segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Paulo Fábio Dantas Neto* - Um político por vocação

Roberto Freire, político pernambucano e nacional, com mais de 60 anos de contínua militância na esquerda, desde seus tempos de estudante, está, desde sábado, 09.09, virtualmente fora da vida política brasileira. Foi destituído da presidência do Cidadania, por maioria de votos dos atuais dirigentes.

É uma situação na qual é muito difícil distinguir os assuntos específicos do partido daqueles que dizem respeito à política de uma maneira mais ampla.  Cabe concentrar-se nesses últimos e contornar o tema da disputa interna pelo poder partidário, com suas inevitáveis controvérsias sobre métodos e fins das partes em litígio. Esses assuntos podem ter lá a sua importância para os membros da organização, mas estão longe de terem o mesmo interesse público que há em saber qual a importância e o papel que o Cidadania poderá ter na política brasileira após o desfecho desse conflito. Se o Cidadania nunca teve mais que um papel coadjuvante, foi sempre uma coadjuvância muito respeitável. Torcemos para que, após o desfecho da crise partidária, essa respeitabilidade política mantenha-se, de alguma forma.

Freire foi, por décadas, membro atuante e destacado do Congresso Nacional, como deputado federal e senador, ministro de estado e longevo dirigente de um partido que integrou durante toda a vida, como militante e voz parlamentar, inicialmente de modo clandestino (no tempo da ditadura, abrigado na frente democrática que foi o antigo MDB), depois como seu mais notório representante popular eleito.

PCB (o antigo “partidão”) foi a sigla originária dessa histórica organização, bem anterior à trajetória pessoal do político em questão. PPS e Cidadania, os nomes que ela passou a adotar, sequencialmente, no bojo de mudanças de paradigma, programa e atitude política, as quais já ocorreram sob sua liderança. Essa porta, pela qual agora Freire está provavelmente saindo da cena política, não é o assunto aqui. Tendo deixado esse/aquele partido há quase vinte anos e ali estando, ainda, amigos a quem estimo e respeito, não me sinto apto a analisar os meandros daquela organização para entender o desfecho do último sábado. Cabe, porém, lamentar que tenha ocorrido e a razão do lamento é a falta que esse valoroso quadro fará, se de fato se afastar da vida política brasileira, tão carente de quadros assim.

Roberto Freire é, certamente, o dirigente político que melhor simboliza o encontro dos antigos comunistas brasileiros com o tema da democracia política. Encontro ocorrido ao longo de um caminho tortuoso em que frustrações superaram conquistas. Muita coisa já se escreveu sobre isso. Duas das mais persuasivas análises, reportando a contextos históricos diversos (“A esquerda positiva: as duas almas do Partido Comunista - 1920/1964”, de Gildo Marçal Brandão[1] e “Questão nacional e democracia: o ocidente incompleto do PCB”, de Luiz Werneck Vianna[2]) mostraram nitidamente esse dilema, jamais plenamente resolvido, entre as inspirações ligadas ao bolchevismo e à social-democracia reformista. As políticas “interna” e “externa” não conversavam bem e não poucas vezes o dilema levava a um pântano. Ainda assim, graças ao seu predominante foco na política e na sociedade real, no diálogo positivo com o que havia fora e distinto de si, o PCB afirmou-se como contraponto, simpático à democracia política liberal, numa esquerda atraída por concepções e experiências avessas a ela. O PCB pedia urnas e não fuzis; saudava Allende, não Fidel.

Alex Ribeiro - Risco fiscal preocupa os banqueiros centrais

Valor Econômico

Agora estão em evidência também os efeitos que os riscos fiscais causam na curva de juros futuros nas economias avançadas, sobretudo nos EUA, com repercussões em todo o mundo

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, acha que os seus colegas vão ter que falar com mais frequência sobre o descontrole fiscal de seus países. “Os banqueiros centrais vão ter que levantar a mão e dizer que o trabalho será muito mais difícil se o fiscal não for controlado”, disse, num evento recente do Fundo Comunitário Keren Hayesod.

A preocupação de Campos Neto com o fiscal não é nova: ele vem insistindo há tempos que uma boa parte da inflação global é um problema de excesso de demanda, que foi puxada, pelo menos em parte, pela política fiscal expansionista. Agora, estão em evidência também os efeitos que os riscos fiscais causam na curva de juros futuros nas economias avançadas, sobretudo nos Estados Unidos, com repercussões nas economias no resto do mundo.

As discussões ganharam impulso há duas semana na reunião de Jackson Hole, o mais importante encontro de banqueiros centrais e especialistas em política monetária do mundo, organizado pelo Federal Reserve (Fed) de Kansas City. Para puxar o assunto, os organizadores encomendaram um estudo sob medida do historiador econômico Barry Eichengreen, da Universidade da Califórnia, em Berkeley.

Um dos pais do Plano Real, o economista Persio Arida, no mesmo evento com Campos Neto, resumiu assim as conclusões de Eichengreen: “a dívida pública é um enorme problema e não tem solução”. As economias avançadas ainda têm alguma chance lidar com esse ambiente complicado, mas para os países emergentes e em desenvolvimento terão uma tarefa muito mais difícil.

Bruno Carazza* - A revolução silenciosa e a reforma administrativa

Valor Econômico

Pix revolucionou o sistema financeiro apesar de governos e do Congresso

Organizando gavetas e armários neste feriadão, encontrei uma pasta com cópias impressas de meus extratos bancários de 20 anos atrás, quando iniciava minha vida profissional e familiar. Mais do que registros financeiros de uma vida que já parece distante na memória - sem filhos, morando em outra cidade e num trabalho completamente diferente do atual -, a sucessão de linhas de créditos e débitos são atestados de uma revolução silenciosa ocorrida na economia brasileira.

Em setembro de 2003, com 14 saques e 7 cheques compensados, as operações mais frequentes na minha conta bancária representavam 28% do valor de todas as minhas despesas financeiras.

Marcus André Melo* - A anistia judiciária

Folha de S. Paulo

A expansão anômala do papel do STF na arbitragem política terá vastas consequências

Quando se especulava sobre a prisão de Lula em 2017, argumentei que provavelmente ele seria preso e eventualmente anistiado. A conjetura mostrou-se acertada. A anulação dos processos e provas é o equivalente funcional a uma "anistia judiciária". Numa perspectiva positiva e não normativa da ciência política não importa se a decisão é legal ou legítima, mas por que razão se espera que determinados fenômenos ocorram e quais suas consequências.

Historicamente, no país, há um padrão de resolução de graves conflitos políticos por meio de anistia e conciliação. Foram 52 anistias desde 1890. O objetivo maior foi a "pacificação política", como mostrou Ann Schneider. Mas a analogia acaba aqui. Há dois aspectos que merecem destaque. Os protagonistas dos grandes episódios de anistia, indulto e graça foram os presidentes —Floriano (Revolta da Armada), Vargas (Revolução Constitucionalista), Kubitschek (Aragarças), Figueiredo (luta armada)—, não o Poder Judiciário.

Denis Lerrer Rosenfield* - Valores

O Estado de S. Paulo

A sociedade brasileira está mudando, ganha autonomia, mas sua representação política continua agarrada ao passado

Lula e Bolsonaro, os principais contendores dos últimos anos, nada apresentaram de propostas ou de valores em seus respectivos pleitos, salvo os lugares-comuns que lhes possibilitassem um capital eleitoral. Ao serem eleitos, abriu-se um vácuo sobre o que iriam fazer, preenchido por atitudes políticas de Bolsonaro cada vez mais à direita, enquanto Lula se aferrou a propostas desgastadas e fracassadas do seu segundo governo e nos de sua sucessora. Na verdade, o Brasil tem se enfrentado com um vazio de ideias, porém se pode igualmente dizer que a sociedade tem trilhado seu caminho na defesa de valores, alguns de corte conservador e liberal. As propostas propriamente de esquerda estão mais confinadas aos núcleos de militantes, às universidades e a setores da imprensa e dos meios de comunicação.

Felipe Moura Brasil - A ‘natureza humana’ de Toffoli

O Estado de S. Paulo

Ao ignorar laudo e sindicância, ministro cumpriu a expectativa de Marcelo Odebrecht

“Afinal vocês fecharam com o amigo do amigo de meu pai?” A frase foi escrita por Marcelo Odebrecht em e-mail enviado em 13 de julho de 2007 a Adriano Maia e Irineu Meireles.

Em 3 de abril de 2019, quando o empreiteiro era “colaborador da Justiça”, seus advogados apresentaram à PF um arquivo para “esclarecimento, com o detalhamento possível, dos assuntos lícitos e ilícitos tratados” nos e-mails, “assim como identificação de eventuais codinomes”.

“‘Amigo do amigo de meu pai’ se refere a José Antonio Dias Toffoli”, explicaram, citando o hoje ministro do STF e então advogado-geral da União no segundo mandato de Lula, o “amigo do meu pai”, Emílio Odebrecht.

Fernando Gabeira - Tempos de El Niño

O Globo

No fim do século passado, já tínhamos como prever e, consequentemente, atenuar seus efeitos

No Vale do Jequitinhonha, onde Minas se aproxima do Nordeste, chove pouco. Talvez chova muito menos por causa do El Niño. O El Niño influencia as enchentes no Sul. Ele é assim: faz chover intensamente em alguns lugares e desaparece com a chuva noutros.

O nome El Niño foi dado por pescadores peruanos porque ele surge perto do Natal. É um fenômeno produzido pelo aquecimento diferenciado das águas do Oceano Pacífico. Num momento em que falamos tanto de nudanças climáticas, ele ressalta a importância dos oceanos, que, às vezes, esquecemos, preocupados com as florestas e a ecologia urbana.

No passado, demos mais importância ao El Niño. Em 1997, o Senado fez uma comissão para estudá-lo, e o resultado foi um documento completo, que deveria, creio eu, ser distribuído para as escolas. Naquele momento, no entanto, as coisas não pareciam tão graves, não se falava tanto em aquecimento global. Apenas o El Niño importava. Sua aparição em 1983 causou 170 mortes no sul do continente e prejuízos de US$ 3 milhões.

Miguel de Almeida - A vez dos patriotas do sopão

O Globo

STF enfrenta uma velha tradição brasileira — a maldição do golpe de Estado

Embora o Manifesto Dias Toffoli tenha confirmado, em letras garrafais, a máxima tupiniquim — “no Brasil, até o passado é incerto” —, o Supremo Tribunal Federal (STF) julga nos próximos dias os primeiros réus do 8 de Janeiro. À beira de sua aposentadoria, a presidente do tribunal, Rosa Weber, num gesto simbólico de contemporaneidade, pôs temas candentes em pauta, entre eles a questão do aborto e os golpistas bolsonaristas.

A carta toffolesca de perdão e súplica, a quem interessar possa, por certo nubla a despedida de Rosa Weber. Difícil ombrear em pompa e chiste com o arrazoado mal disfarçado de quem some com o mapa do tesouro. Ainda bem que a manifestação de caráter revisionista não se dá sob a fatwa lulista do voto (ou despacho) secreto. Assinada e datada, a decisão monocrática, mesmo com a evidência de bilhões de dólares devolvidos, já figura no folclore brasileiro, ao lado do terraplanismo, da manga com leite e da lepidez injuriosa de Barrichello. Soa contaminada pelo jeito Moro de julgar — um olho na plateia e outro no aplauso bacharelesco.

Nos 50 anos do golpe militar, Chile é um país rachado e atormentado pelo passado

Partidos de direita e extrema direita dominam a agenda nacional e divisões ameaçam plebiscito sobre nova Constituição

Janaina Figueiredo / O Globo

Em outubro de 1988, num plebiscito convocado para determinar se o regime ditatorial comandando pelo general Augusto Pinochet, líder do golpe de Estado que derrubou o governo do socialista Salvador Allende em 11 de setembro de 1973, quase 56% dos chilenos optaram pelo retorno da democracia. Depois de uma ditadura que, segundo dados oficiais, matou mais de 3 mil pessoas e teve, no total, mais de 40 mil vítimas de uma violência brutal contra opositores, a sociedade chilena disse basta. Hoje, quando muitos imaginaram que os 50 anos do golpe seriam lembrados num ambiente de consenso sobre um período nefasto de sua História, o Chile continua sendo um país rachado, que não encontra caminhos para enterrar um passado que ainda o atormenta, e seu legado, principalmente a Constituição deixada pelo regime militar.

Depois de um primeiro plebiscito no qual um projeto de nova Carta Magna foi rechaçado, no ano passado, os chilenos irão novamente às urnas em 17 de dezembro. Segundo recentes pesquisas, o mais provável é que um segundo texto, desta vez redigido por uma Convenção Constitucional na qual os partidos de direita são maioria, também naufrague. Se este for o resultado, o governo do presidente Gabriel Boric, à frente de uma coalizão de esquerda, já avisou que não haverá, em sua gestão, uma terceira tentativa. O Chile entraria num período de forte instabilidade e, diante do temor que essa possibilidade provoca, a presidente do Banco Central, Rossana Costa, declarou recentemente que “até agora conseguimos que todo o processo de mudanças não afete o desempenho da economia”. Costa destacou que essa contenção de danos permitiu, até mesmo, que o país tenha registrado uma queda da inflação, tema que preocupa a grande maioria da população.

Ex-exilados brasileiros e ministros do governo Lula participarão de atos pelos 50 anos do golpe de Pinochet

Seis brasileiros assassinados pela ditadura chilena serão homenageados na embaixada do Brasil em Santiago

Janaina Figueiredo  / O Globo

Antes do golpe de Estado de 11 de setembro de 1973, o Chile foi um dos países mais procurados por brasileiros que rumaram para o exílio durante a ditadura brasileira. Alguns desses ex-exilados estarão no país para participar de eventos sobre os 50 anos do golpe dado por Augusto Pinochet, e, entre outras atividades, visitar ex-centros clandestinos de tortura em Santiago. O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva será representado pelo ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida, e pelo ministro da Justiça, Flávio Dino.

Um dos coordenadores do grupo de 137 ex-exilados que estarão em Santiago é Ricardo de Azevedo, de 74 anos, que morou no Chile entre junho de 1972 e outubro de 1973. Azevedo, como vários outros brasileiros, esteve detido no Estádio Nacional, um dos principais centros clandestinos de torturas do regime militar chileno.

— Éramos 105 brasileiros no Estádio, alguns foram muito torturados, eu levei umas porradas. Vimos muitos policiais brasileiros por lá, eles treinaram os torturadores chilenos, que no começo não sabiam o que era um pau de arara — conta Azevedo ao GLOBO.

No Brasil, ele militava na Ação Popular, e chegou a estar um ano e três meses preso em Tiradentes. Depois de ser banido do Chile pela ditadura, voltou outras duas vezes, mas nunca teve coragem de entrar no Estádio Nacional. Desta vez, assegura, vai se reencontrar com o passado.

No manifesto divulgado este mês por ex-exilados brasileiros no Chile, os assinantes afirmam que “depois do golpe militar fascista de Pinochet passamos a ser considerados indesejados, perseguidos, presos expulsos do país e até mesmo assassinados”. Os nomes dos seis brasileiros mortos nos porões da ditadura chilena estarão numa placa que será inaugurada dentro da embaixada do Brasil em Santiago, e também numa segunda placa colocada na Praça Brasil. As vítimas foram Tulio Quintiliano Cardoso, Wanio José de Mattos, Jane Vanini, Nelson de Souza Kohl, Luiz Carlos de Almeida, Nilton Rosa da Silva.

— O Estado brasileiro vai reconhecer a responsabilidade e cumplicidade no golpe — frisa Azevedo.

O papel do Brasil no golpe de Pinochet foi investigado em profundidade pelo jornalista e analista internacional Roberto Simon, autor de “O Brasil contra a democracia. A ditadura, o golpe no Chile e a Guerra Fria na América do Sul”. O livro acaba de ser lançado no Chile, onde Simon participará, no contexto das homenagens pelos 50 anos do golpe, de debates sobre as participações de Brasil e Estados Unidos na ação de Pinochet.

— O Brasil, ao lado dos EUA, foi o principal ponto de apoio externo do golpe no Chile, e por isso deveria assumir sua responsabilidade, continuar as buscas de documentos militares que revelem mais informações sobre essa participação. Quando pedi acesso a documentos do adido militar brasileiro no Chile no momento do golpe a resposta foi que tinham sido destruídos. Existe um grande buraco que nunca abrimos — conclui Simon.

Roberto Simon* - É hora de o Brasil reconhecer seu papel na destruição da democracia do Chile

Ao mostrar que não tem medo do passado, país aumentará a pressão para que outros, como os EUA, façam o mesmo

Há 50 anos, quando Augusto Pinochet fulminou a mais longeva democracia da América Latina, o Brasil foi o primeiro país a reconhecer a nova junta militar do Chile. Com milhares de civis a serem despejados no Estádio Nacional de Santiago, a arena esportiva convertida em centro de prisioneiros, o governo de Emílio Garrastazu Médici despachou uma missão, sob o comando do SNI (Sistema Nacional de Informações), para auxiliar nos "interrogatórios".

Enquanto notícias de torturas e execuções corriam o mundo, diplomatas brasileiros foram os principais advogados da neófita ditadura em foros internacionais e bilateralmente. O Brasil saltou novamente à frente ao tentar evitar uma bancarrota chilena, oferecendo crédito subsidiado de US$ 1,8 bilhão (R$ 9 bilhões, em valores atuais). Rapidamente, virou o segundo maior fornecedor de armas ao Chile. E dezenas de agentes da Dina —a polícia secreta de Pinochet— receberiam treinamento em território brasileiro.

Cinco décadas após aquele 11 de setembro de 1973, documentos antes secretos do Brasil, Chile e Estados Unidos mostram como, ao lado do governo Richard Nixon, a ditadura brasileira foi o principal ponto de apoio externo à destruição da democracia no Chile.

É um passado que ainda nos assombra, perpetuando-se na injustiça dos desaparecidos, chilenos e brasileiros, e no revisionismo histórico que hoje intoxica ambas as democracias. O antídoto é encarar essa história. Cabe ao Brasil reconhecer sua responsabilidade no apoio ao golpe contra Salvador Allende e ao regime de terror que o sucedeu.

Chile no cinquentenário do Golpe de Estado 1973


Horário das 11:30 ás 12:30 hs

O que a mídia pensa: editoriais / opiniões

Opção de negar é crítica em desconto para sindicato

O Globo

STF estabeleceu alternativa aceitável a imposto sindical, mas recusa do empregado precisa ser facilitada

Contrariando posições anteriores, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) formaram maioria para considerar constitucionais as contribuições assistenciais cobradas pelos sindicatos, mesmo dos não sindicalizados. A justificativa é que, em contraste com a contribuição sindical obrigatória — extinta pela reforma trabalhista de 2017 — , a assistencial se destina a financiar a representação sindical exercida em nome de todos os trabalhadores (não sindicalizados também se beneficiam de acordos coletivos) e terá valor compatível com os resultados. O voto vencedor determina que, ao empregado, será assegurado o “direito de oposição”, podendo recusar o desconto em seu salário.

No entender dos ministros que já votaram pela aceitação da contribuição assistencial — o julgamento virtual vai até hoje —, ela é uma resposta coerente com a negociação coletiva. Para eles, se o sindicato representa todos os trabalhadores ao firmar o acordo, também deve poder representá-los para aceitar o desconto na folha salarial. A contribuição assistencial também permitiria, segundo o voto majoritário, reerguer o sistema sindical — previsto e valorizado pela Constituição, mas enfraquecido pela reforma trabalhista de 2017 (a arrecadação caiu de R$ 3 bilhões para R$ 66 milhões em 2021).

Poesia | Façam Silêncio - Pablo Neruda

 

Música | Victor Jara - El Derecho de Vivir en Paz

 

Música | Violeta Parra - Gracias a la vida

 

Música | CHILE: INTI ILLIMANI - EL PAÍS QUE SOÑAMOS

 

domingo, 10 de setembro de 2023

Jairo Nicolau* - Representação desproporcional

O Globo

Muitos eleitores não se dão conta de que seus votos não têm o mesmo peso nas eleições para a Câmara dos Deputados

A ideia de que numa democracia o voto de todos os cidadãos deve ter o mesmo valor é fácil de ser observada nas eleições presidenciais brasileiras. Basta acompanhar a apuração para entender que votos vindos de todos os lugares do país têm o mesmo peso na definição da votação final de cada candidato a cargo majoritário.

Muitos eleitores não se dão conta, porém, de que os seus votos não têm o mesmo peso nas eleições para a Câmara dos Deputados. Para isso acontecer, a bancada de cada estado teria de ser proporcional à população; um estado onde moram 10% dos habitantes do país teria uma bancada de 10%. Essa é a regra adotada na distribuição das cadeiras da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos desde o fim do século XVIII.

No Brasil isso nunca aconteceu. As bancadas das províncias (no Império) e dos estados (na República) nunca foram proporcionais à população. As unidades que ganharam e perderam variaram no tempo, e existem muitas razões para os legisladores optarem por não seguir o modelo proporcional adotado nos Estados Unidos.

Atualmente, o voto dos eleitores brasileiros não tem o mesmo peso nas eleições para a Câmara dos Deputados por duas razões. A primeira é o estabelecimento de um piso e um teto na representação das unidades da Federação na Câmara — nenhuma pode ter menos de oito ou mais de 70 deputados.

O Brasil tem 203 milhões de habitantes (Censo de 2022). Para sabermos o número de habitantes que cada deputado federal representa, dividimos 203 milhões por 513 (o total de deputados federais). O resultado da divisão é 396 mil.

Bernardo Mello Franco – Vem aí o Ministério da Jogatina

O Globo

Grupo de Arthur Lira quer comandar setor de apostas e acelerar liberação de bingos e cassinos

O Ministério do Esporte informa: sai uma campeã do vôlei, entra um especialista em outro tipo de saque. A troca de Ana Moser por André Fufuca marca a capitulação do governo Lula à chantagem parlamentar do Centrão. E pode tomar contornos ainda piores, a depender do novo desenho da pasta.

Para selar o acordo, a turma de Arthur Lira exigiu que o ministério fosse turbinado com mais verbas e atribuições. Seu sonho de consumo é a secretaria que cuidará das apostas esportivas, um negócio com muito dinheiro e nenhuma transparência.

A atividade foi legalizada em dezembro de 2018, no apagar das luzes do governo Michel Temer. Desde então, cresce numa zona de penumbra, sem regulamentação e sem recolhimento de impostos.

Nos últimos meses, servidores do Ministério da Fazenda se dedicaram a modelar uma secretaria especial para o setor. Antes de sair do papel, o órgão pode cair no colo de Fufuca e companhia. Seria uma derrota para o ministro Fernando Haddad, que diz não ver motivos para a mudança de pasta.

Dorrit Harazim - O despejo de Ana Moser

O Globo

Nenhum país de projeção econômica deixa de ser também potência esportiva, pois medalhas têm relação direta com desenvolvimento humano

Atleta consagrada e cidadã engajada, Ana Moser não tinha padrinho político nem peso partidário. Dentro e fora das quadras, sua filiação sempre foi ao esporte com “E” maiúsculo — aquele que forma, educa, constrói uma sociedade saudável e participativa. Despejada do ministério que ocupou por apenas 245 dias, foi substituída por um apadrinhado do cacique Arthur Lira, presidente da Câmara de Deputados, em nome de um sempre incerto apoio do Centrão à governabilidade do presidente Lula.

Apesar de anunciada e esperada há semanas, a troca não é banal. Ela foi doída por retratar o menosprezo secular dado à função social do esporte no Brasil e por ocorrer justo quando a pasta embicava na busca de políticas públicas de alcance duradouro. Por si só, o nome de Ana Moser gerava orgulho e confiabilidade nacional — das alegrias nas quadras, então, nem se fala! E não deixa de ser ironia ter sido substituída por um deputado federal, André Luiz de Carvalho Ribeiro (PP/MA), que trocou de sobrenome pelo apelido do pai, prefeito de Alto Alegre do Pindaré, para fazer carreira política: Fufuca. Ou Fufuquinha.

Elio Gaspari - O brado retumbante de Toffoli

O Globo

Ministro do STF, que viu a Lava-Jato passar sem maiores manifestações, proferiu um voto tardio e pouco original para anular as provas do acordo de leniência da Odebrecht

Com o seu brado retumbante, classificando a prisão de Lula como “um dos maiores erros judiciários da história do país”, o ministro Dias Toffoli alistou-se na categoria criada pelo jornalista americano Murray Kempton para os editorialistas: “O serviço deles é descer da colina depois da batalha para matar os feridos”.

Com um voto de 134 páginas, Toffoli anulou as provas do acordo de leniência da empreiteira Odebrecht e produziu uma catilinária contra a Operação Lava-Jato. Transbordando os limites do que se julgava, chamou-a de “armação”, “ovo da serpente” e “pau de arara”. Se o documento viesse assinado pelo atual ministro Cristiano Zanin, que à época defendia Lula e recorria das decisões enviesadas do então juiz Sergio Moro, seria o jogo jogado.

O brado de Toffoli é tardio e pouco original. Depois de ter sido reprovado em dois concursos para a magistratura, ele se tornou advogado do Partido dos Trabalhadores e foi nomeado no Supremo Tribunal em 2009, por Lula. Viu a Lava-Jato passar sem maiores manifestações. Os pontos de sua fala que mais chamaram atenção — “erro judiciário”, “tortura” e “ovo da serpente” — estão em falas antigas do ministro Gilmar Mendes, que combateu as práticas da República de Curitiba desde o primeiro momento. O voto de Gilmar pela suspeição do juiz Sergio Moro é de 2021.

Cacá Diegues - Oscar para o Brasil ontem e hoje

O Globo

O melhor cinema brasileiro começou a se interessar pelo assunto. Tivemos a seleção de alguns filmes, muitos premiados, e nunca mais tratamos a estatueta com desdém

Antigamente era o governo que indicava o filme nacional que ia competir como o melhor filme estrangeiro no Oscar americano. Conforme a época, isso era feito pela Embrafilme, pelo Ministério da Cultura e até mesmo pelo próprio Itamaraty. Mas nunca demos muita bola para o Oscar, que considerávamos uma premiação da e para a indústria de cinema americano.

Os americanos também não levavam muito a sério essa categoria da premiação. O Oscar de melhor filme estrangeiro era, em geral, atribuído ao filme que mais chegasse perto da tradição americana de uma dramaturgia naturalista e romântica. Um filme que, falado em outra língua, melhor reproduzisse a concepção dos grandes estúdios responsáveis pelos sucessos nas salas do mundo inteiro.

Míriam Leitão - Festa do livro na maior das bienais

O Globo

O quarto maior evento do Rio ficou mais cheio do que nunca, e mostrou que a profecia do fim do livro físico não faz sentido

A Bienal do Rio é o quarto maior evento do Rio de Janeiro. Perde apenas para o réveillon, carnaval e Rock in Rio. É um fenômeno que o quarto maior evento da cidade seja em torno do livro. Andar pelos corredores do Riocentro entre os estandes nos últimos dias foi um desafio. Estive lá na terça, 5, e na quinta, 7. Era uma mistura de pessoas de todas as idades. Na terça me vi várias vezes cercada de estudantes do Fundamental; na quinta, encontrei um senhor de 96 anos numa fila de autógrafos. Tudo era impressionante. Hoje termina a quadragésima edição da Bienal e, ao todo, mais de 600 mil pessoas passaram por lá.

Na opinião de Marcos da Veiga Pereira, integrante da diretoria do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, SNEL, o sucesso é resultado de um esforço coletivo.

Luiz Carlos Azedo - Mauro Cid aceitou a delação premiada para proteger a mulher e a filha

Correio Braziliense

Homem-bomba, o militar pode revelar os bastidores dessa história e muito mais. Só havia uma pessoa acima do ex-ajudante de ordens da Presidência: Jair Bolsonaro

O tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, teve o pedido de delação premiada homologado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. Estava preso desde maio deste ano, no Batalhão de Polícia do Exército, em Brasília, por suspeitas de ter participação do esquema de falsificação de vacina contra covid-19. No decorrer do processo, descobriu-se o envolvimento do militar na tentativa de golpe de 8 de janeiro e na venda de joias que Bolsonaro e a mulher, Michele, haviam recebido de presente da Arábia Saudita. Essas joias foram posteriormente recompradas e entregues ao Patrimônio da União.

Segundo o pedido de homologação da delação premiada, Mauro Cid fez revelações e forneceu provas que dão credibilidade ao seu pedido, durante quase 30 horas de depoimentos prestados à Polícia Federal. A mudança de postura do militar teve como catalisador seu depoimento na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPI), na qual foi duramente inquerido pela relatora Eliziane Gama sobre a situação em que havia deixado sua própria família.

Rolf Kuntz - O governo e a tal produtividade

O Estado de S. Paulo

Em algum momento, especialmente quando da nomeação de ministros, pode se tornar inevitável levar em conta padrões de competência, eficiência e produtividade

Parece piada falar em reforma administrativa, um dos assuntos quentes das últimas semanas, quando o presidente da República loteia cargos e planeja criar um 38.º ministério, destinado, oficialmente, a cuidar das pequenas e médias empresas. Até a palavra administração vira deboche, quando políticos são citados como prováveis futuros ministros e nada se conta sobre suas qualificações. O deboche tornou-se mais escandaloso quando Ana Moser, ministra do Esporte, apareceu como possível objeto de negócio – agora confirmado – no trocatroca político. As qualificações da ministra envolvem muito mais que vitórias notáveis em torneios nacionais e internacionais. Seu currículo inclui trabalhos importantes no desenvolvimento do esporte e da educação. Mas atributos como esses parecem perder relevância, quando se trocam postos de primeiro escalão por apoio parlamentar, sem levar em conta detalhes como experiência, competência administrativa ou preparo técnico. É um dos custos, poderão dizer em Brasília, do tal presidencialismo de coalizão. Tudo certo, então?

J. B. Pontes* - O desperdício de recursos públicos

Estivemos recentemente numa pequena cidade do interior do Estado do Ceará, situada em pleno sertão, onde está sendo aportada parte dos milhões de reais dos cofres públicos disponibilizados aos parlamentares do Centrão.

Ali a população está em êxtase, considerando os parlamentares patronos desses recursos públicos como verdadeiros heróis. Mesmo a parcela mais esclarecida, que tem consciência dos mecanismos que estão sendo usados pelos integrantes do Centrão para apoderar-se desses recursos, os considera apenas como muitos espertos. Alguns chegam a dizer que não importa quais os meios usados para a chegada de toda essa grana, mas sim que ela está chegando lá...

É a prática da filosofia do “levar vantagem em tudo”, mesmo sabendo que isso prejudica os interesses de outros municípios. Há registro, por exemplo, de município com menos de 10 mil habitantes que foi contemplado com 2 ou mais caminhões compactadores de lixo, enquanto o município vizinho com mais de 20 mil habitantes não tem nenhum.

Como os recursos estão sendo aplicados? Eles estão sendo usados para atender as reais necessidades da coletividade? As obras que estão sendo realizadas são priorizadas por meio de um planejamento de desenvolvimento socioeconômico do município, considerando as zonas urbana e rural? Nada disso é levado em consideração.

Vinicius Torres Freire - O bom discurso de Lula no G20 e a falta de pragmatismo e urgência do Brasil

Folha de S. Paulo

Presidente falou bem, mas país não tem política urgente de integração com o mundo

Luiz Inácio Lula da Silva fez um bom discurso sobre ambiente nesta cúpula do G20, na Índia. Basicamente bom porque óbvio e direto ao ponto que interessava.

O presidente disse que o mundo rico deve pagar a conta da redução de danos do desastre climático. O "Norte Global" é responsável em grande parte pela degradação do planeta. Mais do que justo, inevitável: não há alternativa maior para lidar com o problema, a não ser que sobreviesse uma revolução milagrosa no modo de produzir e consumir energia, comida e materiais.

Hélio Schwartsman - Vício virtuoso

Folha de S. Paulo

Livro define matemática como a arte de encontrar atalhos

A preguiça é um dos vícios mais virtuosos da humanidade. Ela não apenas nos levou a grandes invenções poupadoras de trabalho, como o arado e o computador, mas também é uma das forças propulsoras da matemática. Marcus du Sautoy (Oxford), em "Thinking Better" (pensando melhor), define a matemática como a arte de encontrar atalhos e confessa que a foi preguiça que o levou a se tornar um matemático.

"Thinking Better" é um daqueles livros de divulgação matemática que se leem como romances. O autor pesca a atenção do leitor desafiando-o a resolver um problema e, enquanto o contextualiza e apresenta a solução, que invariavelmente envolve um atalho, dá aulas de história e matemática. Também dá pistas de como a questão pode ser generalizada para iluminar outros problemas tão ou mais interessantes que o original.

Bruno Boghossian - Ruptura de pacto torna delação de Cid explosiva para Bolsonaro

Folha de S. Paulo

Coronel foi operador e testemunha de atos do ex-presidente porque oferecia lealdade e discrição

Quando a defesa de Mauro Cid deu os primeiros sinais de que o coronel poderia confessar a venda de joias e implicar Jair Bolsonaro, o ex-presidente disse que aquela era uma estratégia kamikaze. Ele declarou à Band que nunca havia ordenado a venda de presentes e afirmou que seu antigo auxiliar seria capaz de falar qualquer coisa para sair da prisão.

A reação de Bolsonaro naquele momento, há três semanas, mostrava que uma possível delação de Cid já era levada a sério. A comparação com os pilotos suicidas era um aditivo curioso, como se ele fosse obrigado a reconhecer que a confissão do ex-ajudante teria mesmo a capacidade de destruir outros personagens.

Muniz Sodré* - Sinais exalados

Folha de S. Paulo

O protofascismo é uma cesura social que penetra como estado de espírito no modo civilizatório

Uma cena neobrasileira. À beira da piscina do condomínio, o pacato vizinho, membro da classe médica, comenta à boca pequena: "Vejam o que fizeram com o homem...é a máfia!" Todos se conhecem, mas o silêncio que se segue é constrangedor. Antes, aparentemente, concordariam, não mais. O "homem" é o ex-mandatário, a "máfia" abrange entidades republicanas como o Supremo Tribunal Federal, o Ministério da Justiça e a Polícia Federal. No noticiário desfilam acusações gravíssimas, que a alma condominial, cognitivamente dissonante, suprime para metaforizar a República como Don Corleone.

Esse episódio corriqueiro, mas recorrente, é pretexto para observar a vida no seu acontecer específico e tentar trazer à luz aspectos originais do fenômeno da desorientação política, sem o automatismo das categorias normalmente usadas nas ciências históricas. A singularidade da vida pessoal comporta situações e manifestações irredutíveis às objetivações das estruturas sociais. Ignorância, ódio e interesses de classe são influentes fatores coletivos, porém é preciso voltar-se diretamente para a subjetividade enquanto vida histórica na recusa protofascista de enxergar a realidade.

Celso Rocha de Barros* - Taxar os ricos não é pecado

Folha de S. Paulo

Governo Lula não quer proibir riqueza, mas que paguem os mesmos impostos que todo mundo paga

No último dia 2, a Folha publicou artigo de João Camargo, presidente do grupo Esfera Brasil, com críticas à proposta do governo Lula de taxar os super-ricos. O artigo tinha o título "Ser rico não é pecado".

Para sustentar suas críticas, Camargo argumenta, primeiro, que taxar os ricos é difícil: os impostos sobre grandes fortunas (diferentes, portanto, da proposta do governo Lula) foram abandonados em diversos países porque os ricos sempre encontram formas de enviar seu dinheiro para fora do país.

Marcos Lisboa* - Reforma Tributária

Folha de S. Paulo

Grupos de pressão pressionam senadores com informações incompletas, para obter privilégios que trarão prejuízo a toda a sociedade

Anda difícil o debate sobre a Reforma Tributária no Senado. Grupos de interesse demandam regras especiais para pagar menos impostos, por vezes se valendo de argumentos que contam apenas parte da história.

O receio é que essas pressões sejam bem-sucedidas, o que vai aumentar a carga tributária a ser cobrada dos demais bens e serviços. Privilégios para alguns implicam prejuízos para o restante da sociedade.

Setores da agricultura pedem benefícios ainda maiores do que os obtidos na tramitação na Câmara. O mesmo ocorre com a aviação. A eles se somam advogados e profissionais liberais.

Por que mesmo essas empresas devem ter tratamento privilegiado, obrigando os demais a pagar uma carga tributária maior?

Cabe destacar outros pontos, pouco enfatizados pelos grupos que demandam tratamento privilegiado.

Primeiro, a reforma deixa de fora o regime do Simples, que contempla pequenas empresas.

Ruy Castro - A volta do disco impossível

Folha de S. Paulo

Colecionador arremata por R$ 535,50 um exemplar de 'Santos Dumont', perdido há 120 anos

Em 1901, Alberto Santos-Dumont contornou a torre Eiffel num dirigível com motor a gasolina, decolando e pousando no mesmo lugar, à vista de atônitos especialistas, jornalistas e do povo de Paris. Nunca tinha sido feito. Dois anos depois, no dia 7 de setembro de 1903, Santos-Dumont desembarcou do navio no porto no Rio e, embora ainda estivesse a três anos de voar no 14-Bis, já tinha aura de herói. Uma multidão foi recebê-lo. Alpinistas estenderam uma faixa no Pão de Açúcar para saudá-lo. E o querido palhaço e compositor Eduardo das Neves homenageou-o com a marcha "Santos Dumont".

Golpe no Chile: "Vimos quando tiraram o presidente, morto, do palácio"

Pedro Felipe Ramírez, 82 anos, era ministro da Habitação de Salvador Allende. Na manhã de 11 de setembro de 1973, tentou, sem sucesso, chegar ao Palácio de La Moneda

Rodrigo Craveiro / Correio Braziliense

Em 11 de setembro de 1973, terça-feira, Pedro Felipe Ramírez, ministro da Habitação do então presidente chileno, Salvador Allende, despertou às 6h. Recebeu a notícia de que havia um movimento dos militares em Santiago do Chile. "Eu e dois amigos que moravam em minha casa tentamos ir diretamente para o Palácio de La Moneda. Esperamos um pouco, até umas 8h. Em um momento determinado, seguimos por uma direção que não parecia mais segura. Decidimos, então, nós dirigir a uma fábrica, no setor industrial, chamada Fensa. Era uma indústria de artigos metálicos", contou ao Correio. "Ali tínhamos contato com dirigentes sindicais. O meu partido Izquierda Cristiana ('Esquerda Cristã') havia acordado de nos reunirmos ali se houvesse uma emergência. Éramos cerca de 200 companheiros tratando de nos conectar com os nossos dirigentes de partidos da Unidad Popular para ver que ações tomaríamos em conjunto". 

Impossibilitados de fazer o contato, o ministro e os companheiros de partido permaneceram na Fensa à espera dos acontecimentos. "De lá vimos o bombardeio ao La Moneda e escutamos o último discurso do presidente. Pela televisão, vimos quando o tiraram o presidente, morto, do La Moneda", lembrou Ramírez, hoje com 82 anos. "Então, nos demos conta de que nada havia a ser feito. Havia um toque de recolher às 18h. Então, instruímos todos os companheiros a que cada um tomasse medidas de segurança pessoais e mantivesse contato com os outros para passar instruções".