em “dar a todos o mesmo ponto de partida através de educação e saúde.”

Mas, em um mundo onde os serviços e a tecnologia são cada vez mais importantes, simplesmente focar na igualdade de oportunidades não será suficiente para a criação de empregos de qualidade.

Pablo Ortellado: Tumulto nas eleições

O Globo

Nesta semana, a invasão do Congresso americano completou um ano. Em 6 de janeiro de 2021, uma multidão que participava de comício convocado por Donald Trump se dirigiu ao Capitólio para tumultuar a sessão que sacramentaria o resultado das eleições vencidas por Joe Biden.

O que aconteceu naquele dia? Foi um protesto pacífico com episódios isolados de violência? Ou um tumulto orquestrado para atrapalhar a sessão? Foi uma tentativa fracassada de golpe de Estado? Qual a responsabilidade do ex-presidente Donald Trump e da cúpula do Partido Republicano? O que aconteceu em 2021 foi apenas um ensaio para 2024? Há bons motivos para acompanharmos o debate que tenta responder a essas questões, já que Estados Unidos e Brasil têm muitas semelhanças.

Quando acompanhamos a ascensão e consolidação de Donald Trump no Partido Republicano, chama a atenção como o então empresário e apresentador de TV passou de um candidato marginal e excêntrico — ironizado e duramente combatido pelas forças dominantes do republicanismo nas primárias de 2016 — a líder incontestável da legenda. Hoje praticamente não há espaço no Partido Republicano para quem diverge do ex-presidente. A transformação levou metade da classe política do país a aderir a teses conspiratórias sobre as eleições, além de a outras posições extremas em temas como pandemia e imigração.

Por aqui, a inabilidade de Jair Bolsonaro, combinada com seu discurso antipartidos, retardou a captura da classe política por seu projeto populista e autoritário. Mas a adesão entusiasmada de políticos do Centrão, sua entrada no PL e a perspectiva de formação de uma poderosa federação partidária com PL, PP e Republicanos mostram o risco de uma bolsonarização mais acentuada da classe política. As perspectivas ficam ainda mais sombrias se imaginarmos que, a esse grupo de partidos, poderia se juntar o União Brasil, fruto da aliança entre PSL e DEM — cenário hoje improvável, mas que poderia se dar para a formação de uma base parlamentar, na eventualidade de Bolsonaro assegurar um segundo mandato.

Carlos Alberto Sardenberg: Bolsonaro não é Trump

O Globo

O ex-presidente Donald Trump concedia uma entrevista, com plateia favorável, quando lhe perguntaram se havia tomado a dose de reforço. Trump respondeu “sim” — e com entusiasmo.

Foi surpreendido com vaias. Não se intimidou. Apontou o dedo para o grupo que vaiava e comentou que se tratava de uma minoria. Era mesmo.

Como conciliar isso com a atitude francamente negacionista dos republicanos e do próprio Trump? São contra qualquer medida que torne a vacina obrigatória — como ocorre quando uma empresa só emprega imunizados ou quando um estabelecimento só permite a entrada de quem apresentar o certificado.

Para os republicanos, essas regras restringem a liberdade individual, configuram uma quase ditadura.

Nesse caso, vacinar-se não é contraditório?

Parece. E, de fato, 60% dos americanos não vacinados se declaravam republicanos — isso em outubro, segundo pesquisa citada pelo economista Paul Krugman em coluna no New York Times.

A explosão da Ômicron vem sendo chamada de “histeria irracional” por lideranças republicanas do primeiro time.

E, entretanto, Trump se vacinou e contou isso para todo mundo.

Qual a lógica?

Trata-se de política, não de ciência, sugere o mesmo Krugman. A hipótese é a seguinte: mesmo sabendo que a pandemia é grave e que a vacina funciona, os chefões republicanos fazem campanhas negacionistas para, primeiro, fidelizar sua base de ignorantes e, segundo, atrapalhar o governo do democrata Biden, criar caso, gerar medo e insegurança, sentimentos que sempre se voltam contra o presidente de plantão.

Marcus Pestana*: Governabilidade e eleições

Daqui a 9 meses teremos eleições gerais no Brasil. Tudo indica que o problema crônico e progressivo da democracia contemporânea brasileira não será sanado: o descolamento das eleições presidenciais em relação às eleições parlamentares e suas consequências na sustentação política do governo.

Hoje no Brasil existem 33 partidos registrados no TSE, sendo que 24 deles têm presença no Congresso Nacional. No ciclo democrático vigente entre 1945 e 1964, UDN, PSD e PTB eram os eixos organizadores da vida política brasileira, com alto grau de consistência política e fidelização de suas bases.

Nas primeiras eleições presidenciais pós golpe de 64, em 1989, o sinal amarelo acendeu pela primeira vez, quando um jovem governador de Alagoas, com discurso populista contra os “marajás” e o “Estado elefante”, usando pioneiramente avançadas ferramentas de marketing, por um partido inexistente, o PRN, venceu nomes como Ulysses Guimarães, Lula, Brizola, Mário Covas, Aureliano Chaves e seus PMDB, PT, PDT, PSDB, PFL. Daí para a frente, o quadro mergulhou numa deterioração crescente. Veio a equivocada decisão do STF declarando a cláusula de barreira inconstitucional, a criação dos fundos partidário e eleitoral, a consolidação de uma legislação partidária e eleitoral flácida e permissiva, a pulverização disfuncional e sua consequência principal: a migração do presidencialismo de coalizão para o presidencialismo de cooptação, que resultou no mensalão e na Lava Jato.

Eduardo Affonso: Sonhos não envelhecem

O Globo

Emoldurado por um teatro desoladoramente vazio e sob as palmas apenas da orquestra, um homem caminha, amparado, até sua cadeira, na boca de cena. Ali, ouve em silêncio os primeiros acordes de canções compostas há meio século — ou teria sido há meia hora? E então solta a voz — aquela que Elis Regina disse ser a de Deus, se Deus tivesse uma voz.

A voz de Deus não tem mais o timbre, a potência, a extensão de outros tempos. Mas é, ainda, solene, terna, envolvente. Divina.

Quem está ali é Milton Nascimento, cercado de novos arranjos, jovens artistas e músicos embevecidos com o compositor que não precisou escolher entre ser moderno ou eterno. Sua arte esteve sempre impregnada de uma ancestralidade e uma modernidade atemporais. Milton é aquela esquina onde se cruzaram os Beatles e a música sacra, San Vicente e o Beco do Mota, o jazz e o que se dançava nos bailes da vida. Ao cantar Três Pontas, cantou o mundo.

Diferentemente dos outros grandes da sua geração, não foi preso, não teve de se exilar. Sua prisão foi a censura; seu exílio, o das palavras. Do encontro com Clementina de Jesus, salvou-se um refrão; restou uma invocação do que seria um dueto com Dorival Caymmi. Nem por isso Milton deixou de fazer do “Milagre dos peixes” um dos seus discos mais eloquentes: a voz era um instrumento que não se podia censurar.

O que pensa a mídia: Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

A pobreza cresce com a alta de preços

O Estado de S. Paulo.

Combinados, desemprego alto e inflação acelerada corroem os salários e empobrecem os trabalhadores do setor privado

Os brasileiros entram mais pobres em 2022, com a renda familiar corroída pelo desemprego e pela inflação e sem perspectiva de melhora sensível nos próximos meses. Os preços ao consumidor subiram 10,42% nos 12 meses até dezembro, segundo a prévia da inflação oficial, superando amplamente a meta (3,75%) e o limite superior de tolerância (5,25%). A correção salarial, negociada com muita dificuldade num ambiente de baixa atividade econômica, ficou longe de compensar as perdas acumuladas. Até novembro, os trabalhadores com carteira assinada conseguiram reajuste médio de 6,5%, no setor privado, embora os preços pagos por bens e serviços consumidos tenham subido 8,4%, no período de um ano, de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), usado como referência para negociações salariais.

Só 19% das negociações proporcionaram ajustes de salários superiores à inflação acumulada até novembro, indica o “Salariômetro” coordenado pelo professor Hélio Zylberstajn, da Faculdade de Economia e Administração da

USP. “Quando existe desocupação muito grande, os sindicatos não têm poder de barganha nas negociações. É o pior cenário para os trabalhadores”, disse o economista, citado em reportagem do Estadão. O levantamento apontou reajustes abaixo da inflação em 51% dos acordos e empate em 30% do total.

Poesia | João Cabral de Melo Neto: Luz em Joaquim Cardozo

Escrever de Joaquim Cardozo
só pode quem conhece
aquela luz Velásquez
de onde nasceu e de que escreve.

A luz que das várzeas da Várzea
onde nasceu, redonda,
vem até o ex-Cais de Santa Rita
que viveu: luz redoma,

luz espaço, luz que se veste,
leve como uma rede,
e clara, até quando preside
o cemitério e a sede.

Publicado no livro Museu de tudo (1975).

Música | Claudionor Germano: Frevo Ciranda (Capiba)

 

sexta-feira, 7 de janeiro de 2022

Luiz Werneck Vianna*: Em política o que é, é.

A sociedade está entregue a si mesma, ao desamparo de partidos e de vozes que a representem e mesmo assim, por meio de suas instituições ou até por fora delas, tem-se demonstrado capaz de se defender da pandemia que nos infesta diante de um governo omisso e até conivente com ela por sua postura refratária às prescrições recomendadas pela ciência. Contudo, apesar dele, os brasileiros acorrem em massa aos postos de vacinação e ao uso de máscaras e se disseminam práticas de autodefesa nas periferias por meio de práticas solidárias, especialmente nos seus setores subalternos afligidos por uma situação de miséria crescente. O credo neoliberal vocalizado em tom triunfante por Margareth Thatcher de que essa coisa de sociedade não existe tem encontrado refutação eloquente na cena brasileira atual.

A constatação desse fato benévolo torna ainda mais gritante a ausência dos partidos políticos democráticos, principalmente os de esquerda, nos movimentos sociais, limitados às suas ações no âmbito parlamentar numa conjuntura onde ainda se fazem presentes ameaças reacionárias e fascistas. No mundo desertificado da política atual não se pode fazer ouvidos moucos a importante iniciativa de dois próceres da nossa política, Lula e Alkmin, de conceber uma ampla coalizão a fim de pela via eleitoral fechar as portas para o caminho de desgraças que acomete o país.

Fernando Gabeira: No embalo da pandemia

O Estado de S. Paulo.

Assim como nos Estados Unidos, embora não seja o único tema, a covid-19 terá certamente um peso eleitoral no Brasil

O ano começa com um problema que não nos deixou: a pandemia. Embora não tenha condições científicas de afirmar, parece que uma nova onda de covid-19 se abate sobre o Brasil, trazida pela variante Ômicron. Baseio-me em observações pessoais, muitos conhecidos testando positivo e também pelo crescimento do número de testes nas farmácias.

O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros, afirma que no processo eleitoral a pandemia já estará esquecida. Naturalmente que a performance de Bolsonaro não o ajuda e os políticos que o apoiam querem passar uma borracha sobre o tema.

Mas o próprio Bolsonaro, se não bastasse a Ômicron, se dedica a prolongar a polêmica sobre a pandemia. No momento em que a imunização já avançava, ele investiu contra o passaporte sanitário. Na entrada do ano, o governo dedica-se a empurrar com a barriga a vacinação infantil, por orientação do próprio Bolsonaro.

Assim como nos Estados Unidos, embora não seja o único tema, a pandemia terá certamente um peso eleitoral. A resistência de Bolsonaro à vacinação infantil deve afastá-lo mais ainda do eleitorado feminino. Sem contar que muitas crianças voltam às aulas sem que o processo tenha sido realizado integralmente, aumentando os riscos.

Eliane Cantanhêde: Viajando na maionese

O Estado de S. Paulo

Ômicron, Delta, influenza, ‘flurona’, enchentes, rebelião do funcionalismo. E daí?, dirá Bolsonaro

É uma provocação barata e desnecessária do presidente Jair Bolsonaro sair de um hospital de São Paulo e no mesmo dia pegar outro voo para ir a um jogo de futebol de cantores sertanejos em Goiás. Dos jet skis, das férias do Natal, das férias do ano novo e da nova obstrução direto para a campanha eleitoral. Governar, que é bom, necas.

E que tal mandar interromper as férias do seu médico no Caribe para em seguida cair num jogo de futebol, enquanto inundações e enchentes da Bahia se estendem por Maranhão, Tocantins, Paraná, Minas e a própria Santa Catarina das férias presidenciais, ameaçando a vida, as casas e os bens de milhares de brasileiros?

Enquanto isso, também, a Ômicron já matou o primeiro brasileiro, em Goiás, e a covid corre solta mundo afora e acende o sinal vermelho no Rio, São Paulo, Minas, Pernambuco, Bahia, Rio Grande do Sul, além do DF, onde o número de casos deu um salto de 900% do Natal aos primeiros dias de 2022.

Luiz Carlos Azedo: A pedagogia do mau exemplo na campanha antivacinas

Correio Braziliense

Bolsonaro sabota a estratégia de imunização das crianças. É um péssimo exemplo para a saúde pública.  A subnotificação está mascarando a verdadeira dimensão da quarta onda de Covid-19

O presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou a criticar a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) por liberar a vacinação do público pediátrico de 5 a 11 anos. Chamou os cientistas e médicos que defendem a vacinação das crianças a partir dos cinco anos de “tarados da vacina” e reiterou que a sua filha, de 11, não será vacinada. Sua ofensiva contra a vacinação de crianças e pré-adolescentes ocorre num momento em que explodem os casos de influenza e de covid-19, inclusive com transmissão comunitária da variante ômicron. Pronto- socorros e ambulatórios estão lotados, houve aumento exponencial da procura por testes de covid-19.

Os números registrados nos Estados Unidos, Europa e Ásia revelam que a quarta onda da pandemia de covid-19 é uma realidade, com o registro de mais de 2,5 milhões de casos por dia. A interpretação do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, de que o Brasil está fora dessa rota não corresponde à realidade. Além disso, corrobora as suspeitas de que o apagão de dados do SUS pode ter sido provocado por hackers, mas a demora para resolver o problema faz parte da má vontade e das manobras protelatórias do governo federal contra a vacinação. O ministro está incorrendo nos mesmos erros que o general Eduardo Pazuello cometeu à frente do Ministério da Saúde, ao se submeter aos caprichos do presidente da República e dar as costas à população em situação de risco sanitário.

César Felício: Contrato nupcial entre desiguais

Valor Econômico

PSB está com pouco poder de barganha para negociar com PT

A federação partidária é uma velha aspiração do PSB. Não à toa foi um parlamentar do partido que propôs o projeto aprovado no ano passado. Isso em 2015, iniciativa do então senador Antonio Carlos Valadares.

O parceiro preferencial de quase todas as articulações partidárias sempre foi o PT. Está claro, portanto, que ainda que possam acontecer outros matrimônios no jogo das legendas, os protagonistas da novela que o mundo político acompanha são PT e PSB. Partidos de centro-direita podem se federar, mas a Federação é uma antiga ideia da centro-esquerda.

Andam mal as negociações, dada a resistência petista em ceder espaços, e caciques partidários de fora da esquerda apostam que o casamento não irá se concretizar.

“A questão central é a governança. Vai ser preciso um estatuto da federação. São muitas as dúvidas. As convenções serão conjuntas ou cada sigla terá que fazer a sua? se forem juntas, como vai ser a ponderação? quem vai ter mais peso?”, indaga um adversário certo da esquerda este ano.

Bernardo Mello Franco: A advogada e o general

O Globo

Eny Moreira estudava Direito em Juiz de Fora quando leu um perfil de Sobral Pinto, o lendário defensor de presos políticos. Largou a revista e avisou a mãe: “Vou trabalhar com esse homem”. Determinada, viajou para o Rio e madrugou à espera do advogado na porta de uma igreja. No dia seguinte, estava contratada como estagiária. A parceria se estenderia por 15 anos.

Conhecida pela coragem, Eny chegou a ser presa duas vezes. Não se limitou a defender as vítimas do autoritarismo. Também denunciou as torturas praticadas nos porões. Em 1971, pediu a abertura de inquérito contra o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, chefe do DOI-Codi paulista. Protestava contra as agressões ao estudante Paulo Vannuchi, que 34 anos depois se tornaria ministro dos Direitos Humanos. “Minha petição sumiu como num passe de mágica, nunca foi tomada providência”, contou, em entrevista para o livro “Advocacia em tempos difíceis”.

Eny denunciou a farsa do julgamento de Virgílio Gomes da Silva, participante do sequestro do embaixador americano. Na tribuna, disse o que as autoridades fingiam ignorar: o guerrilheiro já havia sido morto na tortura. Irritado, o juiz cassou sua palavra e ameaçou expulsá-la do tribunal.

Bruno Boghossian: A fumaça do Capitólio brasileiro

Folha de S. Paulo

Apesar de armistício, acrobacias antidemocráticas do presidente terão efeito em 2022 e no futuro

Donald Trump não conseguiu melar a eleição de 2020, mas teve sucesso em seu plano B. Um ano depois da invasão do Capitólio, um terço dos americanos acredita na informação falsa de que a disputa foi fraudada para favorecer Joe Biden, e quase metade dos republicanos não aceita até hoje a vitória do democrata.

O ex-presidente adubou o terreno político dos EUA para preservar sua influência. Mesmo derrotado, ele se consolidou como líder de um processo de divisão da sociedade americana que se tornou uma importante ferramenta eleitoral da direita.

O trumpismo se firmou como uma linha central do Partido Republicano. Dirigentes se recusam a condenar a tentativa de golpe de 6 de janeiro de 2021, tratam o ex-presidente como um candidato competitivo para 2024 e pegam carona nas fantasiosas alegações de fraude para aprovar medidas que restringem o voto de potenciais eleitores democratas.

Flávia Oliveira: Volta que deu ruim

O Globo

A esta altura, esperava confirmar duas semanas de férias em Salvador (BA) e reencontrar, no 2 de Fevereiro, a celebração a Iemanjá que se tornara tradição dos meus verões. Esperava não temer assistir presencialmente ao show de Maria Bethânia, após um par de anos aplaudindo-a do sofá. Esperava frequentar ensaios de rua das escolas de samba, abraçar os amigos, franquear a todos os queridos a visita a meu neto, nascido há um ano, no momento mais agudo da pandemia da Covid-19. Mas, a exemplo de ilustração viralizada há tempos sobre a ponta final da Teoria da Evolução, tive de encarar o espelho e proclamar: “Volta que deu ruim”.

É hora de reconhecer que a reabertura foi exagerada e precipitada. Antes mesmo da multiplicação da variante Ômicron, Brasil e mundo afora, o surto —no Rio de Janeiro, epidemia — fora de época da gripe H3N2 estava a confirmar. Abolimos as máscaras, abrimos a porteira, saímos às ruas, os vírus nos alcançaram. As celebrações de fim de ano — incluído o Réveillon carioca descentralizado em dez queimas, com a Praia de Copacabana restrita — deram numa confirmação de casos de Covid-19, que não produziu luto como em janeiro de 2021 em Manaus, porque a vacinação foi robusta. Não sei você, mas eu não me lembro de tantos conhecidos simultaneamente confirmados com a doença em dois anos de pandemia.

Hélio Schwartsman: Ômicron arrasa as escalas de trabalho

Folha de S. Paulo

Autoridades poderiam avaliar reduzir prazos de isolamento de profissionais de saúde

Embora os trabalhos ainda não tenham sido publicados em "journals", já dá para afirmar com alguma segurança que a variante ômicron do Sars-CoV-2 causa uma doença menos grave do que a delta. Acrescente-se a isso o fato de que, pelo menos nos países de renda alta e média, a vacinação está em geral bem avançada e temos bons motivos para crer que não veremos mais taxas de mortalidade como as de ondas anteriores.

Ainda assim, a ômicron pode ser bem disruptiva. O problema é que ela é muito, muito mais infecciosa do que as cepas precedentes. Quem conferir os gráficos de contágio em diferentes países constatará que, nas ondas prévias, as curvas de novos casos lembravam morros e até montanhas escarpadas. Mas, com a ômicron, o que vemos são paredões verticais mesmo. Se ainda não registramos isso no Brasil, é porque testamos pouco e mal e porque o sistema nacional de contabilização está bichado.

José de Souza Martins*: Ruy Ohtake e a moradia de gente

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Morto em novembro, arquiteto foi interlocutor de grande criatividade entre a cultura erudita de sua arte e a cultura popular e cotidiana das populações pobres

A morte, em novembro, do arquiteto Ruy Ohtake privou a inteligência brasileira de um personagem dos mais representativos de nossas possibilidades na área da cultura. Ele foi interlocutor de grande criatividade entre a cultura erudita de sua arte e a cultura popular e cotidiana das populações pobres.

O confinamento e as interdições decorrentes da epidemia da covid restringiram e abreviaram o tempo de sua disponibilidade para o diálogo enriquecedor com os que podiam aprender com ele. Como nós, que, na Academia Paulista de Letras, poderíamos ouvi-lo sobre suas ideias de superação da degradação urbana de São Paulo.

Filho mais velho da grande Tomie Ohtake, sua família foi criada no bairro industrial e operário da Mooca. O que pode ter influenciado sua sensibilidade em relação à situação dos que nasceram para o trabalho, mas não para os melhores frutos do trabalho. Uma característica própria da realidade social dos bairros e do subúrbio de São Paulo.

Prazo curto e impasses regionais emperram federação da esquerda

Indefinição marca as conversas entre partidos de centro-direita e de centro-esquerda sobre acordo

Por João Valadares e Marcelo Ribeiro / Valor Econômico

BRASÍLIA - Com resistências internas a serem superadas, calendário eleitoral apertado e muitas dúvidas sobre o funcionamento prático, partidos tentam destravar as negociações para a criação de federações. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), as legendas têm até o dia 1º de março para solicitarem o registro formal da criação das associações.

Entre os dias 3 de março e 1º de abril, a janela partidária - período em que os deputados podem trocar de partido para concorrer às eleições sem risco de perderem o mandato - também esquenta o cenário eleitoral.

Novidade nas eleições de 2022, a possibilidade de formar federações surge após o fim das coligações e representa um mecanismo para driblar a cláusula de barreira imposta a siglas com baixas votações. Os partidos federados são obrigados a lançarem chapas conjuntas em todos os Estados e a atuarem unidos por quatro anos no Congresso e nas Assembleias Legislativas.

Apesar de a maioria das legendas já ter sinalizado em resoluções internas o encaminhamento para criação do novo mecanismo, a solução prática para formalizar a união não é simples. As disputas acirradas nos Estados entre partidos do mesmo campo acentuam as dificuldades.

Outro ponto de alerta nas legendas diz respeito às eleições municipais de 2024. Há receio sobre os critérios para escolha dos candidatos que vão representar a federação no Executivo e na Câmara dos Vereadores de 5.568 municípios brasileiros.

Na centro-direita, PSDB e Cidadania já iniciaram conversas, mas o tema não é tratado como prioridade.

No campo da centro-esquerda, PT e PSB ainda não chegaram a uma definição sobre o “casamento” de papel passado que pode incluir, além das duas siglas, PCdoB, PV, Psol e Rede.

O PSB, que se coloca como principal aliado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na disputa presidencial deste ano, reivindica apoio petista a candidatos ao governo nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Acre.

Em São Paulo, por exemplo, ainda não há definição sobre o arranjo envolvendo o ex-governador Márcio França (PSB) e o ex-prefeito Fernando Haddad (PT). Os dois são pré-candidatos ao governo paulista.

Biden: Trump ainda é uma ameaça à democracia americana

Lucas de Vitta / Valor Econômico

Biden acusou Trump de espalhar uma rede de mentiras sobre as eleições presidenciais de 2020

O presidente dos Estados UnidosJoe Biden, responsabilizou seu antecessor no cargo, Donald Trump, pelo ataque ao Congresso que chocou o mundo há um ano. Em um discurso para lembrar o aniversário da invasão, o democrata afirmou que o republicano continua representando uma ameaça à democracia e que o país precisa encarar esta realidade para evitar uma tragédia similar no futuro.

Sem citar Trump pelo nome, Biden acusou o ex-presidente de espalhar uma rede de mentiras sobre as eleições presidenciais de 2020 por simplesmente não aceitar perder, dificultando a transição de poder, algo inédito na história da democracia americana. Para ele, seu adversário incentivou que uma “insurreição armada” invadisse o Congresso para beneficiar seus próprios interesses e colocar Washington sob cerco.

“Aqui está a verdade: o ex-presidente dos EUA criou e espalhou uma teia de mentiras sobre as eleições de 2020”, disse Biden. “Ele fez isso porque valoriza mais o poder do que os princípios, porque vê seu próprio interesse como mais importante do que o interesse de seu país e porque seu ego ferido é mais importante do que nossa democracia ou nossa Constituição. Ele não consegue aceitar que perdeu.”

"Eu não busquei esta luta trazida a este Capitólio há um ano, mas também não irei recuar", continuou Biden. "Vou defender este país e não permitirei que ninguém coloque um punhal na garganta da democracia."

Ricardo José de Azevedo Marinho*: Sobre as medidas urgentes espanholas com vistas a reforma trabalhista

A pandemia da COVID-19 é uma emergência de saúde pública internacional, que originou grandes impactos a nível social e econômico, e que se teve de dar uma resposta imediata no plano sanitário, bem como através de um conjunto significativo de medidas de apoio aos desempregados e desempregadas, as empregadas e empregados e seus rendimentos.

A União Europeia (UE), tomando consciência da severidade da crise pandémica e dos seus profundos efeitos nos diferentes Estados-Membros, promoveu uma resposta coletiva e concertada, tendo os Estados-Membros acordado simultaneamente o Quadro Financeiro Plurianual para o período 2021-2027 e os instrumentos de recuperação europeia, designado de Próxima Geração da UE, aprovado no Conselho Europeu, em julho de 2020, ou seja, já havia a previsão de perdas geracionais ainda no princípio do primeiro ano pandêmico. Com efeito, os Estados-Membros comprometeram-se com uma visão de futuro conjunto, para dar forma nas mitigações dos efeitos que decorreriam da capacidade de resposta totalmente assimétrica dos Estados-Membros.

É neste contexto que se deve falar da proposta de reforma trabalhista na Espanha pois evoca um processo complexo de tempos diferentes onde a pandemia cruza um conjunto longuíssimo de mudanças que não conseguiram acabar com os seus graves problemas no seu mercado de trabalho. A conjunção de pandemia com a história institucional trabalhista espanhola extremamente complexa fez com que o trabalho por lá (e não só lá) fosse afetado ainda mais pelo desemprego, pelas más condições de emprego e impede a plena cidadania no trabalho.

O que pensa a mídia: Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

O incendiário do Palácio do Planalto

O Estado de S. Paulo.

Com reajuste para forças de segurança, Bolsonaro encoraja funcionários públicos e policiais civis e militares a criarem um caos no País

O presidente Jair Bolsonaro armou mais uma crise para seu próprio governo ao prometer reajustes salariais às carreiras policiais ligadas ao Ministério da Justiça, deflagrando uma reação em todas as demais categorias de servidores públicos. Em um país que já sofre com inflação alta, juros em ascensão e desemprego elevado em meio ao recrudescimento de casos de covid-19 e, agora, também de influenza, tudo que a sociedade não precisava era de uma ameaça de greve. A entrega de cargos de chefia por funcionários da Receita Federal, Banco Central e auditores fiscais do Trabalho é mais um elemento de instabilidade para a economia, cujas projeções de crescimento foram reduzidas a 0,36% para este ano, conforme o mais recente boletim Focus.

A resposta da elite do funcionalismo cresce a cada dia, e nem poderia se esperar algo diferente. De acordo com o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco), cerca de mil servidores já abriram mão de funções comissionadas e, segundo o Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (Sinal), quase metade dos 3,5 mil em cargos de confiança teria se comprometido a fazer o mesmo. O Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), associação formada por mais de 30 entidades que representam 200 mil pessoas, marcou uma paralisação para 18 de janeiro e não descarta uma greve geral em fevereiro.

Poesia | João Cabral de Melo Neto: A mesa

O jornal dobrado

sobre a mesa simples;

a toalha limpa,

a louça branca

 

e fresca como o pão.

 

A laranja verde:

tua paisagem sempre,

teu ar livre, sol

tuas praias; clara

 

e fresca como o pão.

 

A faca que aparaou

teu lápis gasto;

teu primeiro livro

cuja capa é branca

 

e fresca como pão.

 

E o verso nascido

de tua mão viva,

de teu sonho extinto,

ainda leve, quente


e fresco como pão.