quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Uma bomba política

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


Está na mesa da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, uma verdadeira bomba política, exemplar de uma coalizão onde cada partido defende seus interesses próprios e mantém o governo refém. Um grave problema para quem é candidata oficial à sucessão do presidente Lula: o pedido do ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, para que a Aeronáutica troque seu representante na Agência Espacial Brasileira (AEB), o major-brigadeiro Antonio Hugo Pereira Chaves, que é PhD em Engenharia Espacial em Toulouse, na França, e ex-piloto da Esquadrilha da Fumaça, considerado "top gun" na Aeronáutica.

O pedido de demissão foi feito por pressão do presidente em exercício do Partido Socialista Brasileiro (PSB) e ex-ministro da Ciência e Tecnologia, Roberto Amaral, que acumula a função política com a presidência da empresa brasileiro-ucraniana Cyclone Alcântara Space, que vai explorar o lançamento de foguetes da Base de Alcântara, no Maranhão - cuja utilização está no centro de toda a crise política.

Esse acordo com a Ucrânia, por sinal, foi objeto de uma polêmica logo no início do governo Lula, pois ele continha cláusulas que haviam sido contestadas pelo PT quando o governo Fernando Henrique Cardoso negociou tratado semelhante com os Estados Unidos.

Na campanha eleitoral de 2002, o candidato Lula dissera que o acordo com os Estados Unidos não levara em conta a soberania nacional, pois os americanos é que dariam permissão para que brasileiros entrassem na base e não cabia aos brasileiros "fiscalizar um contêiner em nosso território". Cláusulas semelhantes estão no contrato com a Ucrânia.

Na reunião da Agência Espacial Brasileira na semana passada, houve um bate-boca entre Roberto Amaral e o major-brigadeiro, que defendia uma negociação com os representantes dos quilombolas e dos indígenas que estão instalados no terreno da Base de Alcântara antes de colocá-la em funcionamento novamente.

Embora Alcântara, no Maranhão, seja considerada o melhor local do mundo para lançamento de foguetes, o Programa Espacial está sendo emperrado por grupos de indígenas e quilombolas que estão instalados na região.

É preciso construir uma nova base para os lançamentos de foguetes, pois a antiga base explodiu em agosto de 2003, matando mais de 20 engenheiros, na maior tragédia do setor na história brasileira.

Mas há problemas, pois a Funai exige um estudo de impacto ambiental e um levantamento socioeconômico, enquanto a demarcação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) destinou 78,1 mil hectares aos quilombolas e 8,7 mil para o programa de lançamentos de foguetes.

O ex-ministro Roberto Amaral está empenhado para que as obras da nova Base de Alcântara sejam incluídas no PAC, para garantir a prioridade do projeto e acelerar o processo de licença ambiental da área onde os lançamentos serão feitos.

O projeto da empresa binacional seria iniciar as obras de terraplanagem em agosto, para lançar o primeiro satélite, sem fins comerciais, no segundo semestre de 2010, e o primeiro lançamento comercial em 2011, mas o processo está atrasado pelos problemas.

O major-brigadeiro Antonio Hugo Pereira Chaves, representante da Aeronáutica na AEB, defendeu na reunião da agência a tese de que seria melhor que se tentasse um acordo com os quilombolas e indígenas instalados na região, para que os lançamentos de Alcântara não fossem impugnados internacionalmente pelos movimentos sociais e se tornassem alvos de protestos, inclusive locais, para impedi-los.

Roberto Amaral, presente à reunião como representante da Cyclone Alcântara Space, irritou-se com a proposta do brigadeiro e alegou que os problemas já haviam sido equacionados. Argumentou que a sugestão do brigadeiro prejudicaria o programa espacial brasileiro e, a certa altura, a classificou de uma "proposta de filho da puta", batendo violentamente com a mão na mesa, para em seguida tentar atirar um copo de água na direção do brigadeiro, que reagiu com outro soco na mesa.

Ao mesmo tempo, o brigadeiro atirou-se na direção de Roberto Amaral para lhe tomar o copo, o que fez com que o presidente em exercício do PSB caísse da cadeira, gritando palavrões e sendo contido por seus auxiliares.

Mesmo assim, conseguiu jogar o copo na direção do brigadeiro, sem, no entanto, atingi-lo. Sentindo-se agredido, o presidente do PSB exigiu do ministro da Ciência e Tecnologia a destituição do brigadeiro do conselho da AEB.

Esse ministério é, desde o início do governo Lula, um feudo do PSB, tendo sido Roberto Amaral o primeiro ocupante do cargo, ficando conhecido por uma polêmica declaração em 2003 à BBC Brasil, quando afirmou que concordava com a ideia de que o Brasil tem de buscar "o conhecimento necessário para a fabricação da bomba atômica".

Foi substituído pelo então deputado federal Eduardo Campos, neto de Miguel Arraes, hoje governador de Pernambuco, e depois pelo atual ministro Sérgio Rezende - que coordenou o grupo que elaborou a proposta de apoio à ciência e tecnologia do governo de Arraes, em Pernambuco, em 1986, e depois foi seu secretário estadual de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente.

Como se vê, Rezende não tem condições políticas de recusar uma exigência do presidente do PSB, e muito menos de adverti-lo. Ele já conversou várias vezes nos últimos dias com o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e com o da Aeronáutica, tenente-brigadeiro-do-ar Juniti Saito, mas encaminhou um pedido de demissão do major-brigadeiro Chaves do Conselho da AEB, o que está abalando a Aeronáutica.

O major-brigadeiro Antonio Hugo Pereira Chaves continua trabalhando normalmente, à espera do desfecho da questão.

Guardas da esquina

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


A impressão dá é que o Legislativo quer coibir de algum modo o uso da internet durante períodos pré-eleitorais, mas não sabe direito como nem por quê. A Câmara pelo menos foi clara: propôs a imposição da censura à internet em períodos pré-eleitorais e ponto final. Quem não gostou gostasse.

Ou, então, recorra ao Supremo Tribunal Federal para restabelecer os ditames da Constituição no que tange a garantia legal à liberdade de expressão.

Já o Senado percebeu o absurdo da coisa, afrouxou um pouco, "deixou" livres as manifestações em blogs de pessoas físicas e redes sociais, como twitter, Orkut e YouTube, mas, até o início da noite de ontem quando começaram a discutir o assunto em plenário, estava de pé a ideia de proibir.

Gratuita, como se percebe pelo conteúdo da proposta que, se aprovada ontem, voltaria para nova votação na Câmara.

Os senadores ficaram perdidos na discussão. Foram e vieram ao sabor de críticas e pressões. Primeiro, haviam decidido acabar com a restrição a opiniões e debates, tal como ocorre (de maneira absurda) no rádio e na televisão.

Depois, ensaiaram um recuo por conta da posição dos deputados, que querem a manutenção do texto original, e ontem já não se sabia mais o que, afinal, queriam os senadores.

A prova esteve na quantidade de dúvidas que os parlamentares levantaram a respeito da matéria no início da sessão, vários deles proporcionando a grata surpresa de contestar as restrições propostas pelo relator Eduardo Azeredo.

Ele alega que não se trata de censura. Quer apenas "organizar" as coisas a fim de "assegurar o equilíbrio" de tratamento para todos os candidatos. Evidentemente, não convence.

Inclusive porque a emenda ao projeto da Câmara garante a "livre manifestação de pensamento" em blogs e redes sociais. Em português claro isso significa admitir que em outras formas de comunicação na internet essa mesma liberdade é subtraída.

O objetivo subjacente a todo palavrório é não abrir brecha que possa dar margem ao questionamento das regras restritivas à manifestação de opiniões no rádio e na televisão.

A ideia por trás do argumento racional do "equilíbrio" é a concepção do guarda da esquina, cujo maior tesouro é sua autoridade. Por mais diminuta que seja.

O texto proposto à discussão do Senado é confuso e contraditório. Proíbe os sites noticiosos mantidos por empresas de comunicação de "dar tratamento privilegiado a candidato, partido ou coligação, sem motivo jornalístico que justifique".

O que seria "motivo jornalístico" justificável? Suas excelências não especificam. Nem lhes caberia especificar, uma vez que as razões jornalísticas de veículos de comunicação são da alçada das empresas, não do Parlamento. A menos que os senadores pretendam legislar sobre critérios para a publicação de notícias, artigos e reportagens.

O texto, vago, tanto se presta a julgamentos restritivos quanto à mais absoluta inutilidade.

Segue a proposta, proibindo a divulgação de pesquisas eleitorais com "manipulação de dados", ainda que sob forma de entrevista jornalística.

Desconhece-se se em algum outro tipo de veículo seja permitida a manipulação de dados. Mesmo que a intenção do legislador tenha sido a de inovar, ficou faltando detalhar quais seriam os indícios de manipulação, acompanhados da definição exata do termo no que tange à cobertura jornalística das campanhas eleitorais.

Aqui também a proposta foi redigida de forma genérica, dando margem a questionamentos de resultados que podem ser até mais restritivos que o agora pretendido. Qualquer um poderá se considerar prejudicado por qualquer motivo.

A situação mantida como está, regulada pelo direito de resposta assegurado em lei às vítimas de calúnias, economizaria tempo, energia e muita tolice.

Depois de levar merecida surra de críticas pela condução errática no episódio das acusações contra o presidente do Senado, José Sarney, o líder do PT, Aloizio Mercadante, é um sério candidato à remissão.

O único a se posicionar de forma precisa e sem rodeios, propõe a retirada dessa burlesca tentativa de controle, com um argumento meridiano: "O homem público que teme sofrer crítica na internet é como o guarda noturno que teme trabalhar de noite. Tem que mudar de profissão."

Faltou incluir os que repudiam a crítica ao ponto de dispensar a leitura dos jornais a fim de evitar sofrer de azia.

Algo se move

Aécio Neves já não repudia com ênfase a hipótese da composição de uma chapa "puro-sangue" com José Serra e passou a admitir a escolha do candidato do PSDB a presidente por exame das pesquisas e não mais por meio de prévias.

Em compensação, quer que sejam levados em conta outros aspectos além dos índices de intenção de votos: baixa rejeição, capacidade de agregar e potencial de crescimento.

Ou seja, o mineiro anda. Mas vai devagar.

Papel de trouxas

Eliane Cantanhêde
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


A norte-americana Boeing e a sueca Saab gastaram milhões de dólares para disputar a seleção de renovação da frota da FAB.

E eis que de repente, não mais que de repente, Lula vai comer uma moqueca com Sarkozy e ambos anunciam ao mundo a escolha dos Rafale, da francesa Dassault.

O anúncio, num texto em diplomatês e à parte do comunicado conjunto longamente negociado, correspondeu a dizer que o processo não era para valer. Era só para americanos e suecos verem.

Isso, evidentemente, criou problemas na Aeronáutica, que comanda a indicação com seu jeito militar de ser: tudo tem regra, cronograma, informação técnica. Ou, como explicou Jobim no Planalto, processos de seleção, principalmente internacionais e na área de defesa, seguem "prazos e ritos".

Então, como explicar para a milicada, aqui dentro, e para os países e empresas concorrentes, lá fora, que a decisão foi tomada antes da conclusão do parecer técnico? Esse tipo de voluntarismo cabe bem em lutas sindicais, mas pode criar problemas em negociações muito mais complexas.

Na segunda, Lula e Sarkozy anunciaram a escolha dos Rafale. Na terça, Jobim, em nota, deu o dito pelo não dito. Ontem, foi a vez do contorcionismo retórico para explicar o inexplicável, enquanto Lula tentava reduzir tudo a uma brincadeira: "Daqui a pouco eu vou receber de graça". (Atenção ao "eu". Não tem graça nenhuma.)

OK. Há muito mais do que vã filosofia, questões técnicas e até mesmo de preços por trás da preferência do Brasil pelos aviões franceses -ou melhor, pelos franceses. Mas não precisava esculhambar.

Bastava seguir os "trâmites normais", deixar a FAB concluir o seu trabalho, pressionar por melhores preços e juros e anunciar o negócio com a França com profissionalismo e compostura, para conferir ar de seriedade ao país e evitar questionamentos, até jurídicos, depois.

O preço da aliança a qualquer preço

Maria Inês Nassif
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Os números da última pesquisa CNT-Sensus não são tão ruins a ponto de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter que enterrar qualquer pretensão de fazer o seu sucessor nas eleições do próximo ano, nem tão boas que recomendem manter a sua excessiva autoconfiança de que sua popularidade - que caiu, mas continua alta - terá o poder de eleger um poste em 2010. A moral da pesquisa é que Lula conseguiu manter um baixo grau de contaminação a crises políticas, mas não é nenhum Deus: não ficará imune a elas sempre, em qualquer circunstância.

Existe um elenco de números favoráveis a Lula que pode ser usado com sucesso numa campanha de um candidato governista. Embora tenha caído o desempenho de Lula e do governo, ambos continuam em níveis bastante altos. A pesquisa começou a ser coletada em 1998, no ano da campanha para a reeleição do presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), e até 2002, último ano da administração tucana, os maiores índices foram registrados em março de 2001, quando a avaliação positiva do governo FHC foi de 33,3%, e em abril daquele ano, quando o índice de aprovação de FHC foi de 46,1%. O governo Lula, na baixa, ainda tem 65,4% de avaliação positiva; o presidente Lula, também amargando ligeira queda, tem a aprovação de 76,8% dos entrevistados.

Além disso, o Índice do Cidadão (IC) do CNT-Sensus não aponta para um brasileiro pessimista em relação ao país - e normalmente quando isso acontece há repercussões severas sobre a popularidade do presidente e do partido no poder. O Índice de Avaliação do Cidadão está em 47,79 pontos - já esteve em 54,30 pontos em setembro de 2008, declinou, junto com a crise, até 31,18 pontos, em março deste ano, e sustenta-se em crescimento desde então. O Índice de Expectativa do Cidadão - isto é, o que ele espera do futuro do país - é de elevadíssimos 71,95 pontos, apenas um pouco abaixo dos 73,82 registrados em outubro do ano passado, o maior desde o início da apuração do índice, em abril de 2007.

O IC é medido pela ponderação das avaliações dos entrevistados sobre seis variáveis, nos seis meses anteriores à pesquisa: emprego, renda mensal, Saúde, Educação e segurança pública. Somente na Saúde houve uma percepção clara de piora do serviço público, da penúltima pesquisa, em maio, para a última, em setembro - em maio, 44,4% achavam que a Saúde havia piorado; em setembro, 49,4% tinham essa percepção. Certamente, é um efeito gripe suína. Na questão do emprego, aumentou o número daqueles que consideram que a situação melhorou nos últimos meses - em maio, eram 32,3%; em setembro, 36,5%.

A avaliação sobre a renda mensal ficou estabilizada (46,7% acham que ficou igual, contra 42% na pesquisa anterior; 28,2% acham que melhorou, contra 28,7% entrevistados em maio); na Educação mantém-se uma percepção de melhora (43% achavam que melhorou em maio em 43,8% consideram o mesmo agora) e mantém-se até uma tendência a uma visão mais otimista sobre a segurança pública (24,7% acham que melhorou, contra 22,6% em maio; e 46,9% consideram que piorou, contra 52,2% em maio). Nos cinco indicadores, a expectativa de melhora nos próximos seis meses varia de 48,2% (para a segurança) até 59,6% (emprego).

Esses índices mostram que, pelo menos por enquanto, não há um estrago irremediável na popularidade de um governo que conseguiu manter-se com a cabeça fora d"água inclusive no pior período de crise financeira internacional. Lula teve uma queda de popularidade acentuada em 2005, depois do mensalão, mas rápida - em seguida, manteve índices crescentes de popularidade, ficou a salvo de contaminações de crises cujo palco foi principalmente o Legislativo e ainda conseguiu se dar ao luxo de transferir popularidade para candidatos ligados a ele. O PT, para o tamanho do escândalo do mensalão, não teve uma perda correspondente nas eleições seguintes.

Existem sinais, todavia, de que Lula tende a não manter o mesmo grau de imunidade nas eleições que se aproximam. As quedas que ocorreram agora, mesmo pequenas, e ainda que não o desbanquem como o presidente mais popular do período pós-redemocratização, não são neutras: elas ocorrem justo no momento em que deveria estar colhendo uma passagem relativamente amena pela crise internacional; do pontapé inicial da exploração do pré-sal, que tenderia a levar um eleitorado majoritariamente nacionalista a um certo ufanismo; e quando o país não apenas saiu, mas aparenta ter saído de um longo período de estagnação, ao exibir canteiros de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no país inteiro.

Ainda é cedo para avaliar por que Lula apresenta essas quedas justo num momento de retomada parcial da economia, mas existem indícios. O presidente animou-se excessivamente com o fato de ter passado praticamente incólume, desde 2005, por todos os escândalos políticos que aconteceram no país, e com o fato de as campanhas da oposição contra ele e seu governo terem caído no vazio pelo exagero. Bancou a candidatura de Dilma Rousseff, neófita em política, basicamente com o seu prestígio, e assumiu as negociações com o PMDB para viabilizar essa candidatura certo de que todo o desgaste que isso envolve se diluiria no ar porque era ele, Lula, o fiador. O problema é que os escândalos que envolvem o PMDB não são uma mera campanha da oposição - até porque todos os escândalos que envolvem o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), tem potencial de atingir igualmente os partidos oposicionistas representados no Senado. Os escândalos são a própria imagem política - e popular - do aliado PMDB. O pacote da aliança com o maior partido do Congresso embute o preço de transferência dessa imagem para o aliado. Lula já paga um preço com maior declínio em duas regiões em que já era fraco - Sul e Sudeste - e onde o PMDB perdeu espaço para o PSDB e foi quase consumido pelo partido que é o maior adversário do PT. E paga um preço adicional nas classes de maior renda e escolaridade porque essa aliança imobiliza o governo institucionalmente. Os constantes recuos do presidente Lula, nas mais variadas questões de governo, para consolidar sua aliança com setores conservadores que têm como representantes o PMDB e pequenos partidos da base aliada são acenos de fraqueza de uma administração que termina.

Maria Inês Nassif é editora de Opinião. Escreve às quintas-feiras

Centralidade do pré-sal e o desgaste do PT vão inviabilizando nova CPMF

Jarbas de Holanda
Jornalista

Curiosamente, partiu das bancadas federais do PT, em maior grau do que das do PMDB, a recomendação para que o Palácio do Planalto não assumisse como seu o projeto de instituição da CSS – Contribuição Social para a Saúde, novo nome da CPMF com alíquota (inicial) menor, de 0,10%. Curiosamente porque os parlamentares petistas destacam-se como linha de frente de propostas destinadas à ampliação das receitas fiscais do governo Lula. Indiferentes aos efeitos delas na exacerbação da carga tributária e combinando a retórica da prioridade de programas sociais com a capitalização dos dividendos eleitorais que eles possam propiciar.

O que explica a mudança de postura dos parlamentares petistas é o receio de agravamento, resultante de uma estreita associação ao projeto da nova CPMF, do desgaste que têm sofrido na opinião pública, em especial nas camadas médias e, em conseqüência, de dificuldades maiores para a reeleição, sobretudo dos senadores. Tal desgaste, já evidenciado em 2006 após o mensalão e outros escândalos que envolveram lideranças do partido, acentuou-se na recente crise do Senado. Com efeitos de caráter político, imediatos e sensíveis – forte erosão de credibilidade entre os formadores de opinião e nos chamados movimentos sociais, erosão reforçada por um deslocamento de boa parte do respaldo de que desfrutavam nessas áreas em direção à provável candidatura presidencial de Marina Silva. E com o risco de pesados danos eleitorais para os candidatos petistas dependentes do voto crítico dos grandes centros urbanos, como o senador Aloizio Mercadante, em São Paulo.

Para o presidente Lula, a recomendação das bancadas do PT foi bem acolhida – o Executivo apenas acompanhará o andamento do projeto, cujo sucesso terá de resultar da “mobilização social”, segundo declaração que fez – não porque ele se sinta também dependente do apoio da opinião pública (substituída por sua elevada popularidade nas classes C, D e E), mas por contribuir para que o debate político-parlamentar se concentre agora nos projetos do pré-sal, convertido em carro-chefe da campanha da sua candidata à sucessão, Dilma Rousseff. Debate em que ele será favorecido pela retomada do crescimento da economia, e ao qual buscará associar o acordo com a França de Sarkozy para a compra de equipamentos militares, justificada como ação estratégica de defesa de nossas riquezas minerais e da soberania da Amazônia. Outro motivo, inspirado pela reconhecida sensibilidade tática de Lula, para a abstenção do governo em relação ao projeto da CSS foi o de não entregar aos oposicionistas uma bandeira, concreta, ligada a um tema de grande apelo social: o combate à abusiva e crescente carga tributária do país.

Por tudo isso – mesmo com a recomposição do predomínio governista no Congresso após a superação da crise do Senado, e com a perspectiva de esvaziamento da CPI da Petrobras, um dos objetivos do regime de urgência para as matérias do pré-sal é provável que o projeto da CSS seja abandonado ou venha a ser rejeitado. E a resistência a ele foi reforçada pela divulgação ontem de pesquisa da CNT/Sensus, na qual 53,9% dos entrevistados se manifestam contra a recriação da CPMF, apoiada por apenas 37,1%. O que deve ter influenciado declaração feita à tarde pelo presidente da Câmara, Michel Temer: “Com muita franqueza, não acho fácil a votação dessa matéria. Há grande rejeição, há grande resistência a qualquer hipótese de aumento de imposto”.

O custo tributário

Abertura de matéria da Folhaonline, de ontem, da repórter Janaína Lage (de Nova York), com o título “Empresário brasileiro é o que trabalha mais para pagar impostos no mundo”:

“O empresário brasileiro trabalha 2.600 horas a cada ano para acertar suas contas com o fisco. Segundo o relatório "Doing Business - 2010", divulgado pelo Bird (Banco Mundial), trata-se do maior patamar verificado em um conjunto de 183 países. Na lista de economias onde o empreendedor precisa trabalhar mais tempo para pagar os impostos figuram ainda as de Camarões, com 1.400 horas, Bolívia (1.080 horas) e Vietnã (1.050 horas). No sentido oposto, o empresário precisa trabalhar apenas 12 horas para quitar as dívidas com o fisco nos Emirados Árabes e 63 horas na Suíça. Na comparação regional, o Brasil também vai mal: a média dos países da América Latina é de 563,1 horas. De modo geral, o Brasil fica no 129º lugar no ranking elaborado pelo Banco Mundial de locais de maior facilidade para a realização de negócios. A classificação coloca o país atrás de Colômbia, Chile, Peru, El Salvador e Nicarágua, entre outros. No relatório anterior, o país estava no 127º lugar. O indicador leva em conta exigências para abertura de um negócio, legislação trabalhista, registro de propriedade, pagamento de impostos, comércio exterior e fechamento de empresas, entre outros aspectos.”.

O QUE PENSA A MÍDIA

Editoriais dos principais jornais do Brasil
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Nova Escola / RJ

Carta do Deputado Comte Bittencourt/PPS

Professores,

O Parlamento cumpriu a sua obrigação na votação da incorporação do Nova Escola, ontem (8/9), nessa Casa. Mas, na realidade, os grandes responsáveis por esse acordo são vocês que, através de seus sindicatos, foram incansáveis nessa luta. A categoria mostrou presença e força nas galerias e escadarias da Assembleia, nas ruas, por meio do correio eletrônico, na presença nos gabinetes dos deputados, em reuniões propostas pelas lideranças do governo junto aos secretários e, principalmente, na Comissão de Educação, da qual sou presidente.

Os avanços ainda não são o ideal nem o merecido. O governo ainda não deu as condições necessárias para que a categoria tenha salários dignos. Sabemos que ainda falta muito para conseguirmos o ideal. Mas temos que encarar a votação de ontem como um primeiro movimento importante no papel da valorização do educador fluminense.

A partir de agora, temos que começar a mudar um capítulo da história da Educação no Estado do Rio de Janeiro, algo que não se via há quase duas décadas. Ou seja, entender a Educação como investimento, e não como despesa.

Esperamos que a sociedade comece a enxergar, apesar dos acontecimentos de violência inaceitáveis da polícia, que não vamos transformar e nem preparar nossos filhos sem que tenhamos investimentos maciços em Educação. Tenho afirmado isso permanentemente em todos os meus discursos dentro e fora do plenário.

E investimento maciço em Educação é qualidade. E qualidade é qualificação dos seus profissionais, professores e todos os trabalhadores de Educação.

Reafirmo, na qualidade de presidente da Comissão de Educação, que o meu papel permanente na Casa é fazer com que a Educação seja, de fato, a principal política deste estado. Não avançamos o que desejamos, mas, seguramente, avançamos. Esse avanço é simbólico para que possamos inaugurar uma nova etapa de compreensão do papel da escola pública no desenvolvimento do Estado do Rio de Janeiro.

Tenha certeza que a nossa luta pela valorização da educação pública no estado continua.

Atenciosamente,
Comte Bittencourt (PPS)
Presidente da Comissão de Educação da ALERJ

Câmara aprova em 1º turno mais 7.709 vagas de vereador

Ranier Bragon
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Texto aprovado por 370 votos a 32 aumenta Câmaras em 14,8%; cidades entre 80 mil e 1 milhão de habitantes são as mais afetadas

Emenda ainda precisa ser votada em 2º turno; Câmara estava lotada de suplentes de vereador, que esperam tomar posse após aprovação

Em meio a muita polêmica e uma pressão nos corredores e gabinetes que durou semanas, a Câmara dos Deputados aprovou ontem à noite em primeiro turno a emenda à Constituição que pretende criar 7.709 novas vagas de vereadores no Brasil, elevando o atual tamanho das Câmaras Municipais em 14,8%.

O texto foi aprovado por 370 votos a 32, com 2 abstenções, e ainda precisa passar por votação em segundo turno para ir à promulgação. A emenda redimensiona o tamanho da maioria das Câmaras, aumentando cadeiras principalmente em cidades entre 80 mil e 1 milhão de habitantes. Capitais como São Luís e Maceió, por exemplo, sairiam dos atuais 21 vereadores para 31. São Paulo permaneceria com 55 vereadores.

A votação foi feita sob uma galeria lotada por centenas de suplentes de vereadores que há semanas pressionam os deputados na Câmara. A expectativa deles é que as Câmaras deem posse imediata aos suplentes assim que a emenda seja promulgada, já que o texto fala em eficácia imediata, sem retroatividade de salários e benefícios.

Há muitas dúvidas em relação a isso. Vários deputados dizem que vão recorrer aos tribunais superiores sob o argumento de que o novo tamanho das Câmaras, para valer para este mandato, teria de ser aprovado antes das convenções partidárias das eleições de 2008.

A emenda aprovada ontem é a resposta dos congressistas a uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral de 2004 que cortou cerca de 8.000 vagas de vereadores ao interpretar o artigo da Constituição sobre as Câmaras. Os defensores da emenda aprovada ontem alegam que ela diminui o teto de gastos das Câmaras de 5% a 8% da receita dos municípios, dependendo do tamanho, para 3,5% a 7%.

"Existirá uma economia de R$ 2,2 bilhões anualmente", afirmava panfleto distribuído ontem pela Associação Brasileira de Câmaras Municipais.

Mas não há nenhuma garantia de redução de gastos. Isso porque as prefeituras, em média, não repassam às Câmaras a totalidade dos recursos permitidos pela Constituição. Dados do Tesouro relativos a 2007 mostram que o repasse médio é de 65% do limite permitido. Ou seja, há margem para aumento de gastos, já que mais vereadores exigem mais assessores.

"Presidente Michel Temer [PMDB-SP], o senhor, como grande constitucionalista, sabe que essa emenda não resiste dez segundos no Poder Judiciário. Isso não tem sustentação jurídica e o senhor sabe disso", discursou o deputado Silvio Costa (PMN-PE). "Não nos perguntamos se há uma demanda real dos munícipes, do povo de cada cidade, por mais representantes.

Ficamos, isso sim, prisioneiros das pressões dos suplentes, essa nova "categoria social" mobilizada e reivindicante", afirmou Chico Alencar (PSOL-RJ).

"Não existe hospital sem médico, escola sem professor, nem democracia sem representação", disse Flavio Dino (PC do B-MA), que apoiou a medida. Segundo ele, o aumento de quase 50% da Câmara de São Luís é válido. "São Luís tem um milhão de habitantes. Está sub-representada politicamente."

Senado ainda debate censura à rede na eleição

Adriana Vasconcelos e Maria Lima
DEU EM O GLOBO

Sarney e Tasso batem boca sobre regras para substituição de governadores que tenham os mandatos cassados

BRASÍLIA. Faltando 24 dias para o prazo limite de publicação das mudanças nas regras para a eleição do próximo ano, o Senado iniciou ontem à noite, sem consenso sobre os principais pontos, a votação da reforma eleitoral, que ainda terá de passar novamente pela Câmara antes de ser sancionada. O plenário estava dividido sobre a imposição ou não de restrições à cobertura jornalística feita por empresas de comunicação na internet, e sobre regras para a substituição de governadores cassados pela Justiça Eleitoral.

Os senadores Tasso Jereissatti (PSDB-CE) e José Sarney (PMDB-AP) chegaram a bater boca em plenário por causa da emenda do tucano que estabelece que a cassação de mandatos de prefeito, governador ou presidente poderia resultar na realização de uma nova eleição, se o julgamento fosse consumado nos dois primeiros anos de mandato. Ou de eleição indireta, na metade final do mandato.

Sarney disse que a medida seria inconstitucional, e que o Senado assim, recriaria a eleição indireta. Tasso rebateu, disse que defende a democracia, mas que é preciso haver eleição, e não a posse do segundo colocado - como ocorreu com a filha de Sarney, Roseana, hoje governadora do Maranhão.

No caso da cobertura da campanha na rede, a ideia dos dois relatores, senadores Marco Maciel (DEM-PE) e Eduardo Azeredo (PSDB-MG), era aplicar aos sites de notícias as mesmas regras impostas hoje a jornais e revistas, impedindo tratamento privilegiado de candidatos. Mas o líder do PT, Aloizio Mercadante (SP), tentava arregimentar o apoio para derrubar qualquer restrição à internet:

- A internet é a praça pública. Não tem qualquer sentido essa restrição.

Redes de relacionamento estão liberadas

Até o início da votação só havia consenso para a liberação de manifestações de pensamento em blogs assinados por pessoa física, e nas redes de relacionamento ou troca de mensagens, como Orkut e Twitter. Desde que assegurado, neste caso, o direito de resposta àqueles que se considerarem prejudicados ou ofendidos.

Em busca de apoio, Mercadante garantiu, na última hora, um acordo autorizando todos os candidatos a manterem no ar, até o dia da eleição, seus respectivos blogs e sites pessoais, assim como de seus partidos. A proposta da Câmara previa que esses blogs e sites de candidatos e partidos saíssem do ar 48 horas antes do pleito.

- Se o candidato poderá levar porrete de qualquer blog ou site, é natural que ele possa se defender e o espaço para isso seria o seu próprio blog ou site pessoal - concordou Demóstenes Torres (DEM-GO).

Contrariando o texto da Câmara, que proibia qualquer propaganda eleitoral paga na rede, o Senado autorizou a publicidade, mas apenas para os candidatos à Presidência, por serem nacionais. Serão autorizadas até 24 inserções ao longo da disputa.

Entre as propostas consensuais aprovadas, a oposição garantiu a proibição, nos quatro meses antes da eleição, a qualquer candidato de comparecer a inaugurações ou lançamento de pedra fundamental de obras públicas e até a atos de assinatura de ordem de serviço. No período também ficam proibidas propagandas eleitorais ou institucionais dessas obras.

Será proibido expandir e criar programas sociais em ano eleitoral. Esses benefícios podem ser reajustados, desde que haja previsão orçamentária.

Outro ponto sem acordo referia-se aos debates eleitorais. O texto previa que dois terços) dos candidatos deveriam obrigatoriamente ser convidados, exigindo ainda que seus partidos tenham pelo menos dez deputados federais. Senadores consideraram que isso poderia violar o direito das minorias.

- Assim, a ex-senadora Heloisa Helena (PSOL-AL) não teria participado dos debates da última campanha presidencial, apesar da votação expressiva que teve - ponderou o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM).

Serra quer emitir títulos para antecipar receita

Ricardo Brandt
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), encaminhou à Assembleia Legislativa projeto de lei permitindo que dívidas tributárias e não-tributárias que o Estado tem a receber, algo em torno de R$ 3 bilhões, sejam transformadas em títulos, a ser vendidos no mercado financeiro. A operação vai gerar até o fim do próximo ano cerca de R$ 900 milhões, segundo estimativa da Secretaria da Fazenda. O dinheiro será usado exclusivamente no plano de investimentos do governador, principal nome do PSDB para a disputa presidencial de 2010.

Serra pediu prioridade à Assembleia para que o Projeto de Lei 749 seja aprovado este ano. A lei vai permitir a emissão das debêntures por parte de uma estatal a ser criada, uma sociedade de propósito específico, que ficará responsável pelas operações financeiras. Apenas dívidas já parceladas dentro do Programa de Parcelamento Incentivado (PPI) serão contabilizadas.

Na prática, a estatal vai colocar as debêntures no mercado e resgatá-las conforme os contribuintes forem pagando suas dívidas.

O secretário adjunto da Fazenda, George Tormin, afirmou que o sistema permitirá antecipação de receita ao Estado e não altera nada para o devedor.

Aécio vê descaso de Dilma com Minas

Eduardo Kattah, BELO HORIZONTE
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Governador e pré-candidato tucano diz que governo "está devendo uma ação mais consistente" no Estado

Ao afirmar que o governo federal "está devendo uma ação mais consistente" no Estado, o governador de Minas, Aécio Neves (PSDB), acusou ontem a Casa Civil de "descaso" em relação à proposta de uma Parceria Público-Privada (PPP) para a ampliação do metrô de Belo Horizonte.

Em setembro de 2008, o governo estadual, representado pelo então secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico, Marcio Lacerda (PSB) - atual prefeito da capital mineira -, apresentou a proposta à ministra Dilma Rousseff. O objetivo é ampliar a capacidade de transporte do metrô de 150 mil para 800 mil passageiros por dia, com investimentos estimados em cerca de R$ 3 bilhões.

"Apresentamos alternativas para que o governo federal pudesse ter a parceria tanto do Estado quanto do município e do setor privado, através de uma Parceria Público Privada. Parece que isso não entusiasmou a própria Casa Civil", reclamou o governador. "Mas essa falta de entusiasmo não pode vir acompanhada do descaso a essa questão e da ausência de resposta."

Aécio é pré-candidato tucano à Presidência em 2010 e Dilma é apontada como virtual candidata do PT na disputa.

Aécio também cobrou da Infraero o início do projeto de ampliação do Aeroporto Internacional Tancredo Neves, em Confins. Reclamou da falta de investimento federal em rodovias que cortam Minas e da "omissão" do governo no ressarcimento a Estados por perdas com a desoneração das exportações, como determina a Lei Kandir.

O mineiro afirmou não acreditar em retaliação pelo fato de ser de um partido de oposição, pois o presidente Luiz Inácio Lula da Silva "não tem esse viés". "Acho que, mais uma vez, é a gestão do Estado que é morosa, é complexa e os resultados demoram a vir", disse. "O governo terá inúmeras dificuldades no que depender da nossa ação para aprovar o seu Orçamento, se continuar se omitindo em algo que é de responsabilidade do País e da economia brasileira".

Ministra interina contesta tucano em nota oficial

A ministra-chefe interina da Casa Civil, Erenice Guerra, divulgou nota oficial em que nega "descaso do governo federal em relação a Minas Gerais", em resposta ao governador Aécio Neves. Depois de destacar que "quem construiu e mantém o metrô de Belo Horizonte é o governo federal", a nota informa que, somente no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o Estado receberá "investimentos que somam R$ 50,6 bilhões".

Lula faz acordo e recua na urgência do pré-sal

Maria Clara Cabral, Valdo Cruz e Kennedy Alencar
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Em troca, oposição concordou em votar projetos até 10 de novembro

O presidente Lula recuou e aceitou retirar a urgência constitucional dos quatro projetos de lei sobre o marco regulatório do pré-sal. Em troca, a oposição fechou acordo com a base aliada do governo na Câmara dos Deputados para votar os projetos até 10 de novembro.

O acordo deu à oposição mais 24 dias corridos, cerca de 70 dias ao todo de tramitação, para debater e tentar modificar a proposta do governo. Antes, pelo regime de urgência, os projetos teriam de ser votados em até 45 dias. Caso contrário, trancariam a pauta da Casa.

Lula recua e retira urgência do pré-sal

Temer fecha acordo com presidente para votação de todos os projetos até 10 de novembro e promete "mínimo de modificações"

Oposição ganha 70 dias para debater projetos; Jucá, líder do governo no Senado, defende a manutenção de regime de urgência na Casa


O presidente Lula recuou e aceitou retirar a urgência constitucional dos quatro projetos de lei que tratam do marco regulatório do pré-sal. Em troca, a oposição fechou acordo com a base aliada do governo na Câmara para votar os projetos no dia 10 de novembro.

O acordo deu à oposição mais 24 dias corridos, cerca de 70 dias ao todo de tramitação, para debater e tentar modificar a proposta do governo. Antes, no regime de urgência, os projetos teriam de ser votados em 45 dias ou trancariam a pauta.

O recuo foi articulado pelo presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), que prometeu a Lula ontem à tarde não só votar todos projetos até o início de novembro como também aprová-los na Casa com o "mínimo de modificações".

Pela manhã, Temer havia se reunido com líderes da oposição, como José Aníbal (PSDB-SP) e Ronaldo Caiado (DEM-GO) para fechar o acordo, que havia sido negado pelo próprio Lula na semana passada.

Para convencer Lula, Temer disse que o melhor caminho seria a negociação, já que, com a obstrução que DEM e PSDB estavam fazendo na Câmara, os projetos não seriam votados antes de novembro. E num clima de guerra. O peemedebista disse ainda que deputados da oposição tendem a votar a favor do governo em boa parte dos projetos, mas a urgência poderia prejudicar essa disposição.

Com a urgência, o prazo para as votações se encerraria no dia 16 de outubro. No dia 17, os projetos passariam a trancar as demais deliberações. Sem a urgência, o tempo para a apresentação de emendas foi ampliado. O prazo, que venceria hoje, passa para a próxima semana.

"Desde ontem tenho conversado com todos os líderes, estabelecendo um novo calendário de 60 dias. Levei ao presidente que no dia 10 [de novembro] inicio as votações, mesmo que as comissões não tenham concluído o seu trabalho. Agradamos a todos", disse Temer.

Em retaliação à urgência, líderes dos principais partidos da oposição estavam obstruindo todas as votações na Câmara, o que dificultava o andamento dos trabalhos na Casa.

"Prevaleceu o bom senso. Voltamos a nos pautar, não há mais ameaças do Executivo", disse Ronaldo Caiado.

Para alguns líderes governistas, apesar do recuo de Lula, o novo calendário é positivo. Avaliam que, se a obstrução fosse mantida, os projetos não seriam votados até 10 de novembro. "Lula aceitou retirar a urgência constitucional, embora as propostas continuem urgentes. Uns dias a mais não fazem tanta diferença", disse o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN).

Senado

Deputados governistas lembraram ainda que o acordo com Lula é referente só à Câmara. Ou seja, nada impede que Lula opte por pedir novamente o regime de urgência quando os projetos forem ao Senado. Se isso acontecer, o prazo de 45 dias para análise e votações voltaria a ser contado no Senado.

"Eu defendo a urgência conosco. Um acordo na Câmara não tem relação aqui", disse o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), ressaltando que a oposição tem mais força na Casa.

A visita de Temer a Lula na tarde de ontem, com outros líderes da base, foi a segunda com o mesmo objetivo. Na semana passada, sem o apoio do PT, Lula havia negado a mudança.

Ontem, no entanto, com o calendário semelhante de votação estabelecido por Temer e com o apoio dos petistas, ele aceitou a proposta.

Supremo indica extradição de Battisti

Carolina Brígido e Catarina Alencastro
DEU EM O GLOBO

O Supremo Tribunal Federal (STF) indicou ontem que deverá determinar a extradição do italiano Cesare Battisti, condenado na Itália por envolvimento no assassinato de quatro pessoas, na década de 1970. Por cinco votos a quatro, os ministros consideraram ilegal a decisão do ministro da Justiça, Tarso Genro, de conceder refúgio político ao italiano. Em nova votação, quando o placar era de quatro votos a três pela extradição, o ministro Marco Aurélio pediu vista e o julgamento foi interrompido. Mesmo que ele vote contra a extradição, o presidente da Corte, Gilmar Mendes, deverá desempatar votando à favor.

STF tende a extraditar Battisti

POLÊMICA DIPLOMÁTICA

Julgamento é interrompido em 4 a 3, e resultado parcial contraria decisão do governo

O Supremo Tribunal Federal (STF) abriu caminho ontem para a concessão da extradição do italiano Cesare Battisti, condenado em seu país pela participação no assassinato de quatro pessoas, na década de 1970. Quando o placar contabilizava quatro votos a três pela extradição, o ministro Marco Aurélio Mello pediu vista, para analisar melhor o caso. Não há previsão de quando ele devolverá o processo, mas a expectativa é que vote contra a extradição. Se isso acontecer, caberá ao presidente da Corte, Gilmar Mendes, desempatar. No STF, há indicações de que Gilmar é favorável à extradição.

No julgamento, o maior derrotado foi o ministro da Justiça, Tarso Genro. Dia 15 de janeiro, ele concedeu refúgio a Battisti, considerando que os crimes pelos quais o italiano foi condenado eram políticos. E que ele corria o risco de ser perseguido em seu país, caso fosse extraditado. Por cinco votos a quatro, os ministros consideraram que o benefício foi concedido de forma ilegal, pois não haveria indício de que Battisti seria vítima de perseguição política na Itália. O relator, Cezar Peluso, lembrou que a Itália de hoje é uma república democrática, que respeita os direitos humanos:

- Não há razão para acreditar que, se for concedida a extradição, o extraditando não veria seus direitos respeitados na Itália de hoje.

Peluso: Lula não pode impedir extradição

Apenas nove ministros participam do julgamento. Para o relator, Battisti cometeu crimes comuns e, por isso, não pode ser tratado como refugiado político. Se a posição vencer, Battisti cumprirá pena de prisão na Itália. Se não, será libertado e poderá viver no Brasil. Peluso considerou inevitável a extradição, porque há um tratado entre o Brasil e a Itália que determina a entrega de criminosos comuns ao país de origem. O relator disse que o presidente Lula não tem poderes para se recusar a cumprir a determinação do STF, com base no mesmo tratado.

O relator também defendeu a tese de que Battisti não pode ser considerado refugiado porque cometeu crimes comuns, sem propósitos políticos - embora fosse membro do grupo Proletários Armados pelo Comunismo (PAC) à época. As vítimas eram um açougueiro, um joalheiro, um carcereiro e uma mulher. Segundo Peluso, os homicídios foram motivados por vingança pessoal:

- Não há a mínima possibilidade de enxergar aqui algum crime de caráter político contra um açougueiro e um joalheiro, para dizer o mínimo. Os delitos entram, com folga, na classe dos crimes comuns graves, classificados como hediondos.

Peluso também rebateu o argumento de que Battisti não teria tido o direito de se defender no julgamento na Itália. Sustentou que o réu constituiu advogado, mas foi julgado à revelia porque estava foragido:

- As pessoas que fogem de procedimentos judiciais não são refugiadas. O refugiado é uma vítima da Justiça e não é alguém que foge da Justiça.

O relator afirmou que a tese de que os crimes prescreveram não se sustenta. Segundo Peluso, a prescrição ocorreria apenas em 2013. Outro argumento da defesa é o de que não havia provas concretas contra Battisti. Peluso esclareceu que as leis brasileiras não permitem a revisão de provas de casos julgados em outros países.

O primeiro a discordar do relator foi Eros Grau. Para ele, não há irregularidade na decisão do ministro da Justiça de conceder o refúgio. Para Eros, o processo de extradição deveria ser arquivado e o italiano, libertado. Joaquim Barbosa foi além: disse que a decisão do Executivo é soberana, uma decisão de estado e, por isso, não pode ser submetida ao crivo do STF:

- Concessão de refúgio é assunto político.

Cármen Lúcia concordou. Além de Peluso, foram favoráveis à extradição Ricardo Lewandowski, Carlos Ayres Britto e Ellen Gracie.

Tarso: 'Conceder refúgio político é uma prerrogativa do Executivo'

Ricardo Galhardo
DEU EM O GLOBO

POLÊMICA DIPLOMÁTICA: Ministro diz que ainda não fará "juízo político" do STF

Ministro reclama de "pressão ostensiva e estranha" da Itália sobre o Brasil

SÃO PAULO. O ministro da Justiça, Tarso Genro, responsável pela concessão de refúgio político ao ex-ativista italiano Cesare Battisti, disse ontem que, se o Supremo Tribunal Federal decidir a favor da extradição do italiano, significará o fim do refúgio político no Brasil. Para o ministro, o governo italiano faz uma pressão "ostensiva e estranha" sobre o Brasil.

- Se for declarada a inconstitucionalidade deste artigo (33 do Estatuto dos Refugiados), fica extinto no Brasil o direito de refúgio, que é uma prerrogativa do Executivo. Isso me parece uma questão para ser discutida de maneira profunda - disse Tarso, duas horas após o início do julgamento, depois suspenso.

O ministro reforçou que se trata de uma prerrogativa do poder Executivo.

- Este artigo transforma o asilo em uma questão pertinente ao Executivo, com juízo político do Executivo. Tem questões que são do Judiciário, indevassáveis, e outras do Legislativo também. Cada poder tem suas prerrogativas e características - afirmou.

Críticas ao governo Berlusconi

Ele reclamou da forma como o governo italiano tem se comportado neste caso:

- O governo da Itália exerceu pressão ostensiva e estranha, no mínimo. Pressão que não fez em outros casos aqui no Brasil e também na França, de pessoas que estavam na mesma condição de Battisti.

Ao cobrar mais respeito às decisões brasileiras, o ministro criticou o governo Silvio Berlusconi:

- É preciso examinar por que o governo italiano propõe, por exemplo, leis que obrigam os médicos a denunciar seus pacientes que são imigrantes ilegais. É um feito de um país soberano, tem que ser respeitado, mas o Brasil não precisa se curvar a isso - disse Tarso.

O ministro citou o caso do próprio Battisti, que passou 11 anos exilado na França sob a proteção do governo social-democrata, como exemplo de que o refúgio é uma decisão política que cabe a cada país.

- Em todos os países democráticos do mundo, não só aqui no Brasil, a questão do asilo é do Executivo. Veja que o Battisti esteve 11 anos na França como um refugiado político a partir de um juízo do governo francês, do presidente (Mitterrand), que inclusive tinha um juízo político tão completo que pediu a eles que assinassem um documento renunciando à luta armada.

Perguntado se o fato de o STF estar julgando o caso seria uma intromissão, Tarso preferiu esperar o veredicto:

- O juízo político sobre a decisão do Supremo vou fazer depois.

João Bosco, Nilze Carvalho e Diogo Nogueira

Bom dia!
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quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Candidatura empacada

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


O que menos importa na nova rodada da pesquisa de opinião do Instituto Sensus para a Confederação Nacional do Transporte (CNT) é a queda registrada na popularidade do presidente Lula, simplesmente porque não está caracterizada uma tendência nesse sentido. Na rodada divulgada em junho, 81,5% dos brasileiros aprovavam o desempenho de Lula, e agora esse índice caiu para 76,8%, quase cinco pontos percentuais, acima da margem de erro da pesquisa, que é de três pontos percentuais.

As razões para essa queda são muitas, segundo o Sensus: desde a gripe suína até a disputa entre a ministra Dilma Rousseff e a ex-secretária da Receita Lina Vieira, passando pela crise no Senado. Mas toda a badalação propagandística e o nacionalismo anacrônico da campanha sobre o petróleo do pré-sal podem perfeitamente recuperar a popularidade do presidente.

Provavelmente ele já "precificara" essa perda quando entrou de cabeça na defesa do senador José Sarney, se ligando tão ostensivamente a políticos como Renan Calheiros e Collor e os que formam a "tropa de choque" da base governista.

Se levarmos em conta, no entanto, que Lula já teve, em janeiro, uma aprovação de 84%, veremos que lentamente sua cotação vai caindo, embora ainda se mantenha em patamares bastante altos para a média histórica dos governantes brasileiros.

O que pode indicar que nem mesmo o mito Lula pode abusar da opinião pública como ele vem fazendo.

O mais importante da pesquisa, no entanto, é confirmar que a candidatura oficial da ministra Dilma Rousseff não decolou, e nem o ex-ministro Antonio Palocci nem o deputado federal Ciro Gomes parecem ter condições de vir a preencher essa lacuna petista.

A queda de Dilma - de 23,5% em junho para 19% hoje - é agravada por outros dois dados da mesma pesquisa. A candidata oficial já é amplamente conhecida do eleitorado - apenas 17,1% dizem não saber quem é - e ela tem um índice de rejeição que a coloca muito próxima da inviabilidade eleitoral.

Os técnicos do Sensus dizem que candidato com 40% ou mais de rejeição não emplaca. Dilma está na faixa de 37,6%, enquanto Serra tem 29,1%. Heloísa Helena com 43%, Ciro Gomes com 40%, Marina com 39% e Palocci com 46% são os outros candidatos na zona de rebaixamento da pesquisa do Sensus.

Se um dos fatores para a queda de popularidade de Lula foi a disputa entre Dilma e a ex-secretária da Receita, e levando-se em conta que a maioria dos pesquisados acredita mais em Lina Vieira do que na ministra, não é errado inferir que a imagem de mentirosa e arrogante que a oposição colou em Dilma está tendo receptividade na opinião pública, e será preciso um forte trabalho de marketing para que a candidata oficial passe a ter uma imagem mais simpática, o que não é tarefa simples.

Outro dado relevante da pesquisa é que a ministra Dilma Rousseff aparentemente atingiu o teto no que se refere à transferência de votos do presidente Lula. Há dois anos ele vem levando Dilma pela mão de palanque em palanque, primeiro colocando-lhe o título de "mãe do PAC", o que parece que não deu certo, até mesmo porque as obras do PAC não deslancharam.

Agora, a estratégia é jogar toda a força do apelo nacionalista do pré-sal literalmente em seu colo. Mas aí entrou em cena também a candidatura da senadora Marina Silva pelo PV, que desarticulou completamente a estratégia do lulismo de transformar em plebiscito a eleição do próximo ano.

Além de ser uma petista histórica, o que Dilma não é, a ex-ministra é a encarnação da luta pela preservação do meio ambiente, o que lhe vale um alto índice de rejeição, mas também muita simpatia.

Certamente não é por acaso que a ministra Dilma Rousseff perdeu de junho para cá 4,5% pontos percentuais, praticamente o mesmo índice registrado por Marina Silva na primeira pesquisa do Sensus de que participa (4,8%).

O governador José Serra manteve-se dentro da margem de erro - de 40,4% para 39,5% -, o que indica que a candidatura "verde" retira mesmo votos da candidatura petista.

Para confirmar essa percepção, quando o candidato tucano é o governador de Minas, Aécio Neves, e a senadora Marina Silva está no páreo, Dilma, embora fique em primeiro lugar, cai 4,8 pontos percentuais, enquanto Marina vai para 8,1%.

Uma das críticas que se fazem ao projeto do governo de exploração do pré-sal é que ele não prevê qualquer atuação mais forte para usar esse "tesouro" para alavancar políticas de defesa do meio ambiente.

O deputado Chico Alencar, do PSOL, lembra que uma vantagem no debate dos projetos do pré-sal, "que inclusive impõe que não seja feito a toque de caixa", será forçar o Congresso a pensar estrategicamente, a "olhar o futuro, a fazer a grande política, a vincular matriz energética com cuidado ambiental e recursos a serem geridos com transparência e controle público".

Já o ex-presidente da Agência Nacional do Petróleo (ANP) David Zylbersztajn tem sugerido em diversos fóruns que "parte dos recursos de uma fonte de energia finita e suja seja usada para a pesquisa e desenvolvimento de fontes renováveis, onde o potencial nacional é imenso e nosso atraso nos investimentos tecnológicos idem".

Acontece que o governo e a Petrobras estão trabalhando com a hipótese, que tem base em estudos da Opep, de que não haverá mudanças na matriz energética mundial até pelo menos 2030.

O consumo de petróleo continuará nas mesmas bases de hoje, de 85 milhões de barris/dia, e a demanda que exceder a esse limite é que será atendida pelas novas fontes renováveis de energia.
O governo, portanto, omite-se de atuar com uma visão de longo prazo para a proteção do meio ambiente, e aposta em uma visão estratégica que pode ser boa para a Petrobras, mas não necessariamente para o país.

Um Estado de coluna

Roberto DaMatta
DEU EM O O GLOBO


Veja bem o leitor. Falo de um Estado de coluna; não da coluna afeita ao Estado que retorna por meio do lulismo e joga na nossa cara dita democrática o nome de um jornal absurdamente censurado.

Temos no Brasil uma enorme admiração pelo Estado cujo papel seria o de centralizar, educar, proteger, compensar, administrar e, como fonte exclusiva de virtude, promover o salvacionismo nacional, manter a boa hierarquia dos que estão por cima e, no limite do cristianismo populista que se mistura com politicagem barata, conter as ambições ou - como diz o presidente Lula e seus seguidores - "cuidar" do "povo" e não da totalidade dos seus cidadãos. Pois quem tem sucesso e fortuna não precisaria do Estado.

Disse num trabalho acadêmico que um dos traços mais marcantes da ideologia latino-americana era a estadofilia, a estadolatria, a estadomania e a estadopatia. A ideia segundo a qual o Estado salvaria a sociedade de si mesma, como ocorreu em Canudos e em todos os chamados golpes - essa recorrência das Américas do Sul. No fundo, legislamos - como mostra Sergio Buarque de Holanda em "Raízes do Brasil" - contra e para corrigir o mundo, pois nada que preste pode dele vir, como - contrariamente - concebiam os protestantes em geral e os calvinistas em particular.

Isso pode parecer uma discussão de professores que - indignos de ganhar um salário comparável à quota de papel higiênico de um senador ou ministro de Estado - tapeiam as frustrações dos que ensinam porque não sabem, discutindo o sexo dos anjos e, nas horas vagas, falam de como o Estado é pensado no Brasil. Mas a verdade é que o debate retornou forte neste país que consolida sua democracia fingindo que não vê a censura imposta a um jornal de nobre e rara tradição liberal e, paralelamente, fala de um novo marco regulatório para a indústria do petróleo no qual o Estado terá mais poder, e - mais adiante e com um fôlego de tirar o fôlego - tenta retomar a velha CPMF e, pior que isso, legislar sobre a chamada "propaganda política" na internet, o que seria um atentado não apenas à liberdade, mas um crime contra o bom senso.

Aí está, nu e cru, o primeiro sintoma da doença que essa tradicional idealização do Estado promove, quando se acredita realmente que só o Estado é capaz de conter, inibir ou reformar a sociedade, deixando de lado - eis o ponto brutalmente crítico - o fato irrevogável e não mercadante de que quem vai gerenciar esse Estado perfeito no desenho não serão marcianos, escandinavos, franceses, prussianos ou calvinistas radicais na honestidade, mas nossos parentes, compadres, companheiros e amigos. Podemos ter um Estado à francesa, mas não podemos esquecer que - com o devido respeito - ele será governado por brasileiros que não internalizaram nas suas consciências de ex-traficantes de escravos uma mentalidade institucional gaulesa. Tudo é perfeito no papel, mas os administradores - chamados de "políticos" - têm a lei apenas na cabeça. No coração carregam a penca de favores e de obrigações que devem aos seus netinhos.

A estadofilia, que acaba em estadopatia, vê a sociedade como desorganizada. Como uma mixórdia de raças inferiores e de aristocratas, mas sem hierarquia, princípio ordenador ou ritual (os antigos intérpretes do Brasil não conheciam o carnaval, a Semana Santa, as festas juninas e os almoços de família, etc., etc., etc...). Esse meio tido como caótico, mas dinamizado pelo mais regrado escravismo e patriarcalismo, demandaria esse tal Estado forte, neofascista, que dele viesse "cuidar" com o necessário carinho, comprometendo-se, primeiramente, é claro, com os pobres de Deus e o seu outro lado: os esfomeados de poder.

Esses santos da política que, no Estado, desejam simples e humildemente revogar alguns princípios sociais perniciosos como a propriedade privada, a ambição, a liberdade de opinar, o mercado e, mais modestamente ainda, o capitalismo como forma civilizatória, deixando de lado a arrogância e a onipotência típicas de quem imagina que pode haver Estado sem sociedade. Que ainda é possível continuar com um Estado regiamente sustentado pela sociedade. Com uma administração pública que pouco se lixa para o sistema sociocultural do qual faz parte.

Regular o mundo. Eis o que poderia substituir o nosso velho e nada verdadeiro "ordem & progresso" comtiano como dístico do pendão da política nacional mais reacionária. Certos de que nada existe nos nossos corações, seguros de que nossos costumes não têm nenhuma força ou peso e que não seríamos mesmo organizados porque o mundo do qual viemos estava numa das fronteiras da Europa, nossos teóricos acabaram levando mais a sério do que os próprios alemães, ingleses, franceses, russos e americanos o que os seus ideólogos e estudiosos escreviam. O grande Rousseau situou com precisão a dialética entre costumes e leis falando dos últimos como os hábitos do coração. E Alexis de Tocqueville, que sequer fazia parte das leituras locais, escreveu todo um segundo livro discorrendo sobre os reflexos das instituições democráticas americanas nos costumes, mostrando como a igualdade da lei estimulava a que operava na vida diária.

A questão não é ter de mais ou menos Estado. O real problema é ter mais ou menos competência, canalhice e honra na gerência tanto do Estado quanto da sociedade!

Roberto DaMatta é antropólogo.

Recados ao Planalto

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Os números da nova rodada de pesquisas CNT/Sensus em si não comunicam más notícias para o governo. Já os recados subjacentes a eles não se pode dizer que sejam tranquilizadores para o panorama visto a partir do Palácio do Planalto.

Comecemos pelo que sempre chama mais atenção: os índices de aprovação do presidente Luiz Inácio da Silva. Houve ligeira queda de quatro pontos porcentuais. Nada que abale a condição de campeão de popularidade de Lula em relação aos antecessores.

Avaliação positiva de 76,8% no sétimo e penúltimo ano de mandato, com crise econômica e escândalos para dar e vender, é capital político talvez inédito em regimes democráticos mundo afora.

Portanto, a perda de alguns pontos não se explica pela chamada fadiga de material. Tanto que Lula continua sendo o mais lembrado como candidato a presidente em 2010 na pesquisa espontânea. O brasileiro não parece farto do presidente.

Mas demonstra aborrecimento com algo. O diretor do Instituto Sensus, Ricardo Guedes, levanta três hipóteses: a gripe A (suína), o episódio da briga com a ex-secretária da Receita Lina Vieira e o fato de o presidente "ter deixado de lado o discurso popular, falando mais sobre dificuldades na economia e na crise do Senado".

Especialista, Guedes deve saber do que fala. Mas, de maneira impressionista, parece que ele reserva ao item "crise no Senado" um lugar menos importante do que deveria.

Nada de ruim, da última pesquisa (em maio) para cá, aconteceu para o presidente da República, a não ser a sua defesa apaixonada do presidente do Senado, cujo repúdio popular está expresso numa outra pesquisa em que 76% apoiam punição a Sarney. Em outras palavras, Lula errou a mão.

As outras motivações para a queda não se sustentam. A gripe não tem culpa, pois na opinião de 52,4% , está sendo enfrentada de forma correta pelo governo.

As escaramuças com Lina Vieira dificilmente poderiam justificar a oscilação de humor dos pesquisados porque simplesmente metade deles (50,2%) não acompanhou ou nunca ouviu falar no assunto.

O problema para o governo reside entre os que acompanharam. Destes, 35,9% acreditam que a ministra Dilma Rousseff realmente pediu para a então secretária da Receita que interferisse nas investigações relativas aos negócios da família Sarney. Muito menos que isso, 23,6%, acha que a ministra diz a verdade quando nega.

Quer dizer, problemas sérios no quesito confiabilidade. A alegada candidata de Lula tampouco demonstrou eficácia no tocante à conquista de eleitores. Caiu quatro pontos na simulação de segundo turno com o governador de São Paulo, José Serra - cuja liderança não sofreu abalos - e ficou na casa dos 19% das preferências.

É pouco na comparação, por exemplo, com os 7% obtidos pelo deputado Antonio Palocci. Ele estreou nas pesquisas presidenciais, ninguém sabe se é ou não candidato e acabou de se livrar de um processo criminal numa votação apertada e numa sessão em que todos os ministros do Supremo Tribunal Federal disseram claramente que a quebra de sigilo do caseiro Francenildo Costa aconteceu para favorecer o então ministro Palocci.

Nesse quadro adverso, os 7% dele representam mais que os 19% de alguém que desde fevereiro de 2008 está todos os dias no noticiário sendo apresentada como a predileta do rei.

Isso sem contar os 40 pontos porcentuais (51% a 11% ) de dianteira de Serra sobre Dilma em São Paulo e a vantagem de 13 pontos do tucano no Nordeste, reduto de Lula.

Como diz o velho chavão, é cedo para tirar conclusões. Em um ano tudo pode acontecer: a oposição errar o bastante para perder e o governo acertar o suficiente para ganhar. Mas, pelo quadro atual, haverão ambos de se esforçar muito para tal.

Nome à pessoa

Segundo a pesquisa, 53,9% rejeitam a volta da CPMF. No entanto, 49,4% reclamam dos serviços de saúde pública. Ou seja, não relacionam uma coisa à outra, o que dizima o principal argumento governista em favor da retomada do imposto: a necessidade de verbas para a saúde.

Túnel do tempo

Revirando a coleção de artigos, um de julho de 2002 sobre a final da Copa do Mundo no Japão - quando Diego Maradona atribuiu a vitória do Brasil sobre a Alemanha à "sorte" da equipe -, remete ao silêncio eloquente do agora técnico da seleção argentina ante a derrota de sábado último.

"Diego Maradona chamou a todos de medíocres e aos brasileiros de sortudos. Só perdeu em elegância para os brincos de brilhante limitados ao norte pela negra cabeleira e ao sul pela papada já desprovida de fronteiras com as bochechas. De fato, nosotros moreninhos damos uma sorte danada."

Com a vantagem de que implicamos com os argentinos, mas não os invejamos.

Nosso tecido, "nossos" aviões

Clóvis Rossi
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


SÃO PAULO - Se a a França ganhou a corrida para vender aviões (os "Rafale") ao Brasil porque concordou em transferir tecnologia, pode estar vendendo ouro de tolo. É o que se diz na França.

Christian de Boissieu, presidente do Conselho de Análise Econômica e membro do Conselho Econômico de Defesa, produz a seguinte frase, para a edição on-line de ontem da revista "Le Point": "Supondo que o Brasil queira construir seu "Rafale"... Primeiro, isso não se fará imediatamente e, no dia em que se fizer, me parece que nós já teremos passado ao avião do futuro."

Qual é a graça, então, em comprar aparelhos que são bem mais caros do que os da concorrência se, na hora em que de fato se materializar a transferência de tecnologia, os aviões já serão obsoletos?

É um motivo a mais para cobrar transparência das autoridades e discussão no Congresso, temas que impregnaram todo o noticiário de ontem desta Folha.

Mas, do meu ponto de vista, a dúvida é de outra natureza. Se o objetivo das compras anunciadas é consolidar a hegemonia militar regional, como parece lógico, para que servirá?

Atende uma mentalidade que olha para o passado, para o que Marcos Nobre chamou de "cultura das armas". O Brasil deveria estar olhando é para o que o presidente Barack Obama chamou ontem de "transição para uma economia do século 21" -e que ele pretende pôr no topo da agenda para a cúpula do G20 dias 24 e 25 em Pittsburgh.

Como é essa economia? Responde Obama: "Inovação em alta tecnologia -o que inclui tecnologia verde, educação e treinamento- e pesquisa e desenvolvimento".

Obama citou, entre outros exemplos, que laboratórios médicos de Pittsburgh avançam em regeneração de tecidos. O que você prefere: "Rafales" ou regeneração de tecido humano?

Previsibilidade democrática

Fernando Rodrigues
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


BRASÍLIA - Uma das características mais relevantes de um país democrático é a estabilidade das regras. O ambiente fica previsível.

Os três Poderes são responsáveis por um ambiente assim. Durante anos, Congresso e Executivo fizeram o oposto na política. A partir de 1994, houve uma decantação. O Brasil passou a ter uma eleição regular a cada quatro anos para presidente e governadores de Estado.

Nos últimos tempos, o Poder Judiciário assumiu a linha de frente da imprevisibilidade. No recente caso de Antonio Palocci, o Supremo Tribunal Federal rejeitou a denúncia contra o ex-ministro por considerar não haver indícios sólidos de sua participação num episódio de quebra de sigilo bancário.

Mas semanas antes de absolver Palocci o STF decidiu de maneira inversa ao aceitar a abertura de processo contra o deputado federal Lira Maia (DEM-PA). Só havia indícios inconclusivos contra o político paraense (como no episódio de Palocci), e o caso foi avante.

Hoje, o Supremo novamente pode emitir um sinal trocado ao julgar o italiano Cesare Battisti.

Acusado de terrorismo na Itália, ele recebeu refúgio do governo brasileiro. Os ministros do STF ensaiam anular essa condição e ordenar a extradição. Se esse for o desfecho, haverá um conflito com julgamento sobre tema similar em 2007.

Há menos de três anos, o STF rejeitou o pedido de extradição para Olivério Medina, acusado de ter conexão com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia. Tal como Battisti, o colombiano havia obtido refúgio do governo brasileiro.

É direito líquido e certo do Poder Judiciário decidir de maneira livre e soberana. Também é comum e aceitável uma corte evoluir de uma posição para outra. Essas mudanças só não combinam com a previsibilidade jurídica da democracia quando ocorrem de maneira brusca, ilógica e frequente. Aí, é necessário refletir. Algo não anda bem.

Usados e descartados

Raymundo Costa
DEU NO VALOR ECONÔMICO


O Rio de Janeiro é um nó cego para a candidatura de José Serra a presidente. Em 2002, o tucano levou uma surra de Luiz Inácio Lula da Silva. Foram 3,2 milhões de votos a 721.081 (o mais votado foi Anthony Garotinho, com 3,4 milhões de votos). Mas o tucano ganhou pontos com o Rio e com o seu governador, Sérgio Cabral, no primeiro embate de bastidor para valer com a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), a candidata do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para 2010, que envolveu o marco regulatório do pré-sal.

Depois do jantar que reuniu Lula e ministros aos governadores Serra, Cabral e Paulo Hartung, do Espírito Santo, os dois últimos, lulistas por afinidades pessoais e dependências administrativas, saíram mais impressionados com o desempenho do governador de São Paulo do que com o da ministra-chefe da Casa Civil da Presidência da República.

Serra não se expôs. Durante o jantar, defendeu um período maior de discussão dos quatro projetos que Lula enviou ao Congresso. Cabral e Hartung registraram como um apoio importante de vez que, à esta altura, tempo é o que Rio e Espírito Santo mais precisam para defender suas posições. Do lado de fora, Serra não entrou no mérito da questão.

Para Sérgio Cabral, o modelo de divisão dos royalties do pré-sal a ser definido pode ser decisivo para seu futuro eleitoral. O mesmo ocorre com Paulo Hartung. Hoje, dos dois são beneficiados por um regime especial de divisão dos royalties. Lula e Dilma defendem a divisão igualitária por todos os Estados para o pré-sal.

Cabral saiu aborrecido do jantar realizado na véspera do lançamento do marco regulatório do pré-sal, apesar de ter elogiado Lula em entrevistas. Não passou despercebido ao governador do Rio a desenvoltura com que se comportou o ministro da Comunicação Social, Franklin Martins, na reunião.

Franklin foi uma espécie de regente da orquestra. Em determinado momento, segundo apurou o Valor, chegou a elevar a voz para o governador do Rio de Janeiro. Além dele, também estavam à mesa Dilma e o ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, além de Lula.

A queixa política de Cabral em relação a Dilma é o que importa no momento. Em conversas com governadores e colaboradores o governador deixou claro que viu Serra mais preparado que Dilma para governar e que a ordem de sua preferência pessoal passou a ser Lula, Serra e Dilma. O que não significa que sua preferência política venha a ter esta ordem, nas eleições de 2010.

Serra saiu do episódio solidário com os colegas do Rio e do Espírito Santo sem comprar briga com o Nordeste, onde estaria acampada a "tropa de choque" contrária aos interesses cariocas e capixabas, como se diz tanto nas terras de Cabral como nas de Hartung.

Cabral esperava que Dilma fizesse a costura entre os Estados, antes da apresentação dos projetos. No final, Serra é que teria mostrado maturidade para tratar de assunto dessa envergadura.

As pesquisas em poder de Cabral revelam que os cariocas gostam da aliança do governador com o Lula. O sentimento é que o Rio já foi muito maltratado na história recente. A parceria é positiva para o Estado, dizem as pesquisas, mas nunca deve ser de subserviência. O carioca preserva o orgulho da antiga capital e acredita que o Brasil tem com ele uma dívida eterna pela criação de Brasília.

A exemplo da oposição, os dois governadores condenam a pressa para estabelecer regras para algo que só vai funcionar no final da próxima década. Entre eles circula que Franklin é um dos ministros mais intransigentes quanto ao regime de urgência urgentíssima no Congresso. Amigos de Lula contam outra história: o presidente realmente acha que o pré-sal é uma "dádiva de Deus" que aconteceu em seu governo, ele quer que este seja o registro da história.

Se for este o caso, deve-se esperar um grande embate no Congresso. Do contrário pode se repetir o que vem ocorrendo no governo Lula, que o deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA) chama de "usados e descartados" - o incessante lançamento de programas, com fins eleitoreiros, que não tardam a desaparecer do discurso do presidente. Os exemplos mais escancarados seriam o "Fome Zero", o "Primeiro Emprego" e o "Biocombustível". Pode ser. Mas qualquer projeto aprovado agora que não for do interesse público, certamente será mudado em 2011.

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. A titular da coluna, Rosângela Bittar, não escreve hoje excepcionalmente

Senado recua e deve manter censura à rede

Maria Lima e Adriana Vasconcelos
DEU EM O GLOBO

Devido à pressão da Câmara, proposta manterá restrição à cobertura jornalística da campanha de 2010 nos sites

BRASÍLIA. Com o aval de PSDB e DEM, o Senado deve aprovar hoje a nova lei eleitoral, que restringe a emissão de opinião e a cobertura jornalística da campanha do ano que vem nos sites noticiosos na internet. Pelo acordo fechado pelos relatores Eduardo Azeredo (PSDB-MG) e Marco Maciel (DEM-PE) com o relator da proposta na Câmara, Flavio Dino (PCdoB-MA), só ficam liberados da censura blogs assinados por pessoa física, Orkut, Twitter e YouTube.

Semana passada havia entre os senadores um certo consenso para acabar com qualquer censura a portais e sites de jornais na cobertura das campanhas, após a aprovação da censura em duas comissões. Mas houve recuo diante da forte reação da Câmara, onde o texto fora aprovado com as restrições.

O líder do PT, Aloizio Mercadante (SP), insiste em apresentar emenda extinguindo o artigo 57-D, deixando apenas o direito de resposta àqueles que se sentirem prejudicados. Mas ele adianta que deve perder:

- Os políticos têm que aprender a ser criticados pacientemente. É difícil mesmo abrir a internet e ser esculhambado, mas temos que manter o compromisso com o princípio fundamental da liberdade.

- Acabou essa ideia do liberou geral. Estamos discutindo regras para o conteúdo próprio dos sites, e vamos colocar no texto os pontos que as empresas de comunicação social que estão na internet podem ou não podem fazer - justificou Dino.

Pelo acordo, empresas de comunicação e seus conteúdos de provedores na rede ficam proibidos de exibir enquetes que identifiquem eleitores. Também não poderão fazer propaganda eleitoral de candidato, partido ou coligação, nem dar tratamento privilegiado a um concorrente sem motivo jornalístico que o justifique. Os sites poderão realizar debates, mas terão de seguir as mesmas regras aplicadas às TVs convencionais.

A votação deve ocorrer hoje no plenário do Senado.

O QUE PENSA A MÍDIA

Editoriais dos principais jornais do Brasil
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Presidente critica jornais ''capengas'', com notícia negativa

Leonencio Nossa
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou ontem a criticar a imprensa. Na Coluna Semanal do Presidente, informativo divulgado pela Secretaria de Imprensa do Palácio do Planalto, ele qualificou de "capengas" jornais que, na sua avaliação, só publicam notícias negativas.

"Eu concedo entrevistas praticamente todos os dias e não poderia dar informações se não tivesse informações", disse Lula, em resposta a um professor de Fortaleza que indagou se era verdade que ele não lia jornais e tinha desprezo pelo conhecimento. "Em relação aos jornais: alguns deles parecem ter-se especializado em notícias negativas, de modo que se tornaram capengas, deixando de transmitir as variadas dimensões da realidade."

"Na democracia, quem tem desprezo pelo conhecimento jamais chega a presidente", frisou Lula. Em janeiro, a revista Piauí divulgou entrevista na qual ele afirmou que não lia jornais, sob alegação de que as notícias lhe davam "azia".

Serra lidera; Marina larga com 9,5%

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Dilma, com 19,9%, tem 20,2 pontos de desvantagem em relação a tucano

A primeira pesquisa do instituto Sensus com Marina Silva (PV) na lista de candidatos mostra a ex-ministra do Meio Ambiente com 9,5% das intenções de voto, no cenário em que também são apresentados aos entrevistados os nomes do governador de São Paulo, José Serra (PSDB), e da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT).

Serra (40,1%) lidera com 20,2 pontos porcentuais de vantagem sobre Dilma (19,9%). No levantamento anterior, no cenário em que Heloísa Helena (PSOL) aparecia no lugar de Marina, o tucano tinha 40,4% das preferências e a petista, 23,5%. Não é correto dizer que a ministra caiu, já que os cenários são diferentes. Mas é possível comparar as duas pesquisas na simulação de segundo turno, quando Serra e Dilma aparecem como concorrentes. Nesse caso, do fim de maio para cá, a vantagem do tucano aumentou de 21 pontos porcentuais para 24,9 pontos.

A pesquisa de maio mostrava a petista em ascensão. Desde então, ela reduziu as aparições públicas, por conta do tratamento que faz contra um câncer. Também se envolveu em uma polêmica com a ex-secretária da Receita Lina Vieira, que a acusa de ter sugerido, em um encontro no ano passado, o favorecimento da família Sarney em uma investigação fiscal. Dilma nega as pressões e diz que o encontro nunca ocorreu.

Marina Silva se aproxima dos dois dígitos quando há apenas três nomes apresentados aos entrevistados. Mas, se Heloísa Helena (PSOL) também entra na lista, a provável candidata do PV cai para a quarta colocação, com 4,8%. Nesse cenário, Serra aparece com 39,5% e Dilma tem 19%.

O governador de São Paulo aparece, em todos os cenários, com mais votos do que a soma dos adversários - se o quadro persistir até 2010, vencerá já no primeiro turno. A situação para o PSDB não se mostra tão confortável quando Serra é substituído na lista de candidatos por Aécio Neves, seu rival no partido. O governador de Minas, com 19,5%, aparece atrás de Dilma, que lidera, com 25,6%, enquanto Marina atinge 11,2%.

Os cruzamentos por região do País mostram que o governador paulista reúne mais simpatizantes no Sul (48,3%), enquanto Dilma colhe seus melhores resultados no Nordeste (23,8%) e no Norte/Centro-Oeste (21,1%).

Para medir a rejeição aos candidatos, o Sensus apresentou uma lista e perguntou aos entrevistados em quais eles votariam com certeza, poderiam votar ou não votariam de jeito nenhum. No caso de Serra, 20,2% o definiram como o único candidato em que votariam, 39,7% admitiram a possibilidade de apoiá-lo e 29,1% descartaram a hipótese de isso acontecer. Outros 5,2% negaram conhecer o tucano.

Em relação a Dilma, a rejeição foi maior: 37,6% disseram que não votariam nela. Outros 11,3% a apontaram como candidata preferida, 27,3% admitiram a possibilidade de escolhê-la em 2010 e 17,1% disseram não conhecê-la.

Nas últimas semanas, cresceram as chances de a base governista ter dois candidatos na eleição: Dilma e Ciro Gomes (PSB). Mas o Sensus não avaliou essa hipótese nos cenários apresentados aos eleitores.

Eleitores com mais estudo fazem índice de Lula cair

Daniel Bramatti
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Pesquisa CNT/Sensus diz que a avaliação positiva do governo caiu de 69,8% para 65,4%, e a aprovação a Lula, de 81,5% para 76,8%, de maio a setembro. O recuo é maior entre os mais escolarizados. Na corrida eleitoral, José Serra ampliou vantagem sobre Dilma Rousseff.

Eleitores mais escolarizados puxam avaliação de Lula para baixo

Mas índice de aprovação ao desempenho do presidente, que está em 65,4%, continua alto, indica pesquisa

As taxas de aprovação ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao seu governo caíram nos últimos três meses, apesar de a percepção da população sobre a economia ter melhorado, segundo pesquisa divulgada ontem pelo instituto Sensus.

O levantamento, encomendado pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT), mostra que a avaliação positiva do governo caiu 4,4 pontos porcentuais, de 69,8% no fim de maio para 65,4% no início de setembro. No mesmo período, a aprovação a Lula caiu 4,7 pontos, de 81,5% para 76,8%.

No caso da avaliação do presidente, o resultado foi puxado pelos eleitores mais escolarizados e de maior renda. Entre os que têm curso superior, a parcela que considera o desempenho de Lula ótimo ou bom encolheu nada menos que 16 pontos porcentuais. No outro extremo, entre os eleitores que têm apenas o curso primário, a queda na aprovação foi bem menor - de apenas 3,1 pontos, quase dentro da margem de erro da pesquisa, de três pontos.

A divisão dos entrevistados por faixa de renda mostra que, entre os mais ricos, que ganham mais de 20 salários mínimos, a aprovação ao presidente caiu 10,9 pontos porcentuais, enquanto oscilou negativamente apenas 2,7 pontos entre os mais pobres, que recebem um salário mínimo ou menos.

Na divisão por regiões, o prestígio de Lula permaneceu inalterado no Nordeste e no Norte/Centro-Oeste. Mas sofreu arranhões no Sul e no Sudeste, onde sua taxa de aprovação se reduziu em 11,8 e 8,2 pontos, respectivamente.

HIPÓTESES

O diretor do instituto Sensus, Ricardo Guedes, além de ponderar que o nível de satisfação com o presidente permanece alto, citou três possíveis explicações para o desgaste no período: a gripe suína, a crise no Senado e o episódio que envolveu a ex-secretária da Receita Lina Vieira e a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.

Guedes ressalvou, porém, que a pesquisa não contemplou uma pergunta específica sobre o socorro prestado por Lula ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), na chamada crise dos atos secretos.

A ausência desse dado fez com que o fator Senado fosse visto com cautela por dois cientistas políticos consultados pelo Estado, David Fleischer, da Universidade de Brasília, e Leôncio Martins Rodrigues, professor aposentado da Universidade de Campinas. Para Fleischer, é " improvável" que a crise no Senado tenha afetado a imagem de Lula. Já Leôncio avalia que a explicação é plausível, principalmente ao levar em conta que o desgaste foi maior entre os mais escolarizados - e possivelmente os mais informados sobre as declarações de solidariedade do presidente a Sarney, cuja renúncia foi pedida por líderes da oposição.

No caso da gripe provocada pelo vírus H1N1, há um dado concreto na pesquisa: aumentou a parcela dos entrevistados que consideram que o Brasil tem combatido a epidemia de forma inadequada (de 32,6% para 41,4%). Apenas 1% dos ouvidos pelo Sensus disseram não ter ouvido falar da doença.

Mas a desinformação é grande em relação ao terceiro fator que, na opinião do diretor do instituto, teria desgastado o governo. Apenas 24% afirmaram ter acompanhado notícias sobre a denúncia de Lina de que teria sido pressionada por Dilma para favorecer a família Sarney, alvo de investigação da Receita - a ministra nega. Outros 17,5% disseram ter apenas ouvido falar no caso.

CRISE ECONÔMICA

O grau de apoio ao governo e ao presidente costuma variar segundo as expectativas da população em relação à economia, mas isso não aconteceu no levantamento feito entre 31 de agosto e 4 de setembro.

Nos últimos três meses, a parcela de eleitores que vê o Brasil em processo de saída da crise econômica subiu de 35,9% para 52%. Para 59,6% dos entrevistados, a situação do emprego vai melhorar nos próximos seis meses - no fim de maio, 56,4% faziam essa previsão.