terça-feira, 25 de junho de 2013

OAB afirma ser contrária à convocação de Constituinte

De acordo com o presidente nacional da entidade, não é preciso mexer na Constituição para fazer a reforma política

João Domingos

O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinicius Furtado Coelho, se disse nesta segunda-feira, dia 24, contrário à convocação de uma Constituinte exclusiva para a reforma política, conforme proposta feita pela presidente Dilma Rousseff em torno de um pacto com os governadores e prefeitos. De acordo com Furtado, nem é preciso mexer na Constituição para fazer a reforma política.

"É muita energia gasta em algo que pode ser resolvido sem necessidade de mexer na Constituição. Basta alterar a Lei das Eleições e a Lei dos Partidos. É isso o que queremos com o projeto de lei de iniciativa popular, que já está pronto, de reforma política. É prático e direto. Acaba com o financiamento de campanhas por empresas e define regras para eleições limpas. É por lei, não pela Constituição", afirmou.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Entidades iniciam coleta de assinaturas por reforma política

O movimento "Reforma Política Já" precisa de 1,5 milhão de adesões; no Rio, OAB lançou um comitê de mobilização

Mariângela Gallucci, Luciana Nunes Leal

BRASÍLIA e RIO - Entidades que se mobilizaram para a aprovação da Lei da Ficha Limpa lançaram ontem, em Brasília, uma campanha por eleições limpas no País. A rede de aproximadamente 70 instituições iniciou a campanha "Reforma Política Já" e a coleta de 1,5 milhão de assinaturas para a apresentação de um projeto de lei de iniciativa popular.

No Rio, a seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) criou um Comitê de Mobilização pela Reforma Política durante um ato público. O presidente da OAB-RJ, Felipe Santa Cruz, disse que uma agenda institucional de mudanças deve ser o passo seguinte das mobilizações que se espalharam pelo País.

"Há uma clara insatisfação nas ruas que, ou vai para o campo da fúria ou da esperança. Apostamos na esperança. O comitê terá uma agenda de mobilização, reunirá os pontos de consenso e apresentará uma proposta ao Congresso Nacional", afirmou.

Lançada na sede da OAB na capitai federal, a iniciativa dos autores do Ficha Limpa - adiantada pelo Estado no domingo - propõe uma ampla reforma política que acabaria com o fimanciamento das campanhas por empresas.

O presidente nacional da Ordem, Marcus Vinícius Furtado, confia que todas as 1,5 milhão assinaturas serão alcançadas até o "começo do semestre legislativo". Para as novas regras entrarem em vigor em 2014, elas precisam ser aprovadas no Congresso até 5 de outubro;

"A relação incestuosa entre empresas e candidatos em campanhas eleitorais se repercute em contratos superfaturados, licitações dirigidas e na malversação dos recursos públicos", disse Furtado. "Nunca teremos educação e hospitais de qualidade no Brasil se não houver uma mudança profunda no sistema político eleitoral."

Conforme a proposta, o financiamento seria misto, integrado por dotações orçamentárias e doações de até R$ 700 por pessoas físicas. Com a modificação, as entidades acreditam que seria corrigida uma "distorção grave" da vida política, que é a possibilidade de empresas doarem dinheiro para campanhas e depois receberem em troca contratos públicos privilegiados. Pelo projeto, a divulgação das despesas da campanha deveria ocorrer em até 24 horas após o recebimento do produto ou do serviço.

Além das mudanças nas formas de financiamento e de prestações de contas das campanhas, a proposta estabelece um sistema de dois turnos para a eleição proporcional. No primeiro turno, os eleitores votariam em partidos. No segundo, em candidatos. Essa mudança obrigaria os partidos a apresentarem seus programas e bandeiras.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Democracia direta - Merval Pereira

A presidente Dilma está tentando aproveitar-se de momento delicado das relações partidárias com a opinião pública para passar por cima do Congresso, tão desprezado pelas vozes das ruas, e assumir uma proposta de Constituinte exclusiva para reforma política que não é nova e, sendo lançada pelo Executivo, cria um clima de suspeição.

A ideia já chegou a ser lançada tempos atrás pelo próprio PT, através do então presidente Lula, e com o apoio da OAB, e fracassou por falta de apoio. Sempre pareceu a muitos - a mim inclusive - ser uma saída para a efetivação de uma reforma que, de outra forma, jamais sairá de um Congresso em que o consenso é impossível para atender a todos os interesses instalados.

O deputado Miro Teixeira defende de há muito a tese de que a Constituinte poderia, além da reforma política, tratar de dois assuntos polêmicos: pacto federativo e reforma tributária. Há diferenças básicas, no entanto, pois, além de ser uma proposta de um deputado, a de Miro não foi feita em tempos de crise como o atual e era um instrumento para evitar a crise, que acabou chegando pelas ruas.

A convocação de uma Constituinte restrita, ou um Congresso revisor restrito, para tratar da reforma política, segundo Miro, daria oportunidade de tratar de forma mais aprofundada esses temas, com discussões estruturais que se interligariam, com a redistribuição das atribuições e verbas entre os entes federativos, temas que, aliás, estão na ordem do dia com a disputa pela distribuição dos royalties do petróleo.

A convocação dessa Constituinte, porém, ficaria dependendo da aprovação da população através de um plebiscito, o que torna a tarefa muito difícil de ser concluída: uma proposta de emenda constitucional (PEC) nesse sentido, além das dificuldades inerentes ao quorum qualificado nas duas Casas do Congresso, precisaria também ter o aval do povo para valer e, mesmo assim, certamente seria acusada de inconstitucional, indo parar no Supremo Tribunal Federal (STF), onde há uma opinião predominante de que Constituinte exclusiva é inconstitucional.

Mas toda essa teoria fica anulada pelas experiências na América Latina, onde vários governos autoritários utilizaram a Constituinte para aumentar o poder do Executivo, como ocorreu na Venezuela de Chávez, na Bolívia de Evo Morales, no Equador de Correa.

Tem sido politicamente inviável tentar levar adiante a proposta devido ao uso distorcido das Constituintes em países da região, que acabaram transformadas em instrumentos para aumentar o poder dos governantes de países como Bolívia ou Equador, seguindo os passos da "revolução bolivariana" de Chávez.

A base teórica da manipulação dos referendos e do próprio instrumento da Constituinte para dar mais poderes aos presidentes da ocasião, como já foi dito aqui, é o livro "Poder Constituinte - Ensaio sobre as alternativas da modernidade", do cientista social e filósofo italiano Antonio (Toni) Negri.

O filósofo italiano diz que "o medo despertado pela multidão" faz com que o poder constituído queira impedir sua manifestação através da Constituinte: "A fera deve ser dominada, domesticada ou destruída, superada ou sublimada." Negri considera que o "poder constituído" procura tolher o "poder constituinte", limitando-o no tempo e no espaço, enquanto o dilui através das "representações" dos poderes do Estado.

Em uma definição mais popular, Evo Morales diz que se trata de uma nova maneira de governar através do povo. Defende, na prática, a "democracia direta", o fim das intermediações do Congresso, próprias dos sistemas democráticos. Esse é o tipo de ação basicamente antidemocrática, pois uma coisa é criticar a atuação do Congresso e exigir mudanças na sua ação política para aproximar-se de seus representados, o povo. Outra coisa muito diferente é querer ultrapassar o Poder Legislativo, fazendo uma ligação direta com o eleitorado através de um governo plebiscitário, que leva ao populismo e ao autoritarismo.

O cientista político Bolívar Lamounier considera que a possibilidade de manipulação é inerente ao instrumento do plebiscito, "pois a autoridade incumbida de propor os quesitos pode ficar muito aquém da neutralidade".

Fonte: O Globo

À moda antiga - Dora Kramer

A presidente Dilma Rousseff convocou uma grande reunião com governadores e prefeitos e propôs a discussão de a "cinco pactos" que poderiam ser vistos como itens de uma boa carta de intenções caso as soluções não estivessem nas mãos de um grupo que há dez anos ocupa o poder.

O que se viu foi a tentativa de tratar um problema novo à moda antiga, com a enferrujada ferramenta do gesto de impacto.

A presidente voltou a condenar a violência e prometeu mudanças. Teria dito o óbvio não fosse a esquisitice de ignorar que a preservação da responsabilidade fiscal e o controle da inflação são tarefas das quais seu governo se descuidou.

Governo este que teria de ter cumprido a tarefe de conduzir um esforço nacional pela garantia de serviços decentes na saúde, educação e transportes coletivos, No lugar disso, o discurso antes de falarem as ruas era o de que estava tudo uma maravilha no País cujo sucesso o autorizava a dar lições de gestão mundo afora.

Quanto à reforma política, foi a presidente Dilma Rousseff em pessoa quem avisou logo no início de seu mandato que deixaria de lado toda e qualquer reforma. Agora propõe um plebiscito que por ora tem jeito de factoide: assume o papel de protagonista do debate com vistas a deixar as questões de gestão governamental em segundo plano.

Dilma suscitou mais dúvidas que ofereceu respostas. Muito provavelmente porque não houvesse mesmo nada de diferente a dizer, dado o susto que assolou a nação em geral e talvez de modo especial a presidente, que uma semana antes reagia a vaias com jeito de poucos amigos e atribuía as críticas à intolerância dos militantes do mau agouro.

O buraco, como se viu, é mais profundo e requer algo além de oratória veemente e atos que no passado impressionavam, mas hoje perderam a credibilidade.

Notadamente devido à discrepância entre os fatos e suas versões. Tome-se como exemplo o PAC, a salvação da lavoura a respeito da qual não se tem boas notícias.

O governo queimou capital de confiabilidade fiando-se na sustentação dos índices de popularidade. Agora vai precisar produzir resultados para recuperar o patrimônio.

Dilma dá ênfase ao combate à corrupção, promete mais investimentos e eficiência. Não explicou como vai conjugar essa boa intenção com a companhia de figuras emblemáticas no quesito descompostura nem com o gigantismo da máquina, com a existência de 39 ministérios, muitos deles meras sinecuras para sustentar um modelo esfarrapado de coalizão.

Pregar transparência tendo recentemente ordenado que os gastos com viagens presidenciais fossem considerados sigilosos não ajuda a tecer uma rede de confiabilidade na palavra presidencial.

Na semana passada soou desafinada também a alegação de que não há dinheiro público nos estádios de futebol depois de o governo passar seis anos faturando politicamente a paternidade da Copa do Mundo.

A inconsistência ronda a proposta dos pactos para melhoria dos serviços públicos. Quais os termos do "contrato", quem abrirá mão do quê? O governo federal quer repartir os danos com governadores e prefeitos, pretendendo receber deles apoio político. Já os chefes de executivos estaduais e municipais querem da União mais dinheiro.

Mas, se o Planalto avisa que não tem margem para repartir receitas, fica difícil vislumbrar condições objetivas em torno das quais seria construído um entendimento para atender a gama de demandas.

Como não se enfrenta isso com passes de mágica e o palavrório cansou, convém aguardar para ver se o plano visa a aplacar os protestos ou se ficou bem entendido que as pessoas exigem que o poder público dê soluções concreas aos problemas.

Fonte: O Estado de S. Paulo

O poder se coça - Eiane Cantanhêde

Impressionantes manifestações que varrem o país estão produzindo muito mais: a presidente da República, ministros, governadores, prefeitos, deputados, senadores e entidades que dizem tanto à história brasileira estão se coçando.

Há uma sofreguidão generalizada para atender ao movimento que lavou a alma da maioria dos brasileiros aqui dentro e ganhou manchetes pelo mundo afora.

Se foi vaga no pronunciamento de sexta-feira, Dilma apresentou propostas objetivas ontem. A principal é um plebiscito para que uma constituinte exclusiva faça a reforma política --aliás, como há muito prega o atual governador Tarso Genro (RS). Outra é transformar a corrupção dolosa em crime hediondo.

A presidente se antecipou, mas as suas ideias são só ideias mesmo, pois dependem da disposição do Legislativo. Ela, de certa forma, tirou a bola do Congresso na reforma política, que ficaria a cargo de não parlamentares, e a jogou de novo no caso da mudança da lei sobre corrupção. Mesmo que não faça propriamente as leis hoje em dia, é o Congresso quem as vota, aprova e muda.

Assim, ontem foi a vez do Executivo se render à pressão e à força das ruas, enquanto CNBB, OAB e o movimento que criou a Ficha Limpa listavam suas próprias prioridades e a oposição tentava pegar o bonde.

Depois de baixar o preço de metrôs e trens, Alckmin agora suspende o reajuste dos pedágios. Sem cargo executivo, Aécio Neves lança um manifesto com DEM e PPS por um "país diferente" e joga no ar o balão de uma CPI para gastos da Copa.

Hoje, a comichão será no Congresso, onde Renan e Henrique Alves reúnem os líderes partidários para também correrem atrás do prejuízo com uma "agenda positiva". Mas... peraí? Renan não é aquele que assumiu a presidência do Senado e depois recebeu mais de um milhão de assinaturas pedindo o seu impeachment?!

Fonte: Folha de S. Paulo

O bode na sala - Denise Rothenburg

Do pacote apresentado por Dilma, faltou a redistribuição de recursos e tarefas entre os entes federados. Mais uma vez, a urgente reforma do Estado ficará para depois, enquanto o Congresso se ocupará do plebiscito para a encantada reforma política

Mal a presidente Dilma Rousseff terminou o pronunciamento na reunião de governadores e prefeitos, algumas excelências tarimbadas da política nacional tinham um diagnóstico claro da situação: ela saiu da letargia colocando um bode na sala do Congresso Nacional e outro no colo dos governadores, mas esqueceu o principal. A construção de uma agenda conjunta, dentro de um novo pacto federativo.

Para muitos, Dilma não mudou o estilo dos pacotes prontos a serem deglutidos pela base aliada. Abriu a reunião ditando uma pauta. Não ficou claro sequer se os R$ 50 bilhões da mobilidade são novos recursos ou estão dentro dos R$ 89 bilhões que compõem o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) desse setor.

Parte dos temas está no colo do Legislativo: cabe aos congressistas, por exemplo, convocar o plebiscito da reforma política, no qual será debatida a proposta apresentada ontem pela OAB e pela CNBB, e também destinar os royalties do petróleo para a educação — isso se a proposta sair do Supremo Tribunal Federal, onde está em fase de debates.

Politicamente, marcou um ponto pelo gesto de reunir tantos personagens de uma única vez para pensar na resposta às manifestações. Mas, entre aqueles que torcem pela presidente — leia-se e registre-se de que não me refiro aqui a vozes da oposição —, ficou aquele gostinho de que poderia ter sido melhor.

A sensação de muitos é a de que a convocação de um plebiscito para a realização de uma constituinte exclusiva para a reforma política vem como uma luva no sentido de ocupar o parlamento. Mas, ainda nesse quesito, ficou aquela sensação de ausência da reforma tributária, para uma população que trabalha quase metade do ano para pagar impostos, a maioria incidente sobre o consumo.

Por falar em tributos...

A sensação de muitos é a de que a reforma política foi colocada na sala para que, com o Congresso ocupado nesse debate, Dilma tenha alguma relativa tranquilidade para encontrar uma saída para a perspectiva de crise econômica, que, ao lado da carência de serviços públicos de qualidade, tem alimentado as passeatas (a criação de empregos, embora continue crescendo, perdeu força em relação ao ano passado; a inflação, ainda que se mostre em curva descendente no longo prazo, é sentida em alguns setores).

Nesse campo, os ministros de Dilma têm dito que é questão de tempo para que as medidas adotadas ao longo dos últimos meses deem algum resultado. E, certamente, avaliam muitos dos presentes à reunião de ontem, é desse sentimento de economia em alta que Dilma precisa para garantir novo fôlego e gerar um clima capaz de fazer refluir as manifestações.

Enquanto isso, no PMDB...

Hoje, tem reunião da Comissão Executiva Nacional do partido. A pauta da convocação passou de palanques estaduais para a conjuntura, em função das manifestações. Afinal, os peemedebistas têm claro que quem mais perde com os movimentos de rua é quem está no poder. Portanto, se a confusão continuar, a aliança com o PT é bem capaz de balançar. O mesmo PMDB que, no passado, pulou do barco dos tucanos para o dos petistas, é bem capaz de fazer o caminho inverso. O momento é de todos com as barbas de molho.

E o Sarney, hein?

Ontem, o editor de Política do Correio, Leonardo Cavalcanti, lembrou, na reunião de pauta, uma entrevista feita em 2011 — por ele, Ana Dubeux e eu — com o então presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Abrimos a entrevista com uma frase de Sarney: “A democracia representativa está em xeque. Os partidos estão enfraquecidos e não representam mais o povo. Os partidos eram fortes quando eram ideológicos, mas eles passaram a ser pragmáticos”. Sarney mencionou que a internet estava mudando o exercício da cidadania e da política e vislumbrou ainda uma época em que o cidadão, de seu computador, faria as escolhas que hoje deixa a cargo do parlamento. Esse tempo, dizia, ainda demoraria. Talvez esteja mais perto do que ele pensa, basta ver o movimento pela Lei da Ficha Limpa, as manifestações e o deflagrado ontem pela reforma política, dentro da OAB e da CNBB.

Fonte: Correio Braziliense

Época de mudanças no Planalto Central - Raymundo Costa

Além da convocação de uma Constituinte para mudar o sistema político e das medidas setoriais discutidas com governadores e prefeitos, a presidente Dilma Rousseff analisa também a reforma do ministério. O enxugamento do número de pastas está em discussão, mas a mudança que importa, se de fato ocorrer, será na equipe econômica. Entre os cenários traçados no PT e no governo está o deslocamento de Alexandre Tombini do Banco Central para o Ministério da Fazenda, no lugar de Guido Mantega, e a volta de Henrique Meirelles para o BC.

Outra mudança de fundo poderia ser o remanejamento de Aloizio Mercadante do Ministério da Educação para a Casa Civil, no lugar de Gleisi Hoffmann, virtual candidata do PT ao governo do Paraná, que sairia agora para começar a tratar de sua campanha. Mercadante passaria a exercer um papel que, na prática, já desempenha na coordenação política do governo. Há defensores e adversários dessa solução no Palácio Planalto.

Os cenários são voláteis e mudam com a mesma velocidade com que os protestos cresceram e emparedaram governos e partidos. Semana passada, Meirelles, pela manhã, e Mercadante, à tarde, foram apontados como prováveis futuros comandantes da economia do governo Dilma. A solução Meirelles no Banco Central e Tombini na Fazenda parece menos ofensiva, para a presidente da República, que a pura e simples nomeação de Henrique Meirelles.

Além de ouvir as ruas, é preciso compreendê-las

Entre o PT e os partidos aliados a mudança na equipe de governo é vista como uma chacoalhada necessária para o governo retomar a ofensiva política, perdida nos últimos dias pela onda de protestos e a queda, detectada antes das grandes manifestações, da popularidade de Dilma.

Há dúvidas, no PT e entre os aliados, se o pacote de medidas e de intenções da presidente Dilma Rousseff será suficiente para conter os protestos de rua. Provavelmente não. Propostas na área de transportes e mobilidade urbana podem unir os partidos, mas a convocação de uma Assembleia Constituinte exclusiva para a reforma política divide e é de difícil execução, pois requer aprovação, por quórum qualificado, de uma emenda constitucional (para a convocação da assembleia).

Há divergência também sobre conteúdo. O PT quer financiamento público de campanhas, voto distrital misto e lista fechada, sistema que enfrenta a resistência de boa parte do Congresso, inclusive no aliado principal, o PMDB. A Constituinte exclusiva, sem falar das polêmicas jurídicas, não passa se os aliados sentirem o cheiro de "golpe" do PT para se manter no poder. Mas serve a Dilma quando a presidente joga nas mãos do Congresso a batata quente que recebeu das ruas.

Com a reforma do sistema político ou a mudança no ministério, o que está em jogo é a reeleição de Dilma. Agora, além da sombra de Lula, a presidente enfrenta a queda em seu índice de popularidade. Os partidos ainda não assimilaram as ruas. Mas o instinto da maioria diz que, no atacado, o grande efeito das manifestações será visto nas eleições de 2014. Mesmo que os protestos acabem hoje, o que não é provável.

É um jogo em que a presidente não deve esperar 100% da solidariedade do PT, o que não será novidade. Em 2005, quando seu governo chegou ao fundo do poço devido ao mensalão, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve de defender o mandato praticamente só. Deu a volta por cima, se reelegeu e deixou o Palácio do Planalto pela porta da frente.

Atualmente, do porteiro a integrantes da Executiva Nacional do PT, o que mais se ouve é que Dilma gastou em dois anos e meio todo o capital político deixado por Lula. Queixa-se de que Dilma voltou as costas para o partido e tomou como referência pessoas que não têm intimidade com a máquina. Exemplos citados: os ministros José Eduardo Cardozo (Justiça), Fernando Pimentel (Desenvolvimento Indústria e Comércio) e Aloizio Mercadante (Educação).

É curioso que esse tipo de reclamação persista mesmo depois do curto-circuito na relação do PT com as ruas. É um discurso igual ao adotado pelo PMDB quando diz que determinado ministro não representa o partido no governo.

O que o PT talvez não veja ou não queira encarar é que seus antigos dirigentes foram condenados no julgamento do escândalo do mensalão, após 116 dias de julgamento, todos transmitidos ao vivo pela televisão, no Supremo Tribunal Federal (STF).

Os protestos podem indicar mais ainda: a aposentadoria política de toda a geração de 1968 e suas manifestações com líderes e partidos claramente identificados, bem diferente dos protestos sem carro de som e cartazes confeccionados a mão. Não houve UNE, CUT, MST, governos e nem partidos. Pelo contrário, estes foram barrados na entrada da festa: houve rejeição. É nisso - na reação aos partidos políticos e à política - que as atuais manifestações parecem com as que antecederam o golpe de 1964.

Na realidade, ninguém soube ler o significado do protesto que começou em São Paulo por causa de R$ 0,20 a mais na passagem do ônibus. De início, o governador Geraldo Alckmin saiu em defesa da polícia que reprimia com violência os manifestantes - e foi aplaudido. Esse é o fato. Só a progressão dos protestos mudou o tom dos editoriais. O prefeito Fernando Haddad dizia que só conversaria com os movimentos responsáveis pelo protesto quando eles parassem com as manifestações. O mesmo discurso dos governos que o PT sempre desqualificou como "de direita".

A ninguém ocorreu pensar que os protestos podiam não ser "por apenas" R$ 0,20 a mais que a população teria de pagar pela passagem do ônibus, mas pelo fato de os governos fazerem questão de tirar "apenas" R$ 0,20 do usuário de um transporte precário.

Dilma prometeu ouvir as ruas. "Meu governo está empenhado e comprometido com a transformação social", disse a presidente, por meio de uma cadeia de rádio e televisão. Resta saber se ao ouvir, a presidente vai compreender o que os governantes até agora não souberam decifrar.

Fonte: Valor Econômico

Constituinte exclusiva: o espírito da proposta - Tereza Cruvinel

Se o sistema político está falido, o Congresso se recusa a reformá-lo e o povo nas ruas não pode legislar, a Constituinte exclusiva é o caminho mais curto e legítimo

No fim de semana, alguns interlocutores fizeram chegar à presidente Dilma Rousseff a proposta de uma Constituinte exclusiva para reformar o sistema político que as ruas estão declarando falido. Esta coluna, no domingo, registrou intenções nesse sentido, ao detalhar a proposta do deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), que tramita há mais de 10 anos. O prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB), foi um dos que levaram, em carta, a idéia à presidente. Mas ontem, logo depois de apresentada por Dilma, o meio político reagiu negativamente e a oposição a rechaçou. O novo ministro do Supremo, José Roberto Barroso, avisou que tal processo é inviável. Uma Constituinte não pode mudar apenas um capítulo ou tema na Constituição. Se não pode, deve-se aproveitar o espírito da proposta na busca de caminhos que podem ser trilhados com o mesmo objetivo.

Os manifestantes estão ainda nas ruas declarando-se não representados pelos partidos e pelos políticos. O antipartidarismo demonstrado pelos mais radicais carrega uma semente perigosa, a negação da democracia representativa. Uma negação que nunca deu bons resultados, ao longo da história. Sabemos todos que há um divórcio entre representantes e representados e, agora, ficou evidente que ele precisa ser superado. O povo pede mais controle sobre seus representantes e isso significa mudar um conjunto de regras sobre votar e ser votado. Alterar a Constituição, como corretamente afirmou o presidente do PSDB, senador Aécio Neves, é uma prerrogativa do Congresso.

O problema é que os congressistas não aprovarão mudanças que contrariem seus próprios interesses. Há quantos anos assistimos aos ensaios frustrados sobre reformas no sistema político-eleitoral? Pela mesma razão – a de fixar regras com as quais sabem lidar, eleger-se e sobreviver na política – os constituintes de 1987/88 passaram toda a nossa ordem jurídica a limpo, mas quase nada mudaram no sistema político-eleitoral. Dele removeram, basicamente, o entulho autoritário da ditadura. E, mesmo assim, em alguns casos, foram do 8 ao 80. Por exemplo: substituíram as restrições à criação de partidos à absoluta liberalidade atual, o que nos levou ao sistema fragmentado de hoje, com mais de 30 partidos, alguns sem qualquer representatividade.

Ora, se o sistema político está falido, o Congresso se recusa a reformá-lo e o povo nas ruas não pode legislar, a Constituinte exclusiva é o caminho mais curto e legítimo. O povo, por meio de plebiscito (que só o Congresso pode convocar) autorizaria a eleição de uma assembléia constituinte com essa tarefa específica, assegurando o poder originário da futura assembleia. Agora, se juridicamente isso não é possível, como disse Barroso, que toma posse amanhã no STF, caminhos alternativos podem ser trilhados, buscando o mesmo objetivo. Já houve reação: "Por ora é a manifestação legítima de um cidadão. Depois, se o assunto chegar ao Supremo, ele se pronunciará como ministro, pelo voto", disse Miro, autor da mais antiga proposta sobre o tema.

Se o espírito da proposta é assegurar que o povo tenha a palavra final sobre o tipo de sistema político-eleitoral que deseja, há também outras fórmulas. Uma emenda do ex-deputado Luiz Carlos Santos, também antiga, sugere que o Congresso, num determinado prazo, vote uma reforma e submeta as mudanças a um referendo popular, sobre cada mudança aprovada.

Importante, na proposta, é a ousadia de romper a inércia que cerca o assunto. Se não for a Constituinte exclusiva, alguma fórmula nova surgirá.

FHC em novo livro

É tempo de pensar o Brasil. Até aqui, muito do que nos tornamos decorreu da reflexão e das soluções propostas, no passado, pelos que se dedicaram a desvendar nossa complexidade. Hoje, às 18h, em São Paulo, no Masp/Avenida Paulista (se não houver protestos, como diz ele), o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso lança seu livro Pensadores que inventaram o Brasil (Companhia das Letras, 308 páginas), em que revisita, se não todos, alguns dos mais importantes intelectuais que se dedicaram a compreender o Brasil. Ele respondeu questões apresentadas pela coluna, por e-mail, sobre a nova obra.

Descartou a suposição de que se trata de um mergulho na evolução do pensamento político.

"O livro não tem a pretensão de ser uma história do pensamento político brasileiro. Antes, é uma referência aos autores que mais me influenciaram, com alguns dos quais convivi. Há, portanto, referências arbitrárias, deixando de lado, por exemplo, Viana Moog ou Azevedo Amara, para não falar de Oliveira Vianna." Esclarece como selecionou os pensadores: "Refiro-me a autores que ajudaram a compreender a formação sociopolítica do Brasil, que hoje chamaríamos de intelectuais com visão global, mais do que cientistas sociais especializados. Não há um corte temporal, embora me concentre mais nos autores do século 20. Suas respostas, no transcurso de seus 82 anos, terminam com uma confissão: " Tive grande prazer em rever e corrigir os textos, talvez porque, a esta altura da vida, olhar para trás já seja um hábito, e olhar para o futuro, uma obsessão de quem teme perdê-lo".

Fonte: Estado de Minas

A nova democracia representativa - Gil Castello Branco

Há quinze dias, um dos principais estudiosos dos movimentos sociais na era da internet, o sociólogo espanhol Manuel Castells, realizou palestra na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e afirmou que o atual modelo democrático está esgotado. Em sua opinião, as manifestações por meio das redes sociais surgem de reações indignadas a fatos considerados injustos. Articulam-se de forma virtual, mas em seguida ocupam as ruas.

A tese explica como no Brasil transbordou a insatisfação popular que acuou políticos, partidos e governos. Embora alguns digam que aos participantes falta uma "causa", sobram razões para o descontentamento.

Na web as manifestações já eram abundantes, embora desprezadas por aqueles que deveriam respeitá-las. A petição virtual para impedir a posse de Renan Calheiros como presidente do Senado obteve 1,6 milhão de assinaturas, mas foi ignorada pela enorme maioria dos senadores. As escolhas do deputado Feliciano para a presidência da Comissão de Direitos Humanos e de dois mensaleiros condenados para integrarem a Comissão de Constituição e Justiça beiraram o acinte, tal a quantidade de e-mails contrários. No Facebook, ao qual 74 milhões de brasileiros estão conectados, circulam milhares de mensagens diárias pelo arquivamento da PEC 37 - que proíbe as investigações do Ministério Público - e das propostas que reduzem os efeitos da Lei da Ficha Limpa. Somam-se ao desagrado virtual a inflação em alta, os 39 ministros, os gastos públicos exorbitantes para o Mundial e a corrupção nossa de cada dia. A previsão do ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli, de que o julgamento do mensalão ainda poderá demorar dois anos, colocou mais gasolina na fogueira. Nesse cenário de crise entre representantes surdos e representados revoltados, vaiar Dilma foi a catarse.

Assim, prefeitos e governadores, de diferentes legendas, apressaram-se em baixar as calças e as tarifas para frear o levante. O presidente da Câmara adiou a votação da PEC 37. A presidente da República, desta vez vestida de amarelo, fez pronunciamento repleto de obviedades e meias verdades.

Em relação à construção dos estádios da Copa, por exemplo, Dilma afirmou que "jamais permitiria que esses recursos saíssem do orçamento público federal, prejudicando setores prioritários como a saúde e a educação". De fato, nos R$ 7,1 bilhões previstos não há recursos do "orçamento federal". Mas, além dos R$ 3,8 bilhões financiados pelo BNDES (em condições especiais de prazos e juros), existem recursos próprios de governos estaduais (R$ 1,5 bilhão), municipais (R$ 14 milhões) e do Distrito Federal (R$ 1 bilhão). De outras fontes provêm R$ 820 milhões. Como as unidades da Federação não fabricam dinheiro, verbas públicas estão custeando arenas em detrimento de áreas prioritárias, o que justifica a indignação da sociedade. Afinal, com esses recursos seria possível construir oito mil escolas, adquirir 39 mil ônibus escolares, construir 2.842 km de rodovias ou erguer 128 mil casas populares.

Em relação ao "pacto nacional pela mobilidade urbana", é mais do mesmo. Em janeiro de 2010, o ex-presidente Lula, tendo a ex-ministra da Casa Civil ao lado, lançou o "PAC da Mobilidade Urbana da Copa", com 47 projetos que iriam melhorar o trânsito nas 12 cidades-sede. Paralelamente, desde 2002 existe no Orçamento Geral da União o programa "Mobilidade Urbana". Em onze anos foram autorizados R$ 8,4 bilhões e aplicados somente R$ 1,6 bilhão (19%). Será que agora vai?

A presidente também cobrou dos outros Poderes, estados e municípios a efetiva implantação da Lei de Acesso à Informação. Paradoxalmente, passaram a ser classificados como sigilosos os gastos de suas viagens ao exterior. Além disso, o orçamento da União está a cada dia mais opaco.

Assim, urge ouvir atentamente o que reclamam mais de 1 milhão de pessoas, além do Movimento Passe Livre. O discurso conservador e o diálogo habitual com as entidades chapas-brancas - há muito cooptadas pelo Poder com cargos e verbas - já não surtem o efeito de outrora. A democracia hipócrita faliu.

No mundo, tal como diz Castells, os partidos políticos tradicionais, tanto à direita quanto à esquerda, estão perdendo a legitimidade. Na Itália, o Movimento 5 Estrelas, partido organizado pelas redes e com discurso contrário à política convencional, é hoje uma das principais forças eleitorais no país. Os novos tempos demandam novas formas de participação dos cidadãos nos processos de decisão do Estado. No Brasil não será diferente.

Fonte: O Globo

O estopim e a pólvora - Almir Pazzianotto Pinto

Apenas os alienados foram colhidos de surpresa pelas manifestações que paralisaram São Paulo, se espraiaram a outras capitais, atingiram grandes cidades, até ocuparem a Praça dos Três Poderes.

Não estamos diante de ondas de vandalismo, provocadas por vadios interessados em promover badernas, destruir bens públicos e privados, bloquear o trânsito, multiplicar as dificuldades da população. O que observamos é erupção vulcânica, que traz do subsolo social o desengano de estudantes, trabalhadores, donas de casa, aposentados, servidores públicos, incapazes de reprimir, por mais tempo, o desespero diante do fracasso do Estado. É, sem sentido pejorativo, o estouro da boiada, magistralmente descrito por Euclides da Cunha em Os sertões.

O povo veio às ruas convencido de que não dispõe de canais de comunicação com autoridades municipais, estaduais, federais, do Executivo, Legislativo, e Judiciário. Deixou claro que, apesar de 30 legendas reconhecidas pelo Tribunal Superior Eleitoral, não existem partidos e políticos que o represente e defenda com honestidade, coerência, firmeza. Do PMDB, o primeiro de extensa relação, ao Partido Ecológico Nacional (PEC), cujo registro tem o nº 30, passando por PTB, PDT, PT, DEM, PCdoB, PSD, PSDB, são meras siglas controladas por dirigentes sem ideologia definida, que se digladiam à cata de ministérios, estatais, sociedades de economia mista, para obterem verbas e empregos.

Desencantado, o brasileiro tratou de extravasar a indignação diante da impunidade. Não por acaso, entre os cartazes exibidos por manifestantes, muitos cobravam condenações concretas dos réus do mensalão, temerosos de que o Supremo Tribunal Federal (STF) engate marcha à ré e os absolva.

O encarecimento do bilhete único foi o estopim da revolta. Estopim porque, entre todos os serviços públicos paulistanos, o transporte coletivo é o pior. Os usuários são tratados como gado, e estão convencidos de que promessas de melhoria, apresentadas em sucessivas campanhas, jamais serão cumpridas.

Aceso em São Paulo, o rastilho se espalhou provocando explosões pelo caminho, pois lhe não faltaram barris de pólvora acumulados por administradores venais.

Corrupção à solta e impune, e gastos vergonhosos em estádios faraônicos, ao lado de hospitais quebrados, escolas degradadas, ruas esburacadas, mobilizaram o povo em manifestações que deveriam ser tranquilas e passageiras, mas que, por carência de lideranças e de interlocutores, transbordaram em atos isolados de vandalismo.

Gustavo Le Bom, autor de Sociologia das multidões, descreve o que denominou “massa psicológica”, ou “alma coletiva”. Para ele, independentemente dos indivíduos que a integram, e por desiguais que lhes sejam as condições de vida, caráter, inteligência, e nível cultural, o fato de se reunirem em multidão fazem-nos sentir, pensar, e agir de maneira distinta de como agiria cada um, isoladamente. Sigmund Freud, por sua vez, ensina que o caráter inquietante e coercitivo, das formações coletivas, pode ser atribuído à afinidade com a horda primitiva, da qual descende. Para Le Bom e Freud a massa exige o comando de chefe investido de poder ilimitado, sem o qual se perde e fica fora de controle.

Entender a rebelião não é difícil. Basta olhar o semblante dos jovens participantes. Reunidos em massas desorganizadas, sob vagas palavras de ordem, extravasam as frustrações diante da leviandade de representantes que, após eleitos, renegam compromissos e abandonam quem os elegeu. Deles exigem que se afastem, caiam fora, permitam a renovação de homens e costumes.

Quanto às autoridades, da presidente Dilma aos governadores, nenhuma esteve à altura da crise. Recolheram-se e deixaram à polícia a tarefa de controlar a situação. O pior desempenho foi o do ministro da Justiça. Fazendo-se de ignorante, lançou a responsabilidade total sobre o governo de São Paulo, embora parcela importante do transporte coletivo caiba ao município, cujo prefeito, Fernando Haddad, foi isolado pelo PT.

O sucesso das manifestações perderá, porém, sentido, se for passageiro. Cabe aos jovens a responsabilidade de se integrarem concretamente à vida política, para dar vida e alma aos partidos, e desalojar, pelo voto, anacrônicos e corruptos dirigentes. Se o conseguirem, todos os sacrifícios serão válidos, e o Brasil passará a ser dirigido por representantes fiéis ao povo, como exige a nação.

Foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST)

Fonte: Correio Braziliense

Um rio que passou... - Arnaldo Jabor

À primeira vista, essas manifestações pareciam uma provocação anárquica, sem rumo. Muitos acharam isso, inclusive eu. Nós temos democracia desde 1985, mas, "democracia" tem de ser aperfeiçoada, senão, decai. Entre nós tudo sempre acabou em pizza, diante da paralisia dos três poderes. O Brasil parecia desabitado. De repente, reapareceu o povo. Parecia um mar. Acordou uma juventude calada há vinte anos, uma juventude que nascia enquanto o Collor caia? Isso pode ser o início de uma "primavera brasileira". Contra ditadores? Em parte sim, uma ditadura difusa, ditada por entendimentos silenciosos que formam uma rede de interesses mutuamente atendidos. Nossa rede corrupta tem uma lógica complexa, mas sólida, em que a perversão pavorosa do Congresso se soma à incompetência tradicional dos petistas e sindicalistas do Executivo e um STF querendo acordar, sob uma chuva de embargos. Tudo atende aos interesses dos canalhas. Nossa rede de escrotidões é muito funcional. Sempre que se abre uma porta, damos com uma outra fechada. O atraso é muito bem planejado. O Brasil é o País mais bem "desorganizado" do mundo.

Subitamente o povo reapareceu. Andava muito sumido, como se a sociedade não existisse mais. Nossa opinião pública era queixosa - reclamava muito e agia pouco. Agora, mudou. Os jovens estão com a maravilhosa sensação do Poder. Agora esse movimento tem de proteger o imenso poder de influencia que conquistou.

Mas, sutilmente, essa vitória pode ser apagada pouco a pouco, com a solerte esperteza do Executivo e do Legislativo. Vocês repararam que o Governo Central, na fala de Dilma na TV, está "encantado" com a democracia? Prefeitos, governadores, todos fascinados com a democracia. Todos (de nariz meio torcido) elogiam a "juventude que despertou" etc. tal. Mas, no fundo, ou melhor, na cara, só pensam em recuperar Ibopes e em sossegar os leões. Muitos políticos com culpa no cartório estão ansiosos: "Meu Deus, não se pode nem roubar em paz! Precisamos apoiar isso tudo para que tudo continue como sempre foi", pensam. Quase todos que assinaram o apoio a PEC 37 - a PEC da impunidade - têm ficha suja. São mais de 200.

Todo mundo apoia a democracia - que legal!... - mas ninguém explica por exemplo por quê a Petrobras comprou a refinaria no Texas por mais de um bilhão de dólares, se o valor real é de apenas 100 milhões? Por quê? Por que a ferrovia Norte Sul, desmoralizada há 27 anos pela Folha de S. Paulo que anunciou o resultado da concorrência dois dias antes? E não está pronta ainda, mesmo depois de descoberta a roubalheira da Valec. E a volta da inflação, que causa arrepios nos economistas do mundo todo, menos no trêmulo e incompetente Mantega? E Belmonte? E a refinaria com os fascistas da Venezuela, que não pagam? E o canal do Rio S. Francisco parado? E as privatizações envergonhadas que não saem? E corruptos impunes? E o Estado quebrado, cheio de gastos de custeio, sem dinheiro para investir? E as alianças com partidos-ladrões que impedem qualquer reforma? E a preocupação somente eleitoral? E o custo dos estádios? E a infraestrutura morta?

Ninguém explica. A Dilma tinha de explicar, em vez de tentar acalmar a "massa atrasada". Lula, o eterno e nefasto presidente já disse que "Tudo bem, quem nos apoia não está se manifestando - são os miseráveis do Bolsa Família" (que com inflação crescente vai murchar para vinténs). Foi o mesmo que ele disse na cena do dossiê dos "aloprados", lembram? : "Não tem "pobrema", pois o povão pensa que "dossiê" é doce de batata".

Vamos botar a bola no chão: O PT está no governo há dez anos e é o responsável principal por esta cag... catástrofe pública. Ou não é?

Mas, o que pode acabar com o movimento? O vandalismo, sem dúvida. O vandalismo se explica pela infiltração de vagabundos punks e marginais aproveitando que a polícia não pode matar. Mas, também há o vandalismo proposital, programado por radicais, para desclassificar o movimento. Será que alguns bolcheviques estão seguindo a lição de Lenin, quando escreveu como desqualificar movimentos de rua: "infiltrem nossos homens em outros partidos e (?) dividam a população em grupos antagônicos, estimulando divergências entre eles sobre questões sociais."

E aí? O que pode esvaziar o movimento?

Bem, em primeiro lugar o vazio, a abstração, a luta pela luta, o horror da política. Se virar um movimento genérico demais, tudo acaba. Não podem achar que podem mudar o País num "passe livre de mágica". Não podem.

Não podem se deslumbrar com o sucesso. O fundamental é alguma humildade no processo todo. É necessário lutar contra causas concretas, pontuais. É preciso a organização de lideranças sim, assumidas, inclusive com células nos Estados, todos conectados para agir, sempre em cima de um tema.

A sensação de poder é maravilhosa, mas não pode levar a sentimentos de onipotência, a um excesso de otimismo. Tem de ser um movimento de vigilância, um poder paralelo e discreto que se articula rapidamente para protestos pontuais.

Os partidos que existem tem de ser questionados em seus malfeitos e em seus programas oportunistas. Creio que este movimento jovem tem de ser uma periferia crítica permanente, sem ser um partido tradicional, mas uma vigilância no dia a dia de Brasília. O movimento tem de representar a sociedade. Uma espécie de Ministério Público sem gravata.

Outro perigo que ronda os jovens é o tempo. Sim, os corruptos trabalham com o tempo. São todos cobras criadas que contam com o cansaço dos manifestantes jovens, esperando a hora em que a mamãe chama para o jantar. Contam também com o tédio da população. Eles adoram a falta de memória e os dias que passam. Já adiaram expressamente a votação da emenda PEC 37, para momentos "mais calmos" - ( esqueceram que a votação será nominal, logo, anotaremos todos os inimigos declarados.

Se essas provações forem superadas por jovens sem experiência política, eles terão nos dado uma grande lição: "temos democracia, agora, temos de formar uma Republica." Se não, tudo será apenas um rio que passou em nossa vida e... sumiu.

Fonte: O Globo

Teresa Cristina e Grupo Semente - Meu Mundo é Hoje (Eu Sou Assim)


As lavadeiras – Murilo Mendes

As lavadeiras no tanque noturno
Não responderam ao canto da sibila.

“Lavamos os mortos,
Lavamos o tabuleiro das idéias antigas
E os balaústres para repouso do mar...
Nele encontramos restos de galeras,
Quem nos desviará do nosso canto obscuro?
Nele descobrimos o augusto pudor do vento,
O balanço do corpo do pirata com argolas,
Nele promovemos a sede do povo
E excitamos a nossa própria sede...”

As lavadeiras no tanque branco
Lavam o espectro da guerra.
Os braços das lavadeiras
No abismo noturno
Vão e vêm.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

OPINIÃO DO DIA – Luiz Werneck Vianna:as origens do movimento

"Devemos procurar as origens desse movimento que ainda não terminou e não se sabe para onde vai. Fora as redes sociais, não há nada que esteja organizando a sociedade, especialmente essa multidão de jovens, que vem acorrendo à vida social. Não há clubes, não há partidos. Estes (os partidos) vivem inteiramente orientados para sua reprodução política, eleitoral, não têm trabalho de consolidação, de nucleação. A própria Igreja Católica, que antes cumpria um papel muito importante nessa organização, hoje tem um papel muito pequeno. A sociedade está inteiramente isolada da esfera pública. São dois mundos que não se tocam. Por toda a parte viam-se faixas com os seguintes dizeres: “nós não acreditamos na representação que aí está”. Foi um movimento dirigido também contra essa política. Temos que procurar as origens desse processo, que mal começou, nessa forma de relação entre Estado e sociedade, entre política e sociedade. Está evidente que temos que passar por reformas políticas importantes no sentido de que o sistema político se abra à participação. Esses partidos que estão aí foram chamados pelo ministro Joaquim Barbosa de “partidos de mentirinha”. Embora ele seja muito midiático, nesse ponto não há como discordar dele.
 
Um movimento desses, multitudinário, que vai às ruas, sem lideranças conhecidas, é um perigo. Tudo pode acontecer. Abre-se campo para a selvageria. Com quem negociar? Tomara que o processo desses dias – de ontem (17-06-2013) em particular – sirva como uma sinalização poderosa para que mudanças importantes na política brasileira comecem a ser encaminhadas. É um sinal de alerta. Se nada for feito a tempo, se é que ainda há tempo, esse movimento pode ter um desfecho muito ruim. É preciso evitar – e escrevi isso em um artigo que saiu hoje (18-06) no Estadão – que 2013 tenha o mesmo desfecho que 1968, isto é, uma juventude desencantada com a política, radicalizada e que procure formas inadequadas de resolução de problemas."

Luiz Werneck Vianna, sociólogo e professor- pesquisador da PUC-Rio. In “A busca por reconhecimento e participação política: o combustível das manifestações”. Entrevista IHU On-Line, 19/6/2013.

Manchetes de alguns dos principais jornais

O GLOBO
Dilma discute plano de ação com governadores
Crédito terá menor alta em 10 anos
No Rio, atos tomam orla da Zona Sul

FOLHA DE S. PAULO
Dilma inicia pela saúde plano para estancar atos
Grupo faz reunião e reforça campanha pela tarifa zero
Já em Moscou, delator da CIA solicita asilo ao Equador
Consórcio de BCs pede mais austeridade e mais reformas
Mandela está em estado 'crítico', diz África do Sul

O ESTADO DE S. PAULO
Em resposta às ruas, Dilma faz pacote contra corrupção
Convocados pelo Planalto, prefeitos vão pedir ajuda
Brasileiro usa crédito para pagar dívida

VALOR ECONÔMICO
Infraero tem prejuízo com as privatizações
Dilma apressa medidas para responder às ruas
SP muda regras para empresas de ônibus

BRASIL ECONÔMICO
"Cautela com a turma da bufunfa"
Gás muda cidade no Maranhão
Mobilidade

ESTADO DE MINAS
Paz para protestar
Paz para viver

O TEMPO (MG)
Polícia Militar prevê pior confronto na capital mineira na quarta
Prefeitos têm pacote de pedidos para Dilma
OAB e CNBB se unem a protestos
Falta de rumo político afeta economia do País, diz FHC

CORREIO BRAZILIENSE
Nova onda de protestos na última semana dos jogos
De volta ao futuro
Ativista desde criancinha

GAZETA DO POVO (PR)
MP-PR conduz metade dos inquéritos sobre corrupção
Entidades fazem ato para cobrar reforma política
Ex-técnico da CIA pede asilo ao Equador
Dilma discute protestos com governantes

ZERO HORA (RS)
Dilma chama governadores e prefeitos
Dia reservado para novas manifestações

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Dilma discute crise com governadores
Dias contados para concursos caça-níqueis
Pessimismo ronda economia

O que pensa a mídia - editoriais de alguns dos principais jornais

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Dia reservado para novas manifestações

Ativistas voltam a convocar concentrações puxadas pela questão dos transportes, mas com pauta diversificada.

Protesto e reflexão

Nilson Mariano

Os atos de violência que sobressaltaram o país na semana passada, notadamente no Rio de Janeiro onde desponta a estátua de Drummond, provocaram uma reflexão entre os organizadores das manifestações por melhores serviços públicos e o fim da corrupção. Há a preocupação de que a delinquência de uma minoria possa afetar o andamento de protestos pacíficos e legítimos.

Manifestantes prometem voltar às ruas de Porto Alegre e de outras capitais do país, hoje, em mais protestos contra a passagem de ônibus e por um leque de reivindicações que contempla desde serviços públicos de qualidade até uma reforma política.

A intenção é reprisar os atos que sacudiram o Brasil na semana passada, mas dispensando as minorias delinquentes que se aproveitam da multidão para saquear e depredar.

A temperatura do que pode acontecer hoje podia ser medida no final de semana pelas convocatórias via rede sociais. Como nas vezes anteriores, os protestos são organizados sem a interferência de partidos, sindicatos ou entidades tradicionais. Em Porto Alegre, na noite de domingo, já havia definições, mas pairavam algumas dúvidas. O que parece confirmado: a concentração ocorrerá em frente à prefeitura, a partir das 18h.

– Segunda-feira todos para as ruas – chamava um post assinado pelo Bloco de Lutas Pelo Transporte Público.

As incertezas – que talvez só sejam dirimidas hoje – se referem ao trajeto da manifestação. Uma corrente propunha uma passeata pela Avenida Borges de Medeiros, que culminasse em frente ao Palácio Piratini, na Praça da Matriz. Mas é possível que seja repetido o roteiro da quinta-feira, que tomou a Avenida João Pessoa e desembocou na Avenida Ipiranga, no bairro Azenha.

Há divergências quanto ao percurso a ser feito, mas não sobre o propósito pacífico do ato. No Facebook, foi sugerido que os envolvidos nas cenas de vandalismo da semana passada fiquem em casa para refletir. Insistiu-se para que, uma vez nas ruas, não se deixem arrastar por extremistas.

– Seja diferente. Não derrube, ajude a levantar – escreveu uma jovem.

Também foi recomendado que não sejam levadas bandeiras, camisetas ou faixas identificando partidos políticos ou grupos ideológicos, para manter a essência apartidária do movimento. Mensagens na internet solicitavam que jovens, trabalhadores e a população mostrem a cara.

– Compareça à manifestação sem máscaras. Nosso povo batalhador não tem nada a esconder. Apenas rostos cansados, sofridos e indignados – dizia uma das ativistas.

Desafio é conter as minorias violentas

Preocupação semelhante norteia a preparação de outros eventos pelo país. Os manifestantes que se insurgem contra a corrupção não querem a companhia de desordeiros, que se infiltram para quebrar e roubar. Há o receio de que o furor das minorias, daqueles que sacam martelos e coquetel molotov das suas mochilas para rapinar e destruir, possa comprometer a causa maior de reformar a democracia brasileira.

Os últimos episódios causaram reflexões. Em São Paulo, por exemplo, o Movimento Passe Livre (MPL) chegou a anunciar, na sexta-feira, que desembarcava dos protestos. Oficialmente, alegou que cumprira a missão. Nos bastidores, sabe-se que o MPL preocupa-se com a ação dos grupos radicais – de esquerda e direita – pegando carona nas manifestações populares.

Ontem, o MPL reconsiderou. Fez reuniões em bairros de São Paulo com as comunidades, para esclarecer a campanha por um transporte coletivo eficiente e com tarifa zero. Na página do Facebook, garantiu que irá participar dos próximos atos.

Os protestos anunciados para hoje podem consolidar reclamações já ensaiadas. Uma consulta ao Facebook expõe as que despontam na agenda das ruas: caos na saúde e na educação, superfaturamento nas obras da Copa, corrupção política e a proposta de emenda constitucional (PEC 37) que retira o poder de investigação do Ministério Público.

Fonte: Zero Hora (RS)

Paz para protestar

Depois de mais de uma semana de muita violência nas concentrações populares, o Brasil viveu um dia relativamente tranquilo . Houve protestos de menor dimensão, pacíficos e sem maiores tumultos no Rio, Brasília, Fortaleza e outras cidades. Em Belo Horizonte, em meio a muitos boatos e medo na Feira de Artesanato da Afonso Pena, ocorreram manifestações em alguns pontos da cidade, a maior delas embaixo do Viaduto Santa Tereza, sem incidentes graves.

Uma trégua nos confrontos

BRASÍLIA –A passeata que reuniu 4 mil pessoas ontem na orla de Copacabana, no Rio de Janeiro, convocada para protestar contra a PEC 37, terminou na esquina da Avenida Delfim Moreira com a rua Aristides Espínola, no Leblon, onde fica a casa do governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB). Desde sexta-feira, dezenas de pessoas estão acampadas no local. A rua foi fechada e está protegida por policiais. Sob uma fina garoa, elas ocuparam cerca de duas quadras e gritaram frases contra o governador. O trajeto entre Copacabana e Ipanema foi tranquilo e animado, com palavras de ordem diversas e manifestações de apoio da população

Na Rua Francisco Otaviano, que liga os dois bairros, manifestantes entoaram um dos gritos mais frequentes nas ruas atualmente: "Da Copa eu abro mão, quero saúde e educação!" Nessa hora, muitos moradores, grande parte de pessoas com mais idade, saíram às janelas e aplaudiram, outras piscavam as luzes dos apartamentos e das portarias, funcionários do hotel Arpoador Inn foram à calçada para bater palmas. "Quem apoia pisca a luz", gritaram. Um hóspede do hotel Fasano, um dos mais caros e elegantes do Rio, atendeu a multidão e piscou a luz do quarto.

No vidro que protege o Posto 9, eram projetadas imagens de cartazes de outras manifestações pelo país com frases como "Acorda Brasil, o país é nosso!", "Basta!" ou "Enfia os 20 centavos no SUS", entre outras. Muitos paravam para fotografar.

Policiais militares acompanham a manifestação. Um carro do Batalhão de Operações Especiais (Bope) foi vaiado pela multidão, que emendou gritos e xingamentos ao governador do Rio. O público da passeata foi composto pelas mesmas pessoas que normalmente ocupam o calçadão da orla da Zona Sul carioca. Havia muitas famílias com crianças. Índios da Aldeia Maracanã também se juntaram à manifestação.

Centenas de pessoas saíram do Posto 4 (próximo ao Copacabana Palace), em direção ao Forte de Copacabana, após fazerem um apitaço. Os gritos dos outros atos se repetiram, como o "Vem pra rua, vem". Turistas estrangeiros se misturam à multidão. Os cartazes simularam placas de trânsito com o sinal de proibido sobre a expressão PEC 37.

Os mercados e farmácias que ainda funcionavam, por volta das 15h30, trabalhavam com apenas parte da porta aberta. Alguns quiosques da Avenida Atlântica foram fechados. Os hotéis reforçaram a segurança, mas os restaurantes da orla funcionaram normalmente. O gerente do restaurante Mondego, que fica em frente ao ponto de encontro da manifestação, Ricardo Portela, disse que não montou nenhuma estrutura especial. "A população está mais calma. Não acredito que vá ter problemas como os que aconteceram nas outras manifestações", disse.

Ocupação No terceiro dia de ocupação de parte da Avenida Delfim Moreira, em frente à residência do governador Sérgio Cabral, manifestantes abriram uma roda de debate para que moradores e pessoas que caminhavam na orla pudessem participar do movimento. Quem quis a palavra teve três minutos para expor suas ideias, sempre sendo aplaudido ao final de cada discurso.

Dentre os temas debatidos estavam os rumos dos protestos, reivindicações como o fim da corrupção, a diminuição dos impostos e a relação dos manifestantes com a Polícia Militar. "Democracia é isso: a pessoa chega, fala o que pensa e, assim, trocamos experiências", resumiu o ator Pedro Casarin, que desde sexta à noite dorme na esquina da Rua Aristídes Espíndola com a Avenida Delfim Moreira.

O dia foi de protestos também em cidades do interior de São Paulo, como Ubatuba, Orlândia e Praia Grande, de Goiás, como Caldas Novas, e do Rio Grande do Sul, como Venâncio Aires, Erechim, Canela, Capão da Canoa e Bagé. A tranquilidade, porém, teve exceções. Em Fortaleza, onde houve partida entre Nigéria e Espanha pela Copa das Confederações, cerca de mil pessoas participaram de ato na pista que dá acesso ao aeroporto da cidade. A via ficou bloqueada por quase duas horas. Vândalos picharam e esvaziaram pneus de carros de emissoras de televisão.

Fonte: Estado de Minas

Nova onda de protestos na última semana dos jogos

De olho nas grandes manifestações previstas para a próxima quarta-feira, a presidente Dilma Rousseff encontra-se hoje com governadores e prefeitos de várias cidades brasileiras e recebe líderes do Movimento Passe Livre. A expectativa é de que se repitam, em tamanho, em confrontos e em atos de vandalismo, as marchas da semana passada.

Em Brasília, organizadores das três maiores mobilizações se reuniram ontem em frente à Biblioteca Nacional para unificarem os movimentos. Em Belo Horizonte, que recebe a Seleção Brasileira para o jogo contra o Uruguai pelas semifinais da Copa das Confederações, a Polícia Militar teme o agravamento da violência do último sábado.

Dilma entre o discurso e a ação

Sem a certeza do quanto as manifestações dos últimos dias arranharam seu projeto de reeleição em 2014, mas convicta de que precisa dar uma resposta rápida e eficiente para as reivindicações, sob o risco de que a insatisfação das ruas contamine ainda mais o governo, a presidente Dilma Rousseff terá uma semana decisiva. Passou ontem o dia no Palácio do Alvorada recebendo ministros, checando números, buscando propostas. Hoje, estará com governadores e prefeitos de capitais para debater soluções conjuntas para a crise que assolou todos os políticos com mandato eletivo. Dilma também vai receber também representantes do Movimento Passe Livre (MPL).

Aliados e especialistas lembram que Dilma terá que mudar daqui para frente. Além do lado prático de tirar iniciativas do papel ou acelerar as que já existem, terá que alterar seu perfil de atuação. Tão alertada pelos políticos e representantes dos movimentos sociais, a avaliação é de que precisará dialogar mais. Prometeu isso no pronunciamento de rádio e televisão de sexta-feira, ao assegurar que receberá os movimentos sociais e os representantes pacíficos das manifestações, algo que não tem feito até o momento. "O que um presidente tem de mais precioso é o seu tempo. E Dilma, ao centralizar tudo em suas mãos, gasta muito mal essa riqueza. Em vez de agir como presidente, comporta-se como um assessor, fiscalizando detalhes desnecessários de projetos em gestação", diagnosticou um aliado.

O diálogo com o atual movimento torna-se ainda mais complicado porque não se sabe quem , além do MPL, está do outro lado na figura de interlocutor. Se Dilma tem dificuldade em aceitar a legitimidade de atores conhecidos, como fará para autenticar porta-vozes difusos, com queixas diversas? Se nem os comandantes dos protestos se intitulam como tais, com quem a presidente poderá conversar nas próximas semanas para tentar baixar a temperatura das ruas?

Um importante ministro afirmou ao Correio que a presidente precisa, com urgência, identificar quais são esses interlocutores para que o debate seja iniciado. Tudo isso sem abrir mão dos demais representantes dos movimentos sociais, para que eles não se sintam desprestigiados e transfiram o foco da crise para outros pontos.

Além disso, o mesmo integrante do primeiro escalão dilmista defendeu a urgência de se abrir um diálogo sobre o legado da Copa e das Olimpíadas Rio 2016, um dos pontos centrais da pauta dos manifestantes. Para esse ministro, o governo foi tragado pelo argumento de que o dinheiro foi jogado fora em estádios superfaturados, sem que a população comum se beneficiasse disso.

Transporte

Ontem, no Alvorada, dentre as diversas reuniões que teve, a presidente discutiu mobilidade urbana, uma das promessas centrais do governo quando o país conquistou o direito de sediar o Mundial de futebol e os Jogos Olímpicos. As principais obras não saíram do papel e, das que avançaram, muitas delas não ficarão prontas a tempo do torneio. Dilma quer soluções e deve se apegar, ainda mais, nas concessões de aeroportos, portos, rodovias e ferrovias, cujos editais serão lançados ao longo de 2013.

Dilma também precisa, na opinião de pessoas próximas, sair do casulo no qual se envolveu nos últimos meses e conduzir, como estadista, um grande pacto envolvendo governadores, prefeitos e Congresso Nacional. "Chegou a hora de pararmos de falar e de começarmos a fazer. Isso vale para o governo e vale para o Congresso", declarou o líder do PT na Câmara, José Guimarães (CE). "E não adianta apenas fazermos. Temos que ter urgência nessa ação", defendeu o petista.

Ele defende a prioridade para a pauta apresentada pela própria Dilma no pronunciamento de sexta-feira, dentre elas a destinação de 100% de recursos dos royalties para a educação. Além disso, Guimarães vai propor na reunião de líderes da Câmara, marcada para amanhã, que se vote com rapidez o projeto do deputado Mendonça Filho (DEM-PE) que desonera de PIS/Cofins o setor de transportes, bem como o Fundo de Participação dos Estados (FPE).

Reticente, um aliado do Planalto lembrou que a destinação dos royalties para a educação já foi rejeitada uma vez pelo Congresso. O projeto que tramita na Câmara é nova tentativa de Dilma, mas ninguém tem a certeza se ele será aprovado. "Além disso, o Supremo ainda não definiu de quem são os royalties, se dos estados produtores ou não produtores. Por que as pessoas não vão protestar também no Judiciário?", queixou-se o deputado Danilo Forte (PMDB-CE), relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

Na cadeia de rádio e televisão da noite de sexta-feira, Dilma também prometeu acelerar a entrada de médicos estrangeiros no país, ideia que vem sendo rechaçada com frequência pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Esse foi um dos assuntos tratados ontem nas diversas reuniões no Alvorada. Como não há consenso e a presidente precisa de respostas rápidas, ela deve anunciar amanhã editais destinados a preencher vagas de médicos residentes e investimentos de R$ 100 milhões na rede pública de saúde.

Ponto por ponto

Confira trechos do pronunciamento da presidente Dilma Rousseff na noite de sexta-feira e em que situação estão as áreas abordadas:

Combate à corrupção

"Ela (a mensagem das ruas) reivindica um combate sistemático à corrupção e ao desvio de recursos públicos. Todos me conhecem. Disso eu não abro mão"

Depois de promover uma faxina na Esplanada e demitir ministros envolvidos em corrupção, a presidente chamou aliados dos faxinados para retornar ao governo.

Mobilidade urbana

"O foco será: primeiro, a elaboração do Plano Nacional de Mobilidade Urbana, que privilegie o transporte coletivo"

Já existe o PAC Mobilidade Urbana, para grandes e médias cidades, mas as obras andam lentamente.

Recursos para a educação

"Segundo, a destinação de 100% dos recursos do petróleo para a educação"
Dilma já enviou projeto de lei para o Congresso Nacional. Depende agora de os parlamentares votarem, e se texto enviado pelo Executivo será alterado.

Médicos do exterior

"Terceiro, trazer de imediato milhares de médicos do exterior para ampliar o atendimento do Sistema Único de Saúde, o SUS"

O governo já estuda a contratação de médicos estrangeiros há um certo tempo, mas encontra resistência da categoria. No fim de semana, quatro entidades médicas, entre elas o Conselho Federal de Medicina, divulgaram nota de repúdio à importação de profissionais.

Diálogo com a sociedade

"Anuncio que vou receber os líderes das manifestações pacíficas, os representantes das organizações de jovens, das entidades sindicais, dos movimentos de trabalhadores, das associações populares"

Dilma é criticada por movimentos sociais e sindicatos pela falta de diálogo. Apesar de estar enfrentando crise em sua política indígena, é a única presidente nos últimos 18 anos que não recebeu os índios.

Reforma política

"Quero contribuir para a construção de uma ampla e profunda reforma política, que amplie a participação popular"

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a tentar acelerar tramitação de proposta no Congresso, mas está a cargo dos parlamentares colocar a reforma em votação.

Sistema partidário

"É um equívoco achar que qualquer país possa prescindir de partidos"
A presidente colocou a base aliada para aprovar projeto que dificulta a criação de legendas, e, com isso, barrar o Rede Sustentabilidade, de Marina Silva.

Gastos com a Copa

"Em relação à Copa, quero esclarecer que o dinheiro do governo federal gasto com as arenas é fruto de financiamento que será devidamente pago pelas empresas e os governos que estão explorando estes estádios"

Os financiamentos são feitos por bancos públicos, com juros subsidiados pelo governo federal.

"Jamais permitiria que esses recursos saíssem do Orçamento Público Federal, prejudicando setores prioritários, como a saúde e a educação"

Os estados precisarão pagar os empréstimos, ou seja, continua sendo dinheiro público. No caso da educação, governo federal só é responsável pelo ensino superior.

Fonte: Correio Braziliense

O Brasil nas ruas - Dilma discute plano de ação com governadores

Diante de onda de protestos, presidente deve anunciar medidas na área de saúde
Manifestações se repetiram em pelo menos 20 cidades brasileiras, inclusive o Rio; bandeiras se diversificam cada vez mais, e tema do combate à corrupção ganha força. Novos atos estão previstos para hoje e amanhã

Pressionada pela onda de protestos, a presidente Dilma Rousseff convocou para hoje uma reunião com governadores e prefeitos de capitais em busca de uma ação conjunta para melhorar os serviços públicos.

Em busca de respostas

Após manifestações, Dilma reúne hoje governadores e prefeitos para melhorar serviços públicos

Chico de Gois, Geralda Doca e Luiza Damé

BRASÍLIA - Dentro da estratégia do governo federal de dividir responsabilidades e acalmar os protestos que avançam pelo país, a presidente Dilma Rousseff convocou para uma reunião hoje à tarde governadores e prefeitos de capitais, com o objetivo de definir uma linha de ação conjunta para melhorar os serviços públicos. Dilma chegará ao encontro com propostas recicladas e ouvirá muitas cobranças de governadores e prefeitos, que reclamam do não cumprimento de promessas da União, especialmente da falta de investimento federal em mobilidade urbana.

A pauta principal será Plano de Mobilidade Urbana, o que é considerado pouco pelos gestores estaduais e municipais, que vão para o encontro com pautas específicas e dissociadas das reivindicações das ruas: abordam desde problemas de caixa provocados pelo baixo crescimento econômico, até uma Constituinte para fazer a reforma política, pauta do PT.

Em seu pronunciamento em rede nacional de televisão e rádio, na última sexta-feira, a presidente propôs um pacto entre todas as esferas de governo para tentar melhorar os serviços públicos. Dilma disse que seu governo ouve a voz das ruas e que o país precisa de mudanças profundas, entre as quais uma reforma política.

O Palácio do Planalto já tem confirmada a presença de governadores e prefeitos aliados e da oposição, mas as cobranças virão de todos os lados. Além do Plano Nacional de Mobilidade Urbana, Dilma vai defender a adesão dos estados e municípios à Lei de Acesso à Informação, como forma de dar mais transparência aos atos públicos e combater a corrupção. Vai sugerir a adesão ao Programa Brasil Transparente, da Controladoria Geral da União (CGU), que também já existe.

A presidente deve anunciar melhorias na estrutura pública de saúde: mais hospitais e unidades de atendimento, além de novas vagas em cursos de medicina e para especialistas, a fim de melhorar a rede Médica, o que pode ser uma resposta para neutralizar a resistência à importação de médicos. A vinda de médicos estrangeiros, citada por Dilma no pronunciamento, tem sido continuamente criticada por entidades de médicos.

Combate à corrupção na agenda

O governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), por exemplo, é um dos que dizem não acreditar que investimentos em obras de mobilidade, por si só, resolvam a insatisfação popular, já que tem retorno de longo prazo. Ele afirma que o grito das ruas é preocupante à medida que prega a negação, a rejeição da classe política. A presidente, disse ele, está preocupada porque, em alguns momentos, a manifestação tem enveredado para o vandalismo e a desordem:

- A questão da mobilidade urbana, que originou os protestos, não será resolvida rapidamente, porque as obras levarão até três anos para serem concluídas. Em várias capitais já existem investimentos em andamento, com recursos do Ministério das Cidades, dos estados e do setor privado.

O governador petista disse que ninguém tem pronto na cabeça um produto, uma resposta para as ruas, nem a própria presidente sabe o que fazer. Segundo Wagner, o principal foco tem que ser a reforma política, prioridade do PT, porque elimina possibilidades de conluio e conchavos, pois uma das principais mensagens dos protestos é a questão da corrupção. Wagner também defende uma modernização da Lei de Licitações.

- A corrupção tem o braço político, mas tem também o empresarial. A Lei de Licitações foi elaborada para ajudar no combate à corrupção, mas está ultrapassada - destacou o governador.

Na visão do governador Jaques Wagner, os recursos gastos para sediar os Jogos da Copa estão mal explicados. Ele destacou que é preciso deixar clara a importância do evento para o Brasil e que os investimentos realizados vão permanecer e ajudar na promoção do turismo, e atrair shows internacionais para os estádios, por exemplo.

Tarso defende passe livre para estudantes

O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, chegará a Brasília disposto a defender passe livre para estudantes, uma proposta que está sendo preparada no governo gaúcho, e a convocação de Assembleia Nacional Constituinte para discutir a reforma política.

O governador do Rio, Sérgio Cabral, e o prefeito da capital, Eduardo Paes, ambos do PMDB, viajam no fim da manhã. O vice-governador, Luiz Fernando Pezão (PMDB) criticou o baixo crescimento da economia, por diminuir o poder de resposta dos estados. Antes da viagem, ele e Cabral se reúnem:

- A situação dos estados é muito dura. Há pouca margem de manobra, porque a economia não está crescendo muito, e a arrecadação de impostos diminui. Tivemos menos ICMS, por exemplo. Dinheiro em caixa seria importante para responder aos anseios da população. É um momento muito difícil para todos.

Tucanos fazem reunião prévia

Governadores e prefeitos do PSDB vão comparecer à reunião com a presidente, mas, antes, devem se reunir com o presidente da legenda, senador Aécio Neves (MG), para discutir uma pauta em comum. O governador de Goiás, Marconi Perillo, comemorou em seu twitter o discurso da presidente. "Quero ir ao encontro da presidente Dilma para firmarmos pacto entre União, estados e municípios para ação conjunta em favor dos brasileiros", escreveu ele, continuando: "Ela traduz para toda a Nação a mensagem que o povo nas ruas emite nas veementes manifestações históricas dos últimos anos." E encerrou: "Em seu pronunciamento, a presidente Dilma mostra-se lúcida e de grande capacidade de liderança."

O governador tucano de Minas Gerais, Antônio Anastasia, disse que atenderá ao chamado da presidente, porque se trata de uma questão nacional e vai com o intuito de colaborar. Mas cobrará a retomada dos repasses de recursos para o metrô de Belo Horizonte.

- Vamos pedir para acelerar a retomada dos investimentos. De minha parte, vou apresentar a ela a situação de dificuldades financeiras em que se encontram os estados - disse Anastasia, que irá com o prefeito Márcio Lacerda, do PSB.

A Frente Nacional de Prefeitos (FNP), que reúne as capitais e maiores cidades brasileiras, deve se reunir antes do encontro com Dilma para fechar uma lista de propostas que será levada ao Planalto. No comando da frente estão os prefeitos de Porto Alegre, José Fortunati (PDT), e de São Paulo, Fernando Haddad (PT).

Pelo governo, devem participar os ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo; da Saúde, Alexandre Padilha; da Casa Civil, Gleisi Hoffmann; de Relações Institucionais, Ideli Salvatti; da Educação, Aloizio Mercadante; das Cidades, Aguinaldo Ribeiro; da Secretaria Geral, Gilberto Carvalho; e da CGU, Jorge Hage. Todos foram orientados pela presidente a levantar projetos desenvolvidos pelo governo nos estados e municípios e o que poderá ser feito.

Algumas reivindicações

PREÇO DA TARIFA DOS TRANSPORTES: Essa reivindicação começou a ser atendida durante a semana, com a redução do preço em várias cidades

GASTOS COM A COPA: Questionam o valor investido no torneio e qual o legado que sobrará para a população

EDUCAÇÃO E SAÚDE: pedem melhorias em ambas as áreas e exigem mais investimentos

BASTA DE CORRUPÇÃO. Criticam os políticos em geral e a corrupção e atacam a impunidade que deixa os corruptos livres

CONTRA A PEC 37: Questionam a aprovação da emenda constitucional que tira o poder de o Ministério Público investigar

CRÍTICA AOS PARTIDOS: De forma genérica, não querem a presença de partidos no movimento

As propostas em estudo

MOBILIDADE URBANA: o próprio governo já lançou várias vezes pacote de obras nesse sentido; governadores querem recursos para metrô

SAÚDE: Governo deve se comprometer com novas unidades, novas regras para cursos de Medicina e mais especialistas na rede médica

CORRUPÇÃO: Uma das propostas que será apresentada é a modernização da Lei de Licitações

TRANSPORTES: Alguns governadores defenderão o passe livre nos ônibus para os estudantes

REFORMA POLÍTICA: Há em tramitação um projeto que trata do tema, mas está parado. Outra ideia é criar uma Constituinte exclusiva sobre o tema, É uma pauta do PT, defendida por governadores do próprio partido

Fonte: O Globo