terça-feira, 15 de junho de 2021

Merval Pereira - Um pote de doce de leite

- O Globo

Sempre que uma crise política parece insolúvel no Brasil, surge a proposta de adotar o parlamentarismo e, mais recentemente, o semipresidencialismo, projetos que retiram do presidente poderes que seriam compartilhados, em maior ou menor grau, com o Congresso.

Para que João Goulart pudesse assumir a Presidência da República, seu direito por ter sido eleito vice-presidente na chapa do renunciante presidente Jânio Quadros, foi preciso criar às pressas um regime parlamentarista, rejeitado anos depois pelas urnas plebiscitárias, que majoritariamente aprovaram a volta do presidencialismo.

Com a fraqueza institucional do governo Temer, e, hoje, de Bolsonaro, o Congresso vem ganhando força numa espécie de “parlamentarismo branco”, que dá poderes crescentes à Câmara e ao Senado. Michel Temer convivia bem com essa situação, que conhecia de perto por ter sido presidente da Câmara por duas vezes.

Bolsonaro entregou-se ao Centrão por absoluta necessidade de sobrevivência política, mas procura a todo momento reforçar o poder presidencial, que sente sabotado não apenas pelo Congresso, mas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pelos órgãos de fiscalização e controle, que tenta aparelhar com seus adeptos.

Carlos Andreazza - Perversão de Estado

- O Globo

Não pensemos que a recente mensagem antimáscara de Bolsonaro seja mera isca para desviar atenções. Nem sempre é isso ou só isso. Sabe-se que o sujeito tem razões para produzir fumaça. Está acuado pela CPI; pela revelação de que, presidente da República, mobilizara-se — como um lobista, falando ao primeiro-ministro da Índia — para defender os interesses de empresas privadas importadoras de insumos à produção brasileira de cloroquina. E isso enquanto a comissão inicia a etapa de quebra de sigilos.

Razões para que a rede bolsonarista dedique-se ao diversionismo e tente levar a pauta a outro terreno. Exemplo do emprego bem-sucedido dessa tática desviante é haver tomado o último fim de semana o debate sobre se terá sido a motocada blasfema do mito a maior da história da humanidade.

Sim: fumaça. Mas não somente. A mensagem de um presidente é sempre influente. Tanto mais se um populista. Ele sopra o apito. Fala a seus sectários. O recado chega à ponta. Chegou. O disparo antimáscara foi certeiro. A pregação cumpriu o objetivo. Mais tarde, conforme o padrão, Bolsonaro mudaria — ajustaria — a embocadura. É como procede. E então o que era um parecer ultimado — vendido com a gravidade de um decreto — transforma-se num pedido, não impositivo, de estudo ao novo Pazuello, um tal de Queiroga. Repito: o tiro já alcançara a meta, inclusive a de humilhar o ministro da Saúde, um Pazuello que usa máscara.

Eliane Cantanhêde – Obras exigem manutenção

- O Estado de S. Paulo

É tempo de revisitar a redemocratização, espetacular obra de engenharia política do Brasil

Depois de apoiar a ditadura militar durante anos na Arena e no PDS, os então senadores Marco Maciel (PE), Guilherme Palmeira (AL) e Jorge Bornhausen (SC) tiveram um papel relevante ao liderar a dissidência parlamentar e aderir ativamente às “Diretas-Já” e à articulação para a eleição do oposicionista Tancredo Neves, do MDB, em 1984. 

Ex-governador de Pernambuco e vice-presidente nos oito anos de Fernando Henrique Cardoso, Marco Maciel morreu no sábado de covid, agravada por uma longa doença. Ex-governador de Alagoas, Guilherme Palmeira morreu em maio do ano passado. Ex-governador de Santa Catarina, Bornhausen continua curioso e ativo, aos 83 anos, na iniciativa privada. 

Alinhados ao general e ex-presidente Ernesto Geisel, mentor e garantidor da “abertura lenta, gradual e segura”, e ao ex-governador de Minas Aureliano Chaves, vice do general João Figueiredo no último governo militar, os três, Maciel, Palmeira e Bornhausen, chacoalharam o PDS, abriram canais com setores militares insatisfeitos com o governo Figueiredo e integraram a heterogênea frente de resistência e de pressão pela redemocratização e as “Diretas-Já”. 

Entrevista | Rodrigo Maia: ACM Neto ‘está seguindo o caminho autoritário do bolsonarismo’

Ex-presidente da Câmara compara dirigente do DEM a Tomás de Torquemada, inquisidor geral espanhol durante o século XV, e não esconde irritação

Marcelo de Moraes / O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA – A decisão do DEM de expulsar de seus quadros o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (RJ) não causou surpresa para ele. Mesmo assim, Maia não escondeu a irritação com o desfecho da briga que travou com o presidente do DEM, ACM Neto, iniciada durante o processo de disputa pelo comando da Câmara.

Na ocasião, Neto e seu grupo apoiaram a candidatura de Arthur Lira (Progressistas-AL) para o comando da Câmara contra o deputado Baleia Rossi (MDB-SP), nome defendido por Maia. “Torquemada Neto está seguindo o caminho autoritário do bolsonarismo”, afirmou Maia ao Estadão, comparando o dirigente do DEM a Tomás de Torquemada, inquisidor geral espanhol durante o século XV. 

O ex-presidente da Câmara, que já presidiu o DEM e foi um de seus principais líderes, faz segredo sobre seu novo destino político, mas o Estadão apurou que ele deverá ir para o PSD do ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

Pedro Fernando Nery* - De FHC a Felipe Neto

- O Estado de S. Paulo

Termo social-democrata parecia datado, mas ressurge nas análises do governo Joe Biden e volta a ganhar importância no cenário mundial

Felipe Neto se definiu novamente como social-democrata na semana passada. Acompanhei o anúncio com interesse – afinal, o youtuber tem feito críticas severas ao neoliberalismo (“Derrotar o neoliberalismo é o grande desafio do Ocidente”, twitou para 25 mil curtidas em maio). E neoliberal, mais do que qualquer conceito, parece ser um insulto, o preferido justamente dos detratores da social-democracia no Brasil: basta lembrar do seu expoente mais conhecido, FHC – que faz 90 anos nesta semana. O que afinal abrange esse guarda-chuva que abriga de Fernando Henrique a Felipe Neto? Qual o futuro na geração de Felipe para o modelo sonhado pela geração de FHC?

Lançado recentemente, o livro Social Democratic Capitalism argumenta que é a social-democracia que a história mostrou ser o modelo mais capaz de avançar o desenvolvimento humano. Do professor Lane Kenworthy, da Universidade da Califórnia em San Diego, advoga por um modelo que colha as vantagens do capitalismo em produzir crescimento econômico com a proteção de um Estado de bem-estar social forte, voltado para altos níveis de emprego e baixos níveis de desigualdade.

Luiz Carlos Azedo - Amigos e inimigos

- Correio Braziliense

É preciso identificar os riscos de uma narrativa que exalta o poder ‘por aclamação’, no qual a partição entre Executivo e Legislativo se tornaria desnecessária

Num artigo instigante publicado ontem, na Folha de S.Paulo, o cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFP) Marcos André Mello, ex-professor visitante do Massachussets Institute of Technology (MIT) e da Universidade Yale, chamou a atenção para o que chamou de “pluralismo polarizado”, no qual o centro político estaria sendo centrifugado pela radicalização dos partidos e do eleitorado. Inspirou-se nas análises do cientista político italiano Giovanni Sartori (1924-2017) sobre a Alemanha de Weimar, o Chile de Allende, a Itália do pós-guerra e a França da 4a República.

Sartori formou-se pela Universidade de Florença, da qual foi professor emérito. Fundou a Rivista Italiana di Scienza Politica, que circula até hoje. Mudou-se para os Estados Unidos em 1976, onde assumiu a cadeira de Ciência Política da Universidade de Stanford. Três anos depois, tornou-se professor emérito do Departamento de Humanidades da Universidade de Columbia, em Nova York. Seu livro mais conhecido no Brasil é A Teoria Democrática Revisitada (Ática), no qual afirma que a democracia está ameaçada pelos democratas. Incapazes de diferenciar entre ideal e realidade, a pressão por mais participação e mais igualdade minaria a única democracia possível: a democracia representativa baseada na delegação do poder por meio da competição eleitoral e apoiada nas instituições do liberalismo político. Diez lecciones sobre nuestra sociedad en peligro, seu último livro, publicado em 2015, aborda as inquietudes geradas pela globalização, a busca pelo sistema eleitoral perfeito e os desafios da proteção da cidadania, porém ainda não possui tradução no Brasil.

Ricardo Noblat - Cabe ao Supremo Tribunal obrigar Bolsonaro a usar máscara

- Blog do Noblat / Metrópoles

Quanto mais rápido a justiça decidir, mais vidas poderão ser poupadas

Se há lei aprovada pelo Congresso que obriga o uso de máscara contra a Covid-19 em locais públicos e privados com ampla circulação de pessoas; se nos Estados e na maioria dos municípios decretos de governadores e de prefeitos igualmente obrigam; por que o presidente da República desfila por aí sem máscara?

Essa questão deverá ser resolvida pelo Supremo Tribunal Federal, uma vez provocado por ação de autoria do PSDB. A ação caiu nas mãos do ministro Edson Fachin, que a liberou para ser julgada pelo plenário do tribunal formado por 11 ministros. Vai depender de Luiz Fux, presidente do tribunal, apressar ou não a votação.

Cristina Serra - Cena deplorável no avião da Azul

- Folha de S. Paulo

Se eu fosse passageira daquele voo, já teria entrado na Justiça contra a empresa por atentado à saúde pública

O presidente entrou num avião, provocou tumulto, aspergiu perdigotos, açulou opositores. É o que ele sabe fazer de melhor, já que, medíocre e ocioso, não trabalha pelo país. Até aí, nenhuma novidade. Mas não pode passar em branco o papel da companhia Azul nessa cena deplorável.

Não precisa ser especialista em transporte aéreo para entender que ali foram violados regulamentos do setor e medidas de segurança sanitária. Por mais que não queira, a empresa tem, sim, obrigação de vir a público e esclarecer: não sendo Bolsonaro passageiro do voo, quem autorizou sua presença para fazer proselitismo dentro do avião ? Quem e por quê?

Hélio Schwartsman - Precisamos falar sobre o CFM

- Folha de S. Paulo

O médico em busca de respaldo científico faz melhor se ignorar o Conselho e ouvir as sociedades de especialistas

Se há uma instituição que sai apequenada da crise sanitária, é o Conselho Federal de Medicina (CFM). Quando praticamente todos os órgãos reguladores e sociedades científicas relevantes do planeta já se manifestaram contra a prescrição de cloroquina para pacientes de Covid-19, o conselho segue falando em autonomia do médico e na legitimidade do uso “off-label”.

Também sou um entusiasta do “off-label”, que é uma fonte de inovação na medicina. Foi através dele, por exemplo, que um anestésico velho, a cetamina, está sendo reciclado como antidepressivo. Mas não é porque o médico tem autonomia que ele deve prescrever o que a ciência já mostrou que não funciona, especialmente quando há precedentes de veto do CFM a outras drogas e tratamentos.

Joel Pinheiro da Fonseca - A quem interessa ser contra as vacinas?

- Folha de S. Paulo

Desacreditar os imunizantes vai ao encontro do discurso do governo federal

Um experimento singelo tomou as redes. Diversas pessoas gravaram o seguinte vídeo depois de tomar uma dose da vacina da Pfizer: colocam algum pequeno objeto de metal na área da injeção e —inacreditável!— o objeto não cai, fica parado no braço como se uma força magnética o prendesse.

Em um vídeo particularmente chocante, uma mulher apoia um celular grande ,com um ímã na parte traseira, nos braços de seus pais idosos, e o celular fica ali, suspenso.

Seria apenas algo folclórico se não fosse um lado mais sombrio dessa história. No próprio vídeo da moça que prende o celular nos braços dos pais, ela dá a única conclusão possível: “A vacina vem com microchips que são magnéticos”. Ou seja, a vacina da Covid na verdade faz parte de algum plano maligno.

Andrea Jubé - A disputa pelo voto do povo de Deus

- Valor Econômico

Bolsonaro teme evasão do voto evangélico

Na última semana, em plena quarta-feira, um dia tradicionalmente movimentado em Brasília, de agendas concorridas e votações no Congresso, o presidente Jair Bolsonaro deixou seu gabinete no Palácio, deslocou-se com uma comitiva de ministros para um almoço na fazenda do cantor Amado Batista, e, de lá, seguiu para um culto evangélico em Anápolis (GO), município governado pelo PP, que integra a base aliada.

Durante o encontro religioso, o ministro da Secretaria-Geral, Onyx Lorenzoni, incumbido de articular a base governista na CPI da Covid - que estava colhendo depoimentos naquela hora -, foi ao microfone esclarecer que estavam todos presentes naquela tarde para orar pelo senhor presidente.

O ministro da Educação, Milton Ribeiro, que é pastor da igreja presbiteriana - e tem um Enem para organizar -, e o deputado Major Vitor Hugo (PSL-GO), ex-líder do governo, também discursaram.

Daniela Chiaretti - Impasse na negociação: “Você está no mudo”

- Valor Econômico

As Cops do Clima e Biodivesidade vão ocorrer em 2021?

Há uma concentração de nuvens cinzentas sobre as duas grandes conferências ambientais das Nações Unidas previstas para este ano. A data da conferência de biodiversidade, a CoP 15, marcada para outubro, em Kunming, na China, está subindo no telhado. É quase certo que será adiada novamente, para abril ou maio. Se isso acontecer, o rebatimento para a conferência de clima, a CoP 26, em Glasgow em novembro, é evidente. A pergunta é precisamente esta: as duas megaconferências vão acontecer em 2021? Serão virtuais, presenciais ou híbridas? O debate logístico opõe, como de hábito, ricos e pobres. É um resumo das divergências que polarizam os dois blocos ao longo de décadas destas discussões.

Trata-se de uma síntese perfeita e irônica dos tópicos que rodeiam as negociações internacionais em torno de capacitação e tecnologia, equidade e justiça, inclusão, recursos e conteúdo.

Míriam Leitão - As distorções no avesso da reforma

- O Globo

A Previdência enfrenta uma verdadeira contrarreforma com decisões judiciais que restabelecem pontos que haviam sido alterados na reforma aprovada em 2019. Está empatado no STF, por cinco a cinco, a revisão da aposentadoria com base em recolhimentos antes de 1994. A mudança pode ter o impacto de R$ 46 bilhões em dez anos, mas o maior problema é que qualquer cálculo de valores anteriores ao Real é muito trabalhoso por causa da hiperinflação. Há outras ações em julgamento, como a que permite deixar a aposentadoria para um menor da família, mesmo que tenha pai e mãe, ou a liminar que desobriga os cartórios a mandarem informações detalhadas para a Previdência.

No Brasil, o sistema de aposentadorias não é injusto por acaso. São muitos os caminhos que parecem corretos, mas que acabam sendo usados por quem tem dinheiro para bons advogados. E há neste momento uma ofensiva, em várias frentes, que está reduzindo a economia prevista com a reforma aprovada.

Vagner Gomes de Souza* - Um Passo Atrás para Dar Dois Adiante no Rio de Janeiro

Não podemos contar com uma disputa eleitoral que seja fácil no Estado do Rio de janeiro na sucessão estadual de 2022. O desconhecido Governador Cláudio de Castro tem essa desvantagem como vantagem, pois os pontos negativos de sua gestão recaem para os mandatários municipais recém-empossados. No caso da Capital, a gestão do Prefeito Eduardo Paes sobrevive aos trancos e barrancos ao contingenciamento do Orçamento Municipal o que o impede levantar para novos voos ou buscar uma beligerância na política estadual. Como bom apreciador do samba, o Prefeito carioca segue a linha do “deixa a vida me levar” e se preserva de aventuras quixotescas na política fluminense.

A cidade do Rio de Janeiro, mais uma vez, não se projeta em condições de se fazer decisiva eleitoralmente nas próximas eleições. As forças progressistas não podem reinventar a história recente da política estadual que elegeu um ex-prefeito de Campos com os votos do Partido dos Trabalhadores há mais de 20 anos atrás. Testemunhou a formação de um novo Núcleo Político de Dirigentes estaduais com base política na Baixada Fluminense e todos coabitaram com as novas lideranças políticas com base no voto evangélico.

Zuenir Ventura - E o vírus se diverte

- O Globo

Como se sabe, Jair Bolsonaro ordenou a “um tal de Queiroga” a tarefa de elaborar um parecer para desobrigar vacinados e recuperados de Covid-19 de usar máscaras. Talvez desconfiado de seu ministro da Saúde, que já deu declarações a favor delas, o presidente, ele mesmo, resolveu invadir as cidades com as “motociatas”, como um Mussolini, promovendo aglomerações e dando o exemplo de dispensar o uso das máscaras. O máximo de punição que recebeu pela transgressão foi multa de R$ 552 em São Paulo; no Rio, nem isso, apesar do comício acompanhado de quem ele chama de “meu gordinho”.

Os especialistas consideram uma “temeridade” a decisão presidencial, pois alertam que mesmo quem foi vacinado ou teve a doença pode transmitir o vírus a outras pessoas. E quem já teve a Covid-19 pode ter de novo, assim como quem foi vacinado pode contrair a doença de forma mais branda. Mas Bolsonaro convive mal com sensatez e verdade. Há pouco tempo, teve a coragem de afirmar que, quando foi infectado pela Covid-19, tomou hidroxicloroquina e “no dia seguinte estava curado”. Os devotos presentes não só acreditaram no milagre, como aplaudiram a descarada mentira.

Malu Gaspar - Rodrigo Maia se oferece para ajudar Lula em 2022

- O Globo

O ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia se ofereceu para colaborar com o programa de governo e nas articulações da campanha de Luis Inácio Lula da Silva para a presidência da República em 2022. 

Os dois tiveram uma conversa fechada no Palácio da Cidade, sede da Prefeitura do Rio de Janeiro, na última sexta-feira (11), da qual também participaram o prefeito, Eduardo Paes (PSD), e a presidente do PT Gleisi Hoffman. 

Maia foi expulso ontem do DEM após desentendimentos públicos com o presidente do partido, ACM Neto. Ele deve se filiar ao PSD que já abrigou Paes. Por ter sido expulso, o deputado federal não perde o mandato. 

O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais

EDITORIAIS

Uma questão moral

O Estado de S. Paulo

O presidente Jair Bolsonaro participou, no dia 9 passado, de um culto evangélico em Anápolis (GO). O evento contou com transmissão ao vivo da TV Brasil, que deveria ser pública, mas, a exemplo do que acontecia nos governos lulopetistas, tem feito serviços privados – no caso, divulgar a campanha antecipada de Bolsonaro à reeleição e privilegiar a religião do presidente. Além da violação de comezinhas normas republicanas, o evento ensejou um grosseiro atentado às normas morais, pois, como enfatizado ontem neste espaço (ver o editorial O ‘evangelho’ segundo Bolsonaro), o presidente mentiu do início ao fim de seu discurso, com a agravante de que o fez num templo religioso.

A exploração particular da TV estatal deve ser tratada no âmbito da Justiça. Já a mendacidade de Bolsonaro, em franco escárnio dos fundamentos da religião, está no terreno da moral, que é questão de consciência pessoal. Se o presidente consegue dormir tranquilo depois de mentir descaradamente, como fez naquele templo religioso em Anápolis, é questão para ser estudada por psiquiatras. Mas espanta que Bolsonaro, mesmo violando mandamentos religiosos de forma tão explícita, ainda tenha apoio entre aqueles que prezam esses mandamentos como pilares de sua fé e de seu comportamento em sociedade.

Como se sabe, os evangélicos formam uma parte importante da base de apoio de Bolsonaro. Consta que, no segundo turno da eleição de 2018, o presidente teve nada menos que 70% dos votos dos evangélicos. Isso significa que Bolsonaro, de algum modo, soube capitalizar as expectativas dessa parte do eleitorado, cujo tamanho cresce exponencialmente – hoje os evangélicos são 35% do total.

Poesia | Carlos Drummond de Andrade - Construção

Um grito pula no ar como foguete.
Vem da paisagem de barro úmido, caliça e andaimes hirtos.
O sol cai sobre as coisas em placa fervendo.
O sorveteiro corta a rua.

E o vento brinca nos bigodes do construtor.

Música | Leila Pinheiro - Verde

 

segunda-feira, 14 de junho de 2021

Entrevista | José Álvaro Moisés: 'Dois impeachments em 30 anos indicam que algo não está bem'

Para cientista político, a crise do sistema de representação provoca queda da qualidade da democracia brasileira

Marcelo Godoy, O Estado de S. Paulo

Qual o estado da democracia representativa hoje no Brasil?

Temos uma democracia que os cientistas políticos costumam designar como democracia eleitoral. Isso significa que ela garante os mecanismo de alternância de governo e engloba dois aspectos muito importantes que teóricos, como Robert Dahl, chamam a atenção: participação da grande maioria dos adultos e a possibilidade de contestação por meio da existência de partidos políticos e regras que permitam que o adversário de quem está no governo chegue ao poder. Nós temos isso.

Qual nosso problema então?

O problema com a democracia brasileira não é se ela existe ou não. O problema é a qualidade de democracia. E isso tem relação com a crise do sistema de representação. Temos um conjunto de regras que, em invés de introduzir o eleitor no sistema político, trabalha para desconectar representados e representantes. Isso transparece em pesquisas de opinião quando as pessoas não se sentem representadas ou acreditam não influir no sistema. O que a diferencia a democracia das alternativas autoritárias é que na democracia as pessoas comuns são os soberanos; não o rei, o príncipe ou o secretário-geral do partido. Mas essa soberania é delegada por meio do sistema de representação, em primeiro lugar, aos partidos políticos. Quando os partidos começam a falhar nessa função e já não recebem a delegação dos soberanos para passá-la à frente ao presidente ou ao prefeito, você tem uma queda na qualidade da democracia. A soberania dos eleitores não se expressa apenas no direito de escolher o representante, ela se expressa por meio das instituições de mediação para propor temas ao sistema político que correspondam aos interesses dos eleitores.

Existe algum aspecto novo nessa crise após 2018?

Há um aspecto para entender os limites dos avanços que tivemos. Este é o fato de que, nos 30 anos que antecedem 2018, os militares haviam voltado à caserna e estavam subordinados a líderes eleitos, exercendo, dentro dos limites constitucionais, suas funções. Mas em 2018 houve uma quebra grave desse quadro, que foi a intervenção do comandante do Exércitogeneral Villas Bôas, antes do julgamento do habeas corpus de Lula, o que pode ter interferido nas eleições. No Brasil, a democracia tem alguns condicionantes que ainda não estão resolvidos, e a questão militar é um desses.

Essa crise da representação abre caminho para a usurpação da soberania?

Abre perspectiva para que alguns atores imaginem que podem ser os portadores da soberania e já não mais estabelecer a conexão com os eleitores. Esse é um aspecto da crise dos partidos. Eles não têm só um conteúdo programático frágil; a conexão com os eleitores se perdeu. Aquilo que começou a existir logo depois da campanha das Diretas Já, com cinco partidos políticos que deram origem ao nosso sistema partidário, ao longo do tempo foi se perdendo. Essa crise está visível a partir das jornadas de 2013, que reuniram milhões de pessoas. Foi uma crítica severa ao modo das elites políticas da época fazerem política.

Onde a eleição de Bolsonaro se encaixa nessa história?

Alguns avanços de realização da democracia ocorreram. Temos alternância do poder, temos uma série de direitos dos cidadãos mais reconhecidos do que antes. Mesmo a imprensa funciona com ampla liberdade. Mas o que ocorreu foi que, a partir da crise de 2014, com o governo de Dilma Rousseff, em parte porque ela não foi capaz de coordenar a coalizão de apoio que conseguiu formar e criou divisões internas, a crise se degenerasse. O agravamento da crise também veio com as denúncias de corrupção. Quando ficou mais evidente que o esquema de corrupção era sistêmico, envolvendo dirigentes de partidos e executivos de grandes empresas, aumentaram todos os índices de desconfiança em relação às instituições, às elites, ao governo de Dilma Rousseff, mas também em relação aos partidos. As duas instituições que tiveram os índices mais altos de rejeição foram os partidos e o Congresso. A crise aumentou porque flagrou os principais partidos responsáveis pela democratização. E, quando chega nas eleições de 2018, nenhuma das elites desses partidos em crise foi capaz de dar uma resposta a um sentimento de rejeição e exclusão, que a maioria dos eleitores estava sentindo. Nenhum dos líderes democráticos fez menção ao tema da corrupção ou assumiu compromisso com os eleitores de que isso mudaria, que não seria mais uma componente naturalizado da política brasileira. Isso abriu o espaço que foi ocupado por Bolsonaro, que apareceu como campeão do combate à corrupção capaz de cuidar de outro tema importante: a Segurança Pública. É um contexto de fragilidade de algumas das principais instituições da democracia brasileira. E, embora na campanha não tenha dito uma palavra sobre o embate com as instituições, assim que começou seu mandato a lógica dele se organizou em torno do enfrentamento das instituições e da mobilização de apoiadores contra o Judiciário e o Legislativo e uma tentativa de controle dos mecanismo de fiscalização, como o CoafPolícia Federal e Receita. O vácuo deixado pelas lideranças democráticas foi ocupado por uma alternativa de mentalidade autoritária. Essa mentalidade tem se refletido em sucessivas políticas pública. A mais importante delas é o negacionismo em relação à pandemia, a incapacidade de perceber o papel do estado diante da crise sanitária. Houve ainda uma desconstrução grave da legislação do meio ambiente e da tentativa de dar uso de armas a setores da população sem nenhuma justificativa. Bolsonaro se inscreve na crise como organizador de um movimento político que se insurgiu contra todos os avanços que tinham ocorrido nos 30 anos anteriores. Ele deteriora as condições da democracia.

Entrevista | Francis Weffort: ‘Bolsonaro não obedece às regras de um sistema democrático’

Na avaliação do cientista político, é muito difícil um país com o espírito regional forte, como o Brasil, virar uma ditadura

Marcelo Godoy / O Estado de S. Paulo

Como a democratização por via autoritária se manifesta em nosso dias e, particularmente, no governo de Jair Bolsonaro?

Essa ideia da democratização por via autoritária é uma noção para cobrir todo o processo que vem dos anos 1930 para cá. Meu entendimento é que Jair Bolsonaro é um subcapítulo desse processo. Ele repete, provavelmente sem saber, os procedimentos já adotados pelo Getúlio (Vargas) em 1930. Não vejo Bolsonaro como agente da democratização, ele fala que é democrata e que a democracia está ameaçada, mas não o comparo a nenhum dos líderes autoritários democráticos que já tivemos.

O sr. quer dizer que a democracia para Bolsonaro teria um caráter meramente instrumental?

Eu creio que sim: instrumental e propagandístico, porque efetivamente ele fala de uma democracia que a gente não vê acontecer. A única medida que mais ou menos assemelha o governo Bolsonaro à essa tradição brasileira é o auxílio emergencial, algo típico da democracia autoritária. Claro que o Estado deve dar o auxílio, mas isso é um gesto democrático que vem de fonte autoritária.

O sr. trabalha a ideia de que a democratização por via autoritária torna difuso o conceito de que a política se realiza à parte da sociedade. E também dá como herança outra ideia, a de que a vontade do líder vale mais do que o respeito às leis, de que a política só se efetiva quando autoritária...

A política só se efetiva quando ela fala, se expressa pelo líder, pelo chefe, pelo comandante. Essa é a ideia básica. O Bolsonaro acredita que deve opinar sobre tudo como se pudesse entender de tudo. Estamos em uma pandemia e ele agora decide da cabeça dele que não é necessário usar máscara para quem já foi vacinado. Ou seja, não obedece às regras habituais de um sistema democrático. Nesse sentido é autoritário.

O sr. também descreve no livro surgimento de dissidências oligárquicas. Bolsonaro não é um dissidente. Como ele se situa dentro dessa tradição?

Ele é um caso à parte. Nesse sentido ele é um ponto fora da curva. Ele é ex-membro de uma organização de Estado. As dissidências oligárquicas têm relação com os chefes políticos regionais, da tradição oligárquica brasileiro. Ele é um ex-oficial que fala como ex-oficial.

Ele se insere dentro da tradição de uma parte da burocracia estatal, o Exército, de intervir na vida política da República?

Eu diria que ele quer relembrar tradição. Ele quer convocar essa tradição a favor dele, mas é muito diferente, como significado político, de toda essa tradição, pois ela é a tradição do tenentismo. É a que vem de antes do fim do Império, muito antiga, que fala dentro do Exército. Ele é excluído do Exército e fala da memória de ter sido. Ele não é bem esse personagem, mas quer lembrar essa tradição em nome dele. Então diz: ‘O meu Exército’.

Tenta reeditar a ideia de uma reforma institucional que passe pela moralização da política?

Exatamente. Isso sim. Se você lembrar bem, a Revolução de 1930 foi uma revolução em nome da moralidade pública, um grande movimento de opinião pública que passou pelas Forças Armadas e entrou na tradição militar. É verdadeiramente da tradição brasileira. É curioso, mas a Revolução de 1930 é uma luta pela democracia, pois a democracia que tínhamos era restrita, era oligárquica. Fica na tradição a lembrança da democracia vencendo. É parte do discurso oficial brasileiro, parte do sonho brasileiro – digamos assim –; o fantasma brasileiro, da ilusão brasileira da democracia. E parte das tradições de origem militar.

Fernando Gabeira - Para sair desta maré

- O Globo

 ‘É tudo um tecido de mentiras.’

Essa frase de um personagem de Ingmar Bergman às vezes me vem à cabeça quando tento sintetizar a política do governo Bolsonaro contra a pandemia.

Noutros momentos, procurei destacar a base dessa atitude devastadora, que é a negação de fatos. A negação como fenômeno psicológico foi teorizada por Freud em 1923. Sua filha Anna Freud ampliou os estudos do tema, sobretudo em crianças.

Não ver ou ouvir certos fatos às vezes é uma tentativa de evitar a dor ou o desafio que abale nossas convicções do mundo. Nas crianças indefesas, até que isso, em determinadas condições, tem um lado positivo e permite seguir adiante apesar de experiências traumáticas.

Em política, esse conceito de negação foi usado também para definir as teses que negam o Holocausto e as atrocidades do regime nazista.

Mas às vezes essa tendência se infiltra na sociedade. Michael Milburn e Sheree Conrad escreveram um livro sobre as principais políticas de negação na sociedade norte-americana.

Bolsonaro se recusou a aceitar a existência da pandemia. Da célebre comparação do vírus a uma gripezinha a todos os passos posteriores, sua atitude foi negar.

No auge da pandemia, já com 480 mil mortos, ele ainda fez uma tentativa desesperada de negar que todas essas mortes foram causadas pela Covid-19. Para isso, um auditor amigo produziu um relatório fake e o introduziu no sistema do Tribunal de Contas da União.

No entanto, na CPI da Covid, onde se apuram as responsabilidades, a tendência do governo é negar sua política de adesão à hidroxicloroquina e recusar a vacina. É a negação da negação.

Federações partidárias viram boia de salvação para 'nanicos' e abrem caminho para fusões

Projeto que tramita em regime de urgência na Câmara faz com que partidos 'driblem' cláusula de barreira, mas engessa alianças para 2022

Pedro Venceslau e Camila Turtelli / O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO E BRASÍLIA - O projeto de lei que cria o modelo de federações partidárias e tramita em regime de urgência na Câmara pode forçar a ação conjunta de partidos de oposição e abrir caminho para fusões partidárias. Segundo dirigentes e especialistas ouvidos pelo Estadão, a mudança, que é vista como uma tábua de salvação para as legendas pequenas, conta com o apoio “solidário” das siglas de esquerda, mas sofre resistência entre as médias e do Centrão.

Se for aprovado em plenário, o novo modelo também vai engessar as articulações em torno das eleições de 2022, já que os blocos que se formarem terão que apoiar o mesmo candidato presidencial e a governador em todos os Estados. O tema entrou em debate após o “endurecimento” da cláusula de desempenho ou de “barreira” – ela funciona com uma espécie de “filtro”.

A cláusula entrou em vigor antes do fim das coligações partidárias proporcionais (ou seja, nas eleições parlamentares), que começaram a valer em 2020. Ela estipula um patamar mínimo de votos para que uma legenda tenha acesso ao Fundo Partidário, tempo de rádio e TV no horário eleitoral e espaços de liderança no Congresso – e cresce progressivamente a cada eleição.

Nas eleições 2018, esse número foi de 1,5% dos votos válidos para deputado federal, distribuídos em pelo menos um terço dos Estados. Em 2022, esse piso pulará para 2% (o que equivale a eleger 11 deputados). O piso aumenta de forma progressiva até chegar a 3% na eleição de 2030.

O tema é complexo, mas, em resumo, o objetivo do fim das coligações combinado com a cláusula é justamente reduzir o número de partidos no Brasil. Hoje existem 35 registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sendo que 28 elegeram representantes há quatro anos.

Na quarta-feira passada, por 429 votos a favor e 18 contra, os parlamentares no plenário concordaram em dar prioridade ao texto do Senado, de autoria de Renan Calheiros (MDB-AL), que permite a dois ou mais partidos se reunir em uma federação para que ela atue como se fosse uma única sigla nas eleições.

Carlos Pereira* - Viés de otimismo dos bolsonaristas

- O Estado de S. Paulo

Conexões de conservadores com Bolsonaro diminuem a percepção de risco quanto à suscetibilidade e a gravidade da covid

Pessoas tendem a superestimar as chances de experimentar resultados favoráveis ou subestimar as chances de obter resultados desfavoráveis. Esse comportamento é conhecido como viés de otimismo e se manifesta em diversos contextos.

Por exemplo, indivíduos tendem a subestimar o risco de ganhar peso e contrair doenças cardíacas; mesmo quando fumantes, avaliam como baixo o risco de contrair câncer de pulmão; dirigem de forma arriscada quando consideram que são baixas as chances de se envolverem em acidentes.

O comportamento otimista sobre eventos futuros pode até gerar mais felicidade. Estudos apontam que otimismo estimula o sistema imunológico, diminui o risco de sofrer um AVC, propicia mais sucesso no trabalho, gera pessoas mais saudáveis etc. Mas o excesso de otimismo pode ser problemático, pois tende a induzir a comportamentos imprudentes e impedir a adoção de medidas de autoproteção.

Por outro lado, comportamentos de autoproteção podem afetar a própria percepção de risco. Por exemplo, ciclistas que fazem uso habitual de capacete tendem a dirigir suas bicicletas de uma forma mais aventureira.

Será que, no caso da pandemia da covid, medidas de autoproteção, como o uso de máscaras, estimulariam um otimismo irreal e, por consequência, um comportamento mais arriscado?

Para responder a essa pergunta, eu e meus coautores da FGV EBAPE (Yan Vieites, Guilherme Ramos, Eduardo Andrade e Amanda Medeiros) pesquisamos, a partir de dois surveys experimentais com o apoio do Estadão, se o uso de máscara durante a pandemia da covid poderia aumentar a propensão das pessoas a se sentirem mais seguras de não contrair a doença e/ou de desenvolvê-la na sua forma mais branda, e, com isso, se expor a mais riscos.

Bruno Carazza* - A arte de empurrar com a barriga

- Valor Econômico

Governo perde credibilidade ao reeditar Refis

E lá vamos nós novamente. A cada crise que sacode a economia brasileira, o governo e o Congresso Nacional logo tiram da cartola uma proposta para socorrer as empresas nacionais. Não importa a natureza da recessão, se política ou econômica, externa ou doméstica, a solução imaginada passa sempre por uma palavra mágica: Refis.

São 2,5 trilhões de reais. Esse é o valor da dívida que 4,7 milhões de cidadãos e empresas possuem junto ao Fisco federal, segundo a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), órgão do Ministério da Economia responsável pela gestão e execução de tributos, contribuições e outras obrigações não pagas na data ou no valor considerados devidos.

Marcus André Melo* - Pluralismo polarizado

- Folha de S. Paulo

A lógica da polarização centrífuga é muito mais complexa do que se pensa

nova onda populista causou certa perplexidade porque havia certo consenso que posições radicalizadas seriam derrotadas nas urnas por posições menos radicalizadas e mais “centristas”.

A lógica era cristalina: estas últimas contariam não só com o apoio de seu próprio campo mas também de rivais do polo oposto. O partido ou o candidato que expresse a preferência do eleitor mediano (que não se confunde com o ponto médio da escala ideológica), em disputa majoritária terá o apoio de uma maioria.

Mas como mostrou Sartori (1924-2017) na análise do que chamou “pluralismo polarizado” da Alemanha de Weimar, Chile de Allende, Itália do pós- guerra, a França da 4ª República, outros fatores importam. Neles não havia uma competição centrípeta pelo centro mas uma tendência centrífuga de radicalização entre os partidos e no eleitorado. E isso, argumentava, não decorria da adoção da representação proporcional, como se argumentava.

Sartori identificava sete traços fundamentais no pluralismo polarizado, mas alguns nos interessam. O primeiro é a existência de partidos ou movimentos anti-sistema que tem efeitos deslegitimadores (ou devastadores quando chegam ao poder). O segundo é que, em reação, tais partidos levam o centro a ser “habitado”, impedindo o centrifugalismo moderador da competição entre dois polos.