domingo, 20 de dezembro de 2015

Dora Kramer: E o vento pode levar...

- O Estado de S. Paulo

Visto assim do alto, o cenário melhorou consideravelmente para a presidente Dilma Rousseff do início para o fim da semana passada. O governo fez valer quase todas as suas teses no Supremo Tribunal Federal, viu a Procuradoria-Geral pedir o afastamento de Eduardo Cunha e conseguiu firmar acordo de proteção com o presidente do Senado, Renan Calheiros.

Olhadas no detalhe, contudo, as vitórias podem não ser tão vantajosas quanto parecem à primeira vista. Em primeiríssimo lugar está a perda do discurso de que o impeachment equivale a um golpe de Estado. Não bastasse o escrito na Constituição para convencer os renitentes, a palavra do Supremo serviu para desmascarar os petulantes engenheiros da obra falsa.

Todo o País pôde acompanhar, voto a voto, ministro a ministro, em minúcias a exposição dos argumentos legais que estabeleceram o rito do processo do impeachment. Portanto, com o STF, o governo não poderá contar em caso de aprovação do afastamento pelo Congresso. A Corte examina a constitucionalidade das questões e esta, no caso, não esteve em questão. Logo, constitucional é.
Desdobrando as decisões tomadas naquela sessão de quinta-feira última, tomemos o voto em aberto e a necessidade de o Senado corroborar decisão da Câmara por maioria simples.

É fato que a escolha secreta favorece traições, porque serve de biombo aos infiéis temerosos.

Com pureza d’alma, é de se perguntar: nesta e na altura em que for apreciado o impeachment, quantos têm razão para temer um governo que não tem condições para reagir contra ninguém? Precisa, antes, agir a favor de si. E se vier uma nova derrota, ainda que por margem mais apertada que a anterior, desta vez aberta ao escrutínio público. Prejuízo bem maior a ser contabilizado.

Sobre a maioria simples exigida no Senado, os números falam por si. Para aprovar, a Câmara precisa de 342 (dois terços) dos 513 deputados e, para não arquivar, basta a maioria simples dos presentes no plenário. Em tese, 21 senadores, caso estejam presentes apenas os 41 necessários para abrir a sessão.

Há a suposição de que o ânimo governista dos senadores possa garantir um número bastante expressivo de presença para elevar o quórum e que a posição do presidente da Casa baste para que a presidente garanta o arquivamento. Pode acontecer, de fato. Mas é preciso lembrar que a fidelidade de Renan Calheiros guarda semelhança com uma mercadoria, cujo preço pode ser alterado ao sabor dos acontecimentos.

Outra vitória atribuída ao governo seria a volta do deputado Leonardo Picciani à liderança do PMDB. Picciani, por óbvio, não unifica a bancada e, além disso, seu mandato acaba em fevereiro. Na volta do recesso, o partido terá de escolher um novo líder. E o fará sob a égide da circunstâncias em que estiver envolvido o PMDB. Circunstâncias estas que podem ou não ser favoráveis ao Planalto.

Por fim, e não menos importante, o pedido da Procuradoria-Geral da República pelo afastamento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Na superfície, parece que quanto Cunha for mais fraco, mais forte Dilma será.

Volver. Tem gente referida no auto engano. Gente crente que a situação do País se resolve com uma conversa entre Lula e FH. Não é assim. Talvez não esteja em Michel Temer a solução. É possível que tudo seja mais simples, mas é provável que seja mais complicado e irremediável.

Entre outros motivos porque Nelson Barbosa no comando formal do Ministério da Fazenda significa a retomada de uma política que comprovadamente não deu certo, embora seja da preferência da presidente, cujas escolhas erradas deram no que deu.

Hélio Schwartsman: Próceres da República

- Folha de S. Paulo

É precisa a análise que Eduardo Cunha faz das movimentações do governo, nem todas confessáveis, para salvar o mandato de Dilma Rousseff. São irretocáveis as explicações que a esquerda dá para as decisões, muitas das quais transcendem os limites da cara de pau, de Cunha à frente da Câmara. Como escreveu François de La Rochefoucauld, "a opinião que nosso inimigo tem de nós está mais perto da verdade do que a nossa própria".

Vivemos tempos que tornam tentadora a solução argentina do "que se vayan todos!". No plano ético, talvez seja isso mesmo, com a ressalva de que deve existir uma ou duas dúzias de pessoas honestas atuando na política. A Operação Lava Jato já comprometeu PT, PMDB e PP e levantou suspeitas sobre representantes dos principais partidos do país, incluindo os oposicionistas PSDB e DEM.

A questão é que nem só de ética vive o ser humano. Enquanto o anarquismo permanecer um sonho distante, precisaremos de um governo, que será necessariamente constituído com o material humano de que dispomos. O dilema que se coloca, então, é definir se, no plano pragmático, vale a pena tirar Dilma para colocar Michel Temer em seu lugar.

Numa primeira análise, pode parecer que sim. Se Dilma não conseguiu até aqui conduzir uma agenda de salvação da economia, é pouco provável que tenha sucesso mais adiante, já que a crise só a enfraquece politicamente. O problema é que um eventual governo Temer não seria muito diferente.

Se a hipotética gestão ganharia apoio de setores da oposição, provaria também a sanha de um PT ferido e de movimentos sociais que não teriam mais pruridos em convocar greves e protestar contra reformas que serão para tirar benefícios e não dá-los. De resto, a espada da Lava Jato continuaria pairando sobre os próceres da República, que poderiam, como agora, acordar com a PF à porta. Essa crise, com ou sem impeachment, ainda dura.

Luiz Carlos Azedo: Supremas contradições

• O STF tornou mais difícil, mas sepultou a tese petista de que impeachment é golpe, pois não revogou a decisão do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de iniciar o processo de impedimento de Dilma.

- Correio Braziliense

A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), na decisão que emparedou a Câmara dos Deputados e deu superpoderes ao Senado para decidir sobre o afastamento da presidente Dilma Rousseff do cargo, até que seja julgado o seu pedido de impeachment pelos senadores, exumou velhas teses federalistas de James Madison (1751-1836), um dos pais da democracia norte-americana. Ele tinha verdadeira ojeriza à Câmara dos Deputados e atribuía ao Senado o papel de guardião da federação.

Bem que o ministro-relator, Luiz Edson Fachin, em parecer antológico, tentou preservar as prerrogativas da Câmara, ao resgatar a jurisprudência firmada por ocasião do impeachment do ex-presidente Collor de Mello e a lei do impeachment, de 1950. Mas já havia tirado o gênio da garrafa ao acolher a liminar do PCdoB que questionava o rito adotado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Fachin organizou a oposição a si próprio ao provocar o Ministério Público Federal, a Advocacia-Geral da União e o Senado, além de distribuir seu voto com antecedência aos pares, que acabou vazando.

O ministro Luís Roberto Barroso, que contestou o parecer de Fachin e liderou a maioria da Corte ao reformar as atribuições da Câmara, uma questão crucial para a relação entre os poderes, avocou para o Supremo Tribunal Federal (STF) um papel reformador de caráter mais iluminista do que democrático; e mudou a hierarquia do Congresso, subordinando a Câmara ao Senado, no qual a representação de São Paulo (31,9 milhões de eleitores), por exemplo, é igual à de Roraima (299 mil eleitores). A Câmara representa o povo; o Senado, os estados.

O STF reformou o regimento interno da Câmara ao determinar a formação de uma comissão biônica para apreciar a admissibilidade do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Indicada pelos líderes, será homologada à moda soviética pelos 513 deputados, com voto aberto e não secreto, como era de praxe nas eleições do Congresso. Se a maioria do plenário da Câmara rejeitar a chapa oficial, a comissão será eleita pela minoria? Ou não será instalada comissão alguma? Mesmo assim, o STF tornou mais difícil, mas sepultou a tese petista de que impeachment é golpe, pois não revogou a decisão do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de iniciar o processo de impedimento de Dilma.

Iluminismo
Montesquieu dizia que o Judiciário é o mais fraco dos poderes e atribuía aos monarcas o papel de poder moderador, para que houvesse equilíbrio entre os demais poderes nos regimes parlamentaristas. Coube aos “federalistas” norte-americanos resolver essa equação nos regimes republicanos. Enquanto Alexander Hamilton (1755-1804) pregava a independência integral das cortes de justiça para que pudessem defender a integridade de uma Constituição limitada contra eventuais violações por “atos legislativos”, Madison fazia severas restrições à Câmara dos Deputados. Dizia que seus membros “serão recrutados naquela classe de cidadãos que gozam de menos simpatia na massa do povo e são mais propensos a defender o sacrifício de muitos em proveito de poucos”.

Indagava: “Quem serão os eleitores dos deputados federais? Não os ricos mais do que os pobres, os letrados mais do que os ignorantes; não os orgulhosos herdeiros de nomes famosos mais do que os humildes filhos de obscuras e desafortunadas famílias. O eleitorado será constituído pela grande massa do povo (...)”. Madison defendia a existência do Senado para neutralizar as pressões da opinião pública: “Há determinadas ocasiões nos assuntos públicos em que o povo, estimulado por alguma paixão anormal ou vantagem ilícita, ou ainda iludido por embustes ardilosos de pessoas interessadas, possa clamar por medidas que, mais tarde, ele será o primeiro a lamentar e condenar”.

O raciocínio serve para o impeachment de Dilma, mas, convenhamos, também vale para a reeleição da presidente da República. Voltemos, porém, a Madison: “Nesses momentos críticos, quão salutar será a interferência de um grupo de cidadãos moderados e respeitáveis, a fim de deter a orientação errada e evitar o golpe preparado pelo povo contra si mesmo, até que a razão, a justiça e a verdade retomem sua autoridade sobre o espírito público!”

Parece que Madison baixou no terreiro, porém, no país da jabuticaba, esse “americanismo” é uma ideia fora de lugar. Não temos Constituição enxuta, direito anglo-saxão e sistema bipartidário secular. Além disso, a cúpula do Senado está muito mais envolvida no escândalo da Lava-Jato do que as lideranças da Câmara, embora seu presidente, Eduardo Cunha, esteja se afogando na lama. Por fim, recentes decisões do próprio STF sobre a legislação eleitoral e partidária facilitaram a fragmentação fisiológica e patrimonialista do sistema partidário.

Elio Gaspari: Difícil mesmo é começar a governar

- O Globo

Quando a doutora Dilma foi reeleita, ela tinha uma crise econômica no forno, um ministro da Fazenda (Guido Mantega) demitido pela televisão e outro que, convidado, não aceitou (Luiz Carlos Trabuco). Contentou-se com Joaquim Levy, companheiro de Trabuco no Bradesco. Passou-se um ano, ele vai embora, e todos os indicadores mostram que a crise piorou, devendo piorar mais.

Ao contrário das crises anteriores, quando houve alguma influência de fatores externos, como altas súbitas do preço do petróleo, a encrenca saída do comissariado petista é um legítimo produto nacional. Foi produzida em Pindorama, pelo governo brasileiro. Pode-se dizer que suas origens estavam em políticas equivocadas, como a fantasia do "campeões nacionais" ou meros truques, como as pedaladas fiscais. A ruína de 2015 nem a isso se deve. Houve nela o ingrediente adicional da falta de governo. O PT atirava em Levy, que atirava na política do primeiro mandato da doutora. Ambos acertaram na patuleia, produzindo desemprego e inflação. A unção de Nelson Barbosa significa apenas que a doutora livrou-se de Levy e ele dela.

Contra falta de comando não há remédio. A crise da Década Perdida só acabou quando Itamar Franco entregou o leme da economia (e do governo real) a Fernando Henrique Cardoso. Durante todo o mandarinato de Guido Mantega, a doutora Dilma foi ministra da Fazenda e seu leal companheiro acabou pagando o pato. Com a saída de Levy, o jogo volta ao ponto de partida.

Em menos de uma semana, a inevitabilidade do impedimento da doutora foi afastada pela rua e pelo Supremo Tribunal Federal. Uma parte do tucanato já sonhava com uma partilha de ministério no governo de Michel Temer mas, na melhor das hipóteses, a festa ficou para depois. O Planalto tem o hábito de superestimar seus êxitos, subestimando suas dificuldades. A parte que lhe cabe no latifúndio da crise é sua inação. Não há melhor exemplo disso que sua perplexidade diante da epidemia do zika. Alguém poderia presentear a doutora com uma gravação de Maria Moita, de Carlos Lyra:

"Vou pedir ao meu Babalorixá
Pra fazer uma oração pra Xangô
Pra pôr pra trabalhar gente que nunca trabalhou".

Dois mistérios das petrorroubalheiras
Se não bastassem a extensão e os assombros produzidos pela Lava Jato, na semana passada um auditor da Receita Federal informou que, graças a uma "medida judicial engendrada", sumiram dois navios-sonda do grupo Schahin, avaliados em US$ 400 milhões.

Em outubro, esses dois navios operavam no litoral e foram levados por tripulações desembarcadas no Brasil. Foram ao mar amparados em decisões da Justiça de São Paulo e de Macaé. Segundo a Receita, os navios eram de empresas da Schahin no exterior. Segundo os beneficiários das ordens judiciais, os barcos pertenciam a credores da Schahin. Um belo caso para o Ministério Público e a Polícia Federal dizerem o que de fato aconteceu.

Num segundo mistério, reapareceu a fornecedora de equipamentos holandesa SBM. Sabe-se que os pixulecos milionários da SBM antecederam as investigações brasileiras. Ela caiu na Lava Jato e seus negócios com a Petrobras foram suspensos ainda ao tempo da doutora Graça Foster. Agora o Ministério Público do Rio de Janeiro acusa a SBM de pagar US$ 42 milhões em propinas a diretores da Petrobras num esquema que nasceu em 1997.

Nada de novo, mas até hoje não se entendeu por que o doutor Aldemir Bendine disse o seguinte, pouco depois de assumir a presidência da empresa: "Talvez você pegue uma SBM, que é uma importante fornecedora, mas que a gente vê caminhando para uma solução".

Sem pilotos
Numa conta conservadora, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, deixou o governo há pelo menos dez dias. Essa pedra estava cantada há meses.

O que ninguém poderia esperar é que o doutor Alexandre Tombini, presidente do Banco Central, entrasse em órbita mantendo-se na cadeira.

Diante do rebaixamento dos créditos brasileiros pela agência de risco Fitch, ele informou que a providência já era esperada. Esperada, era, mas se tudo o que o presidente do Banco Central tem a dizer é semelhante platitude, confirma-se que o deputado Tiririca estava errado: pior, fica.

Mais Datafolha
Uma nova revelação da pesquisa do Datafolha feita na avenida Paulista no domingo passado:

Ouvindo 1.351 pessoas ela encontrou uma percentagem de 15% de empresários e 8% de profissionais liberais. Jogo jogado. Os desempregados, contudo, eram 4%.

Em fevereiro deste ano, o índice de desempregados que buscavam trabalho em São Paulo estava em 7% e pode-se supor que tenha aumentado.

Disso resultam duas informações, boas e más, intercambiáveis, tanto para a doutora Dilma quanto para quem quer a sua destituição:

1) Os desempregados não foram para a rua, apesar da manifestação ter ocorrido num domingo.

2) Os desempregados ainda não foram para a rua.

Pirata do papagaio
O deputado Eduardo Cunha inovou o cerimonial de suas entrevistas num salão da Câmara. Era comum que aparecessem à sua volta os indefectíveis papagaios de pirata.

Cunha faz-se escoltar por um guarda-costas capaz de meter medo até mesmo em quem o vê pela televisão.

Operação recesso
Os çábios acreditam que durante o recesso terão tempo para trabalhar pelas bordas algumas deserções na bancada que segue a flauta mágica de Eduardo Cunha.

Se tivessem feito isso há um ano, talvez tivessem conseguido um candidato estranho ao PT para derrotá-lo na disputa pela presidência da Câmara.

Números paulistas
A Secretaria de Segurança do tucano Geraldo Alckmin tem um problema com os números.

Há poucas semanas os repórteres Lucas Ferraz e Rogério Pagnan mostraram que pelo menos 31 mortes atribuídas a policiais militares em agosto e setembro desapareceram de suas estatísticas. Explicando-se, a Secretaria informou que 23 mortes relacionadas com uma chacina ficaram fora da estatística porque faltavam informações nos boletins de ocorrência. Vá lá.

Às 21 horas de quarta-feira, a mesma secretaria informava que na manifestação de apoio à Dilma havia 3.000 pessoas.

No dia seguinte, corrigiu-se informando que, segundo a PM, os manifestantes foram 50 mil. Explicando a discrepância, disse que "o registro de 3.000 manifestantes refere-se ao início da manifestação". Como a mobilização começou no início da tarde, faltou explicar porque foi repetida às 21 horas.

Não saber contar é coisa que pode acontecer, divulgar explicações desse tipo são uma ofensa à inteligência alheia.

Surpresa
Investidores internacionais que estão de olho na liquidação de empresas brasileiras lidam com um novo dado. Para eles a Lava Jato deixará cicatrizes tão profundas na cleptocracia nacional que o país ganhará competitividade no item do combate à corrupção.

Bernardo Mello Franco: Descartado do folhetim

- Folha de S. Paulo

A dois dias de entregar o cargo, o agora ex-ministro Joaquim Levy reclamou do noticiário de que deixaria a Fazenda. "Eu continuo alheio a este folhetim", desdenhou. Na sexta, veio a confirmação: Levy está fora do governo.

As especulações sobre a iminente queda do ministro se tornaram tão comuns que deixaram de ser levadas a sério na capital. Levy colaborou ativamente com a novela, ao ameaçar sair a cada vez que era contrariado pelo Planalto ou pelo Congresso.

Segundo ex-auxiliares, o economista escreveu ao menos duas cartas de demissão, sem tirá-las do bolso. Preferiu ficar, sentindo-se recompensado por elogios públicos da chefe.

Doutor pela escola liberal de Chicago, Levy era um estranho no ninho dilmista. Encarnava a fé religiosa no ajuste fiscal e no Estado mínimo, comungada pelo mercado financeiro e blasfemada pela esquerda que elegeu e reelegeu a presidente.

Numa narrativa folhetinesca da economia, desempenhava o papel de infiltrado tucano no governo petista. O economista Armínio Fraga, ex-candidato a ministro de Aécio Neves, chegou a descrevê-lo como um espião da CIA na direção da KGB.

Levy não foi o único a mudar de lado. Ao bancar sua receita amarga, que incluiu cortes sociais, Dilma rasgou o programa de 2014. Com razão, foi acusada de estelionato eleitoral.

Nos 347 dias em que ficou no cargo, o ministro não conseguiu cumprir o que prometeu. Anunciou uma "travessia" para o crescimento, mas só entregou recessão; vendeu prestígio no exterior, mas assistiu ao rebaixamento do país nas agências de risco. Agora deve voltar à banca, único setor que continuou a lucrar na crise.

Os roteiristas da novela econômica se dividem entre os que culpam Levy pelo fracasso e os que dizem que ele foi vítima de boicote. O desenvolvimentista Nelson Barbosa ainda não assumiu seu lugar, mas os porta-vozes do mercado já começaram a escrever o novo folhetim. A ele, parecem ter reservado o papel de vilão.

Míriam Leitão: O ministro ideal

- O Globo

O ministro da economia ideal é aquele que aceita o convite, conversa com o governante de forma clara sobre os limites do seu poder e já assina a carta de demissão. Com ela no bolso, trabalhará sabendo que pode entregá-la ao chefe a qualquer momento. A carta evitará o apego ao cargo e ajudará o ministro a manter o foco no que é relevante para as suas funções e o país.

Foi assim que num dia de agosto de 1979 o ministro Mário Henrique Simonsen entregou o cargo a um presidente de ceroulas na Granja do Torto. João Figueiredo estava nesta vestimenta quanto foi receber Simonsen, que chegara de forma inesperada em sua residência. O ministro entregou a carta que era tão irrevogável que ele já havia chamado o caminhão de mudança. Foi pelo caminhão que a imprensa soube que o ministro estava deixando o governo, depois de passar oito meses sendo bombardeado pelo então ministro da Agricultura, Delfim Netto, desejoso de voltar ao comando. Delfim assumiu o Planejamento — que naquele momento tinha o maior poder —, manteve na Fazenda um ministro que aceitou ser seu subordinado e comandou a desastrosa política econômica do governo Figueiredo.

Ministro da Fazenda tem que saber que será atacado por todos os outros. É da natureza do cargo. Ele terá de zelar pelo equilíbrio das contas públicas e todos os outros vão querer políticas que favoreçam seus setores. Não pode então ser sensível. Terá que ouvir críticas em silêncio e seguir seu caminho, mas não pode transigir em decisões tomadas em sua área sem ouvi-lo. Quando acontecer, aquela carta que fica no bolso, ou na bolsa, deverá ser entregue.

Houve um dia em que o ministro Pedro Malan estava ao lado de Clóvis Carvalho num evento público. O ministro Clóvis Carvalho, chefe da Casa Civil, e homem de confiança do presidente Fernando Henrique, criticou a política econômica. Malan ouviu em silêncio e ao falar não deu demonstrações de que tivesse ouvido. Nada comentou com os insistentes jornalistas. Guardou silêncio até que o presidente Fernando Henrique demitiu Clóvis Carvalho. Não é que um ministro da Fazenda não possa ser contrariado, é que ele tem que ter noção de quando o essencial está em jogo. No essencial, não dá para transigir.

Ministro ideal de um presidente que está sob a ameaça de ser removido do cargo, em um processo de impeachment, é aquele que foca no que é fundamental de sua função pública. Era este o ambiente em 1992 no Brasil. O ministro Marcílio Marques Moreira tomou duas decisões. Primeiro, brigou para que o dinheiro que o Plano Collor havia sequestrado dos brasileiros fosse entregue aos seus donos. Não houve postergações. O dinheiro foi devolvido em parcelas, mas emagrecido. Cumpriu-se, no entanto, a promessa. Em um segundo momento, o ministro se descolou do presidente declinante. Com Celso Lafer, das Relações Exteriores, e Celio Borja, da Justiça, fez um cordão de isolamento que foi uma espécie de núcleo ético em um governo que seria meses depois deposto.

Foco na função pública, intransigência no essencial e carta no bolso, eis três características do ministro ideal. Seria simples, não fosse a natureza humana que às vezes encanta-se com os rapapés do posto. Ministro ideal é aquele que sabe que não vai salvar o mundo, nem mesmo o Brasil, mas apenas, se for competente, o Tesouro. Parece pouco, mas a tarefa é um teste de longa resistência.

Ministro ideal conhece todas as formas de dizer a palavra “não”. Muito lhe será pedido, pouco será no interesse geral. Os pleitos são sobre que bocado do dinheiro coletivo vai para que grupo específico. O ministro, ao se sentar na cadeira, deve esquecer os amigos, perdoar os inimigos e ignorar os que se apresentam como amigos do rei.

Por fim, ministro ideal não pede demissão, nem se deixa demitir, na sexta-feira. Neste dia da semana, os jornalistas fazem algo que chamamos com o exótico nome de “pescoço” e que em língua de gente significa antecipar o fechamento do jornal de domingo. Ou seja, há muito trabalho. Mas só essa reivindicação já mostra como a tendência, diante do ministro da Fazenda, é fazer algum pedido setorial. Deve, portanto, ignorar este último parágrafo e sair no dia e hora que aquela carta precisar ser entregue.

Samuel Pessôa: Barbosa na Fazenda

- Folha de S. Paulo

Joaquim Levy saiu do Ministério da Fazenda, e Nelson Barbosa assume a pasta. A nota positiva da troca de guarda na Fazenda é que ela restaura a vontade das urnas.

O ministro Levy sai porque não conseguiu construir um caminho que garantisse em horizonte razoável —de dois a três anos— que a trajetória da dívida pública se estabilizasse. Para que haja esta estabilização, é necessário haver superavit primário na casa de 3% do PIB. Assim, o ministro Levy falhou na tarefa de construir esse superavit.

Evidentemente, como tem afirmado meu amigo Marcos Lisboa, ajuste fiscal dessa magnitude não é tarefa do Ministério da Fazenda. É necessário que toda a Esplanada dos Ministérios esteja empenha- da nesse objetivo e que o Executi- vo consiga construir uma base de sustentação no Congresso Nacional que dê suporte às diversas medidas que ataquem nosso desequilíbrio estrutural, isto é, as regras que condicionam um crescimento vegetativo do gasto público em ritmo mais rápido que o produto da economia. Adicionalmente, é necessário suporte a medidas que aumentem a carga tributária.

Em vista do enorme estelionato eleitoral praticado pela presidente, dos desdobramentos da Operação Lava Jato entre os políticos e das cicatrizes da campanha eleitoral, que inviabilizaram qualquer conversa mais produtiva com a oposição, a tarefa legislativa necessária para a construção de um superavit primário que estabilize a dívida pública ficou impossível.

Para complicar todo o quadro, o buraco fiscal que se apresentou em 2015 foi de 1 a 1,5 ponto percentual do PIB maior do que as piores estimativas que tínhamos na virada de 2014 para 2015.

Trabalho demais para um governo fraco, no final de longo ciclo de um grupo político que ganhou a eleição à custa de muita mentira.

Apesar de a ida de Barbosa para a Fazenda restituir a verdade das urnas, isso não significa que o governo resolveu alterar a política econômica. Houve tentativas de outros nomes. Parece que a incapacidade de construir uma equipe econômica qualificada representa sinal de desorganização e total incapacidade de governo.

Difícil imaginar os próximos passos. No front inflacionário, as notícias são terríveis. A prévia da inflação deste mês —o IPCA-15 de dezembro— veio acima do que se esperava e a inflação acumulada no ano aproxima-se de 11%. Os núcleos e a difusão vieram muito fortes.

Tudo sugere que a inércia do processo inflacionário brasileiro atingiu novo patamar. É possível divisar forte estagflação em 2016, com a atividade recuando 3%, a inflação acima de 8% e o desemprego atingindo 12% a 13% no fim do ano.

O ciclo de crescimento da década passada terminou. As escolhas de política econômica de 2009 até 2014 colocaram em xeque a geração de emprego e renda. A recessão que se iniciou no segundo trimestre de 2014 continuará conosco em 2016.

O trabalho de década e meia de arrumação de casa foi destruído nos seis anos da nova matriz econômica, também de responsabilidade de Nelson Barbosa. A geração que viveu a esperança de um Brasil como nunca antes na história deste país reencontra a sina do fracasso. Para quem vivenciou o governo Sarney, não haverá novidades.

O lado social da crise – Editorial / O Estado de S. Paulo

Para milhões de brasileiros, este não será um fim de ano tranquilo. E não surgem no horizonte sinais de que o começo do novo ano será melhor. A crise se acentua à medida que se estende a agonia de um governo cada vez mais impopular e paralisado por sua própria incompetência para tomar as decisões de que o País necessita. Os dados econômicos que acabam de ser divulgados compõem um cenário sombrio e deles se destaca um que dá ideia do impacto social da crise política, econômica e moral em que o governo do PT lançou o País. Nada menos do que 945.363 postos de trabalho no mercado formal – com carteira assinada e garantias trabalhistas e previdenciárias – foram fechados neste ano até o fim de novembro.

Em 12 meses, 1.527.463 trabalhadores foram demitidos, de acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho e Emprego, abastecido regularmente com informações que as empresas são obrigadas a enviar para o governo. Uma comparação com a evolução do desemprego no mês de dezembro nos últimos anos, porém, fortalece a previsão de que, neste ano, o número de demitidos de empregos formais no País chegue perto de 1,7 milhão.

Eles se juntarão aos que já tinham perdido emprego ou não o encontravam, tanto no mercado formal como no informal, e que, no trimestre encerrado em agosto, totalizavam 8,8 milhões de pessoas, segundo o levantamento mais amplo disponível sobre o mercado de trabalho no País, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua, do IBGE. São as vítimas diretas da aventura populista imposta ao País nos últimos 13 anos e que agora cobra seu preço, e o faz diretamente daqueles que o PT sempre disse proteger: os trabalhadores.

A perda causada pelo desastre petista não é apenas quantitativa. É também qualitativa. O desemprego é mais acentuado na indústria de transformação, que nos 12 meses até novembro fechou 590.731 vagas. Eram vagas que requerem maior habilitação e, por isso, oferecem em média remuneração melhor. A construção civil, por sua vez, demitiu 447.728 trabalhadores, como consequência da paralisia das obras públicas e da retração do mercado imobiliário.

Consequência óbvia do corte do emprego na indústria é a redução da folha de pagamento do setor, como constata há um bom tempo a Pesquisa Industrial Mensal: Emprego e Salário do IBGE. Em outubro (último dado disponível), a folha de pagamento real da indústria era 10,3% menor do que a de um ano antes. Há 17 meses consecutivos a folha salarial real vem caindo nessa forma de comparação.

Com desemprego em alta, renda em queda, investimentos privados contidos e investimentos públicos que um governo paralisado pela ameaça do impeachment da presidente da República não consegue tirar do papel, o resultado não poderia ser diferente do aferido pelo Banco Central com seu indicador mensal Índice de Atividade Econômica (IBC-Br), considerado uma antecipação do desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) aferido pelo IBGE. Em outubro, o IBC-BR registrou queda de 0,6% em relação a setembro. Em 12 meses, a queda foi de 3,2%. Para o ano, as projeções de instituições privadas é de que o PIB encolha de 3,5% a 4%.

A maioria dessas projeções sugere que a crise continuará a se aprofundar pelo menos até o fim do primeiro semestre do ano que vem, para só então começar um lento processo de reversão. Mesmo que essa reversão ocorra, porém, o resultado acumulado de 2016 deverá ser novo encolhimento do PIB, talvez um pouco menos do que em 2015.

E tudo isso ocorrerá num ambiente de aceleração dos preços. A última medida da inflação divulgada pelo IBGE, o IPCA-15, registrou alta de 1,18% em dezembro, bem maior do que a de novembro, de 0,85%. Com isso, a alta desse índice, que baliza a política de meta inflacionária, em 2015 já alcança 10,71%, bem mais do dobro da meta de 4,5%. Pode haver uma pequena desaceleração dos preços que compõem o grupo Alimentação e Bebidas do IPCA, mas nada que mude de maneira sensível um cenário desolador.

Manuel Bandeira: O Bicho

Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.

O bicho, meu Deus, era um homem.

Maria Rita: Bandeira Branca

sábado, 19 de dezembro de 2015

Opinião do dia: Miguel Reale Junior

Está sendo praticado um ativismo de altíssimo grau no STF. O Supremo Tribunal Federal não está contente em julgar e quer legislar. Como pode uma maioria simples do Senado destituir uma maioria de dois terços da Câmara dos Deputados? O artigo 51 da Constituição diz que compete privativamente à Câmara, por dois terços dos votos, instaurar o processo (de cassação da presidente da República). Achei a decisão estranha. O STF entrou em um campo de normatizar o que já está previsto na Constituição.

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Miguel Reale Junior, um dos autores de pedido de impeachment, entrevista em O Estado de S. Paulo, 19.12.2015.

Lula atribui a Dirceu indicação de diretores para a Petrobrás

• À Polícia Federal, ex-presidente afirmou que 'processo de escolha não contava com sua participação'

Por Beatriz Bulla e Gustavo Aguiar – O Estado de S. Paulo

O ex-presidente Lula atribuiu a José Dirceu, ex-ministro chefe da Casa Civil do seu governo, responsabilidade pela indicação de diretores da Petrobrás. Em depoimento à Polícia Federal na quarta-feira, 16, Lula disse que “cabia à Casa Civil receber as indicações partidárias e escolher a pessoa que seria nomeada”.

Dirceu chefiou a Casa Civil durante parte do primeiro mandato do petista, entre 2003 e 2005, quando estourou o escândalo do mensalão – Dirceu foi condenado a 7 anos e onze meses de prisão no mensalão e está preso desde 3 de agosto como alvo da Operação Lava Jato, que desmontou esquema de propinas na estatal petrolífera.

Investigadores já suspeitavam que Dirceu havia indicado o engenheiro Renato Duque – preso da Lava Jato desde março – para a Diretoria de Serviços da estatal petrolífera. Mas Dirceu sempre negou. “Que o nome de Renato Duque foi levado à Casa Civil da Presidência da República, à época chefiada por José Dirceu”, disse Lula à PF.

O ex-presidente disse que “não sabe se foi o PT ou outro partido politico que indicou Renato Duque para assumir a Diretoria de Serviços”. Afirmou que “não conhecia Renato Duque e que não participou do processo de escolha do nome de Renato Duque”.

Sobre o ex-diretor da Área Internacional da Petrobrás, Nestor Cerveró, que também foi preso na Lava Jato e já está condenado a 17 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, o ex-presidente disse. “Que acha que Nestor Cerveró foi uma indicação politica do PMDB; que Nestor Cerveró era um funcionário de carreira da Petrobrás.”

Lula eximiu-se de qualquer responsabilidade na indicação dos diretores da Petrobrás. Ele afirmou que “o processo de escolha dos nomes dos diretores não contava com sua participação”.

“Que o declarante recebia os nomes dos diretores a partir de acordos políticos firmados; que este processo de acordos políticos era feito normalmente pela ministro da área, pelo coordenador politico do Governo e pelo partido interessado na nomeação; que teve vários coordenadores políticos ao longo de seus oito anos de mandato; que pode citar Tardo Genro, Jacques Wagner, Alexandre Padilha, Aldo Rebelo, etc; que não se recorda qual destes articuladores políticos tratou das nomeações de Renato Duque e também de Nestor Cerveró.”

Sobre outro ex-diretor que a Lava Jato pegou – Paulo Roberto Costa (Abastecimento) -, o ex-presidente disse que ‘seu nome foi apresentado pelo Partido Progressista’. “Como nos demais, o nome de Paulo Roberto Costa foi levado à Casa Civil para deliberação e posterior e posterior nomeação pelo declarante; que os nomes dos indicados pelos partidos não eram levados diretamente ao declarante; que, como explicado, o processo de • escolha passava pela discussão com os diversos envolvidos no aspecto politico e não somente com o ministro-chefe da Casa Civil; que, ao final deste processo, o declarante concordava ou não com o nome apresentado, a partir dos critérios técnicos que credenciavam o indicado.”

A PF quis saber de Lula se ele conversou com o ex-deputado José Janene (PP/PR, morto em 2010) sobre a indicação de Paulo Roberto Costa para assumir a Diretoria de Abastecimento da Petrobrás – Janene é apontado como o mentor do esquema de corrupção que se instalou na Petrobrás. O ex-presidente disse que ‘nunca conversou’ com Janene ‘a respeito de qualquer assunto’.

Lula também afirmou que nunca tratou com os deputados Pedro Henry e Pedro Corrêa sobre a indicação de Paulo Roberto Costa. “Nunca tratou com qualquer liderança de qualquer partido sobre a indicação de algum nome para cargo da administração pública; que os nomes eram apresentados pelo Governo, ou seja, pelos articuladores políticos que levavam O nome à Casa Civil da Presidência.”

Lula disse que ‘nunca se sentiu pressionado pela Partido Progressista a fim de que Paulo Roberto Costa fosse nomeado diretor de Abastecimento da Petrobrás’. Ele declarou que o PMDB ‘nunca ofereceu apoio político ao Governo a fim de manter Paulo Roberto Costa no cargo de diretor de Abastecimento, e se ofereceu tai apoio isto não chegou ao conhecimento do declarante’.

A PF indagou de Lula sobre quais diretores da Petrobrás foram indicados pela PT. “O declarante afirma que talvez Renato Duque tenha sido uma indicação do PT.”

Ele saiu em defesa do ex-presidente da Petrobrás José Sergio Gabrielli. Neste caso disse que ‘foi uma indicação pessoal sua’. “Que indicou José Sérgio Gabrielli para ser diretor financeiro da Petrobrás em razão do mesmo ser um economista altamente capacitado e por ser alguém de sua confiança; que, da mesma forma, a indicação de José Sérgio Gabrielli para assumir a presidência da companhia foi uma escolha do declarante.”

Lula disse que há um “processo de criminalização” do PT

• Ex-presidente afirmou, ainda, não ter conhecimento sobre corrupção na Petrobrás

Em depoimento prestado à Polícia Federal no âmbito da investigação da Lava Jato, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que existe um “processo de criminalização” do PT. Ele disse não ter conhecimento sobre os eventos de corrupção ocorridos na Petrobrás e, questionado a que atribui a existência de pessoas de seu governo investigadas na Operação, apontou três motivos: o aprimoramento dos processos de fiscalização, a imprensa livre, e a criminalização do PT. Ele disse ainda que “não crê que os principais partidos da base aliada do governo tenham, através de suas principais lideranças, obtido vantagens indevidas a partir dos contratos das diversas diretorias da Petrobras”.

DEPOIMENTO LULA   PDF

Lula atribui nomeações a Dirceu

O ex-presidente Lula disse em depoimento à PF que coube ao então ministro José Dirceu (Casa Civil) indicar diretores da Petrobras suspeitos de comandar o esquema de corrupção na estatal

À PF, Lula diz que cabia à Casa Civil encaminhar indicações na Petrobras

• Ex-presidente afirma que não participou da escolha de diretores

Vinicius Sassine e Evandro Éboli - O Globo

BRASÍLIA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou em depoimento à Polícia Federal, em Brasília, na última quarta-feira, que ficou fora do processo de escolha dos diretores da Petrobras suspeitos de comandar um esquema de corrupção na estatal. Ouvido como testemunha no principal inquérito da Lava-Jato em curso no Supremo (STF), que investiga crime de formação de quadrilha e atuação de políticos do PMDB, do PP e do PT, Lula disse que os diretores foram indicações políticas dos partidos e que apenas recebia as indicações a partir de acordos políticos. “O processo de escolha dos nomes dos diretores não contava com a participação do declarante”, cita o termo do depoimento, anexado ontem ao inquérito.

O petista imputou à Casa Civil e à coordenação política de seu governo a responsabilidade por fazer, respectivamente, o encaminhamento das indicações e os acordos políticos necessários à ocupação dos cargos. Lula disse que não conhecia Renato Duque, ex-diretor de Serviços da Petrobras preso em Curitiba por suspeita de operar um esquema de desvios de recursos da estatal. “O nome de Renato Duque foi levado à Casa Civil da Presidência da República, à época chefiada por José Dirceu”, disse Lula ao delegado Josélio Azevedo de Sousa. “Cabia à Casa Civil receber as indicações partidárias e escolher a pessoa que seria nomeada”, completou. O ex-presidente afirmou não saber se foi o PT o responsável pela indicação de Duque.

Sobre Nestor Cerveró, que ocupou a Diretoria Internacional e que também é suspeito de operar o esquema, Lula disse “achar” que o nome foi uma indicação do PMDB. “O declarante recebia os nomes dos diretores a partir dos acordos políticos firmados. Este processo de acordos políticos era feito normalmente pelo ministro da área, pelo coordenador político do governo e pelo partido interessado na nomeação”, registra o termo do depoimento. O petista afirmou ter tido diferentes coordenadores políticos em oito anos de governo. Ele citou os petistas Tarso Genro, Alexandre Padilha e Jaques Wagner, atual ministro da Casa Civil. Também foi citado Aldo Rebelo, do PCdoB, hoje ministro da Defesa.

A indicação de Paulo Roberto Costa para a Diretoria de Abastecimento partiu do PP, segundo Lula, e também “foi levada à Casa Civil para deliberação e posterior nomeação do declarante”. “Ao final deste processo o declarante concordava ou não com o nome apresentado, a partir dos critérios técnicos que credenciavam o indicado”. Lula disse acreditar que o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, preso em Curitiba, será absolvido. O ex-presidente foi questionado sobre a proximidade ao pecuarista e lobista José Carlos Bumlai, investigado e preso na Lava-Jato. Lula disse ter “relação de amizade” com Bumlai, mas negou ter tratado de qualquer negócio ou indicação política com ele.

O presidente do PT, Rui Falcão, prestou depoimento no mesmo inquérito no início de dezembro. Ele declarou que nunca definiu as empresas a serem procuradas por Vaccari e que a única diretriz que deu é que as doações “sejam legais”. Perguntado, respondeu que o PT “nunca” recebeu dinheiro do esquema de corrupção na Petrobras.

Ala governista do PMDB quer tirar Cardozo

• Renan e outros senadores investigados na Lava-Jato reclamam de ministro da Justiça

Fernanda Krakovics - O Globo

Aliado do governo e peça-chave para barrar o processo de impeachment, o comando do PMDB do Senado pressiona a presidente Dilma Rousseff a tirar José Eduardo Cardozo do Ministério da Justiça. Assim como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o PT, o grupo liderado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), reclama que Cardozo não controla a Polícia Federal. Além de Renan, quatro senadores peemedebistas são investigados na Operação Lava-Jato.

A ala governista do PMDB argumenta que Dilma precisa colocar no comando do Ministério da Justiça alguém que tenha “autoridade” e possa “dialogar” com a Polícia Federal, o Ministério Público e os outros Poderes. No PMDB do Senado, além de Renan, estão na mira da Lava-Jato os senadores Romero Jucá (RR), Jader Barbalho (PA), Edison Lobão (MA) e Valdir Raupp (RO).

O assunto foi abordado em almoço do presidente do Senado com Dilma anteontem e seria reforçado pelo ministro Eduardo Braga (Minas e Energia) em conversa com a presidente ontem. O líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), foi na mesma linha em encontro com Dilma na semana passada.

Cerco ao partido
O PMDB foi o alvo de nova fase da Lava-Jato na última terça-feira. A Polícia Federal vasculhou casas e escritórios do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (RJ), e de outros políticos do PMDB, inclusive ligados ao presidente do Senado, além de dois ministros indicados pelo partido, Celso Pansera (Ciência e Tecnologia) e Henrique Eduardo Alves (Turismo).

No PT, a avaliação é que há um “apagão” no Ministério da Justiça. Desde o ano passado, Lula tenta convencer Dilma a substituir Cardozo. Mas, mesmo entre os insatisfeitos com o ministro, a avaliação é que a presidente está em uma saia-justa. Se substituir Cardozo, passará a imagem de que cedeu às pressões e de que pretende abafar as investigações. Além de reclamar de falta de controle da Polícia Federal, Lula se queixa de supostos excessos e de vazamentos seletivos. A irritação do ex-presidente aumentou com a operação de busca e apreensão no escritório de seu filho Luis Claudio, em outubro.

A avaliação da cúpula do PMDB do Senado é que, apesar da vitória obtida pelo governo no Supremo Tribunal Federal (STF) em relação ao processo de impeachment, Dilma precisa, para atravessar os próximos três anos, ter um mínimo de controle da Lava-Jato, que aumenta a turbulência política, e fazer mudanças nos rumos da economia, para aumentar sua popularidade.

Esse assunto foi debatido, na noite de anteontem, em reunião em que estavam presentes Renan, Eunício, Jucá e Eduardo Braga. Esse último ficou encarregado de reforçar os argumentos em conversa com Dilma ontem.

— A gente está dizendo para ela que, com essa decisão do Supremo, o impeachment foi para o saco, mas ela precisa conquistar também as ruas. Se ela não mexer na área econômica, não vai adiantar nada. Se ela não der uma sinalização nesse sentido até março, (o governo) está perdido. E precisa dar uma mexida no Ministério da Justiça, botar alguém que tenha autoridade, que possa dialogar com a Polícia Federal — afirmou um dos participantes da reunião.

O STF decidiu que o Senado, onde a base governista é mais forte, pode rejeitar o processo de impeachment, caso ele seja aberto pela Câmara. Em uma vitória do governo e contrariando o rito que vinha sendo imposto por Eduardo Cunha, o Supremo anulou os procedimentos adotados até agora, e a Câmara terá de eleger novamente, e em sessão aberta, a comissão que fará o parecer a ser votado em plenário.

A decisão do STF foi um revés para o vice-presidente da República e presidente do PMDB, Michel Temer, que, apostando no impeachment, tentou liderar um desembarque do partido do governo. Aliado a Cunha, Temer chegou a destituir o deputado Leonardo Picciani (RJ) da liderança do PMDB da Câmara. Picciani, que conseguiu retomar o cargo, trabalha para barrar o processo de afastamento de Dilma.

Agora, em uma guerra aberta, a ala governista do PMDB articula o lançamento de um candidato à presidência do partido contra Temer. A convenção nacional está marcada para março, e o nome defendido pelo grupo alinhado ao Planalto é o do ex-senador José Sarney (MA).

O vaivém de Renan

• Ao longo do ano, presidente do Senado esteve ao lado do governo e contra ele


STF ainda tem dúvida sobre comissão da Câmara

• Rito não define o que ocorre se chapa indicada por líderes for rejeitada

Tiago Dantas e André de Souza – O Globo

BRASÍLIA - Na última sessão do ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou ontem a ata da sessão que definiu o rito do impeachment da presidente Dilma Rousseff. Durante a sessão, os ministros discutiram o texto do acórdão, que será publicado hoje em uma edição extraordinária do Diário Oficial. A principal dúvida que resta é sobre o que ocorre se o plenário da Câmara rejeitar a chapa dos deputados indicados pelos líderes partidários para compor a comissão do impeachment. O STF determinou que essa é a única forma de apontar integrantes para a comissão, proibindo candidaturas avulsas.

O ministro Dias Toffoli, que foi voto vencido nessa questão, não soube responder, e disse que é possível entrar ainda com embargos de declaração, um tipo de recurso usado para esclarecer omissões, obscuridades, contradições de uma decisão. Já o advogado-geral da União (AGU), Luís Inácio Adams, que defendeu Dilma e foi contra a possibilidade de candidatura avulsa, apontou um caminho.

— Essa questão quem deve responder são aqueles que votaram no sentido de que há necessidade da indicação dos líderes. Eu não votei dessa forma — disse Toffoli em entrevista após a sessão.

— Uai, isso mostra que haverá necessidade de os líderes refazerem a chapa. Se não há base de sustentabilidade no processo para essa chapa, eles refazem a chapa — afirmou Adams.

Para Mendes, STF foi ‘bolivariano’ em julgamento

• Integrante da Corte, ministro criticou decisão sobre o rito do impeachment e afirmou que houve ‘cooptação’ e ‘artificialismos’

Gabriel Manzano Valmar Hupsel Filho – O Estado de S. Paulo

Horas depois de o Supremo Tribunal Federal ratificar, ontem, as decisões da quinta-feira sobre o rito a ser adotado no processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o ministro da Corte Gilmar Mendes afirmou, em São Paulo, onde almoçou com amigos, que o tribunal se comportou de forma “bolivariana” naquela sessão.

Ele disse concordar, de modo geral, com as críticas feitas pelo jurista Miguel Reale Jr., que afirmou que houve “ativismo político”. Ele repetiu a frase do jurista e um dos autores de pedido de impeachment de Dilma segundo a qual o Supremo decidiu “legislar em vez de julgar”. “Eu também disse isso, no final da sessão.”

“Mas o que mais me preocupou”, afirmou o ministro ao Estado, “foi a opção do tribunal pela intervenção no sistema de eleição da comissão na Câmara. Achei lamentável. ”E prosseguiu: “Tem jeito de coisa direcionada. Líderes indicados, voto aberto. Ora, a gente vê o que está acontecendo nos partidos. Foi para isso que o tribunal se reuniu? Achei aquilo constrangedor”.

No julgamento do rito do impeachment, na quinta-feira, o Supremo, por maioria, reconheceu o poder do Senado em barrar o processo, mesmo após eventual aprovação na Câmara. Além disso, a Corte derrubou a eleição dos membros da Comissão Especial instalada para avaliar o processo do impeachment, estabeleceu que os membros da comissão devem ser nomeados pelos líderes partidários, e rejeitou a exigência da defesa prévia da presidente em caso de abertura do processo. Gilmar Mendes foi voto vencido em todas os casos.

‘Cooptação’. Em entrevista à rádio Jovem Pan, o ministro também criticou a decisão do plenário do Supremo sobre o rito do impeachment. “Lembra que eu tinha falado do risco de cooptação da Corte? Eu acho que nesse caso isso ocorreu”, disse Mendes. “Há todo um processo de bolivarianização da Corte. Assim como se opera em outros ramos do Estado também pretende-se fazer isso no Tribunal. E, infelizmente, ontem se deu mostra disso.”

Reconhecido por suas declarações críticas aos governos petistas, Mendes insinuou que o Supremo usou de “artificialismos” para beneficiar o governo. “Imagine que diante de todo quadro de crise de corrupção vamos fazer artificialismos jurídicos para colocar um balão de oxigênio para quem tem morte cerebral”, afirmou. O Estado entrou em contato com o ministro, mas ele não quis comentar.

Miguel Reale Jr acusa STF de fazer 'ativismo de altíssimo grau' sobre impeachment

• Ex-ministro da Justiça do presidente Fernando Henrique Cardoso e um dos que assinou o pedido de afastamento da presidente criticou decisão do STF desta quinta

Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - Um dos signatários do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff que foi acolhido pela Câmara dos Deputados, o jurista Miguel Reale Júnior, acusou o Supremo Tribunal Federal (STF) de ter praticado "ativismo jurídico" a favor do governo ao acatar a tese do Palácio do Planalto na votação desta quinta-feira, 17, sobre o rito do processo.

"Está sendo praticado um ativismo de altíssimo grau no STF. O Supremo não está contente em julgar e quer legislar", diz. Ex-ministro da Justiça do presidente Fernando Henrique Cardoso, Reale também considera que a Corte não seguiu o mesmo rito de impedimento de Fernando Collor. "Como pode uma maioria simples do Senado destituir uma maioria de 2/3 da Câmara?", questiona.

Além de Reale, também assinaram o pedido o ex deputado petista Hélio Bicudo e a professora de direito da USP, Janaína Paschoal. O Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a eleição da comissão especial da Câmara que será responsável por decidir se abre ou não processo contra a presidente.

A Corte respondeu uma iniciativa do PC do B, que questionou o rito adotado por Eduardo Cunha (RJ). O peemedebista permitiu a participação da chapa avulsa, formada pela oposição e dissidentes da base e eleita por 272 votos contra 199 em votação secreta.

Entrevista. Miguel Reale Junior, um dos autores de pedido de impeachment

1.O que o sr. achou da decisão do Supremo Tribunal Federa sobre o rito do processo de impeachment? 

Está sendo praticado um ativismo de altíssimo grau no STF. O Supremo Tribunal Federal não está contente em julgar e quer legislar. Como pode uma maioria simples do Senado destituir uma maioria de dois terços da Câmara dos Deputados? O artigo 51 da Constituição diz que compete privativamente à Câmara, por dois terços dos votos, instaurar o processo (de cassação da presidente da República). Achei a decisão estranha. O STF entrou em um campo de normatizar o que já está previsto na Constituição.

2.O que achou da decisão do STF de derrubar o voto secreto na votação da comissão do impeachment?

O ministro (Luís Roberto) Barroso diz que a decisão foi pessoal do Eduardo Cunha (presidente da Câmara dos Deputados), mas o artigo 188 do regimento da Casa diz que a eleição é secreta para as comissões, tanto as permanentes como as temporárias. O voto do ministro (Luiz Edson) Fachin foi correto.

3.Avalia que impeachment perdeu força depois dos últimos acontecimentos?

Tudo vai depender dos fatos que vão ocorrer. O novo ministro da Fazenda (Nelson Barbosa) é um dos apontados como responsável pela pedaladas fiscais. Se o PMDB tiver, depois do recesso, uma prevalência de deputados pró-impeachment, ele poderá ocorrer.

4.A manifestação pró-governo de quarta-feira levou mais gente para a rua do que a de domingo em defesa do impeachment. Como avalia isso politicamente?

O governo federal nunca colocou tanta gente nas ruas como as redes sociais. Em março foram milhões de pessoas no Brasil inteiro. Quem foi para a rua na quarta-feira, em um dia de trabalho, recebeu algum benefício. / Pedro Venceslau

Oposição aposta em ruas e na divisão da base para impeachment avançar

• Após revés no STF, adversários do Planalto na Câmara definem estratégia para manter presidente sob pressão, o que inclui aproximação com grupos anti-Dilma, projeto de resolução para escapar de decisão da Corte e atuação para desidratar alas pós-governo

Erich Decat e Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

Após vitória do governo no Supremo Tribunal Federal, que definiu o rito do impeachment, a oposição a Dilma Rousseff iniciou ontem a elaboração de uma estratégia para tentar manter a petista sob pressão na Câmara dos Deputados e dar início ao processo na Comissão Especial da Casa encarregada de analisar o pedido de afastamento da presidente, aceito por Eduardo Cunha (PMDB-RJ) no último dia

A tática dos oposicionistas, que não se agregam num único grupo, apesar do interesse comum de afastar a presidente, tem três pilares: 1) novas ações regimentais; 2) busca de apoios nos movimentos antipetistas da sociedade civil para pressionar políticos nas suas bases durante o recesso; 3) enfraquecer a ala de parlamentares governistas do PMDB, hoje liderada por Leonardo Picciani (RJ).

Apesar de o Congresso funcionar na próxima semana, é quase certo que o trâmite do impeachment só comece mesmo no ano que vem. Para escapar do alcance de uma das decisões do STF, a oposição promete apresentar um projeto de resolução que estabelece a possibilidade de se ter chapa avulsa para compor a comissão responsável por analisar o de impeachment.

Em decisão tomada anteontem, os ministros do STF, entre outros pontos, vetaram a possibilidade de candidaturas alternativas para a composição do colegiado. No entendimento dos integrantes da Suprema Corte, a chapa deve ser composta apenas com os nomes indicados pelos líderes partidários, o que favorece o governo.

A proposta já foi protocolada na Casa pelo líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), e prevê mudanças no regimento interno justamente para validar a chapa avulsa que o STF julgou inconstitucional. "A ideia é mudar o regimento e colocar a questão de líderes e candidaturas avulsas. Como o Supremo mandou desmanchar todos os atos praticados até aqui, vai ser designada uma nova Comissão Especial e, com a alteração do regimento da Câmara, essa nova eleição para a constituição da comissão se dará com esse novo entendimento, ou seja, via eleição e num processo em que se pode ter chapa avulsa", afirmou Mendonça Filho.

Segundo ele, o tema deverá ser discutido em reunião de líderes prevista para a próxima segunda-feira na Câmara. Na ocasião, Mendonça pretende também coletar assinaturas dos demais líderes para que o projeto tramite sob o regime de urgência. Além desse tema, deve ser colocada em pauta a apresentação de possíveis embargos contra a decisão do STF a respeito do rito do impeachment.

Frente. A outra aposta é nas ruas. "Haverá pressão popular na base dos deputados durante o recesso. Isso deve influir no mau humor do Parlamento com o governo depois do recesso", diz. "Haverá tempo, daqui até o fim do recesso, para se reorganizar e mobilizar os movimentos de rua", completa Bruno Araújo, líder do PSDB.

Dentro das discussões realizadas entre os integrantes do grupo a favor do impedimento de Dilma, após a decisão do STF, está também a possibilidade de se apresentar um voto em separado na Comissão Especial, caso os opositores não consigam apoio para o projeto de resolução de Mendonça.

Diante da possibilidade de o processo de impeachment coincidir com um período de agravamento da crise econômica, lideranças da base apostam na divisão dos partidos de centro - o chamado "centrão", mais flexível a mudanças de posições a depender do quadro político. Legendas como PP e PSD, que contam com ministérios relevantes na Esplanada dos Ministérios, estão rachadas. A bancada pepista, com 41 deputados, se divide hoje em 26 votos a favor e 15 contra o impeachment. A bancada do PSD conta hoje com 20 votos contra o afastamento e 12 a favor. No PMDB, a ala pró-impeachment vai tentar destituir Picciani. "Ele introduziu a prática das listas e agora vai esperar outra que o destituirá. Picciani será um líder em exercício", afirma Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA).

Grupo de Temer reclama do STF e do Planalto


  • Oposicionistas do PMDB dizem que governo fez intensa pressão pró-Picciani

Júnia Gama - O Globo

BRASÍLIA - A cúpula do PMDB ligada ao vice-presidente Michel Temer criticou as decisões de anteontem do Supremo Tribunal Federal (STF) — que anulou a comissão de impeachment da Câmara que tinha maioria antigovernista — e do Palácio do Planalto — que conseguiu devolver ao deputado Leonardo Picciani (PMDBRJ) a liderança da bancada na Câmara, fortalecendo a ala do partido contrária à queda da presidente Dilma Rousseff.

Dirigentes do PMDB afirmam que a retomada da liderança pelo grupo governista ocorreu graças a um intenso trabalho de pressão sobre caciques do partido, incluindo ministros, parlamentares e seus familiares. A interferência do Planalto na articulação próPicciani levou integrantes do grupo dissidente do PMDB a reclamar de um suposto viés “chavista” no governo.

— É um governo totalitário. Onde ele vê que pode influenciar, ele vai. A intervenção no PMDB é para transformar nosso partido na filial do PT, e algumas pessoas se prestam a esse trabalho, achando que serão recompensadas se prestarem esse serviço, mas desconhecem a tradição do PT de chupar a laranja e jogar o bagaço fora — disse o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), que esteve na linha de frente da articulação que levou Leonardo Quintão (PMDB-MG) à liderança do partido por uma semana. — O chavismo no governo sempre foi um sonho do PT, e agora passa a ser o Brasil o polo mais importante desse projeto hegemônico e totalitário das esquerdas da América do Sul.

Há reclamações de que o governo teria atuado diretamente para pressionar deputados que apoiaram Quintão a voltar atrás e assinar a lista a favor de Picciani. São citados os casos das deputadas Elcione Barbalho (PMDB-PA) e Simone Morgado (PMDB-PA), mãe e madrasta do ministro Helder Barbalho (Pesca), respectivamente, e do deputado Hildo Rocha (PMDB-MA), a quem teria sido oferecido um cargo no Dnit no Maranhão.

Segundo integrantes da cúpula do partido, cresceu o apelo interno para que a convenção do PMDB, marcada para março, seja antecipada, mas os dirigentes pretendem esperar até fevereiro, na volta do recesso parlamentar, depois que estiver consolidada a decisão do Supremo sobre o impeachment — que será alvo de recursos de partidos da oposição e do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

A maior preocupação, afirmam peemedebistas históricos, é sobre o que fazer a respeito daqueles que não querem desembarcar do governo Dilma, como os ministros ligados ao Senado. Reservadamente, as críticas no PMDB se estendem também ao Supremo.

— A Câmara representa a nação, e o Senado, os estados. O Supremo tirou da nação o direito de decidir sobre o impeachment e levou esse poder para os estados — afirma um integrantes da cúpula do PMDB.

País perde 1,5 milhão de vagas formais em 12 meses

• Em novembro, foram fechados 130 mil empregos com carteira assinada, no pior resultado em duas décadas

Geralda Doca - O Globo

BRASÍLIA - O mercado formal de trabalho registrou uma redução de 130.629 vagas (admissões menos demissões), no oitavo mês consecutivo de piora no emprego. É o pior resultado para o mês da série histórica do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), iniciada em 1992. No mesmo período de 2014, foram criados 8.381 postos. Nos doze meses encerrados em novembro, as demissões superam 1,5 milhão, segundo o Ministério do Trabalho. É também o pior resultado em 23 anos. Entre janeiro e novembro, o país fechou 945.363 vagas com carteira assinada.

Em relação a outubro, quando foram eliminados 169.131 postos, houve queda no ritmo dos desligamentos. No mês passado, o comércio registrou saldo positivo de 52.592 empregos, devido às vagas temporárias para o fim de ano. Mas, nos demais setores, as demissões superaram as contratações, sendo que na indústria, os cortes somaram 77.341; a construção civil perdeu mais 55.585 empregos; serviços, outros 23.312 e agricultura, 21.969.

O diretor do Departamento de Emprego e Salário do Ministério do Trabalho, Márcio Borges, disse que o resultado do emprego formal em novembro já era esperado. Segundo ele, os números mostram que as empresas vêm ao longo dos últimos meses fazendo ajustes, diante da crise na economia e do cenário de incertezas.

Corte menor em dezembro
Isso, destacou, pode fazer com que o saldo de dezembro, tradicionalmente negativo devido às rescisões dos contratos temporários, fique inferior à média de 300 mil desligamentos.

— Nossa expectativa é que dezembro venha com um número menor porque já está havendo um processo de alinhamento das empresas — disse o diretor, acrescentando que o cenário de incertezas precisa ser enfrentado pela equipe econômica, a fim de retomar a geração de empregos. — Isso precisa ser enfrentado pelos Ministérios da Fazenda e do Planejamento — destacou.

Para Rodolfo Torelly, do site especializado Trabalho Hoje, não há sinais de que o desemprego vai diminuir:

— Os resultados no mercado de trabalho formal continuam se agravando, com seguidos recordes negativos de perdas mensais de empregos formais. Ainda não vislumbramos uma desaceleração nos cortes de vagas, que obrigatoriamente irão anteceder uma retomada da geração positiva dos empregos formais — disse Torelly.

De acordo com o Caged, os setores mais afetados no acumulado do ano são a indústria, onde os cortes já atingiram 414.075 empregos, seguida pela construção civil, que já perdeu 309.226 empregos. No Rio, foram fechadas 137.740 postos entre janeiro e novembro. Em São Paulo, foram registrados 254.040 desligamentos no período.

Emprego industrial recua
Outra pesquisa divulgada ontem, do IBGE, mostrou que o emprego na indústria caiu 7,2% em outubro, na comparação com o mesmo mês do ano passado. Frente a setembro, a queda foi de 0,7%, no décimo mês seguido de perdas de emprego.

Houve forte redução também na renda dos trabalhadores. A folha de pagamento real — ou seja, o total ganho por todos os trabalhadores da indústria, já descontada a inflação — caiu 0,8% frente a setembro. Na comparação com outubro do ano passado, a queda foi de 10,3%, a maior já registrada na série histórica do IBGE.

Prévia indica que inflação deve fechar o ano próximo dos 11%

• IPCA-15 tem alta de 10,71%, influenciado por preços de alimentos e energia

Lucianne Carneiro e Marcello Corrêa – O Globo

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), considerado a prévia da inflação oficial, fechou o ano de 2015 em 10,71%, segundo o IBGE. Trata-se do maior nível desde 2002, quando o índice acumulou alta de 11,99%. Alimentos e energia elétrica foram as principais pressões para a disparada dos preços no ano.

Em dezembro, a inflação ficou em 1,18%. É o resultado mais alto para o mês desde 2002, quando havia avançado 3,05%.

O preço da energia elétrica subiu 51,76% e foi a principal influência individual para a alta da inflação em 2015. Com isso, o grupo Habitação, do qual faz parte, acumulou alta de 18,51%, a maior expansão entre os nove grupos de gastos medidos pelo índice. O preço de alimentos e bebidas subiu 12,16% no ano.

Para Marcio Millan, economista da Tendências, o resultado de dezembro confirma a expectativa do mercado financeiro de que a inflação oficial de 2015, que será divulgada em janeiro, ficará em dois dígitos. Millan elevou sua projeção para o IPCA de 2015, de 10,6% para 10,7%. Para o ano que vem, prevê alta de 7%, acima do teto da meta do governo, de 6,5%:

— O resultado é surpreendente. Se a gente olhar projeções de três ou quatro meses atrás, ninguém esperava por isso.

O economista destacou o papel dos alimentos, que só em dezembro subiram 2,02%, respondendo pela principal influência sobre o indicador no mês.

— A primeira análise é o movimento de alta dos alimentos ‘in natura,’ com o choque do efeito do El Niño provocando perdas nas colheitas. Há também repasse do câmbio para o varejo, afetando principalmente alimentos industrializados — disse Millan.

Em relatório, o Itaú Unibanco informou que espera que o IPCA do ano chegue a 10,7%. O banco revisou sua projeção para o índice fechado de dezembro, de 0,97% para 1,02%. Já o Banco Fator destacou, em nota, que o resultado “representa praticamente uma meta de inflação a mais (4,5%) sobre o teto dessa (6,5%)”.

Sete das onze regiões pesquisadas pelo IBGE tiveram alta de dois dígitos na prévia da inflação oficial no ano. O Rio de Janeiro registrou alta de 11,05%.

O IPCA-15 é usado para definir o reajuste do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). A Secretaria Municipal de Fazenda já informou que o aumento será de 10,71% em 2016.

Troca de Levy por Barbosa provoca temor de recuo

• Novo ministro diz, porém, que manterá foco no equilíbrio fiscal

• Em meio à crise política e à maior recessão em duas décadas, Dilma dá comando da economia a titular do Planejamento, mais alinhado com PT. Empresários e analistas temem volta do modelo expansionista

Após meses de desgaste, Joaquim Levy deixou o Ministério da Fazenda e foi substituído por Nelson Barbosa, que ocupava o Planejamento. A troca foi recebida com ressalvas por empresários e economistas, que temem a volta da política fiscal expansionista. Barbosa, porém, fez questão de afirmar que a política econômica não muda e que o equilíbrio fiscal é prioridade. A Bolsa caiu 2,9% e o dólar subiu 1,43%, para R$ 3,949, com a notícia da saída de Levy. A escolha de Barbosa foi comemorada pelo PT e pela CUT, que espera maior adesão nos protestos contra o impeachment.

Sai Levy, entra Barbosa

• Para buscar confiança do mercado, novo ministro da Fazenda assume defendendo controle fiscal

Catarina Alencastro, Geralda Doca, Martha Beck, Cristiane Jungblut e Washington Luiz - O Globo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff fez ontem a troca que o PT e a área social do governo tanto queriam na equipe econômica. O comando do Ministério da Fazenda saiu das mãos do liberal Joaquim Levy e passou para o desenvolvimentista Nelson Barbosa, até então titular do Planejamento. Preocupado com a reação do mercado a seu nome — muitos economistas e empresários temem que a troca de Levy por Barbosa represente a volta de uma política fiscal expansionista — o novo ministro da Fazenda deu ontem sua primeira entrevista coletiva defendendo as propostas do seu antecessor e garantindo que não haverá uma ruptura. Prometeu compromisso com o rigor fiscal, com a realização de superávits primários (economia para pagar juros) capazes de reduzir a dívida pública, com o combate à inflação e com reformas, começando pela da Previdência Social.

— A política fiscal, a política econômica como um todo, continua na mesma direção. Direção de buscar o reequilíbrio fiscal, controlar o crescimento da dívida pública, de elevar o resultado primário da União, controlar a inflação — disse o ministro, que acrescentou depois: — Com foco no controle das despesas, vamos conseguir produzir os resultados primários necessários para estabilizar a dívida pública e depois reduzir a dívida pública. Com a estabilização fiscal, vamos, de um lado, ajudar o combate à inflação e também acelerar a recuperação do crescimento.

Meta fiscal foi gota d’água
Na tentativa de tranquilizar o mercado que tanto defendeu Levy, Barbosa repetiu várias vezes que o principal desafio do Brasil é o fiscal. As ações de curto prazo, segundo ele, são o pagamento das “pedaladas” de 2015 e a meta de superávit primário prevista para 2016. Ele garantiu que trabalhará para cumprir a meta fiscal de superávit de 0,5% do PIB aprovada pelo Congresso, apesar de o Planalto ter defendido um resultado menor, com abatimentos que, na prática, permitiriam ao governo não fazer qualquer economia em 2016. Perguntado sobre a desconfiança do mercado financeiro a seu nome, afirmou:

— É natural que haja avaliações divergentes do mercado financeiro. Isso se traduz numa flutuação de curto prazo de preços de ativos, mas, à medida que ficar cada vez mais claro que o governo continua na direção do reequilíbrio fiscal, do controle da inflação, essas oscilações vão se dissipar, e as avaliações vão melhorar em relação à economia brasileira.

A saída de Levy vinha sendo anunciada há meses, mas foi acelerada depois de um forte desgaste justamente por causa da meta fiscal de 2016. O ex-ministro queria manter 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB) e condicionou sua permanência a este número. Para que ele fosse atingido, porém, o Congresso previu um corte de R$ 10 bilhões no Bolsa Família.

Com isso, o Planalto saiu do lado de Levy e se alinhou com Barbosa, propondo ao Legislativo a redução da meta para 0,5% do PIB. Menos de 24 horas depois, a agência de classificação de risco Fitch retirou do país o grau de investimento, selo de bom pagador. Levy, então, avaliou que depois de sucessivas derrotas, não tinha mais sentido continuar no governo.

Com pouco tempo para fazer a troca — Levy deixou claro que não permaneceria no cargo por muito tempo — a presidente optou por uma solução caseira. Mas antes mesmo do anúncio do novo nome, interlocutores do Planalto se apressaram em dizer que não haveria qualquer guinada brusca na condução da economia.

— Não vai ter populismo, guinada e nem um retorno à matriz econômica do primeiro mandato — afirmou uma fonte do governo.

Em seu último dia no cargo, Levy divulgou uma carta na qual defendeu seu trabalho durante pouco mais de um ano à frente da Fazenda, indicando ter achado injusto o bombardeio que sofreu por parte do PT, e ressaltando que sua agenda nunca foi excessivamente fiscal.

Em nota, a presidente Dilma agradeceu a dedicação de Levy, que, segundo ela, teve “papel fundamental” no enfrentamento da crise econômica. Para o lugar de Barbosa no Planejamento foi o ex-chefe da Controladoria-Geral da União (CGU), Valdir Simão. Na CGU ficará interinamente o secretário-executivo, Carlos Higino.

Em sua primeira fala como ministro da Fazenda, Barbosa disse que vai trabalhar junto com o Congresso para aprovar as medidas de ajuste fiscal pendentes, como a recriação da CPMF e a DRU (Desvinculação de Receitas da União). Também afirmou que encaminhará a proposta de reforma da Previdência no início de 2016. Ele ainda mencionou a reforma do PIS/Cofins, enviada por Levy à Casa Civil, para simplificar o sistema tributário.

Barbosa citou o trabalho feito conjuntamente por ele e Levy, como a mudança nas regras de pensão por morte, de auxílios sociais e o contingenciamento de R$ 78 bilhões de gastos deste ano.

— Estamos empenhados na redução da inflação, o Banco Central vem adotando as medidas necessárias para trazer a inflação para o centro da meta do período. Esse esforço está em andamento e começará a gerar frutos no próximo ano com a redução da inflação de modo a começar a melhorar o poder de compra das famílias brasileiras — afirmou.

Para lula, levy estava insustentável
Barbosa teve de responder várias vezes sobre as incertezas que sua entrada na Fazenda já começava a gerar. Demonstrando tranquilidade, respondeu calmamente:

— Prefiro não ter o debate sobre política macroeconômica com base em estereótipos ou caricaturas. Estamos aqui não para aprovar ou refutar teses. Estamos focados em resolver os problemas do presente para construir um futuro melhor.

Nos bastidores, o ex-presidente Lula deu aval para a substituição de Levy. Na quarta, ele esteve em Brasília com aliados e disse que a situação de Levy era insustentável:

— Essa divisão não dá mais — disse. Apesar do esforço do novo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, de pregar a continuidade do ajuste fiscal tocado por Joaquim Levy, o ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, evidenciou ontem que a estratégia do governo por trás da troca de comando é uma mudança gradual na condução da política econômica. Segundo ele, as escolhas do governo são feitas pela presidente Dilma Rousseff e aos ministros cabe executá-las.

— Há um equívoco dos que fazem uma leitura dos caminhos do governo da presidente Dilma. Quem banca a política econômica não é o ministro da Fazenda, quem banca a política econômica é a presidente da República, e ela convoca o ministro da Fazenda para cumprir. Evidentemente que discute com ele, mas se ilude quem aponta um fuzil para este ou aquele ministro. Se agora ela entender que está na hora não de sair do ajuste, mas de modular o ajuste, aí é uma questão pessoal dela — disse, em encontro com jornalistas antes do anúncio oficial da saída de Levy.

Preocupação com crescimento
A declaração explicita o que no entorno da presidente se discutia freneticamente nas duas últimas semanas. Pressionada pelo impeachment, que reforçou a necessidade de aglutinar a base de apoio no Congresso e nos movimentos sociais, e pela mais grave recessão brasileira em 25 anos, Dilma chegou à conclusão de que precisa trabalhar para “tirar a economia do buraco”.

Esta meta embute a percepção de que são necessárias medidas que, ainda que com baixo impacto fiscal, estimulem o crescimento e a retomada dos investimentos e estanquem o desemprego. Porém, este objetivo se chocava com o receituário de Levy, centrado no ajuste fiscal.

Não foi coincidência, desta forma, o fato de que a gota d’água para a saída de Levy tenha sido a discussão da meta de superávit primário (economia para pagamento de juros da dívida) de 2016. Mesmo quando Dilma deu sinal verde para a equipe econômica trabalhar com um número menor, de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), o agora ex-ministro articulou pessoal e incisivamente com o Congresso a aprovação da meta original de 0,7%.

Com a troca, Dilma fortaleceu ainda o PT e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pressionaram nos últimos meses pela substituição.

Umas das principais críticas do grupo era a de que Joaquim Levy fazia um discurso muito parecido com o do mercado financeiro e das agências de classificação de risco, focado nos problemas e nas dificuldades de passar o ajuste, esquecendo de ressaltar que o esforço fiscal do governo ao longo de 2016 foi imenso, com corte de despesas em todas as áreas.

Esta corrente do PT, da qual Jaques Wagner é um dos principais integrantes, defendia há meses que Barbosa tinha perfil mais habilidoso para transmitir a mensagem de que o governo não está parado.

Wagner deixou isso claro ontem. Ao comentar o perfil que um ministro tem que ter, disse que não adianta nada ser puramente técnico ou um grande político se não resolver o problema do governo. Em momentos de crise, o ideal é que o portador das más notícias seja sensível:

— Quando você conclui que há um desequilíbrio fiscal e que é preciso fazer uma arrumação não é bom para ninguém. Evidentemente quando você tem que trazer uma notícia que é dura, melhor que quem a traga... O mensageiro tem que ser jeitoso. Mas eu não quero fazer nenhum juízo de valor sobre a atuação do ministro Levy.

Wagner afirmou ainda que tem ido a São Paulo ouvir especialistas da área econômica e representantes do meio empresarial a pedido de Dilma. Segundo ele, “a grande pergunta” é qual o melhor caminho para a economia, para o desenvolvimento do país e para a retomada da geração de emprego.

Colaborou Bárbara Nascimento