domingo, 16 de agosto de 2015

Ferreira Gullar - Beco sem saída

- Folha de S. Paulo / Ilustrada

• Lula e Dilma tanto sabem que as acusações contra Dirceu procedem, que não vieram a público defendê-lo

A primeira semana deste mês veio confirmar o ditado segundo o qual agosto é o mês do desgosto. Que o digam os petistas, a começar por José Dirceu, por Dilma e por Lula, que efetivamente não estão vivendo o melhor agosto de sua vida.

Sem exagero, tendo a acreditar que, em meio a tantos percalços, esta nova prisão de José Dirceu –e, sobretudo, as denúncias que a motivaram– foi um baque do qual, até agora, o petismo, em seus diferentes níveis, ainda não conseguiu se recuperar. E, creio eu, dificilmente o conseguirá.

É que José Dirceu, depois de Lula, é a figura mais importante do Partido dos Trabalhadores, como comprova a sua história política. Pois bem, as acusações vêm confirmar não apenas sua atuação decisiva no esquema de propinas vultuosas em favor do PT como em seu próprio benefício.

E não se trata de qualquer dinheiro, mas de milhões de reais. Com essa grana, comprou apartamento para a filha, adquiriu e mandou reformar imóveis de luxo.

Para a perplexidade da nação, ficou-se sabendo que, mesmo depois de preso em consequência do mensalão, continuou, de dentro da prisão, a administrar o recebimento e aplicação das propinas milionárias. Isso indica que ele não estava levando a sério a ação da justiça e que achava que logo, logo, estaria livre e impune.

Calculou mal, claro, mas não é isso que impressiona, e sim que aquele líder revolucionário, que enfrentou a ditadura militar e se dedicou à luta pelo socialismo, aliado de Fidel, tornou-se um corrupto, ladrão do dinheiro público.

Não surpreende a ninguém que ele se diga inocente. Mas Lula, Dilma e a direção do PT sabem muito bem que as acusações são procedentes e, tanto o sabem, que não vieram a público defendê-lo, como o fizeram no caso do mensalão. Muito pelo contrário, a direção do PT fugiu da imprensa e se reuniu secretamente para discutir o abacaxi e ver que decisão tomar.

Foi uma longa discussão. Se no mensalão ainda se sentiam à vontade para apresentá-lo como vítima de calúnias, precisamente pelo que significava como líder do PT, desta vez não se atreveram a tanto; pior ainda, sequer mencionaram-lhe o nome na nota que, por força das circunstâncias, tiveram de redigir e entregar à imprensa.

Não diria que, por essa omissão, tenha a nota causado surpresa, já que todos sabíamos o quanto seria difícil para a direção do partido pronunciar-se sobre essa nova prisão de José Dirceu, em face das graves acusações, que sabia verdadeiras. A nota do PT, de fato, cumpre uma única função: dar a entender que o partido nada tem a ver com as falcatruas de seu ex-presidente e um de seus líderes mais importantes.

Ela não causou espanto, mas pegou mal. Como pegou mal o silêncio de Lula sobre a prisão e as acusações sofridas por seu companheiro de vida política e partidária, seu braço direito quando exercia a função de presidente da República, na condição de ministro da Casa Civil.

Que pode significar esse silêncio da parte de Lula, senão o propósito de evitar que a desgraça do companheiro o contamine?

Dilma tampouco tocou no assunto. É como se nada houvesse acontecido, embora ela seja presidente, chefe de um governo do mesmo partido a que pertence José Dirceu. Como ela se diz inimiga da corrupção, poderia até, quem sabe, pedir que o expulsem do PT. Mas a coerência não é o seu forte.

De qualquer modo, ignorar o que acontece com José Dirceu, se é lamentável, era previsível, uma vez que, a cada dia, o cerco aperta em consequência de novas delações –e o desprestígio do governo atinge índices assustadores.

Isso com apenas sete meses da nova gestão. E sem perspectiva de melhorar, uma vez que a situação econômica se agrava e o governo perde o apoio de seus próprios aliados, que começam a abandonar o barco, mesmo porque novos acusados aderem à delação premiada, como é o caso de Renato Duque, homem de ligação do PT com o esquema de propinas de Petrobras.

Acredita-se que ele trará à Lava Jato informações só comparáveis às trazidas por Paulo Roberto Costa, e envolvendo diretamente os governos petistas e seu partido. Se se soma isso à ampla rejeição popular ao governo Dilma, pode-se admitir que a história do PT, como partido governante, parece chegar ao fim.
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Ferreira Gullar é ensaísta, crítico de arte e poeta

Murillo de Aragão - O recado das ruas

- O Globo

• Rejeição ao governo pegou em cheio eleitores e não eleitores de Dilma

As manifestações estão de volta. Hoje, haverá manifestação contra o governo em várias cidades. Será a terceira do ano. expectativa é de que a adesão seja similar ou maior do que em março, quando cerca de dois milhões foram às ruas. Naquele mês, segundo o Datafolha, 13% consideravam o governo ótimo ou bom. Hoje, são apenas 8%. A avaliação ruim/péssimo passou de 62% para 71% no mesmo período.

Outro fator que pode contribuir para incrementar o número de pessoas nas ruas é a recente prisão do ex-ministro José Dirceu por suposto envolvimento no escândalo da Petrobras. Como contraponto às manifestações de hoje, no dia 20 movimentos sociais ligados ao PT e ao governo farão protestos em São Paulo.

Nessa etapa das manifestações, no segundo mandato de Dilma Rousseff, elas têm ocorrido dentro da normalidade, com pouquíssimos incidentes. A maioria das expressões está dentro da normalidade democrática. Apenas uns e outros pregam a volta dos militares, numa espécie de delírio nostálgico, mas poucos dão curso a tais delírios.

Até agora, mesmo em meio a uma tempestade perfeita que inclui crises de natureza variada, as instituições democráticas estão funcionando a contento, e tudo tende a se constituir um verdadeiro e necessário exercício de cidadania.

Evidente que, ao escrever ex ante, corro riscos. A análise da conjuntura política trabalha com uma métrica elástica. Não é possível testar hipóteses para apontar um resultado concreto. Vale lembrar o velho ditado: “Aquele que prevê o futuro erra mesmo quando acerta”. Porém — e sempre existe um porém —, a partir de nossa visão analítica, é possível avaliar os principais vetores e concluir que as manifestações tendem a ocorrer de forma pacífica, todavia não menos legítima. Assim, a mensagem que vem das ruas é poderosa e deve ser levada em conta pelos detentores do poder.

O que as ruas querem? Considerando o perfil dos manifestantes de eventos passados, a maioria era de eleitores de oposição. Entretanto, a situação de hoje é bem diferente. A impopularidade do governo pegou em cheio eleitores e não eleitores de Dilma.

Para piorar, a cena econômica se deteriorou frente ao quadro de março. O que era apenas político e ético, agora passa a ser econômico também. É uma situação muito grave que tende a enfraquecer o governo, já que tudo conspira contra. Inclusive a precária capacidade de o Executivo se comunicar. E, pior, de reagir ao recado das ruas.

O que quer as ruas? Basicamente, três coisas que dependem da preferência (ou da não preferência) política dos manifestantes. São elas: uma atitude firme dos poderes públicos contra a corrupção; a substituição do atual governo; e/ ou a retomada do crescimento econômico, com controle da inflação.

Alguns querem tudo ao mesmo tempo; outros entendem que a questão da corrupção é a mais séria e implica uma “limpa” no mundo político. Fora isso, tanto as classes médias quanto as populares estão, com toda a razão, preocupadas com a crise econômica.

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Murillo de Aragão é cientista político e especialista do Instituto Millenium

A legitimidade de Dilma – Editorial / O Estado de S. Paulo

Diálogo, para a presidente Dilma Rousseff e seus apoiadores, só vale quando é conversa entre amigos. Para o lulopetismo, as vozes discordantes, que questionam as ações do governo, nada mais são do que expressão de “golpismo” – contra o qual vale lutar inclusive empregando a violência.

Nos últimos dias, Dilma transformou o Palácio do Planalto, onde ela é inquilina passageira, em um bunker. É nessa fortaleza, protegida por líderes de movimentos sociais e organizações sindicais conhecidos por sua falta de vocação democrática, que a presidente pretende se apresentar ao País como vítima de uma conspiração para tirá-la do poder e demonstrar que está disposta a defender seu mandato “com unhas e dentes”, como declarou noutro dia.

Dilma tem sugerido sistematicamente, em todos os seus discursos mais recentes, que seus opositores não respeitam a escolha dos brasileiros nas urnas e agem para restabelecer a ditadura. “Este país é uma democracia. E uma democracia respeita, sobretudo, a eleição direta pelo voto popular”, disse a presidente. E ela acrescentou: “O voto é a fonte da minha legitimidade, e ninguém vai tirar essa legitimidade que o voto me deu”.

Trata-se de um entendimento indigente do que vem a ser o regime democrático em vigor no Brasil. Se Dilma foi eleita pelo voto popular, os parlamentares que lhe fazem oposição também o foram e, portanto, seus mandatos são tão legítimos quanto o dela. Também é legítimo o poder que emana da enorme parcela do povo que se cansou da irresponsabilidade de Dilma, Lula e companhia. Ademais, os que pretendem abreviar o mandato de Dilma em razão dos desmandos cometidos em seu governo ou em sua campanha eleitoral baseiam sua reivindicação em processos previstos expressamente pela Constituição. Por fim, mas não menos importante, as manifestações de rua que pedem a saída de Dilma da Presidência são igualmente legítimas, pois, na democracia que a presidente tanto proclama prezar, o direito ao protesto contra o poder constituído, desde que realizado de maneira pacífica, é cláusula inquestionável.

A legitimidade que Dilma invoca tão ardentemente para si é apenas um princípio. Para que se torne de fato legítimo, o chefe de governo deve comprovar que ganhou o mandato de forma limpa e deve exercer esse mandato de maneira responsável e em respeito irrestrito às leis. Esse conceito foi explicado recentemente pelo ministro João Otávio Noronha, relator de ações movidas no Tribunal Superior Eleitoral que acusam Dilma de abuso de poder econômico e político nas eleições de 2014. “A presidente diz: ‘Eu tenho a legitimidade do voto’. Não, ela tem a presunção da legitimidade do voto, que pode ser destituída por uma ação de investigação eleitoral ou impugnação”. Para Noronha, a legitimidade da presidente “não cai só nas pesquisas”; pode cair também “no mundo jurídico”.

Dilma, porém, tem um entendimento bem menos sofisticado do que é legitimidade democrática. Ela quer fazer acreditar que, por ter sido eleita pelo voto direto, está acima das instituições, e quem disso discordar deve ser tratado simplesmente como inimigo da democracia – personalizada na figura da presidente petista. Esse discurso autoritário foi prontamente adotado pelos movimentos sociais e sindicais com os quais Dilma escolheu “dialogar”, fechada em seu bunker no Planalto.

Lá, na linguagem belicosa muito apropriada a esse clima que Dilma e os lulopetistas criaram, não faltou quem ameaçasse, com todas as letras, partir para ações armadas contra os opositores da presidente. Diante de Dilma, em alto e bom som, o presidente da Central Única dos Trabalhadores, Vagner Freitas, avisou: “Recado para os golpistas: nós somos trabalhadores, trabalhamos pela democracia. O que se vende é a intolerância, o preconceito de classe contra nós. Somos defensores da unidade nacional. Isso implica ir para a rua entrincheirados, de armas na mão, e lutar se tentarem tirar a presidente”.

Se a presidente da República realmente tem apreço pela democracia, está disposta ao diálogo e quer ver reconhecida a legitimidade de seu mandato, deve tratar de acalmar os ânimos de sua tropa, baixar o tom e aceitar o fato de que o Estado não é ela.

De Itamar a Dilma – Editorial / Folha de S. Paulo

• Sem temer a perda de uma popularidade já esvaída, a presidente tem a última chance de abraçar reformas inadiáveis para o país

Os protestos marcados para este domingo (16) em diversas cidades do Brasil serão realizados a contrafluxo do que tem se passado nas esferas política e econômica.

Não que a crise esteja superada; longe disso. Mas, nos últimos dias, líderes partidários e empresariais parecem ter-se dado conta de que, a despeito dos erros cometidos pela presidente Dilma Rousseff (PT) –e foram muitos–, o melhor para o país, neste momento, é contar com alguma calmaria no Planalto.

Nada disso, naturalmente, tira a legitimidade dos atos contra o governo federal. Reeleita no segundo turno por ínfima margem de votos, a petista se tornou a presidente mais impopular da nossa história por seus próprios deméritos.

Da percepção de que a corrupção grassou como nunca na administração do PT à convicção de que as ideias equivocadas de Dilma levaram a economia a piorar muito mais do que seria aceitável, passando pelo estelionato eleitoral e pela fragilidade da base aliada, inúmeros aspectos explicam a insatisfação com a presidente.

Ainda assim, as circunstâncias começaram a mudar a favor de Dilma, aportando um alívio pequeno e ainda provisório no Planalto –as investigações da Operação Lava Jato podem mudar o horizonte sem aviso prévio.

O Tribunal de Contas da União, o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal tomaram decisões que resultaram em uma lufada adicional de oxigênio para o governo –seja dilatando prazos para explicações, seja retirando de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara, o poder de comandar votação sobre contas de presidentes da República.

Ficam por ora travados os meios para o impeachment, cujas requisitos, de resto, nem estão atendidos. O recurso traumático demanda sólida comprovação de crime de responsabilidade e amplo consenso de que o presidente não tem condições de seguir no comando.

Surgiu nas águas turbulentas, ademais, uma pequena tábua de salvação. Trata-se da Agenda Brasil, um pacote de reformas amarrado por Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado.

Verdade que muitas das medidas já tramitavam no Congresso; que o conjunto, ainda em mutação, tem pouca harmonia interna; que diversos interesses escusos se insinuam entre as propostas; que muitas sugestões são sumárias demais até para serem debatidas; que tudo, enfim, pode não passar de mera estratégia diversionista.

Mesmo assim, o gesto de Renan oferece ao menos um ponto de partida para discussões sobre o futuro do Estado brasileiro –o que não é pouco para um governo que afundava sem nem saber apontar a direção do céu e a do fundo do mar.

Se quiser tirar o melhor proveito da situação, o governo federal deve priorizar alguns projetos.

O Brasil não pode perder tempo com propostas como a de criar novas regras para atividades produtivas em áreas indígenas ou para o licenciamento de investimentos na zona costeira, em áreas naturais protegidas e cidades históricas. Tais medidas não passam de lobby de setores específicos e nada fariam para conter a dívida pública.

Por outro lado, o país sem dúvida precisa de maior segurança jurídica, agradeceria se houvesse aperfeiçoamento do marco regulatório das concessões e teria muito a ganhar com novas regras para a terceirização do trabalho. Tais iniciativas, porém, pouco ajudariam a resolver o desafio mais premente.

O desastre nas contas públicas nos últimos anos colocou a dívida em trajetória explosiva. Se ela não for estabilizada, o risco percebido de calote provocará danos na economia. Os juros cobrados no mercado para financiar o governo subirão ainda mais; o câmbio ficará ainda mais desvalorizado.

Entre as consequências estão aumento da inflação, agravamento da recessão e desemprego crescente.

Pôr um freio nos gastos públicos pode ser visto como sacrifício no curto prazo, pois necessariamente implica discutir os limites de crescimento das despesas obrigatórias (como Previdência), as vinculações excessivas no Orçamento e uma infinidade de subsídios e desembolsos que beneficiam apenas grupos de pressão.

Tais debates, por impopulares que sejam, não podem ser adiados. É urgente fazer o Estado brasileiro caber no PIB, sob pena de a sociedade perder parte dos formidáveis avanços conquistados nas últimas duas décadas.

Sem reformas dessa natureza, o país jamais conseguirá galgar o próximo degrau de seu desenvolvimento, assim como não teria avançado tanto se não tivesse conseguido estabilizar a economia em meados dos anos 1990.

Ao jornal "Valor Econômico", o cientista político Fernando Abrucio sugeriu um caminho: "A melhor das hipóteses para Dilma é ser um governo de transição para 2018. Não é pouca coisa para o país, nem para ela, se souber ter estatura política para isso. (...) Dilma é o Itamar [Franco] da vez".

Que Dilma Rousseff enxergue essa última oportunidade que, paradoxalmente, a história lhe oferece.

Fernando Gabeira - O grito dominical

- O Globo / Segundo Caderno

Hoje é domingo, dia de manifestação. Dia singular, pois podemos sair às ruas e dizer em alta voz o que queremos para o país. Digo singular porque o grito nas ruas nos libera do esforço, construindo mediações nas relações cotidianas. Outro dia, ia entrevistar um prefeito do PT no interior a propósito de algo muito positivo que acontece em sua cidade. No entanto, eu me vi planejando uma pergunta indispensável, com o máximo de diplomacia: “O que o senhor acha dessas coisas que acontecem com o PT?”

Entre amigos, às vezes, a discussão sobre política vai para a sobremesa. Mesmo reconhecendo o desastre do projeto do PT, há os que ainda, sentimentalmente de esquerda, temem as mudanças. Nesses casos, é possível uma abstração ainda maior, quando tocamos no tema: — Está grave a crise. — Gravíssima. É um diálogo parecido com os ouvidos no interior: — Compadre, vem chuva. — Vem não, esse vento engana. — Olha que vem, compadre. A partir de um grito coletivo, como o de hoje, sem ferir a sensibilidade do outro, será mais fácil demonstrar que não é possível, nesse momento, deixar de considerar uma solução para a crise.

Sou pela saída de Dilma. Não tenho meta: impeachment ou renúncia. Mas quando chegar a essa meta, desejaria dobrá-la e levar também Eduardo Cunha e Renan Calheiros. Essa frase de não ter meta e dobrá-la ao atingi-la me lembra o zen-budismo. Uma de formas de transmissão de seus ensinamentos é o koan, de um modo geral uma frase desconcertante: ouvir o batido da palma de uma só mão.

Dilma é uma mestre zen que tomou um porre de saquê. Uma boa razão para segui-la. Outro dia, em Mumbuca, no Jalapão, os fiéis saíram do culto na igreja local e comeram uma imensa bacia de mandioca. Logo depois, passei por uma casa em que a mulher raspava a mandioca e os filhos a molhavam e amassavam. Saudei os produtores de mandioca. Se saudasse apenas a própria, podiam não entender. Cumpri meu dever cívico.

Respeitosamente, portanto, analiso os caminhos da queda. O impeachment é algo feito nas instituições. É preciso alguém investigar as contas, tribunal julgar, advogados pra cá, advogados pra lá, enfim, algo que corre muito longe do alcance de um indivíduo. Só podemos vigiar e cobrar. Já a renúncia depende mais da sociedade, de suas formas de demonstrar que não quer ser governada por ela. Dilma tem 8% de aprovação. Existem duas maneiras de ver seu futuro. Ela pode se convencer do movimento declinante e, num gesto de grandeza, renunciar. Ou ela pode chegar a 1% de aprovação e também, num gesto de grandeza, renunciar, dizendo: “Nunca um presidente será tão impopular como eu”.

Ela terá de escolher entre entrar para a História ou para o “Guinness”. Isso não significa subestimar o caminho institucional do impeachment. Apenas fazer o que está ao alcance da sociedade. Dependem dela o ritmo e a intensidade da pressão sobre Dilma.

Dá uma certa ansiedade ver o Brasil sem rumo. Dilma mostra que ganhou o apoio da UNE e do MST. Agora vai. Fechada no gueto, promove atos cirurgicamente preparados para evitar protestos. Apenas uma forma de dizer que está viva. Os jornais falam que Renan Calheiros foi chamado a salvar Dilma. Mas quem salvará o salvador? Renan está implicado na Lava-Jato e ainda corre aquele processo em que empreiteiras pagavam a mesada de sua bela amante.

Essa dança de encontros em Brasília é, na verdade, um ritual vazio, destinado a jogar areia nos olhos da plateia. Todos sabem que a polícia está chegando e que a crise econômica não se debela com algumas medidas anotadas no guardanapo do bar. A mais recente aparição de Dilma foi em Roraima. Ela estava inaugurando casas. O discurso sobre a casa é mais patético que os outros porque faz sentido, é possível detectar alguma lógica nele.

Dilma evoluiu e já está em condições de escrever sua primeira composição infantil. Segundo ela, na casa mora a família, as pessoas comem, têm laços afetivos, amam suas crianças. Ela viajou tanto para fazer esse discurso espontâneo mas também para justificar o recado ensaiado sobre sua capacidade de resistir a pressões. Vestiu de novo a máscara da militante com vontade de ferro, uma reminiscência stalinista na esquerda armada latino-americana. Ela confunde o momento da ditadura com a aspiração popular de acabar com a roubalheira e retomar o curso de nossa vida republicana. Confunde panelaço com pau de arara, rejeição política com tortura.

Congelados num momento histórico de resistência, prosseguem na vida como se cada dia fosse uma oportunidade de mostrar heroísmo, coragem e coração valente. Um coração valente não dispensa uma cabeça pensante, sobretudo no momento de crise. Dilma já consegue escrever um parágrafo sobre a casa. Não consegue entender uma vírgula do processo histórico.

Compete a cada um de nós mostrar que esse sistema criminoso de governo chegou ao fim. O momento é de abrir a janela para o sol e o ar puro. Respirar de novo.

Samuel Pessôa - Sobre o impeachment

- Folha de S. Paulo

• A melhor saída que há à manutenção da presidente zumbi por mais 3 anos seria a renúncia de toda a chapa

Do ponto de vista econômico, não me parece que o impeachment da presidente seja um bom caminho.

Tínhamos no fim do ano passado três inconsistências: um regime desastroso de política econômica, que produziu forte desaceleração na atividade e a construção de desequilíbrios (inflacionário, externo e das contas públicas); o esgotamento de um contrato social que requer crescimento contínuo do gasto público além do crescimento da economia; a necessidade de nova rodada de medidas com vistas a elevar a eficiência da economia e estimular o crescimento, como a reforma dos impostos indiretos para reduzir o custo de observância da legislação tributária.

O ministro Levy abordou o primeiro item dessa pauta, pois encontra-se sob sua jurisdição. O resto depende do Congresso Nacional.

O impedimento da presidente Dilma não irá fazer aparecer 3% do PIB de superavit primário, não produzirá uma reforma previdenciária que mantenha o crescimento do gasto público nos limites dados pelo crescimento do produto nem criará as condições políticas para a aprovação das reformas estruturais necessárias à retomada do crescimento.

O exemplo exitoso do mandato tampão de Itamar sugere que podemos repetir a aposta. Sou cético.

O motivo de meu ceticismo é que os dilemas atuais apresentam economia política muito mais complexa do que a estabilização econômica. A complexidade do Plano Real era mais técnica do que política, apesar de os desafios de construção de consensos políticos serem sempre imensos, dadas as características de nossa sociedade e de nossas instituições políticas.

Parece-me, portanto, que dificilmente Temer ou quem quer que venha ocupar aquela cadeira terá as condições de tocar o governo. A campanha eleitoral, que somente discutiu legados, retira hoje legitimidade de qualquer governo.

A melhor saída que há à manutenção da presidente zumbi por mais três anos seria renúncia de toda a chapa, da presidente e do vice, para que um novo processo eleitoral fosse convocado e os partidos apresentassem candidaturas.

Um processo eleitoral competitivo, em que os partidos conversassem abertamente com a sociedade sobre nossos dilemas, dificuldades e possíveis caminhos, poderia pavimentar a construção de consensos políticos para viabilizar saídas para as duas inconsistências que impedem, mesmo após completarmos o ajustamento cíclico, a retomada do crescimento.

Essa saída, porém, teria que derivar de ato voluntário da atual chapa no poder, e não a ela imposto.

Na coluna anterior abordei o esforço que houve em 2005, liderado pelo Ipea e por políticos da situação e da oposição, além dos ministros Palocci e Paulo Bernardo, com vistas à construção de um limitador ao crescimento do gasto público.

Glauco Arbix, à época presidente do Ipea e um dos líderes da iniciativa, e o atento leitor Ney José Pereira notaram erro que cometi no texto da coluna.

A hoje presidente Dilma, que abortou a iniciativa em entrevista no dia 9 de novembro de 2009 ao jornal o "Estado de S. Paulo", quando qualificou o ajuste de "rudimentar", já deixara o Ministério de Minas e Energia e encontrava-se na Casa Civil.

Aos dois agradeço a atenção. Os interessados encontrarão no blog de Mansueto Almeida (https://mansu eto.wordpress.com/), em post do dia 13, o link para o texto do Ipea que acabou não vindo a público, além da entrevista ao "Estado de S. Paulo" da então ministra da Casa Civil.
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Samuel Pessôa, formado em física e doutor em economia (USP), é pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV).

Miriam Leitão -Razão de existir

- O Globo

Se o Tribunal de Contas da União (TCU) nos servir uma pizza, é o caso de se pensar sobre a razão de sua existência. Tudo bem se o Congresso achar que uma eventual recomendação contrária do TCU não pode ser motivo para impeachment, mas o próprio órgão tem que ser objetivo, do contrário, estará liberando um vale tudo nas finanças públicas. O que Dilma fez não pode ser feito.

Aconsequência da decisão do TCU é assunto da soberania do Legislativo, por isso faz sentido o que o ministro Luis Roberto Barroso decidiu: é melhor que seja o Congresso a deliberar sobre um eventual processo, do que a Câmara dos Deputados, apenas. Não só pela pessoa que ocupa o cargo no momento, mas porque é mais lógico que seja atribuição de todo o parlamento.

O TCU custa caro ao país e não é para ser um aprovador geral das contas dos governos. Sobre o órgão paira uma dúvida institucional. Ele é formado por ministros indicados por políticos, não faz parte do Judiciário, apesar de chamar tribunal, e seus ministros têm vitaliciedade. A dúvida de sempre é se pessoas que terão todas essas vantagens, até o final de suas vidas, pagas pelo nosso bolso, atenderão aos interesses coletivos ou servirão aos senhores que os indicaram?

Por um momento, nos últimos meses, o país passou a considerar que o Tribunal de Contas sairia fortalecido, ao ser capaz de elaborar um relatório favorável à reprovação de contas em tudo reprováveis. O parecer dos técnicos já divulgado em sua fase preliminar é um conjunto de mais de 80 páginas, e nele há a condenação da utilização dos bancos públicos como fontes de crédito para o governo.

As operações feitas pelo governo Dilma são proibidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

Simplesmente elas não podem ocorrer. O governo mandou os bancos pagarem benefícios orçamentários e assim manteve o dinheiro nos seus cofres. Eles pagaram e foram ressarcidos meses depois. Mas aí o governo já havia espetado uma enorme conta nessas instituições.

Aceitar isso é chamar o pizzaiolo e servir ao distinto público pagante mais uma indigesta pizza. É natural que o contribuinte se pergunte para que mesmo existe o TCU. Agora já se foi longe demais. As irregularidades foram expostas para todos, o relatório preliminar foi lido pelos especialistas, o tempo dado ao governo foi usado em sofismas do tipo “todo mundo fez, logo posso fazer”, ou por explicações que fazem pouco da inteligência alheia, como a de que é previsto no contrato. Nada disso é verdade.

Qualquer contrato de prestação de serviço financeiro pode conter uma cláusula estabelecendo que, em caso de insuficiência de fundos, o valor é pago e, em seguida, a despesa será coberta pelo contratante. Mas não faz sentido o tempo de atraso, nem o montante bilionário a que se chegou de programas assistenciais cobertos pela Caixa Econômica, Banco do Brasil, BNDES, FAT, FGTS. O governo Dilma ficou devendo a todos os bancos e fundos e, assim, foi construída uma falsificação das contas públicas.

Pode até haver na longa lista de irregularidades levantadas pelos técnicos do TCU algumas que dê para explicar, mas os empréstimos concedidos aos bancos públicos para o governo não podem acontecer porque foram proibidos pela LRF. E a lei proibiu por bons motivos. Durante anos os bancos foram usados como emissores de moeda. Governos federal e estaduais sacavam a descoberto de seus bancos e assim desorganizavam as contas públicas. Quebravam as instituições e estimulavam a inflação. Foi necessário fechar alguns bancos, privatizar outros, sanear todos à custa de recursos do contribuinte e, em seguida, proibir a prática. Ela reapareceu no governo Dilma, que agora diz que isso é contratual. Não pode haver um contrato autorizado a burlar uma lei.

Neste momento, o governo usa os políticos que indicaram os ministro do TCU para que pressionem por um alívio no julgamento das contas de 2014. A manobra começa a surtir efeito. Se a pressão funcionar, e o TCU encontrar formas de desdizer o que vinha dizendo e negar a irregularidade que apontou, será um retrocesso institucional e um tiro dado pelo tribunal em seu próprio pé. No dia seguinte, será natural que o contribuinte se pergunte: para que mesmo existe o TCU?

Cris Delanno e Oscar Castro Neves - Chora tua tristeza

Mário Sá Carneiro - Dispersão

Perdi-me dentro de mim
Porque eu era labirinto,
E hoje, quando me sinto,
É com saudades de mim.

Passei pela minha vida
Um astro doido a sonhar.
Na ânsia de ultrapassar,
Nem dei pela minha vida...

Para mim é sempre ontem,
Não tenho amanhã nem hoje:
O tempo que aos outros foge
Cai sobre mim feito ontem.

(O Domingo de Paris
Lembra-me o desaparecido
Que sentia comovido
Os Domingos de Paris:

Porque um domingo é família,
É bem-estar, é singeleza,
E os que olham a beleza
Não têm bem-estar nem família).

O pobre moço das ânsias...
Tu, sim, tu eras alguém!
E foi por isso também
Que te abismaste nas ânsias.

A grande ave dourada
Bateu asas para os céus,
Mas fechou-as saciada
Ao ver que ganhava os céus.

Como se chora um amante,
Assim me choro a mim mesmo:
Eu fui amante inconstante
Que se traiu a si mesmo.

Não sinto o espaço que encerro
Nem as linhas que projeto:
Se me olho a um espelho, erro —
Não me acho no que projeto.

Regresso dentro de mim
Mas nada me fala, nada!
Tenho a alma amortalhada,
Sequinha, dentro de mim.

Não perdi a minha alma,
Fiquei com ela, perdida.
Assim eu choro, da vida,
A morte da minha alma.

Saudosamente recordo
Uma gentil companheira
Que na minha vida inteira
Eu nunca vi... Mas recordo

A sua boca doirada
E o seu corpo esmaecido,
Em um hálito perdido
Que vem na tarde doirada.

(As minhas grandes saudades
São do que nunca enlacei.
Ai, como eu tenho saudades
Dos sonhos que não sonhei!...

E sinto que a minha morte —
Minha dispersão total —
Existe lá longe, ao norte,
Numa grande capital.

Vejo o meu último dia
Pintado em rolos de fumo,
E todo azul-de-agonia
Em sombra e além me sumo.

Ternura feita saudade,
Eu beijo as minhas mãos brancas...
Sou amor e piedade
Em face dessas mãos brancas...

Tristes mãos longas e lindas
Que eram feitas Pra se dar
Ninguém mas quis apertar
Tristes mãos longas e lindas

Eu tenho pena de mim,
Pobre menino ideal...
Que me faltou afinal?
Um elo? UM rastro?... Ai de mim!,..

Desceu-me na alma o crepúsculo;
Eu fui alguém que passou.
Serei, mas já não me sou;
Não vivo, durmo o crepúsculo.

Álcool dum sono outonal
Me penetrou vagamente
A difundir-me dormente
Em urna bruma outonal.

Perdi a morte e a vida,
E, louco, não enlouqueço...
A hora foge vivida,
Eu sigo-a, mas permaneço,..
.....................................

.....................................


Castelos desmantelados,
Leões alados sem juba
.........................................

.........................................

Paris, maio, 1913

sábado, 15 de agosto de 2015

Opinião do dia – Aécio Neves

O Brasil assistiu ontem (anteontem) com perplexidade à declaração, na sede do governo nacional, no Palácio do Planalto, na presença da senhora presidente da República, e sem que ela fizesse qualquer contestação, a palavra de um importante dirigente sindical conclamando os companheiros a se entrincheirarem e pegarem em armas. Eu quero dizer ao presidente da CUT que nós não vamos nos entrincheirar. Vamos de cabeça erguida para as ruas de todo Brasil no próximo domingo levando como nossa única arma a Constituição.
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Aécio Neves é senador (MG) e presidente nacional do PSDB. O Estado de S. Paulo, 15 de agosto de 2015.

Governo bloqueia novos empréstimos para estados

• Governadores e prefeitos contavam com recursos externos para investir

• Tesouro suspende aval para financiamento de administrações estaduais e municipais

Apesar da pressão de governadores e prefeitos, o governo federal decidiu suspender o aval a pedidos de empréstimo de estados e municípios a organismos internacionais. O Tesouro determinou à Comissão de Financiamentos Externos a retirada de pauta de todas as solicitações. Em reunião 15 dias atrás, governadores cobraram da presidente Dilma Rousseff mais rapidez na liberação desses empréstimos, que serviriam para investimentos em infraestrutura e logística. Segundo o Tesouro, essas operações de crédito somaram R$ 44 bilhões entre 2011 e 2014 e “cresceram fortemente nos últimos anos”.

Torneira fechada para estados

• Governo Dilma rejeita uma da principais reivindicações dos governadores na reunião de 15 dias atrás

Por Martha Beck – O Globo

BRASÍLIA - Num momento em que vários estados enfrentam dificuldades para fechar suas contas, e diante da necessidade de pôr em prática o ajuste fiscal, o governo federal decidiu suspender o aval para empréstimos internacionais a estados e municípios. A decisão desta sexta-feira vai na contramão de uma das principais reivindicações dos governadores à presidente Dilma Rousseff no encontro de duas semanas atrás, no Palácio da Alvorada. O Tesouro Nacional solicitou à Comissão de Financiamentos Externos (Cofiex) que retire de pauta a análise de todos os pedidos de empréstimos feitos pelos governos estaduais e municipais.

Na prática, isso significa que prefeitos e governadores ficarão temporariamente impedidos de solicitar financiamentos junto a organismos internacionais como o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O Tesouro Nacional é quem dá garantia a essas operações.

Na reunião de 15 dias atrás, convocada por Dilma no auge da crise política, os governadores disseram à presidente que agilizar a liberação de empréstimos com organismos multilaterais é importante para que eles possam fazer investimentos em infraestrutura e logística. O governador de Goiás, Marconi Perillo, foi um dos que mais brigou pela agilização das garantias para empréstimos, embora Goiás não tenha pedidos de financiamento pendentes. Os estados que atualmente esperam autorização da União para contrair empréstimos são Mato Grosso, Paraná, São Paulo, Paraíba e Amazonas, além do Distrito Federal. Nove municípios estão na mesma situação.

Perillo argumentou que a presidente Dilma tem que dar fôlego aos governadores autorizando novos empréstimos junto ao BID, a outros bancos estrangeiros e financiamentos de Caixa Econômica, Banco do Brasil e BNDES.

— Ninguém aguenta mais aumento de despesa sem previsão de receita. Com esses empréstimos vamos conseguir respirar, retomar investimentos em logística para gerar empregos e reagir à crise — disse Perillo no dia da reunião.

O arrocho também aconteceu na mesma semana em que o governador do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori, deixou de pagar parcela de R$ 263 milhões da dívida do estado com a União para conseguir pagar os salários do funcionalismo. Sergipe e Mato Grosso do Sul também não quitaram seus débitos. Os três sofreram bloqueio de repasses do Fundo de Participação dos Estados (FPE).

Rebaixamento de nota do Brasil
Segundo os técnicos da equipe econômica, a piora da economia, o encarecimento das operações de crédito e o rebaixamento da nota do Brasil e de vários estados pela agência de classificação de risco Moody´s obrigaram o Tesouro a adotar postura mais conservadora em relação às garantias que dá aos empréstimos. Eles alegam que a mensagem que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, quer passar é de que o quadro fiscal é muito grave e que é preciso ter austeridade não só no governo federal, mas também nos estados e municípios.

Outro fator que pesou na decisão foi a preocupação com a realização da meta de superavit primário (economia para o pagamento de juros da dívida). Ela depende não apenas da União, mas também de estados e municípios. Em 2015, a meta do setor público é de R$ 8,7 bilhões, ou 0,15% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país). Deste total, o governo federal tem que fazer R$ 5,8 bilhões (0,1% do PIB) e os estados e municípios, R$ 2,9 bilhões (0,05% do PIB).

Em nota, o Tesouro informou que as as operações de crédito para estados e municípios cresceram fortemente nos últimos anos, e que é preciso rever esse quadro, pois houve deterioração do quadro macroeconômico. Entre 2011 e 2014, por exemplo, os financiamentos externos para estados somaram R$ 44 bilhões. Já os empréstimos no mercado doméstico chegaram a R$ 67,5 bilhões. O Tesouro ressalta que os pedidos podem voltar a ser analisados no futuro.

Segundo o governo, o quadro macroeconômico adverso e o recente rebaixamento da nota do Brasil e de alguns estados e municípios por agências de classificação de risco obrigaram o governo a reavaliar a política de garantias da União e de expansão da dívida pública. Esse endividamento tem impacto direto na dívida bruta — um dos indicadores de crise mais observado pelos investidores estrangeiros — e na dívida externa.

Outro fator que foi levado em consideração foi o encarecimento de linhas de crédito, o que levou a “uma revisão da capacidade financeira dos próprios entes subnacionais”, afirma a Fazenda. O texto informa ainda que o Tesouro tem passado um pente-fino nas informações sobre o endividamento dos governos regionais, seus riscos, e sua capacidade de afetar o equilíbrio fiscal do país. “Dessa maneira, até que sejam concluídas essas avaliações, mostrou-se prudente e necessária a retirada de pauta dos pedidos de operação de crédito”, diz a nota.

INSS pode adiar 1ª parcela do décimo terceiro

Aposentados: parcela do 13º pode atrasar

• Com crise e queda na arrecadação, governo está sem dinheiro em caixa para pagar o adiantamento

- O Globo

Os aposentados e pensionistas do INSS podem ficar sem receber a primeira parcela do 13º salário em agosto e setembro, como era de praxe ocorrer há nove anos. Segundo fontes da equipe econômica, por causa da crise e da queda acentuada na arrecadação, o governo não tem recursos em caixa para custear a despesa, estimada em cerca de R$ 15 bilhões. Os ministérios da Fazenda e da Previdência tentarão uma solução até a próxima semana, mas, ainda que isso aconteça, dificilmente os segurados receberão o adiantamento nos mesmos prazos do ano passado.

Pelo cronograma de pagamento do INSS, o crédito dos benefícios tem início nos últimos cinco dias úteis de cada mês, começando por quem ganha até o salário mínimo, e vai até os cinco primeiros dias úteis do mês seguinte. O 13º geralmente é pago junto com o benefício. A Dataprev, prestadora de serviço para o INSS, precisa de prazo para processar a folha de pagamento, serviço que costuma ser feito nas primeiras duas semanas de cada mês, no máximo.

Além disso, a antecipação do 13º tem de ser autorizada por decreto, elaborado pelo Ministério da Previdência. No ano passado, esse decreto começou a ser preparado em junho e foi publicado no Diário Oficial da União no dia 5 de agosto. Em 2014, o gasto com a antecipação da parcela do 13º salário para 27,3 milhões de segurados foi de R$ 13,6 bilhões. Neste ano, a despesa será maior, porque a folha aumentou com o reajuste do salário mínimo e novos benefícios.

Por outro lado, as receitas previdenciárias estão caindo. Segundo dados da Receita Federal, a arrecadação com as contribuições ao INSS somaram R$ 178 bilhões entre janeiro e junho deste ano, perda de 3,4% em relação ao montante recolhido no mesmo período de 2014, que foi de R$ 184,2 bilhões.

Procurada, a assessoria de imprensa do Ministério da Previdência informou que o ministro responsável pela pasta, Carlos Gabas, está empenhado em encontrar uma solução junto à Fazenda e à Casa Civil. E, ainda que não dê tempo para pagar a parcela do 13 º junto com os benefícios de julho, o pagamento poderá ser feito posteriormente, em folha suplementar.

O presidente da Confederação Brasileira dos Aposentados ( Cobap), Warley Martins, disse que foi informado pela presidência do INSS que o governo pretende encontrar uma saída até o dia 20. Segundo ele, caso o pagamento não seja feito, a entidade pretende entrar na Justiça sob a alegação de direito adquirido.

— Faz nove anos que estamos recebendo a parcela adiantada. Milhares de aposentados estão esperando o dinheiro para pagar dívidas. O governo não pode mudar de uma hora para outra sem comunicar, sem conversar com os sindicatos — afirmou Martins, acrescentando que a Cobap recebeu ontem várias ligações de aposentados em busca de informações.

Antecipado para alguns
Mesmo com o aperto fiscal, os servidores públicos federais do Executivo, ativos e aposentados, receberam o adiantamento do 13º salário normalmente em julho, junto com o contracheque de junho. Esses funcionários pertencem ao Regime Próprio da Previdência Social e não são pagos pelo INSS. A assessoria de imprensa do Ministério do Planejamento informou que não tem dados sobre os outros poderes.

Oposição diz que fala de presidente da CUT tenta intimidar manifestantes

• Representantes do PSDB e do PPS repudiaram fala de sindicalista que faz referência a 'pegar em armas'

Daiene Cardoso - O Estado de S. Paulo

Brasília - Partidos de oposição repudiaram nesta sexta-feira, 14, a declaração do presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas, feita nesta quinta em cerimônia no Palácio do Planalto. Para os oposicionistas, ao falar em "ir para a rua entrincheirados com armas na mão se tentarem derrubar a presidente", o sindicalista tentou intimidar os manifestantes que prometem ir às ruas contra o governo petista no próximo domingo, 16.

"A declaração do presidente da CUT, na sede do governo, num evento oficial, e na presença da presidente Dilma tem um objetivo bastante claro: intimidar as pessoas e tentar diminuir o impacto das manifestações de domingo. Isso é absolutamente inaceitável numa democracia", afirmou o líder do PSDB na Câmara dos Deputados, Carlos Sampaio (SP).

Em nota, o parlamentar classificou a declaração de "absurda e inaceitável" e criticou a presidente Dilma Rousseff por não agir de forma enfática contra o discurso do presidente da CUT. "A presidente Dilma não o desautorizou. E, não sendo clara o suficiente diante de tamanho disparate, ela tem a obrigação de dizer à Nação que ela, de fato, não é conivente e não concorda com o posicionamento do presidente da CUT", comentou.

Diante da declaração de Freitas, o tucano informou que pretende entrar com representação junto ao Ministério Público Federal. "Eles querem intimidar a grande maioria dos brasileiros que estão indignados e não querem mais esse governo incompetente e marcado pela corrupção.", concluiu o líder do PSDB.

O líder da maior central sindical do País fez um discurso inflamado em defesa dos governos petistas, em especial da presidente Dilma e de seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva.

"Qualquer tentativa de atentado à democracia, à senhora, ou ao presidente Lula, nós seremos um exército", afirmou.

Nesta sexta o presidente do Solidariedade e ex-presidente da Força Sindical, o deputado Paulo Pereira da Silva (SP), disse por meio de nota que a postura de Freitas foi "irresponsável e antidemocrática". "As declarações do presidente da CUT incitam o ódio e a violência. Se nas manifestações previstas para este domingo, que vão pedir a saída de Dilma do poder, ocorrerem incidentes de violência, Vagner Freitas será um dos responsáveis por incitá-las", diz a mensagem do presidente da sigla.

Constituição será a única arma nos atos, diz Aécio

- Folha de S. Paulo

MACEIÓ - O presidente nacional do PSDB, Aécio Neves, criticou nesta sexta (14) a declaração do presidente da CUT, Vagner Freitas, sobre um possível uso de armas contra quem tentasse derrubar a presidente Dilma.

O tucano falou em Maceió, onde participou da abertura da campanha nacional de filiação do PSDB, realizada às vésperas de protestos contra o governo.

Segundo ele, a resposta a Freitas é que os atos contra o governo marcados para este domingo (16) serão pacíficos.

"Eu quero dizer ao presidente da CUT e, principalmente, aos brasileiros, que nós não vamos nos entrincheirar, nós vamos de cabeça erguida para as ruas de todo o Brasil e levando, como nossa única arma, a Constituição do Brasil", disse.

Nesta quarta (12), o líder sindical afirmou que, se preciso, os movimentos sociais iriam às ruas "com arma na mão" contra quem tentasse derrubar Dilma.

Sindicalista 'levanta a bola' e tucano corta

• Presidente da CUT sugere reação armada a protestos contra o Governo e dá munição ao senador oposicionista Aécio Neves

Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

Ao conclamar, no Palácio do Planalto, que os movimentos sociais devem "ir para as ruas entrincheirados, com armas nas mãos, se tentarem derrubar a presidenta", o presidente da CUT, Vagner Gomes, prestou uma colaboração preciosa ao PSDB. Para os tucanos, o sindicalista "levantou a bola" para o senador Aécio Neves (MG) cortar.

A equação é simples. Com o agravamento da crise política, petistas e aliados da presidente passaram a acusar os tucanos de "golpistas" por defenderem a tese do impeachment. Esse selo passou a ser peça de resistência dos discursos governistas.

Ao defender na semana passada que a melhor saída para a crise seriam novas eleições, os líderes do PSDB no Congresso deram munição aos adversários e abriram um debate interno que constrangeu Aécio.

Aliados do governador paulista Geraldo Alckmin na direção executiva tucana se apressaram em criticar a iniciativa. O próprio Alckmin disse a auxiliares que considerava o discurso "inócuo" e classificou como um erro o partido falar em novas eleições. O senador José Serra (SP) seguiu na mesma linha, configurando-se o racha.

Emparedado entre os aliados no Congresso e a ofensiva paulista, Aécio optou por um recuo tático no Recife, na segunda-feira, nas homenagens ao governador Eduardo Campos (PSB). "Não cabe ao PSDB escolher o melhor desfecho para o País. O papel do PSDB é garantir que as instituições funcionem na sua plenitude", afirmou.

Com o discurso belicoso do presidente da CUT, Aécio pôde reconciliar o discurso com os correligionários e passar a bola do constrangimento aos aliados de Dilma.

Para Aécio, Dilma transforma Planalto em ‘comitê de apoio’ contra protestos

• Senador do PSDB critica evento da presidente com movimentos sociais dentro do palácio e afirma que ‘arma’ dos tucanos nas manifestações contra o governo marcadas para amanhã será a Constituição: ‘vamos de cabeça erguida para as ruas de todo o País’

- Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

MACEIÓ - Na antevéspera das manifestações contra a presidente Dilma Rousseff marcadas para esta domingo, 16, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), líder de oposição, evocou nesta sexta-feira, 14, a Constituição para defender a legitimidade dos protestos e rebater os governistas que acusam os tucanos de “golpistas”. O senador criticou a postura de Dilma, que nos últimos dias participou de atos com apoiadores do governo e atacou os críticos de sua gestão.

Segundo Aécio, Dilma “é hoje uma presidente sitiada, que só pode participar de eventos que são muito bem preparados para que não haja a presença de cidadãos comuns. Apenas da claque, que muitas vezes é paga com recursos públicos. Estamos assistindo, estarrecidos, o Palácio do Planalto se transformar em um comitê de apoio a presidente”.

Na quinta, a presidente recebeu representantes de movimentos sociais no Palácio do Planalto e falou em “trajetória de golpe” e que é preciso “respeitar a regra do jogo”.

Aécio também rebateu o presidente da CUT, Vagner Freitas. No evento da presidente no Planalto, Freitas afirmou: “Recado para os golpistas: nós somos trabalhadores, trabalhamos pela democracia. Somos defensores da unidade nacional. Isso implica ir para a rua entrincheirados de armas na mão se deitar e lutar se tentarem tirar a presidente”.

“O Brasil assistiu ontem (anteontem) com perplexidade à declaração, na sede do governo nacional, no Palácio do Planalto, na presença da senhora presidente da República, e sem que ela fizesse qualquer contestação, a palavra de um importante dirigente sindical conclamando os companheiros a se entrincheirarem e pegarem em armas. Eu quero dizer ao presidente da CUT que nós não vamos nos entrincheirar”, disse Aécio.

“Vamos de cabeça erguida para as ruas de todo Brasil no próximo domingo levando como nossa única arma a Constituição”, afirmou o senador.

Aécio, presidente do PSDB e candidato derrotado por Dilma na eleição de 2014, esteve ontem em Maceió (AL) para a campanha nacional de filiação do PSDB. Em discurso, com um exemplar da Constituição na mão, ele disse aos militantes: “Vamos fazer com que a lei seja cumprida. Foi por isso que tantos brasileiros lutaram tanto durante tantos anos. Vamos responder a essas tentativas de intimidação com a Constituição”.

Em Maceió, Aécio defendeu reiteradas vezes a “autonomia” do Tribunal Superior Eleitoral e do Tribunal de Contas da União, onde tramitam ações que podem levar à cassação da presidente.

“Ao PSDB não cabe escolher desfechos. Há uma avaliação equivocada quando dizem que essa saída é boa para A ou B. Para nós, seja qual for o desfecho, inclusive se ela (Dilma) continuar no cargo, tem que ser pela via Constitucional”, afirmou. “O que nós não aceitamos é que a defesa da Constituição possa ser chamada, como querem alguns, de tentativa golpista. Nós louvamos a Constituição e vamos fazê-la cumprir. Não vamos aceitar constrangimento às cortes brasileiras”, concluiu o senador.

Outras siglas. Presidente do Solidariedade e ex-presidente da Força Sindical, o deputado Paulo Pereira da Silva (SP) disse em nota que a postura de Freitas foi “irresponsável e antidemocrática”. “As declarações incitam o ódio e a violência. Se nas manifestações previstas para este domingo, que vão pedir a saída de Dilma do poder, ocorrerem incidentes de violência, Vagner Freitas será um dos responsáveis por incitá-las.”

O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), entrou com pedido no Ministério da Justiça para que a Polícia Federal garanta a integridade dos manifestantes amanhã. “Essa declaração do presidente da CUT é um atentado grave contra o Estado. O que mais impressiona é a presidente da República permitir isso dentro do Palácio do Planalto. / Colaboraram Daiene Cardoso e Isadora Peron

Dilma diz que adota vida saudável para suportar ‘imensa desfaçatez’

• Lula e Aécio criticam presidente da CUT por ter falado em ‘pegar em armas’

Rodrigo Aguiar* e Cristiane Jungblut - O Globo

-SALVADOR E BRASÍLIA- A presidente Dilma Rousseff afirmou ontem que precisa manter a “vida saudável” para enfrentar “a pressão, a imensa desfaçatez e a intolerância que recaem alguns momentos lá em Brasília”. A frase foi dita ao discursar em solenidade do programa Dialoga Brasil, em Salvador.

Depois de ouvir de uma mulher da plateia que estava “gata”, Dilma aproveitou para dar a receita da vida saudável: “Comer menos, acordar cedo e trabalhar muito”. Disse ainda que há “insidiosa tentativa de criar um clima de quanto pior, melhor”.

Rui Costa faz defesa enfática
A presidente também citou o escritor Guimarães Rosa.

— É como aquele meu conterrâneo dizia. O que ela [a vida] quer da gente é coragem — disse Dilma, que já havia lido o mesmo trecho em seu discurso de posse, em janeiro de 2011.
Governador da Bahia, o petista Rui Costa fez a defesa mais enfática do governo.

— Um país que respeita o seu povo e as instituições não aceita golpe de qualquer natureza. Querem provocar o caos para adotar o quanto pior, melhor. Nós queremos serenidade.

Tanto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva quanto políticos de oposição como o senador Aécio Neves ( PSDBMG) criticaram ontem as declarações feitas na véspera pelo presidente da Central Única dos Trabalhadores ( CUT), Vagner Freitas, que disse estar preparado para “pegar em armas” se houver uma tentativa de tirar Dilma do poder.

Em ato do PT, Lula disse que a Educação é a melhor forma de fazer uma revolução.

— Quero dedicar esse meu discurso ao companheiro Vagner da CUT, que ontem cometeu uma frase que não queria cometer. Queria dizer para o Vagner que o Plano Nacional de Educação é a grande arma que a CUT tem que usar. Não existe nada mais importante do que a educação para fazer a revolução nesse país — afirmou o ex-presidente em discurso.

A frase de Vagner Freitas foi citada por políticos de oposição ao convocarem a população para participar, amanhã, de protestos contra o governo em todo o país. Em Maceió, durante campanha de filiação ao PSDB, Aécio Neves disse que a população vai às ruas usando a Constituição como arma, e que o país vive um crise moral sem precedentes.

Já o líder do DEM, senador Ronaldo Caiado (GO), anunciou que pedirá ao Ministério Público Federal a abertura de um inquérito contra Freitas por ‘‘incitação ao crime’’.

— Vamos para a rua, mas não entrincheirados. Vamos de braços abertos e apenas com uma arma, a Constituição, nas mãos. Não vamos permitir que a lei seja violentada por um governo que perdeu todos os escrúpulos — disse Aécio, acrescentando ter ficado estarrecido com o fato de o dirigente da CUT não ter sido repreendido por Dilma.

Álvaro Dias (PSDB-PR) foi outro senador que criticou Freitas:

— Quem incita a violência não está preparado para o exercício da democracia.

Após a repercussão negativa, o presidente da CUT disse que não teve a intenção de incitar a violência, e que “usou uma figura de linguagem’’. O governo de São Paulo mobilizará mil policiais para acompanhar as manifestações, que ficarão concentradas na Avenida Paulista. (* Da Agência A Tarde)

Ecos

- O Globo

EM MAIS uma pajelança de “movimentos sociais” em defesa de Dilma, o presidente da CUT, Vagner Freitas, encheu os pulmões no salão nobre do Planalto para ameaçar com um “exército” que pegaria “em armas’’ para defender a presidente. Desafinou.

COM EQUILÍBRIO, Dilma, no evento, defendeu a tolerância na política e a democracia. O próprio Freitas procurou a Globo para que registrasse no “Jornal Nacional’’ que ocorrera um mal- entendido.

MELHOR ASSIM, porque na última vez que este tipo de discurso se infiltrou no Palácio a sociedade pagou alto preço, e durante longo tempo.

Mercado atua como ‘bombeiro’ da crise

• Setor produtivo pressiona por distensão e se aproxima de Renan por agenda positiva

Erich Decat - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A pressão dos setores produtivos foi um dos principais fatores para o abrandamento do ambiente político nesta semana, às vésperas das manifestações contra o governo que ocorrerão amanhã em todo o País. A ascensão do presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), como contraponto à “pauta-bomba” encampada pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), já vinha sendo incentivada por nomes de peso do setor empresarial e entidades classistas, além de senadores que representam grande segmentos produtivos.

A mensagem que esses grupos fizeram chegar aos senadores foi a de que a piora no cenário econômico do País, com a aprovação de projetos com impactos ao Orçamento da União, teria efeito negativos nos setores em que atuam. Sob pressão, Renan começou a elaborar ainda no recesso parlamentar o pacote de medidas apresentado na segunda-feira, batizado de Agenda Brasil. Dois dias depois, o presidente da Federação da Indústria do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, foi pessoalmente ao gabinete do peemedebista agradecer a criação do pacote.

A aproximação entre Renan e o Planalto serviu ainda para alimentar o entendimento de que “murchou” o ímpeto no Senado em um eventual processo de impeachment contra a presidente.
O lançamento do pacote anticrise também a Renan o protagonismo político perdido desde que seu nome apareceu na lista de investigados na Operação Lava Jato. E acabou por ser determinante na que é considerada pelo governo como a melhor semana do ano, dias antes da terceira manifestação contra o governo nas principais cidades do País.

O Executivo conseguiu acumular uma série de fatos políticos positivos, como a extensão do prazo de defesa da presidente Dilma Rousseff no TCU; e a decisão do STF de que as contas de governo da petista devem ser julgadas pelo Congresso, e não apenas pela Câmara, como defende o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Desde a eclosão dos protestos, o governo patinava para emplacar uma “agenda positiva”.

Na avaliação de governistas, Dilma, ao encampar a agenda de Renan, voltou a ter condição de criar uma agenda positiva pós-ajuste e diminuiu o isolamento político em um momento de instabilidade e baixa popularidade do governo. O pacote foi crucial para acuar a base aliada na Câmara, que vinha atuando contra o governo por meio da pauta-bomba. Muitos empresários passaram a pressionar os deputados para evitar que o ambiente político contaminasse a economia.

Ambiente. “As ações que a Câmara toma hoje cria um ambiente muito ruim para os negócios do Brasil”, ressaltou o senador Blairo Maggi (PR-MT), representante de um dos maiores grupos produtores de soja do País. “Não se podia esperar uma reação diferente da que foi tomada pelo presidente do Senado.”

O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, que disputou o governo de São Paulo no ano passado pelo PMDB e é próximo do vice-presidente Michel Temer, também teve papel relevante. Segundo relatos, ele e Renan têm tido conversas frequentes, por telefone, ocasiões em que Skaf tem retratado o humor do mercado. No último mês, Renan também esteve com o presidente do grupo Gerdau, Jorge Gerdau, ocasião em que ouviu relatos desanimadores sobre os efeitos da atual crise.

Dilma critica 'insidiosa tentativa de se criar o quanto pior, melhor'

Por Tiago Décimo - Para o Valor Econômico

SALVADOR - Dois dias antes das manifestações programadas em protesto contra seu governo, a presidente Dilma Rousseff, acompanhada por oito ministros, participou de dois eventos em Salvador, na tarde desta sexta-feira, tentando reforçar a agenda positiva de sua administração.

No auditório da sede do Senai-Cimatec na capital baiana, a presidente foi recebida pela plateia com palavras de ordem em defesa de seu mandato, como “não vai ter golpe” e “no meu país eu boto fé porque ele é governado por mulher”.

Os argumentos em defesa do governo de Dilma encontraram eco nos discursos das autoridades. “Um país democrático, que respeita suas instituições, não aceita golpe de nenhuma natureza”, disse o governador Rui Costa.

Já a presidente qualificou como “insidiosa” o que chamou de “tentativa de se criar, no Brasil, a sensação de que quanto pior, melhor”. “Mesmo debaixo da imensa desfaçatez e intolerância que recaem em alguns momentos em Brasília, temos de tentar manter a serenidade”, disse. “Serenidade e vida saudável dão condições para enfrentar dificuldades. O que a vida quer da gente é coragem.”

Estando na Bahia, afirmou ainda que tem orgulho do que ela e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fizeram pelo Nordeste.

A presidente realizou uma apresentação da plataforma Dialoga Brasil, a primeira fora de Brasília, na qual foi anunciada a inclusão da cultura entre os temas debatidos no programa – os outros são educação, saúde, segurança pública e redução da pobreza. Participaram do evento cerca de 400 pessoas, entre representantes de movimentos sociais e de entidades de classe favoráveis à administração de Dilma, além de cinco ministros – Miguel Rossetto, da Secretaria Geral da Presidência, Arthur Chioro, da Saúde, Tereza Campello, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Juca Ferreira, da Cultura, e Jaques Wagner, da Defesa – além do governador baiano, Rui Costa (PT). A plataforma permite que o usuário dê sugestões às áreas do governo.

Empresários
Antes, em evento à fechado à imprensa, Dilma reuniu-se com 50 empresários baianos, de setores como as indústrias petroquímica, automobilística e de energia eólica, o varejo e o agronegócio, para apresentar projetos locais do Programa de Investimentos em Logística (PIL). Também integraram este encontro os ministros do Planejamento, Nelson Barbosa, da Agricultura, Kátia Abreu, e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Armando Monteiro.

O encontro entre Dilma e os ministros com os empresários realizado na Bahia foi o primeiro de uma série de eventos que deve percorrer no país nos próximos meses. O próximo está agendado para sexta-feira (21), em Recife (PE).

Vamos pra Rua


Ou o governo muda, ou o povo muda o governo, diz senador do PMDB

• Para o senador Romero Jucá, planalto está na UTI, mas impeachment não está maduro

Natuza Nery, Valdo Cruz – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Um dos principais representantes do empresariado no Congresso, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) faz um prognóstico pessimista para a economia este ano e diz que a situação vai "piorar a cada domingo" ao avaliar que as manifestações deste domingo (16) não serão o ápice do desgaste do governo.

Idealizador dos principais pontos da Agenda Brasil, pacote de medidas anticrise proposto pelo Senado, Jucá diz que o quadro de uma eventual deposição da presidente da República não está "maduro". Mas sentencia: "Ou o governo muda ou o povo muda o governo". E faz um alerta geral: "O governo está na UTI. Pelo amor de Deus, não racionem o oxigênio!"

Jucá é um dos investigados na Operação Lava Jato, que apura corrupção na Petrobras. Durante o primeiro mandato de Dilma Rousseff, ele foi afastado pela presidente da liderança do governo no Senado. Agora, ajudou a costurar as articulações que deram oxigênio à petista às vésperas dos protestos.

Folha - A Agenda Brasil foi lançada para corrigir o rumo do ajuste na economia feito pelo governo. É um atestado de erro da presidente?

Romero Jucá - Desde o início do ano que a gente coloca questões que consideramos vitais. A primeira é a forma equivocada como o governo iniciou esse processo de reconstrução da economia.

Como assim, equivocado?

Ao falar de corte, de aumento de impostos e de direitos sociais sendo retirados que, na verdade, não o eram, o governo começou a criar um ano depressivo. O governo tinha uma nuvem diante de si, estava entrando na tempestade. Não disse em quanto tempo ia sair dela para os agentes econômicos se planejarem, arrocharem o cinto, recolherem a bandeja. Botaram a culpa nas aeromoças. Com um agravante: o GPS deste avião estava danificado.

GPS danificado?

O GPS da condução política. Não previa a tempestade. O GPS mostrava que essas questões todas podiam se resolver facilmente e não previa as dificuldades com a tripulação (políticos), com os passageiros (população). Problemas foram subestimados.

Qual o resultado disso?

O que acontece quando a economia não sabe o que fazer? Planeja pelo pior. O empresário, ao não ter a previsibilidade, decide demitir o que puder, fechar o que puder.

Foi o que ocorreu?

E vai piorar. Não tenho dúvida. A arrecadação federal está caindo, a atividade econômica está caindo, os Estados estão começando a quebrar, os setores que ainda empregaram no primeiro semestre, como comércio e serviços, vão desempregar no segundo semestre, com a classe média com risco de desemprego. Então todo mundo vai ser o mais conservador possível.

Por isso começou a alinhar um pacote anticrise?

O primeiro sacrifício deveria ter sido do governo. Diminuir ministérios, consolidar e fundir empresas. Acabar com estatais ineficazes e juntar agências reguladoras. Não basta cortar R$ 70 bilhões, tem de mostrar corte na carne.

Quando sugeria mudanças, o que o ministro Joaquim Levy (Fazenda) dizia?

Que eu estava equivocado. Que precisava fazer o ajuste para depois ir para essas etapas. O problema é começar pelo sacrifício depressivo. Tem que ter o discurso da animação econômica. O governo partiu da premissa de que tinha de fazer uma recessão para a inflação cair. É um modelo econômico. Mas está dissociado do momento político.

O pacote é viável?

Tem pontos técnicos, estruturais e filosóficos. Nem tudo vai ser votado.

Dilma demorou muito a acordar para o problema?

O governo por um tempo achou que o ajuste fiscal, da forma como foi proposto, bastaria. Simplificou dificuldades. Não estão falando a língua da sociedade.

Quais os riscos?

Impeachment é consequência de falta de condição de governar. Ninguém é cassado pela vontade de A, B ou C dentro do Congresso. Para cair é preciso haver uma decisão do país. Essa decisão não está madura.

Pode chegar a isso?

Não tenho bola de cristal. Mas o quadro vai se agravar a cada dia com os remédios que estão sendo aplicados hoje.

O quadro é reversível?

Se ela se entender com a sociedade, sim.

E o fator Lava Jato?

Agrava porque fragiliza o governo e cria fatos negativos permanentemente. Todo dia estoura uma bomba diferente.

Há autores da Agenda Brasil, entre eles o sr., citados ou investigados. Isso não gera suspeita...

Toda investigação é legítima. Na democracia, o presidente pode ser investigado e o motorista, também. Há demérito em ser investigado? Não. Demérito é ser condenado, com provas contundentes de irregularidade. Vou votar a favor da recondução do [procurador-geral Rodrigo] Janot. O Senado não tem de retaliar nada.

A presidente está tutelada pelo PMDB hoje?

De forma nenhuma, mesmo porque o PMDB tem diversas posições. Eu sou de um PMDB independente, eu não votei nela por estas questões econômicas. Mesmo assim, ajudo quando acho que é importante para o país. Ou o governo dá um cavalo de pau radical ou ele não se sustenta. Mas tenho esperança. Para que existe UTI? Para reanimar o cidadão. O governo está na UTI. Pelo amor de Deus, não racionem o oxigênio! Porque depois vai morrer e aí não adianta, porque já passou a hora. Ou o governo muda, ou o povo muda o governo.

As manifestações de domingo vão ser um termômetro disto?
Não, não serão ainda, porque o quadro econômico e político vai se agravar cada dia mais. Cada domingo será pior, pois haverá mais pessoas chorando desemprego, lojas fechando, pessoas sem pagar o carnê na segunda, devendo cheque especial.

Governo não adiantará 13º de aposentados e pensionistas pela 1ª vez em 9 anos

• Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, avisou que não há recursos para o pagamento, o que provocou atrito com o ministro da Previdência, Carlos Gabas, e tensão em integrantes do governo, preocupados com o protesto marcado para o domingo

- Bernardo Caram e Célia Froufe - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Com o aperto das contas, o governo decidiu que não vai pagar em agosto o adiantamento do 13.º salário de aposentados e pensionistas do INSS. A medida, ainda não anunciada oficialmente, veio a público às vésperas das manifestações contra Dilma Rousseff, previstas para domingo.

A decisão foi tomada sob atritos entre os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e da Previdência Social, Carlos Gabas, que divergiam sobre o tema. Levy não quis assinar o pagamento. Com resultados fiscais ruins nos últimos meses, o ministro da Fazenda defendeu que não havia recursos disponíveis no momento para os repasses.

Apesar de não ser obrigatório, o adiantamento de 50% do valor do 13.º tem sido feito pelo governo desde 2006, após um acordo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com centrais sindicais. No ano passado, a Previdência transferiu R$ 13,9 bilhões para a antecipação para aposentados e pensionistas. 27 milhões de beneficiários receberam a antecipação.

Na avaliação de alguns integrantes do governo ouvidos pela reportagem, a decisão não foi em boa hora, já que vem dois dias antes dos protestos contra o governo Dilma previstos para o domingo.

Nesta semana, Gabas se reuniu com representantes de associações de aposentados e pensionistas. No encontro, demonstrou preocupação e disse que estava quase convencido de que o pagamento não seria feito neste mês. Ele teria garantido que daria um retorno por escrito até esta sexta-feira.

Segundo o Sindicato Nacional dos Aposentados, que participou da reunião com Gabas, nenhuma resposta foi dada e nenhum representante do ministério atendeu ligações nesta sexta-feira. “Acho que eles não queriam divulgar essa informação hoje (sexta)”, disse João Inocentini, presidente do sindicato.

Inocentini ressaltou que os aposentados costumam tomar crédito ou fazer compras já contando com o adiantamento. “Vai ser um caos”, afirmou. Segundo ele, o sindicato tem audiência agendada para segunda-feira com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. No encontro, será feita uma consulta sobre possíveis ações judiciais para garantir o pagamento.

Terreno preparado. Na opinião do advogado da Associação Brasileira de Apoio aos Aposentados, Pensionistas e Servidores Públicos (ASBP), Evaldo Oliveira, o aumento de 30% para 35% no limite do crédito consignado feito em julho pelo governo foi uma forma de preparar o terreno para que o adiantamento do 13.º não fosse feito.

“Foi preparado não para resguardar o bolso da categoria, mas para proteger o setor bancário quanto à inadimplência”, disse Oliveira. “Para que os aposentados e pensionistas venham utilizar essa margem para saldar dívidas contraídas junto às instituições de crédito.”

O Ministério da Fazenda tenta encontrar uma solução para o problema ainda este mês. Pela lei, o pagamento do benefício deve ser feito até o fim do ano, sem impedimento para que seja feito de forma integral em um único mês.

Efeitos. A poupança também deverá ser afetada e agravar seu progressivo esvaziamento. De janeiro a julho, a caderneta teve R$ 41 bilhões a mais de saques do que depósitos por causa do baixo rendimento e da piora do mercado de trabalho.

Os depósitos que ainda são feitos na caderneta nos últimos tempos têm vindo da parcela de recursos extras de trabalhadores e aposentados. O grosso das aplicações tem sido concentrado no último dia do mês, quando muitas recursos que sobram na conta corrente vão automaticamente para a poupança.

Tradicionalmente, agosto é mais fraco para a poupança na comparação com mês anterior. Julho é um período em que muitos trabalhadores tiram férias e podem receber adiantamento do 13.º salário, além dos demais benefícios.

Há, portanto, mais chances de sobra dos rendimentos para investimento. Com a situação crítica da caderneta, o quadro tende a piorar. Em julho, o volume de resgates foi R$ 2,5 bilhões maior do que o de aplicações. Nos primeiros 10 dias deste mês, o resultado já está negativo em R$ 2,3 bilhões.

A falta desses recursos da poupança atingiu diretamente duas áreas importantes de crédito: o imobiliário e a agricultura.