domingo, 29 de abril de 2012

Um Código sem floresta:: Marina Silva

O Congresso brasileiro aprovou nessa semana um novo Código Florestal. As avaliações são unânimes em dizer que foi o maior retrocesso no arcabouço institucional das políticas socioambientais no Brasil desde a ditadura. Isso não é exagero ou retórica para um projeto que anistia os desmatamentos ilegais ocorridos até junho de 2008, com perdão das multas e desobrigação de recuperar o dano ambiental. Fez, está feito. Quem cumpriu a legislação, em vez de ser premiado, reconhecido, fica no prejuízo. Além disso, facilita a vida de quem quer continuar desmatando, abrindo brechas e exceções que permitem a redução das reservas legais e das áreas de preservação permanente e premiando o produtor que infringiu a legislação com acesso a crédito subsidiado do governo.

A principal justificativa é que precisamos aumentar a produção de alimentos para um mundo que já ultrapassou a marca de 7 bilhões de pessoas. Parece um objetivo nobre, mas a história não é bem assim. Basta lembrarmos que temos cerca de 200 milhões de bovinos no Brasil, que ocupam aproximadamente 200 milhões de hectares de terra. Uma produtividade de quase um boi por hectare, enquanto na vizinha Argentina esse índice chega a três bois por hectare. Estudos mostram que é possível dobrar a produtividade pecuária no Brasil a baixo custo, pois existe tecnologia acessível. Isso significa liberar 100 milhões de hectares, área bem maior que as ocupadas pela soja, cana, café, milho, arroz, feijão, batata, mandioca, etc, somadas.

Só esse exemplo mostra que é possível dobrar a produção sem derrubar um pé de árvore. É possível ainda expandi-la com a recuperação das áreas degradadas e abandonadas, que podem chegar a outros 100 milhões de hectares. Portanto, o que está em jogo não é a produção de alimentos, mas sim um modelo de desenvolvimento predatório, que maximiza o lucro no curto prazo e deixa para a sociedade um passivo ambiental gigantesco.

A escolha do Brasil se dá na encruzilhada da civilização. Não é possível ignorar os alertas da ciência para a realidade do aquecimento global e as drásticas mudanças no clima do planeta. Não podemos mais perder tempo com "bolhas" de prosperidade ilusória que custam os recursos de mil anos e se desfazem em menos de uma década. A encruzilhada da civilização é, sobretudo, de natureza ética.

A presidente Dilma terá que fazer a escolha: pactuar com esse modelo que gera degradação ambiental, privatiza o lucro e transfere os prejuízos para o restante da sociedade ou vetar o projeto e recolocar a discussão em outro patamar – o do desenvolvimento sustentável.

Vetar um projeto aprovado com o voto de boa parte da própria base parlamentar pode não ser uma situação confortável para a presidente, mas foi o próprio governo quem permitiu que ela chegasse a esse nível. Todos os relatores eram da base do governo e eram ruralistas confessos ou neorruralistas. O resultado não poderia ter sido diferente, tinha que dar num estrondoso retrocesso. Agora, entra em cena a "disputa" entre ruralistas e governo.

Já estão discutindo quais pontos podem ser vetados sem melindrar os interesses da bancada ruralista. Torcemos para que a presidente realmente cumpra sua promessa de campanha e não faça uma espécie de maquiagem legal apenas para não ficarmos tão ruim assim na foto da Rio+20. O que interessa é nosso futuro e essa foto será impossível de retocar caso o projeto seja sancionado.

O projeto anistia as áreas ilegalmente ocupadas até junho de 2008 nas matas ciliares, nas encostas de morros, em mangues, nas reservas legais de propriedades de até quatro módulos fiscais (que pode chegar a 440 hectares, dependendo da região do País) e muitas outras áreas sensíveis. A anistia está espalhada em inúmeros artigos e parágrafos ao longo de todo o projeto. Muitos deles não podem ser vetados sem, com isso, subtrair igualmente do texto importantes instrumentos de proteção ambiental. Isso porque em muitos casos a exceção está junto com a regra principal, que é boa. A presidente não pode vetar apenas parte de uma frase, somente toda ela.

Para cumprir sua promessa eleitoral, a presidente Dilma teria que vetar "propostas que reduzam áreas de reserva legal e preservação permanente". Novamente nesse caso temos uma lista bem grande de vetos. Mas o que deveríamos estar discutindo não é nada disso. O Brasil é uma potência ambiental e poderíamos estar discutindo de que forma valorizar nossos ativos para construirmos um país justo, com geração de emprego de qualidade e renda sem degradação ambiental, investimento em tecnologia e inovação que permita ao Brasil liderar a transição para o desenvolvimento sustentável, para a economia de baixo carbono.

Esse novo Código Florestal não representa a competição pelo caminho de cima, do ganho de produtividade como fator impulsionador da economia. Por isso, não há outra escolha a fazer, senão vetar tudo. Por isso pedimos o veto total. Dilma, veta tudo.

Marina Silva é ex-ministra do meio ambiente

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO/ALIÁS

O mundo e a bola murcha na Espanha:: Vinícius Torres Freire

Espanhóis amargam novo pico do desemprego já brutal e onda de desconfiança sobre os seus bancos

O Barcelona perdeu, o Real Madrid perdeu, e o assunto da semana na finança internacional foi a bola murcha dos bancos espanhóis. Um país europeu depois do outro reconhece a recessão. Os americanos pararam de melhorar. O mundo não vai dar uma força para o crescimento da economia da primeira metade do governo de Dilma Rousseff.

O que temos a ver com as finanças da Espanha? Quase nada, assim como a Grécia até 2009 era só um lugar lindo para as férias, até que quebrou, emperrou o sistema bancário europeu, arrastou outros países e ameaçou derrubar uma série de dominós financeiros pelo mundo.

O tumulto que começou na pequena Grécia tira pontos do crescimento mundial desde 2010.

Os empréstimos ruins dos bancos espanhóis levaram o país para o buraco. Emprestaram demais para especulação imobiliária, como se sabe. O governo fez dívida brutal para cobrir os rombos, que em parte ainda estão lá. Ou voltaram a aparecer, pois a Espanha está em crise faz quatro anos, o que provoca deterioração ainda maior do balanço dos bancos.

Por fim, mesmo as instituições remediadas ou saudáveis têm dificuldades para captar dinheiro. Os bancos espanhóis pegaram dinheiro com o governo, pegaram dinheiro com o Banco Central Europeu e mesmo assim estão na pindaíba.

A conversa desta semana de bola murcha no futebol e na finança, porém, é mais feia. Discute-se quem vai colocar dinheiro nos bancos meio quebrados ou descapitalizados do país.

A Alemanha diz que a Europa e suas instituições não vão dar um tostão. O governo da Espanha mal consegue arrecadar o bastante para cumprir sua meta fiscal (de redução de dívida), dada a recessão ainda pior do que a prevista.

Recessão, receita de impostos problemática e risco de gastos na salvação da banca fizeram os donos do dinheiro grosso levantar suspeitas sobre a Espanha. Na prática, isso significa cobrar mais para emprestar ao Estado espanhol ou para manter títulos da dívida espanhola em carteira. Já sobrecarregada de dívidas, a Espanha tem de pagar mais para rolar o papagaio.

Sim, a Espanha não é a Grécia. Para o bem ou para o mal, ressalte-se. A Espanha tem finanças muito mais ordenadas e não deve ser abandonada à própria sorte, pois é "grande demais para quebrar". Ser "grande demais" é também um problema. Mesmo uma balançada feia da Espanha pode causar estrago.

O novo problema espanhol começou a fermentar agora. O governo de lá diz que não haverá rolo nos bancos. Mas o "mercado" não tem acreditado. Se continuar descrente e piorar a recessão de crescimento e de receitas de impostos, a Espanha terá cada vez menos crédito. Quando se vai saber o que vai dar? Trata-se de um jogo marcado lá para o meio do ano.

Um ano, aliás, que já seria apenas medíocre, de recessão suave na Europa, de crescimento que já desanima (mas nada grave) nos EUA, de China mais devagar. Tudo isso deixa cinzento o cenário para a nossa indústria, que ainda padece de câmbio ruim e falta de crédito para o consumidor, que, de resto, comprou demais nos últimos anos e está numa ressaca de despesas grandes.

Não é um desastre. Mas vai ser enjoado.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Compromissos e desafios da gestão pública:: Rosemberg Pinheiro

A implementação de novas práticas e instrumentos de gestão afinados às constantes inovações tecnológicas e integrados às novas necessidades da sociedade, cada dia mais consciente e exigente nos seus pleitos e necessidades, é o desafio posto ao gestor público do século XXI.

A produção de serviços com mais qualidade e melhor custo, efetividade, burocracia mínima e ágil, recursos humanos eficientes profissionalizados e comprometidos com metas, orçamentos descentralizados compatíveis com as reais necessidades da gestão, transparência, combate permanente às praticas de corrupção, rompimento com as práticas patrimonialistas e paternalistas são ações que podem contribuir para a melhoria da gestão pública.

No nosso caso, nesses nove meses de trabalho junto à Faculdade de Medicina da UFRJ, estamos pondo em prática ações concretas e determinadas, na perspectiva de um novo ciclo de gestão, que esperamos aperfeiçoar gradativamente enfrentando as resistências naturais de percurso que vêm sendo trabalhadas, ao mesmo tempo com cada nova ação, num exercício permanente de dar velocidade aos processos e intervenções e implementá-los de acordo com as nossas reais possibilidades, notadamente dificultadas pelas deficiências de recursos humanos.

A nossa estratégia tem como meta buscar da forma mais eficiente possível atender e satisfazer a nossa clientela interna e prioritária, formada pelos nossos Professores e Alunos, nas suas necessidades gerais e especificas. Portanto, a nossa missão, enquanto gerente, é oferecer todos os meios possíveis para que a plenitude acadêmica aconteça e seja incorporada pelo conjunto da faculdade como cultura institucional, para transformação permanente de nossas práticas burocráticas e profissionais visando o ensino de qualidade.

Para a concretização dessa meta, temos que enfrentar um desafio que consideramos crucial, pois entendemos que para se realizar uma gestão eficiente e resolutiva é necessário reformular os conceitos e as práticas de recursos humanos no setor público. E, especialmente com urgência entre nós, consideramos que o atual modelo está esgotado e não satisfaz mais aos anseios e compromissos com a sociedade,às suas necessidades e direitos e, paradoxalmente, tem servido com frequência a interesses particulares de indivíduos públicos em detrimento do coletivo.

para se realizar uma gestão eficiente e resolutiva é necessário reformular os conceitos e as práticas de recursos humanos no setor público

Essas deformações são responsáveis em grande parte pela crise do modelo público assistencial de saúde e de educação pública, nos quais estamos inseridos e que são evidenciados, notadamente, pelas dificuldades que enfrentamos hoje junto ao nosso hospital universitário( Hospital do Fundão)que atualmente convive com as incertezas e os conflitos de sua própria identidade, como referência para o ensino médico no país , numa crise para a qual não vemos saída sem o rompimento com o tradicional modelo perdulário de gestão e sem a experimentação de alternativas inovadoras que ofereçam a oportunidade de se construir um novo conceito de hospital universitário, moderno e sintonizado com as inovações tecnológicas e acadêmicas do primeiro mundo.

Entretanto, as mudanças nos modelos de gestão no setor público enfrentam muitas dificuldades e resistências, principalmente nos campos políticos e ideológicos, pela própria tradição histórica do nosso Estado paternalista e grande empregador da sociedade.

Precisamos, definitivamente, fugir da improvisação do amadorismo e corporativismo que caracterizam os atuais modelos de gestão pública, precisamos de gestores profissionais com autonomia e capacidade, que sejam criativos e estejam preparados para utilizar as ferramentas das inovações tecnológicas, desenvolver metas, resolver problemas, dirimir conflitos e intermediar interesses coletivos.

precisamos de gestores profissionais com autonomia e capacidade, que sejam criativos e estejam preparados para utilizar as ferramentas das inovações tecnológicas, desenvolver metas, resolver problemas, dirimir conflitos e intermediar interesses coletivos

Precisamos criar um RH público de novo tipo, para enfrentarmos os novos e irreversíveis desafios, visando a nossa definitiva inserção no primeiro mundo da gestão e em suas boas práticas. Precisamos ter a atenção voltada para as questões de custos, produzindo cada vez melhor com menor custo; porque o desperdício é, na verdade, uma tragédia gerencial, que confirma a baixa qualidade e a falta de compromisso com a coisa públicao que também onera o conjunto da sociedade.

Precisamos construir compromissos coletivos e pactos de gestão para enfrentarmos as múltiplas dimensões do atual modelo patrimonialista e burocrático, com o qual ainda convivemos, e praticar um modelo de administração pública voltado para a eficiência, a eficácia e a efetividade, com foco em resultados.

praticar um modelo de administração pública voltado para a eficiência, a eficácia e a efetividade, com foco em resultados

Rosemberg Pinheiro, Diretor Adjunto de Administração da Faculdade de Medicina da UFRJ é Especialista em Saúde Publica ENSP/FIOCRUZ e Mestre em Planejamento e Gestão IESC/UFRJ

FONTE: REVISTA MEDICINA EM FOCO, Maio 2012 Nº 01 - Faculdade de Medicina da UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro.

O velho no novo:: Ferreira Gullar

Não estava ausente do projeto de Brasília a promessa utópica de uma cidade justa

Não me canso de me surpreender com o óbvio. Desta vez foi a comemoração do 52º aniversário de Brasília. Foi um susto constatar que faz 51 anos que morei ali, quando a cidade completava seu primeiro aninho de vida, e que eu não só morei como fui um dos responsáveis pela festa de comemoração.

É que eu era presidente da Fundação Cultural de Brasília, o primeiro, porque a instituição ainda não existia, era apenas um estatuto publicado no "Diário Oficial". Tive então que inventá-la.

Certo ou errado, entendi que Brasília era o produto do que havia de mais moderno no Brasil -a arquitetura de Oscar Niemeyer- e do que havia de mais arcaico -a mão de obra do homem sertanejo, que veio trabalhar na construção dos edifícios e palácios.

E daí concluí que a fundação devia voltar-se para a arte de vanguarda e para o artesanato. Assim, logo promovemos uma exposição de obras do Museu de Arte de São Paulo, um espetáculo do Teatro de Arena, criamos o Museu de Arte Popular e levamos, para a festa de aniversário da cidade, a escola de samba Mangueira.

Contratamos gente para sair país afora comprando arte popular e artesanato. Esses objetos causaram sensação no gabinete do prefeito Paulo de Tarso, que não pôde resistir ao assédio de altos funcionários e amigos do Planalto: levaram tudo. Meu projeto era criar, junto ao aeroporto, uma loja para vender essa produção artística do interior do país. Não deu em nada, mesmo porque o aeroporto mudaria de lugar.

Não era fácil viver naquela Brasília recém-nascida. A cidade ainda estava em obras, a maior parte das ruas não tinha calçamento e, com a secura do clima, vivíamos todos cobertos de um talco vermelho. Nossa diversão, ali, era ir para o aeroporto ver avião descer e levantar voo.

A certa altura, comecei a me perguntar se Brasília deveria ter sido traçada daquele jeito mesmo, se o Plano Piloto estava certo. Isso me ocorreu certa noite, à janela do apartamento de Betinho, quando me lembrei que, àquela hora, a Esplanada dos Ministérios estava totalmente deserta, já que de noite era hora de morar, e morar era ali onde eu estava.

Naquele momento, na parte residencial, estavam todos morando. Noutro ponto da cidade, havia o local para fazer compras, e noutro, o setor de diversões. Isso tornava difícil viver ali.
Mas é que planejar uma cidade a partir do zero é muito difícil. O urbanista começa de algum modo, e depois a vida corrige o plano. Foi o que aconteceu em Brasília.

Já naquela época, começaram a surgir lojas comerciais onde não estava previsto. E assim, pouco a pouco, a necessidade corrigiu o planejamento, até humanizá-lo. Hoje, os moradores de Brasília enfrentam muitos problemas, mas são outros, nascidos do próprio crescimento de sua população e das cidades-satélites em redor.

Nada que Lúcio Costa pudesse prever. Isso sem falar nos problemas decorrentes da política, por ter Brasília se tornado uma espécie de sede imperial, ocupada em boa parte por uma elite que usufrui de privilégios impensáveis quando a nova capital foi concebida. Muito pelo contrário, não estava ausente do projeto de Brasília a promessa utópica de uma cidade justa, organizada de modo a superar as desigualdades sociais.

Na visão de Lúcio e de Oscar, pelo menos ali haveria igualdade entre os cidadãos. Mal sabiam eles o que iria acontecer. Ao contrário disso, o nível de desigualdade entre pobres e ricos só tem aumentado, num movimento inverso ao que ocorre no resto do país.

Não obstante, sua renda domiciliar per capita é mais do que o dobro da média brasileira, embora Brasília quase nada produza, já que é sustentada pelo dinheiro público. Eu, de minha parte, por linhas tortas, acertei num ponto, pois Brasília iria tornar-se a expressão do que há de mais arcaico no Brasil: a apropriação da coisa pública pelos políticos corruptos.

E causa estranheza, sendo ela a sede dos Três Poderes da República, que tenha se tornado uma cidade provinciana, dominada por políticos medíocres. A esperança é que, no dia de seu aniversário, muitos cidadãos foram à praça dos Três Poderes protestar contra a corrupção.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO/ILUSTRADA

Memórias oblíquas de um intelectual

João Cezar de Castro Rocha*

O novo livro de Roberto Schwarz, Martinha Versus Lucrécia, reúne 17 textos, enfeixando grande diversidade de gêneros: ensaios de fôlego, outros curtos, escritos de ocasião, palestras, entrevistas e mesmo uma arguição de trabalho acadêmico.

O leitor talvez se sinta desorientado frente à natureza heteróclita do livro. Contudo, para esclarecer a coerência da organização, recordem-se dois títulos machadianos.

Principie-se pela advertência de Machado de Assis a Papéis Avulsos (1882): "Este título (...) parece negar ao livro uma certa unidade; faz crer que o autor coligiu vários escritos de ordens diversas para o fim de não os perder. A verdade é essa, sem ser bem essa."

O mesmo pode ser dito a respeito de Martinha Versus Lucrécia.

O primeiro ensaio, Leituras em Competição, cujo eixo fornece o título da coletânea, apresenta os pressupostos da pesquisa corrente de Roberto Schwarz, assim como anuncia desdobramentos futuros. Trata-se, assim, de trabalho em curso, que busca ampliar seu bem-sucedido modelo de interpretação da obra machadiana.

O último texto, Na Periferia do Capitalismo, uma longa entrevista, permite a Schwarz recapitular os primeiros passos de sua carreira, desde o ingresso no curso de ciências sociais na USP, em 1957, até a formação de seminário dedicado ao estudo de O Capital, no ano seguinte.

No fundo, os dois extremos se tocam. Em Dom Casmurro (1899), Bento Santiago almejou semelhante unidade para a escrita de suas memórias: "O meu fim evidente era atar as duas pontas da vida, e restaurar na velhice a adolescência. Pois, senhor, não consegui recompor o que foi nem o que fui."

Se não vejo mal, Martinha Versus Lucrécia compõe uma autobiografia intelectual oblíqua. E, ao contrário do narrador casmurro, Schwarz articula com êxito os momentos de seu percurso.

Voltemos ao princípio, escutando as lembranças do autor acerca dos estudos dedicados ao livro de Karl Marx: "Começou a se configurar no seminário a distância entre a construção marxista e a experiência histórica do país. O seminário teve a força de não desconhecer a discrepância (...)."

A obra de Roberto Schwarz foi a que levou mais longe as consequências dessa dissonância entre construção teórica e vivência histórica.

O exame de O Capital, a partir da circunstância brasileira, demandou a atualização do clássico no confronto com um contexto diverso do de sua produção. Ao mesmo tempo, porém, foi preciso compreender a realidade local com as lentes novas fornecidas pelo exame. O vaivém epistemológico é propriamente dialético e deu a régua e o compasso do método de Schwarz: "Dentro de minhas possibilidades, quando chegou a hora de fazer tese e de analisar os romances de Machado de Assis, eu me havia impregnado muito desse modo de ver."

Esse modo de ver adquire direito de cidadania na viravolta machadiana; noção que fornece o fio condutor de seu livro. De uma forma ou de outra, os 17 textos lidam com aspectos variados da noção.

Consultemos o ensaio precisamente intitulado A Viravolta Machadiana, e que sintetiza dois de seus livros - Ao Vencedor as Batatas (1977) e Um Mestre na Periferia do Capitalismo (1990). No ensaio, encontra-se a definição: "Até as Memórias Póstumas de Brás Cubas - a obra da viravolta machadiana -, o romance brasileiro era narrado por um compatriota digno de aplauso (...). Já o narrador das Memórias Póstumas de Brás Cubas é (...) acintoso, parcial, intrometido, de uma inconstância absurda (...)."

Portanto, a viravolta ocorre a partir da adoção de um ponto de vista com ramificações inéditas. Nos primeiros quatro romances, por meio do tradicional narrador onisciente, Machado assumiu o ponto de vista do agregado, cujo desejo mais atrevido se limitava à cooptação por parte de um protetor rico. Já nas Memórias Póstumas, a desfaçatez do narrador, típico representante da elite pátria, elabora uma forma literária dominada pela volubilidade da voz narrativa que, pelo avesso, articula uma exposição corrosiva das desigualdades definidoras da sociedade brasileira.

Assim, o caráter sempre arbitrário e por vezes violento da narrativa em primeira pessoa do defunto autor denuncia a arbitrariedade e a violência dominantes no Brasil escravocrata. E isso em meio à defesa dos princípios do liberalismo.

A viravolta machadiana é a mais completa tradução da dissonância cognitiva aprendida no corpo a corpo com Karl Marx.

Chegamos, portanto, à noção-chave da primeira fase da obra de Roberto Schwarz. O livro traz um ensaio esclarecedor sobre o tema, Por que 'Ideias Fora do Lugar'?

De um lado, Schwarz sistematizou uma longa tradição que defendia a inadequação entre princípios estrangeiros e cotidiano nacional. Ou seja, ele produziu um mapeamento específico dessa ideologia no caso da adoção oitocentista do liberalismo numa sociedade escravocrata. Não se trata, assim, de advogar um lugar platônico para as ideias, porém de identificar a tópica articuladora do discurso hegemônico no Brasil.

De outro lado, Schwarz identificou uma deliberada volubilidade ideológica. Isto é, para consumo externo, nossa elite lança mão do discurso liberal, reivindicando sua igualdade frente aos pares europeus e norte-americanos. No entanto, para uso doméstico, a mesma elite assegura sua diferença defendendo a "necessidade" de preservar o trabalho escravo. Ora, como os públicos-alvo são diferentes, por que exigir coerência discursiva?

Jano é o símbolo dessa estratégia marota, que ainda hoje possui partidários.

Aqui, as "ideias fora do lugar" e a volubilidade estrutural se dão as mãos, esclarecendo a força do pensamento de Roberto Schwarz.

Para concluir, apontemos dois reparos para um possível diálogo.

Valeria a pena incorporar certo aspecto da crítica de Alfredo Bosi. Schwarz está certo ao sublinhar o sentido específico que atribui à noção de "ideias fora do lugar". Daí, a ressalva de Bosi sobre as incoerências do liberalismo também na Europa apenas reforça a intuição de Schwarz, pois a alta voltagem da dissonância no cenário brasileiro estimula o remate decisivo: "O dado de observação tem horizonte local, mas o horizonte último da análise é globalizador e ironiza o primeiro, que pode ironizá-lo por sua vez." Touché!

Porém, a observação de Bosi sobre a existência de correntes opostas do liberalismo no Brasil oitocentista poderia tornar o raciocínio de Schwarz mais complexo. Estudar a presença de um grupo que, antes da viravolta machadiana, tocou o dedo na ferida, assinalando a discrepância entre discurso liberal e escravidão, poderia fornecer uma fonte ainda não explorada de diálogo para o entendimento do Machado das Memórias Póstumas.

Tratemos, por fim, do ensaio mais polêmico do livro, o até agora inédito Verdade Tropical: Um Percurso do Nosso Tempo.

A fascinação de Roberto Schwarz com o livro de Caetano Veloso relaciona-se tanto ao gênero da autobiografia, quanto à possível associação do narrador de Verdade Tropical com a volubilidade de Brás Cubas.

O paralelo, contudo, é problemático, embora não deixe de ser estimulante. No caso das Memórias Póstumas, a notável análise do crítico acerca do narrador e de suas cabriolas ideológicas nunca é interrompida para que se indague severamente acerca do engajamento de Machado nas transformações da sociedade brasileira. A hipótese é absurda, pois supõe uma justaposição ingênua entre autor empírico e narrador do romance.

Já na leitura de Verdade Tropical, Schwarz parece oscilar entre o estudo do texto - que julga notável - e a avaliação do comportamento político do autor, que ele considera autoindulgente e condenável.

Há, portanto, um desequilíbrio estrutural no ensaio. O olhar do crítico é, por assim dizer, estrábico: nem sempre trata do mesmo objeto, embora escreva sobre o "mesmo" livro. O estrabismo crítico pode ser produtivo, mas somente se o analista problematizar a dualidade de sua perspectiva.

Assim, a divisão observada na escrita de Caetano também contamina o discurso do analista. Por vezes, trata-se do crítico estudando o texto com a inteligência costumeira; por vezes, trata-se do cidadão Roberto Schwarz, avaliando as posições do compositor a partir de um contraponto nunca explicitado - o de suas convicções políticas.

É como se a complacência identificada na narrativa do músico ironicamente se voltasse contra o crítico. Entende-se, então, a abertura incomum do ensaio: "De início devo dizer que não sou a pessoa mais indicada para comentar a autobiografia de Caetano Veloso, pois não tenho bom conhecimento da música nem das composições do autor. Entretanto gosto muito do livro como literatura".

O artifício é sagaz, um drible desconcertante. Ou não.

Schwarz deseja sugerir que sua leitura apenas leva em consideração o texto, uma vez que se declara pouco familiarizado com a obra do compositor. Contudo, ele revela pleno conhecimento da carreira artística de Caetano, mediado por um viés determinado da circunstância política.

Ora, por que não imaginar a escrita de um novo ensaio, no qual o crítico reconheceria que sua análise da autobiografia de Caetano também é um exercício autobiográfico?

Para um dos mais destacados críticos dialéticos da atualidade - e isso em qualquer latitude -, talvez a sugestão não seja impertinente.

*João Cezar de Castro Rocha é professor de literatura comparada da UERJ

Martinha Versus Lucrécia
Autor: Roberto Schwarz
Editora: Companhia das Letras
(320 págs., R$ 44)

FONTE: SABÁTICO/O ESTADO DE S. PAULO

Diário do Cine PE 2012

Luiz Zanin

A inteligência de Jorge Furtado

RECIFE – Não digo que a inteligência seja tudo na vida – ou mesmo no cinema. Às vezes até atrapalha. Mas é bom quando posta em prática, e da maneira como o faz Jorge Furtado em Até a Vista.

O curta-metragem, me informam, faz parte de uma série para TV a cabo. Algo como dez episódios, ou coisa assim, dirigidos por diretores conhecidos. Jorge é um deles.

A história é a de um candidato a cineasta que descobre uma boa história, escrita por um argentino. Vai até Buenos Aires, tentar comprar os direitos do livro e encontra a figura, um certo Borges Escudero. Este tem um pedido a fazer: cede os direitos em troca de uma viagem ao Brasil, para reencontrar uma certa pessoa que ele conheceu tempos atrás.

O pequeno filme é uma aula sintética de humor, amor e ternura pelos personagens. Não poupa, no entanto, alguma dose de ironia e distanciamento crítico, ao comentar as relações entre brasileiros e os vizinhos, as dificuldades dos cineastas, etc.

Enfim, há inteligência e humor, termos que se aproximam muito. Coisa rara hoje em dia. A ser saudada quando aparece. É um refresco.

Paraísos Artificiais

Como costuma acontecer (há exceções) as entrevistas coletivas fazem mais esconder o filme que revelá-lo. Foi o que se passou na coletiva de Paraísos Artificiais, de Marcos Prado. A autocongratulação entre atores, diretor e jornalistas pouco acrescentou à compreensão de um filme de proposta ousada, porém com problemas de decolagem, como acontece com certos aviões.

Prado tenta um mergulho no universo jovem, das drogas, das raves. (Bem, ele mesmo diz que o termo rave é inadequado, pois este designa uma festa por tempo limitado, enquanto o que os jovens frequentam os festivais de música eletrônica, vários dias, em regiões paradisíacas, festas muito intensas, com muita droga e bebida.)

Enfim, o filme se divide entre o Rio, nordeste brasileiro e Amsterdã, com a condução da protagonista Erika (Nathalia Dill), no papel de uma DJ.

O filme, cujo título se deve a Baudelaire, tem muitas cenas de sexo, entre homem e mulher e entre mulheres, uso de drogas e conflitos familiares. Não abandona, no entanto, apesar dessa “temática” forte, um certo plano de voo de baixa altitude, talvez com vistas a um diálogo mais fácil com o público. E também de baixa profundidade. De fato, a impressão que se tem é de superficialidade.

No entanto, é muito bem filmado – mais uma vez por Lula Carvalho, que trabalha muito e bem, seguindo os passos do pai o consagrado Walter Carvalho. Quer dizer, o filme tem qualidade, é muito bem filmado, mas ressente-se de uma visão um tanto epidérmica da juventude, de sua relação com as drogas ou com o sexo. No próprio debate foi abordado o tema da juventude, essa geração ultraplugada, que atende pelo nome de “geração T (de testemunha), que posta tudo no twitter ou no Face no momento mesmo que o está vivendo. Aconteceu na sessão do filme no Cine Teatro Guararapes. Acontece o tempo todo. Talvez se pudesse fazer uma relação entre essa sensação opressiva de viver um eterno presente e o uso de drogas, mas não se fez.

Muita coisa fica no ar e, no desfecho, que óbvio não citarei, tudo parece bem arrumadinho demais, todas as pontas são unidas e não se dá um respiro para que o espectador tire suas próprias conclusões. Por isso, por mais que o filme às vezes “ameace” ser bom, acaba não passando de um plano mediano.

Acho que foi pouco pensado.

Girimunho

Duas velhas senhoras se tornam mais próximas quando o marido de uma delas morre. As mulheres interpretam os seus próprios papéis, quer dizer, empenham-se naquilo que no meio cinematográfico costuma se chamar de “autoficção”. Um termo que coloca sério problema para definir fronteiras entre o documentário e a ficção e tem se prestado mais a confusão que esclarecimento. Ao refazerem suas existências diante da câmera, estariam essas senhoras criando vidas novas ou se prestando a uma espécie de relatório etnográfico?

Talvez nada disso mais importe. Eduardo Coutinho, autor de Cabra Marcado para Morrer e Jogo de Cena, dois títulos referenciais do cinema brasileiro, disse que nem podia ouvir mais falar nessa questão. Falso problema, segundo ele. Girimunho retoma tudo isso tomando por título esse termo já de ressonância roseana. Envolve o espectador no torvelinho do mundo das mulheres, sem explicitar o que é documental ou ficção. Inventa-se ou registra-se.?Tudo isso passa em especial pela fala e presença de de Bastú (Maria Sebastiana Alves), viúva de um certo Feliciano, e sua vizinha.

O filme é feito de palavras, mas também sons, silêncio, sombras. Aposta, em sua dimensão poética, no caráter sensorial do cinema, produzindo a imersão na magia sertaneja, numa localidade chamada São Romão, interior de Minas.

Nesse trabalho, os diretores Helvécio Marins e Clarissa Campolina aproximam-se do ar misterioso do conterrâneo ilustre da literatura, Guimarães Rosa, que encontrava na fala sertaneja a elaboração metafísica das grandes questões. Vida, morte, o passar do tempo, o aqui e o além. Problemas sem solução, porém impossíveis de serem evitados pelo pensamento humano, escandem-se poeticamente, não de forma racionalista ou expositiva. É a filosofia que não diz seu nome, mas nem por isso é menos profunda.

Se Girimunho tem problemas de comunicação com o público mais amplo é porque este já está condicionado ao cinema linear e digestivo vendido pela publicidade. O fato de um filme como este e O Homem que Não Dormia estrearem no mesmo dia de um mega blockbuster como Os Vingadores não deixa de ser simbólico e interessante. São o minúsculo contraponto do cinema autoral brasileiro ao tsunami comercial de Hollywood. Tirem suas conclusões.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Traduzir-se:: Ferreira Gullar

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir-se uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?

sábado, 28 de abril de 2012

OPINIÃO DO DIA – Alberto Goldman: Código Florestal

"Sinto-me vexado. O meu partido, o PSDB, se dividiu na votação do Código Florestal na Câmara dos Deputados. Metade votou a favor do relatório que foi aprovado, que não impõe obrigações razoáveis aos desmatadores que não cumpriram a lei. A outra metade, derrotada, votou a favor do relatório do Senado, que não dava aos agricultores uma anistia pelo não cumprimento da lei. Qualquer posição mais clara, menos dúbia, que fosse assumida, seria melhor do que esta divisão. Não temos qualquer comando, qualquer discussão interna que permita à população fazer uma avaliação sobre o que pensamos e o que queremos."

Alberto Goldman, Blog do Goldman, 27 de abril de 2012.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Mortalidade cai, brasileiro volta e a renda sobe
Enquanto isso, no Brasil das CPIs...
Riotur estimula carioca a ficar fora na Rio+20

FOLHA DE S. PAULO
'É para o governador', diz Cachoeira sobre dinheiro
Percurso ao trabalho exige mais de 1 hora para 7 milhões
Senador avisava empresário de operações contra os seus negócios
Indicador ruim da Europa e dos EUA preocupa mercado
Crédito para carros é o menor desde dezembro de 2009

O ESTADO DE S. PAULO
Mortalidade infantil cai 47,5% no País
Em áudio, Demóstenes diz que ‘bate’ em Gurgel
Universidades de SP descartam cota
Ângela Merkel desiste de participar da Rio+20

CORREIO BRAZILIENSE
Cachoeira: STF libera inquérito e esquenta CPI
Censo: Via-crúcis até o trabalho

ESTADO DE MINAS
Conheça os mineiros no século 21
Mortalidade infantil tem uma queda expressiva
Supremo libera inquérito que investiga Demóstenes

ZERO HORA (RS)
A casa dos gaúchos ficou mais prática, moderna e conectada

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Brasil tem forte queda da mortalidade infantil
Alta do IGP-M deve pressionar valor do aluguel
Verba anunciada para construção de barragem

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Enquanto isso, no Brasil das CPIs...

Demóstenes ganhou R$ 3 milhões de Cachoeira

Íntegra do inquérito liberado pelo STF vaza em site antes de chegar ao Congresso

Gravações feitas pela Operação Monte Carlo fortalecem a parceria entre o bicheiro Carlinhos Cachoeira e o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) para favorecer a Delta Construções. Elas indicam, e o procurador-geral Roberto Gurgel corrobora, que Cachoeira teria repassado ao senador R$ 3,1 milhões. Segundo a PF, Demóstenes usou o mandato para impedir a convocação pelo Senado, em 2011, do agora ex-presidente da Delta Fernando Cavendish. Ontem o Supremo Tribunal Federal liberou à CPI a íntegra do inquérito – que vazou em site antes mesmo de chegar ao Congresso.

Cachoeira pagou R$ 3 milhões a Demóstenes

Gravações da Polícia Federal reforçam ainda ligação estreita entre senador e bicheiro para favorecer a Delta Construções

Roberto Maltchik, Jailton de Carvalho, Paulo Celso Pereira e Fernanda Krakovics

BRASÍLIA . Gravações feitas pela Polícia Federal, na Operação Monte Carlo, fortalecem a estreita relação entre o senador Demóstenes Torres e o bicheiro Carlinhos Cachoeira para favorecer a Delta Construções. Segundo a PF, o parlamentar não só recebia dinheiro do contraventor, como usou o mandato para impedir a convocação no Senado do ex-presidente da empresa Fernando Cavendish, em 2011. E se valeu de sua influência para que a empresa fechasse negócios no Centro-Oeste. As gravações também indicam — e o procurador- geral da República, Roberto Gurgel, corrobora — que Cachoeira teria repassado ao parlamentar R$ 3,1 milhões.

A presença de Demóstenes em reuniões de trabalho teria sido indispensável para sacramentar contratos da Delta com o poder público. A construtora chega a disponibilizar um jato para levar o senador de Brasília para Goiânia, onde receberia em seu apartamento o então diretor-executivo da Delta, Carlos Pacheco; o diretor regional da construtora, Cláudio Abreu, e o bicheiro Carlinhos Cachoeira.

— Vê com o Demóstenes se dá pra ele chegar aqui umas três, quatro horas, no máximo, pra gente bater o martelo com o Pacheco no assunto, entendeu? É um assunto com a Foz do Brasil, a Foz do Brasil é empresa da Odebrecht, concessão. Então, nós precisamos falar urgente com Demóstenes, aproveitando que o Pacheco está aqui. Urgente, urgentíssimo — disse Abreu.

Segundo a PF, Demóstenes deu o caminho para impedir a convocação de Cavendish no Senado, após reportagem da "Veja" vinculando o aumento dos contratos entra a Delta e o governo federal à contratação, pela Delta, de consultoria do ex-chefe da Casa Civil, José Dirceu.

A articulação ocorreu em 8 de maio de 2011. Demóstenes tranquiliza Cachoeira, dizendo que Cavendish não pode ser convocado, e manda avisar o empresário que é preciso abafar o caso, rapidamente. O senador prevê que a reportagem será "o grande assunto no Congresso", mas pondera que, no máximo, ele será convidado, com a possibilidade de não comparecer.

— (Tem que) avisar o pessoal que tá todo mundo em cima. E o que vai acontecer? Vão fazer um requerimento. Requerimento é convite. O cara (Fernando Cavendish) pode recusar. (...) Eles (Álvaro Dias e outros senadores de oposição) vão fazer barulho — diz Demóstenes a Cachoeira.

Adiante, Demóstenes dá a senha para abafar o caso: — Talvez, o Fernando se antecipasse soltando uma nota. Dizendo que isso é uma mentira. O grande assunto no Congresso vai ser isso. Explique que o convite não vai ser aprovado, mas o barulho é inevitável.

Cachoeira responde: — Eu vou falar isso com ele (Cavendish ou Abreu). Tá bom? Minutos depois, Cachoeira liga para o ex-superintendente regional da Delta, o Abreu, e repassa as instruções de Demóstenes.

— Fala com o Fernando que o Álvaro Dias vai pedir a convocação dele lá. Tem que botar o mais rápido possível (...) para não alastrar.

Advogado de Demóstenes, Antônio Carlos de Almeida Castro diz que não comenta trechos pinçados e descontextualizados de gravações da PF. Ontem, foi procurado no celular e no escritório, mas não foi encontrado.

Em nota, a Delta informou que "não teve acesso a essas gravações nem todo, nem em parte" e que "tem sido informada de partes editadas e manipuladas de conversas que saem na mídia".

Portanto, não se pronunciará. A empresa diz ainda que "é vítima de vazamentos parciais e descontextualizados de áudios saídos de interceptação telefônica de um inquérito sigiloso".

A cifra atribuída como pagamento total ao parlamentar alcança R$ 3,1 milhões. No pedido de instauração de inquérito no Supremo para investigar Demóstenes, vazado ontem pelo site de notícias "Brasil 247", Gurgel afirma que há indícios da prática dos crimes de corrupção passiva, prevaricação e advocacia administrativa por parte do senador goiano, fruto de seus "estreitos vínculos" com Cachoeira.

Sustenta que a relação de Demóstenes com o bicheiro "é de natureza profissional" e "extrapola os limites éticos exigíveis na atuação parlamentar, adentrando a seara penal". Gurgel afirma, em sua denúncia, que Cachoeira depositou mais de R$ 3 milhões nas contas de Demóstenes.

A autenticidade dos documentos vazados pelo site não foi contestada pelo STF nem pela Procuradoria Geral da República.

"Constatou-se que o Senador Demóstenes Torres mantém estreitos vínculos com Carlos Cachoeira, de natureza pessoal e, também, de natureza profissional.

Os contatos telefônicos entre eles são praticamente diários, sucedidos, muitos deles, de encontros para tratar de assuntos que não poderiam ser conversados por telefone", afirmou Gurgel no documento.

Sobre os repasses de Cachoeira para Demóstenes, o procurador- geral escreveu: "Em diálogo no dia 22 de março de 2011, às 11:18:00, entre Carlos Cachoeira e Cláudio Abreu, não degravado pela autoridade policial, é expressamente referido que o valor de um milhão foi depositado na conta do Senador Demóstenes e que o valor total repassado para o Parlamentar foi de R$ 3.100.000,00 ".

A assessoria de Gurgel informou que ele está no Chile e que não teria como confirmar a veracidade do documento vazado.

Em diálogo de 16 de março de 2011, Demóstenes revela que obedece a Cachoeira: — Você dá a orientação aqui e obedeço — diz.

Colaborou André de Souza

FONTE: O GLOBO

A marca de Cachoeira em contratos públicos

Empresas que têm ligação com o bicheiro ganharam negócios de R$ 2,2 milhões com o governo federal e prefeitura do Rio

Fábio Vasconcellos

Empresas ligadas ao bicheiro Carlinhos Cachoeira, preso pela Polícia Federal na Operação Monte Carlo, ganharam contratos de cerca de R$ 2,2 milhões em órgãos do governo federal e da prefeitura do Rio. Os valores se referem a pagamentos por prestação de serviços na área de segurança patrimonial e à venda de medicamentos.

A Ideal Segurança Ltda. que, segundo a PF, pertence ao delegado federal Deuselino Valadares e aos sócios ocultos Cachoeira e Cláudio Abreu — ex-diretor da Delta Construções — recebeu R$ 480 mil do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia Goiano e do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro).

Os valores começaram a ser pagos em 2010 (R$ 69 mil). No ano seguinte, chegaram a R$ 367 mil. Este ano, o Instituto de Educação foi responsável por praticamente todos os repasses (R$ 43 mil). A Ideal foi chamada para fazer a segurança do prédio da reitoria do instituto.

Empresas venceram pregão, afirmam órgãos

No relatório da Operação Monte Carlo, a PF descobriu que a Ideal foi comprada em fevereiro de 2011 por Deuselino Valadares. Nas interceptações telefônicas, a PF encontrou indícios de que Cachoeira e Cláudio Abreu seriam também donos da Ideal. Numa das interceptações telefônicas, Gleyb Cruz, um dos integrantes do grupo, revelou os percentuais de participação de Cachoeira e Cláudio na empresa. Há ainda transferências de dinheiro feitas pela Alberto e Pantoja Construções para a Ideal. A Alberto Pantoja, segundo a PF, está em nome de "laranjas" e seria usada pela organização para encobrir movimentações financeiras de Cachoeira e seu grupo. A Delta Construções, da qual Cláudio era diretor, realizou transferências para a Alberto Pantoja entre 2010 e 2011.

Outra empresa ligada a Cachoeira é a Vitapan Indústria Farmacêutica.

Em documentos obtidos pela Operação Monte Carlo, a empresa do bicheiro foi vendida para outros dois sócios, em 2005, entre eles sua ex-mulher, Andréa Aprígio de Souza. O negócio chamou a atenção porque até aquela data a Andréa não apresentava rendimento ou qualquer bem em seu nome e, a parti daí, passou a receber salário da Vitapan, apesar de constar como sócia da empresa.

A Vitapan vendeu medicamentos para a Fundação Oswaldo Cruz, no Rio. Entre 2009 e 2012, cerca de R$ 163 mil foram pagos à empresa. Na prefeitura, a Secretaria municipal de Saúde pagou R$ 1,6 milhão à Vitapan de 2009 até hoje. O maior desembolso correu em 2011 (R$ 1 milhão).

O Serpro, a Fiocruz e a Secretaria de Saúde do Rio informaram que as empresas foram contratadas após venceram pregão eletrônico. De acordo com o Serpro, a Ideal fazia a segurança do posto do órgão em Goiânia até o ano passado, quando o contrato foi encerrado. Já Secretaria de Saúde explicou que os pagamentos à Vitapan se referem à compra de medicamentos e que o produto tem sido entregue. A Fiocruz, por sua vez, disse que comprou da Vitapan 5,7 milhões de comprimidos para tratamento cardíaco e um anti-inflamatório que foram distribuídos para a Farmácia Popular.

FONTE: O GLOBO

Confraternização em Paris

Fotos publicadas no blog de Garotinho mostram Cavendish, Cabral e secretários estaduais

Fotos publicadas ontem no blog do ex-governador e deputado federal (PR-RJ) Anthony Garotinho mostram o governador Sérgio Cabral (PMDB) e os secretários Wilson Carlos (Governo) e Sérgio Côrtes (Saúde) numa viagem a Paris, feita em 2009, na companhia de Fernando Cavendish. Até semana passada, o empresário, que é amigo de Cabral, estava à frente da Delta Construções, envolvida no escândalo envolvendo Carlinhos Cachoeira e que recebeu R$ 1,4 bilhão em contratos com o estado.

Numa das imagens, Wilson Carlos e Sérgio Côrtes dançam abraçados com Cavendish.

O clima de comemoração era tanto que o grupo usou lenços amarrados na cabeça.

Em outra sequência, Cabral é visto sorridente posando para fotos ao lado de Cavendish que, agachado, parece brincar com a situação. Na mesma foto, está o atual conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) Aloysio Neves, um dos responsáveis por fiscalizar os contratos do governo com as empresas. Ele foi nomeado para o TCE em abril de 2010.

Uma terceira foto mostra os secretários de Transporte, Júlio Lopes, e da Casa Civil, Régis Fichtner, abraçados com Cavendish.

O chefe da Casa Civil é o responsável pela auditoria anunciada pelo governo nos contratos assinados com a Delta. A medida foi tomada após vir à tona as relações da empresa com o bicheiro Carlinhos Cachoeira.

Em nota, o governo informou ontem que o governador foi a Paris para lançar o Guia Verde Michelin Rio, na embaixada do Brasil. Na ocasião, segundo a nota, Cabral foi condecorado pelo governo francês.

Segundo o comunicado, após o evento, o "barão francês Gerard de Waldner — casado com a brasileira Sílvia Amélia de Waldner —, chamou ao Clube Inglês convidados dele em homenagem ao governador e à condecoração recebida".

Sobre a foto de Fichtner e Cavendish, o governo disse que "não mistura questões privadas com públicas. As análises de governo seguem critérios técnicos".

FONTE: O GLOBO

Alvo da CPI, Delta deve manter obras federais

Empresa pode ser declarada inidônea e ficar proibida de firmar contratos com o governo, mas pode continuar tocando projetos que já começaram

Lu Aiko Otta

BRASÍLIA - Mesmo envolvida no turblhão da CPI do Cachoeira, a construtora Delta deverá seguir prestando serviços ao governo federal, pelo menos por algum tempo. Flagrada em uma série de irregularidades pela Controladoria-Geral da União (CGU), a empresa é alvo de um processo administrativo no qual pode ser declarada inidônea e ficar, por isso, proibida de firmar novos contratos com o governo federal. Mas os que estão em andamento poderão ser mantidos. Principal parceira do governo na execução das obras do Programa de Aceleração do Crescimen-to (PAC), a Delta tem, assim, chances de escapar viva das investigações. “ Pode sair uma pizza”, disse o coordenador da ONG Contas Abertas, Gil Castelo Branco. “O governo pode paralisar só em parte as obras que tiverem problema e colocar a CGU para vigiar.”


Desde o início do escândalo, a Delta já anunciou sua saída de duas obras no Rio, o Maracanã e a Transcarioca. Mas nada ocorreu em relação às federais. Pelo contrário, a empresa divulgou comunicado no qual afirma que “continuará a cumprir os contratos, obrigações e compromissos assumidos com fornecedores e clientes, com a habitual regularidade”. A pressa do governo em executar as obras do PAC e aquelas relacionadas com a Copa poderão jogar a favor da empresa.

Decisão

Segundo informou a CGU, caso a Delta seja declarada inidônea – algo que não tem prazo para ocorrer, pois o processo administrativo admite ampla defesa – as obras em andamento serão analisadas uma a uma para o governo decidir se é o caso de suspender os serviços ou não. As que estão em estágio mais avançado poderão continuar a cargo da Delta, pois pode ser mais caro, além de demorado, entregar o serviço a outra empreiteira. A praxe, quando o governo rompe o contrato com uma prestadora de serviço, é chamar a segunda colocada no processo licitatório. Porém, existe o risco de ela não aceitar concluir a obra, pelo fato de o preço estar defasado. Fazer uma nova licitação levaria tempo e aumentaria o gasto. Já existe uma rotina no tratamento de irregularidades. Quando é detectado um pagamento indevido, a CGU recomenda que o valor pago a mais seja descontado de pagamentos posteriores, já que as construtoras normalmente recebem por etapas. Mas, mesmo que a Delta seja declarada inidônea, seus donos não ficarão impedidos de fazer negócios com o governo. Já existe, no entanto, um projeto de lei na Câmara que pretende fechar essa brecha na legislação. Nesta semana, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, descartou atrasos no PAC por causa da CPI. Ela assegurou que as licitações para novas obras seguirão o ritmo normal. Para Gil Castelo Branco, a CPI deve interferir no andamento das obras.

Compensação

Embora tenha saído de duas obras no Rio, a Delta ainda não abandonou obras federais. O que pesa a favor da empreiteira é a pressa do governo com as obras do PAC, da Copa e da Olimpíada.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

STF autoriza cópias de inquérito sobre Demóstenes

Ricardo Lewandowski liberou que Conselho de Ética da Câmara e Comissão do Senado peguem cópias do documento, porém ressaltou que o segredo deve ser mantido

Mariângela Gallucci

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou ontem a CPI mista do Cachoeira, o Conselho de Ética e Decoro do Senado e a Comissão de Sindicância da Câmara a extraírem cópias integrais do inquérito 3430, que tramita no STF, para investigar as ligações do senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) com o empresário do ramo de jogos Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.

Lewandowski fez questão de deixar claro que as informações existentes no inquérito são sigilosas e que o segredo deve ser mantido, especialmente em relação às interceptações telefônicas. Também nesta semana, o ministro autorizou a abertura de inquéritos no STF contra os deputados Sandes Júnior (PP-GO), Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO) e Stepan Nercessian (PPS-RJ), também para apurar suspeitas de ligações com Cachoeira.

Em sua decisão, o ministro citou uma lei de 1996 que regulamentou as interceptações telefônicas. Essa norma estabelece que é crime quebrar segredo de Justiça sem autorização judicial. A pena prevista para quem descumprir a regra é de 2 a 4 anos de reclusão e pagamento de multa.

Para autorizar a extração de cópias do inquérito, Ricardo Lewandowski teve como base decisões anteriores do STF que garantiram a CPIs e comissões do Congresso acesso a investigações em tramitação perante o Supremo.

Além do compartilhamento de informações com os órgãos da Câmara e do Senado, Lewandowski decidiu nesta semana abrir três inquéritos contra os deputados Carlos Leréia, Sandes Júnior e Stepan Nercessian (PPS-RJ) para também apurar suspeitas de ligação com Cachoeira.

O ministro também autorizou o desmembramento do inquérito aberto contra Demóstenes Torres para que sejam separadas as partes da investigação relacionadas ao governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, já manifestou a intenção de pedir ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) que abra um inquérito para investigar Agnelo.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

CPI quer começar por Gurgel

Senadores e deputados pretendem ouvir primeiro o procurador-geral da República antes de convocar políticos e empresários

Júnia Gama

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, será a primeira autoridade a prestar depoimento na CPI mista que irá investigar as relações do bicheiro Carlos Cachoeira com políticos e empresas públicas e privadas. Assim como o suposto consenso em torno da abertura da CPI, tanto a base aliada quanto a oposição enxergam em Gurgel um elemento menos explosivo para ambos. Ao sentar-se na cadeira de depoente, porém, o procurador-geral da República será o centro do cabo de guerra político travado entre oposicionistas e governistas.

O discurso oficial é de que é preciso obter informações sobre as operações Vegas e Monte Carlo, da Polícia Federal, que culminaram na prisão de Cachoeira. A base aliada, entretanto, pedirá explicações a Gurgel por ter levado cerca de quatro anos para pedir abertura de inquérito contra o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO). "Ele apresenta muito mais risco para a base aliada, sobretudo porque Demóstenes, da oposição, já está sangrando. Quem garante que as declarações do PGR não vão obrigar a investigação a escolher o Palácio do Planalto como seu norte?", avaliou um líder governista.

Petistas também pretendem questionar Gurgel sobras as razões que o levaram a não pedir abertura de inquérito contra o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB). "O Perillo pediu para ser investigado, o Gurgel não se antecipou. Isso só piora a situação dele na CPI", apontou um petista que integra a comissão.

Arquivamento

Independentemente da forma, há um entendimento geral de que Gurgel deve prestar depoimento. Outro esclarecimento que petistas pretendem pedir diz respeito ao reatamento de relações com Demóstenes, em meados do ano passado. O senador havia, em junho de 2011, criticado duramente Gurgel por ter arquivado uma representação assinada pelo parlamentares contra o ex-ministro da Casa Civil Antonio Palocci. Na ocasião, o senador afirmou à imprensa que Gurgel se "acovardou" e o acusou de ter tomado a decisão para facilitar sua recondução ao cargo de procurador-geral, já que seu mandato expirava no mês seguinte.

Mais um fato pode ser negativo para Gurgel: no início de maio do ano passado, ele recebeu em seu gabinete Demóstenes e o irmão, Benedito Torres, que trabalharam pela indicação de Tito Amaral para o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). O encontro, confirmado pela Procuradoria-Geral da República, teve êxito e Tito recebeu a indicação de Gurgel. Na semana passada, o Correio mostrou que Tito foi assessor de Demóstenes na Procuradoria-Geral de Justiça de Goiás, na Secretaria de Segurança Pública do estado e se instalou no gabinete do senador de terça a quinta-feira durante nove anos, quando foi designado pelo MP goiano para acompanhar trabalhos de interesse do órgão. Na manhã da próxima quarta-feira, o presidente da CPI, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), e o relator da comissão, deputado Odair Cunha (PT-MG), irão visitar Gurgel para convidá-lo a ir à CPI.

160

Total de requerimentos apresentados na primeira reunião da CPI do Cachoeira, na última quarta-feira. A maior parte se refere a depoimentos de autoridades

Colaborou Gabriel Mascarenhas

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Receita da Delta somou R$ 9,6 bi entre 2004 e 2010

Rubens Valente

BRASÍLIA - Os primeiros documentos entregues à CPI do Cachoeira, um conjunto de demonstrações contábeis da Delta Construções S/A, indicam que a empreiteira registrou receita bruta de R$ 9,6 bilhões entre 2004 e 2010.

O site Contas Abertas divulgou há duas semanas que a Delta recebeu R$ 4 bilhões do governo federal desde 2001. Os números globais da empresa, entregues pela Delta à CPI, incluem clientes privados e públicos, como governos estaduais, cujas contas não integram a pesquisa do Contas Abertas.

A receita bruta anual da Delta triplicou entre 2004 e 2010, passando de R$ 724 milhões, em valores atualizados, para R$ 3 bilhões.

O lucro líquido passou de R$ 100 milhões em 2004, em valores atualizados, para R$ 220 milhões, em 2010. A Delta informou ontem que "o crescimento do faturamento da Delta Construção acompanha o crescimento da indústria da construção civil".

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Inquérito vaza antes mesmo de liberado pelo STF

Lewandowski alertara para sigilo, mas íntegra surgiu em site sem que tivesse chegado ao Congresso

Carolina Brígido, Maria Lima e Isabel Braga

BRASÍLIA. O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), liberou ontem à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do caso Cachoeira cópia integral do inquérito que tramita sob segredo de Justiça na Corte para investigar a ligação entre o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) e outros políticos com o bicheiro Carlinhos Cachoeira.

Apesar da sua ressalva sobre a necessidade de se manter o sigilo das informações, integrantes da CPI afirmaram que não podiam assumir essa responsabilidade, já que mais de uma centena de parlamentares poderá ter acesso aos dados. Mas antes que a documentação chegasse ao Congresso, a íntegra do inquérito foi publicada pelo site "Brasil 247". O STF decidiu que vai acionar a Polícia Federal e o Ministério Público federal para descobrir como ocorreu o vazamento.

Pela determinação do STF, além dos integrantes da CPI (64 parlamentares entre titulares e suplentes), os integrantes do Conselho de Ética do Senado poderiam ter acesso à parte dos documentos relativos ao caso Demóstenes.

Da mesma forma que a Comissão de Sindicância da Câmara aos dados sobre os deputados citados no inquérito.

Os autos que estão no Supremo têm mais de 2 mil páginas, divididas em mais de 20 volumes, com apensos e DVDs. Há pelo menos 19 escutas anexas no processo, nem todas degravadas.

Os arquivos serão entregues ao presidente da CPI, senador Vital do Rego (PMDB-PB), que não estava ontem em Brasília, dentro de 48 horas, a partir de ontem.

— O Supremo atendeu a necessidade do momento, não perdemos nenhum dia útil. Na segunda-feira, vamos resolver a estrutura da CPI — disse Vital, por telefone.

Integrante da CPI, o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) afirma que ser responsável pelo sigilo não significa não divulgá-lo de nenhuma maneira, mas tratá-lo na forma da lei. Segundo ele, a lei sobre sigilo legal diz que o segredo se impõe no interesse da investigação pública e na preservação da intimidade, mas não pode servir para proteger o crime e o criminoso.

— A expressão vazamento pode deixar a impressão de leviandade.

Mas estou falando de publicidade e transparência que são devidas à opinião pública. O segredo se impõe no interesse da investigação pública e na preservação da intimidade, mas não protege nem o crime e nem o criminoso. Às vezes, a revelação de um documento permite o aparecimento de novos documentos.

Em outras CPIs, isso já ocorreu — afirmou o pedetista.

Miro lembra ainda que já há jurisprudência dos tribunais superiores de que segredo de Justiça não pode existir para proteger o crime e os criminosos, e sim para proteger as investigações e o interesse público: — Neste caso o que estamos investigando é uma organização criminosa, e não cabe sigilo. O que for de interesse de divulgação que facilite a investigação, aliás, deve ser estimulado. Foi assim que apareceu o motorista Eriberto na CPI do PC Farias. É a chamada ponta do novelo.

Em São Paulo, as principais lideranças do PSDB afinaram o discurso em defesa da apuração do suposto envolvimento do governador de Goiás, Marconi Perillo, com Cachoeira. Os dirigentes tucanos pregaram que todos os envolvidos com o contraventor devem estar à disposição da CPMI.

O governador tucano, cuja presença era esperada, não compareceu a evento do PSDB. O presidente do partido, Sérgio Guerra, defendeu uma apuração total, no âmbito da CPMI, e afirmou que aqueles que cometeram irregularidades, não ficarão na legenda.

— No PSDB, quem estiver envolvido nisso, quem tiver contas a pagar vai embora, não fica conosco, não tenho a menor dúvida disso. Nós não vamos prejulgar, não vamos condenar ninguém antecipadamente, mas, se um de nós impedir investigação, não é do partido e vai estar fora — afirmou o dirigente tucano.

O senador Aécio Neves (MG) pregou a apuração das recentes denúncias e defendeu a presença dos acusados na CPMI: — O próprio governador de Goiás se colocou à disposição para essa apuração. O que nós não permitiremos é que a CPMI seja instrumento de luta política, da base do governo contra a oposição.

FONTE: O GLOBO

STF debaterá julgamento do mensalão

BRASÍLIA. O ministro Joaquim Barbosa, relator do processo do mensalão, pautou para quartafeira, no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), uma questão de ordem para que os ministros resolvam detalhes sobre o julgamento do processo, que ainda não tem data marcada.

Há chance de serem definidos, por exemplo, os horários das sessões e os dias da semana em que o tribunal funcionará durante o julgamento.

A expectativa é que o julgamento consuma cerca de um mês. Para ser marcado, o revisor do caso, ministro Ricardo Lewandowski, precisa entregar seu voto. Se ele fizer isso até o fim de maio, o processo poderá ir a plenário ainda neste semestre. Caso ele demore mais, o julgamento ficará para agosto.

São 38 réus.

Cada advogado terá uma hora para falar. Em seguida, o procurador-geral Roberto Gurgel vai se manifestar. Depois, Barbosa.

O voto terá 500 páginas e será dividido em capítulos, dedicados aos políticos, ao núcleo financeiro e aos publicitários.

FONTE: O GLOBO

Lei Florestal desagrada pequenos produtores

Kelly Matos

BRASÍLIA - O presidente da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), Alberto Broch, afirmou ontem em audiência com a presidente Dilma que o novo Código Florestal, aprovado pela Câmara na quarta-feira, desagradou os trabalhadores da agricultura familiar.

A principal crítica é em relação à ausência de uma diferenciação entre pequenos e grandes produtores.

"Um agricultor que tem cinco hectares, que tem um riozinho que passa lá, terá a mesma legislação que alguém que tem 10 milhões de hectares", afirmou Broch.

Ele disse que pediu à presidente que observe a possibilidade de estabelecer um tratamento diferenciado para os pequenos produtores. No entanto, Dilma não confirmou se vetará o novo Código Florestal.

"Ela não falou [que vai vetar]. Ela falou que vai estudar o caso", contou Broch.

Durante a reunião, representantes da Contag entregaram à presidente a pauta de reivindicações da edição deste ano do Grito da Terra, mobilização de trabalhadores rurais que ocorrerá no dia 30 de maio, em Brasília.

O documento traz 141 itens, que incluem, por exemplo, questões relacionadas à reforma agrária, à agricultura familiar e a políticas sociais para os trabalhadores.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

PSDB acusa governo de direcionar CPI

Congresso sindical do PSDB é marcado por críticas do partido ao PT e ao governo federal, acusados de utilizarem a CPI instalada no Congresso contra a oposição

Daniela Lima

SÃO PAULO – O primeiro congresso sindical do PSDB em São Paulo foi palco para os principais líderes do partido atacarem o governo federal e defenderem tucanos envolvidos em acusações de envolvimento com o empresário Carlos Cachoeira. No evento, realizado com apoio de empresários e grandes construtoras, os tucanos criticaram o que chamaram de aparelhamento dos sindicatos e conclamaram os trabalhadores a protestar contra a desindustrialização do País.

Em seu discurso, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), cotado para disputar a Presidência da República em 2014, citou a presidente Dilma Rousseff e disse que há um ufanismo desenfreado sobre seu desempenho. “Há um ufanismo desenfreado com os índices de aprovação da presidente Dilma. Mas se aprofundarmos os dados, veremos que 60% da população está insatisfeita com a saúde”, disse.

Em outra frente, líderes do partido defenderam o andamento das investigações envolvendo o empresário Carlos Cachoeira, acusado de explorar o jogo ilegal e manter uma rede de influência com empresários e políticos, mas acusaram o governo de estar direcionando o escândalo para a oposição. “Sou a favor da CPI, desde que ela não esteja a favor de uma maioria”, afirmou o presidente nacional do PSDB, deputado federal Sérgio Guerra (PE). “Na última semana só saíram vazamentos contra nós. O PT quer segurar o governador deles, de Brasília, Agnelo (Queiroz), que já está na forca, falando de Goiás e de Minas”, disse Guerra. Escutas feitas pela Polícia Federal indicaram o envolvimento de Cachoeira com o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), e a nomeação de uma prima do contraventor no governo de Minas, quando o hoje senador Aécio Neves (PSDB-MG) era governador do Estado.

A edição de ontem da Folha de S.Paulo mostrou que Cachoeira mantinha contatos com um diretor da empreiteira Delta em São Paulo. “O próprio Marconi se colocou à disposição da investigação, foi o primeiro a propor ir depor na CPI. Agora, pede ao procurador-geral da República que o investigue. Ele vai sair desse episódio como entrou: absolutamente seguro”, disse Sérgio Guerra.

O governador Geraldo Alckmin também defendeu as investigações. “Os contratos da Delta em São Paulo, a maioria, já foi concluída. Mas investigar é sempre bom”, disse.

Durante o evento, Alckmin e Guerra enalteceram a candidatura do ex-governador José Serra à Prefeitura de São Paulo. Serra, ao discursar, mesclou temas nacionais com os do cotidiano nas cidades e pediu que os sindicalistas filiados ao PSDB se mobilizem para a eleição municipal. “O futuro começa agora, afirmou. Proponho que o núcleo sindical faça propostas para as cidades, para que possamos montar a plataforma tucana para 2012”, disse.

O congresso também evidenciou o desconforto de Serra com relação a Aécio. Ontem, a Folha de S.Paulo publicou entrevista na qual o senador diz que, mesmo se for eleito prefeito, Serra pode deixar o cargo para disputar a Presidência em 2014. A declaração vai na contramão da estratégia de Serra, que tenta afastar de todo modo especulações sobre o abandono da prefeitura.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Serra pede apoio de sindicatos já em 2012

PSDB lança núcleo para se aproximar de trabalhadores e movimentos sociais e fortalecer mobilização nas eleições municipal, estadual e federa

Bruno Boghossian

Ao realizar ontem o primeiro congresso sindical do PSDB, líderes tucanos atacaram a relação do PT com os sindicatos e apresentaram aos trabalhadores os benefícios da política econômica do governo Fernando Henrique Cardoso. A aproximação com as entidades de classe em ano eleitoral é uma tentativa do partido de criar um grupo mobilizado para a disputa deste ano e de 2014 e aproximar a sigla dos movimentos sociais. Pré-candidato à Prefeitura de São Paulo, o ex-governador José Serra (SP) pediu o apoio dos sindicatos. “Temos nossa primeira tarefa: mobilizar nossos sindicalistas para a campanha eleitoral deste ano.” Em 2014, o novo núcleo quer eleger um deputado estadual e um federal por Estado.

Diante de uma plateia de sindicalistas que se esvaziou ao longo do dia, o presidente do partido, Sérgio Guerra, o governador Geraldo Alckmin (SP), Serra e o se-nador Aécio Neves (MG) afirmaram que a relação da sigla com sindicalistas e trabalhadores “não é uma novidade”. Alckmin chegou a iniciar seu discurso com o bordão “companheiros e companheiras”, marca do PT e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “O PSDB é um partido que dá prevalência ao trabalho sobre o capital. Foi importante para os trabalhadores com o Plano Real e com a estabilização da moeda”, disse. A festa custou cerca de R$ 800 mil ao partido. O presidente do núcleo sindical do PSDB, Antônio de Sousa Ramalho, chegou a pedir doações para construtoras, mas diz não ter recebido nada. A sigla pagou transporte aos presentes na plateia, que incluía tucanos sem relação com entidades trabalhistas. O público foi engrossado pela Força Sindical, a quem Ramalho é ligado. O presidente da central, Paulinho da Força (PDT), sentou-se na primeira fileira do palanque. “A Força é pluralista, não pode ser ligada a um único partido”, disse. Organizadores afirmavam
que havia representantes da Central Única dos Trabalhadores (CUT) no evento, grupo tradicionalmente ligado ao PT. Os tucanos não quiseram identificá-los, pois eles “temiam represálias”.

Popstar. Possível candidato à Presidência em 2014, Aécio aproveitou o discurso para atacar o governo Dilma Rousseff. “Não queremos sindicatos a serviço de um partido político, como acontece na relação da CUT com o PT”, afirmou. Depois, no palco, distribuiu autógrafos em camisetas atiradas a ele – principalmente das mulheres da plateia. Adversários dentro do PSDB, Aécio e Serra nem se olharam nos cinco minutos em que estiveram lado a lado. Depois que Aécio discursou, Serra foi o último a se levantar para aplaudi-lo.

Chalita pede que tucano o respeite

O deputado federal e pré-candidato do PMDB a prefeito de São Paulo, Gabriel Chalita, pediu ontem ao pré-candidato José Serra (PSDB) “respeito e maturidade” na campanha eleitoral. Chalita afirmou que Serra é um desafeto seu e que, por isso, nem sequer o cumprimenta.

“Espero que ele (Serra) não faça ataques pessoais. Na campanha presidencial aconteceu. Não foi bom para ele, não foi bom para o Brasil. A crítica tem de ser olho no olho e não usar mídias sociais, línguas de aluguel.”

O peemedebista propôs a Serra um pacto de não agressão, como o que fez com o pré-candidato Fernando Haddad (PT). “Não vou fazer nenhum ataque a ele, por- que não é da minha índole e do meu estilo de fazer política”, avisou Chalita, antes de dizer que o tucano só quer ser presidente da República. Em nota, a assessoria de Serra disse que ele conduzirá a disputa eleitoral “com correção e elegância, como sempre fez”.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Jarbas: 'Não temos acordo para a eleição'

Falando sobre sua reaproximação de Eduardo, senador diz que pretende pacificar o ambiente político no Estado e nega que exista conversa sobre 2012 e 2014

Débora Duque

Embora tenha procurado se manter longe das discussões políticas locais, o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB) quebrou, ontem, o silêncio. Em entrevista à Rádio Folha, o peemedebista tratou não só das eleições municipais como de seu rompimento com o presidente nacional do PSDB, Sérgio Guerra. Falou, ainda, de sua recente aproximação com o governador Eduardo Campos (PSB). Ele fez questão de frisar que o distensionamento da relação entre os dois nada tem a ver com projetos eleitorais, repetindo o discurso de que os gestos têm como objetivo pacificar o ambiente político do Estado para as “novas gerações”.

“O que fiz, com absoluta consciência e sem estar fazendo espalhafato disso, foi tentar distensionar os fatos no sentido de manter uma relação de cordialidade com que aquele que me derrotou há quase dois anos. Há toda uma geração aí atrás de mim e é preciso respirar dentro do Estado, o que estava quase impraticável. Mas não temos nenhum acordo para a eleição que vai se dar agora e, sobre 2014, também não existe nenhum entendimento. Se houvesse, já teria dito”, afirmou, sem citar o nome do atual governador.

Como, até então, não costumava fazer, Jarbas também respondeu às provocações daquele que se tornou seu maior desafeto político no Estado: Sérgio Guerra. Os dois romperam na campanha de 2010, quando o senador acusou o tucano de não ter se empenhado na sua eleição para governador. Há dois dias, Guerra concedeu entrevista à mesma emissora e, ao comentar sobre as chances de uma reconciliação, disse que sua relação com Jarbas não tem mais “nem ida nem volta”. A resposta do peemedebista, ontem, foi igualmente irônica: “A melhor coisa que poderia me acontecer numa sexta-feira foi ele dar essa declaração, dizendo que ele reconhece o óbvio. Coisa que ele deveria ter reconhecido há muito tempo. Para mim, foi uma beleza”, alfinetou, enterrando a possibilidade de uma reaproximação.

Em relação à situação das oposições no pleito municipal, o senador reiterou seu apoio ao correligionário Raul Henry (PMDB), mas enfatizou que, caso ele não vá para o segundo turno, apoiará qualquer um dos candidatos do grupo, inclusive, o deputado estadual Daniel Coelho (PSDB). “Raul teve algumas dúvidas, estava querendo remover alguns obstáculos, mas conseguiu alcançar seus objetivos. Ele é candidato e vou apoiá-lo”, disse. O senador ainda fez críticas ao PT. “O PT está completamente enrolado. Uma coisa nessa eleição que tem que ser explicada a fundo é essa briga dos dois Joões. Por que brigaram no começo do governo? Isso tem que ser explicado ao povo”, disparou.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)