segunda-feira, 29 de junho de 2020

Fernando Gabeira - A morte e a morte da democracia

- O Globo

Ela é comida pelas beiradas, como vírus que invade, gradativamente, seu pulmão até que pare de respirar

É preciso retomar o tema da democracia ameaçada. A prisão de Fabrício Queiroz conteve o avanço da extrema direita. Muitos interpretam o perigo de golpe apenas como um blefe de Bolsonaro, um delírio que agora se dissolve.

São pessoas sensatas que me perguntaram quando soei o alarme se eu não estava exagerando.

De uma certa forma, abordei este tema num artigo de fim de semana. Lembrei a tensão nas democracias europeias dos anos 30 e as pequenas pausas que surgiam entre elas. Muitos as interpretavam como o fim dos problemas, um novo período de paz.

Não tenho nenhuma intenção de comparar a extrema direita brasileira com a Alemanha nazista. Isto serviria apenas para reforçar a ideia de que exagero. Minha preocupação é apenas analisar a pausa. Ela pode ser aproveitada para se avançar na defesa da democracia ou pode ser considerada como o fim de um período de hostilidades.

Muitos imaginam o golpe de estado clássico: tanques saindo dos quartéis e ocupando pontos estratégicos, Congresso e STF fechados. É uma espécie de tiro no coração da democracia. Acontece que, nos últimos anos, cresce o consenso de que a democracia é comida pelas beiradas, como um vírus que invade, gradativamente, seu pulmão até que pare de respirar.
Essa lenta e sistemática derrubada da democracia brasileira está em curso. Não há tanques na rua, nem censores dentro dos jornais.

Carlos Pereira - Tea Party à brasileira

- O Estado de S.Paulo

Perfil similar a movimento dos EUA garante sobrevivência política de Bolsonaro

Diante da avalanche de notícias e eventos ruins que o governo Bolsonaro tem acumulado nas últimas semanas, era de se esperar uma queda mais acentuada da popularidade do presidente e um crescimento mais vigoroso da avaliação negativa do desempenho de seu governo.

Afinal de contas, já são mais de 1,3 milhão de pessoas contaminadas pela covid-19 e mais de 57 mil mortes. Houve redução de aproximadamente 10% da atividade econômica e estima-se que a taxa de desemprego já esteja em torno de 16%.

Para completar a “maré de azar”, o ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro e também amigo de longa data do presidente, Fabrício Queiroz, foi preso enquanto escondido na casa do advogado da família Bolsonaro, Frederick Wassef, sob acusação de ser o operador de um esquema de lavagem de dinheiro, enriquecimento ilícito e formação de quadrilha liderado pelo próprio filho do presidente.

Entretanto, os institutos de pesquisa têm mostrado que a popularidade de Bolsonaro se estabilizou em 30%, o que sugere grande resiliência política do presidente.

Quem seriam os eleitores que continuam apoiando o presidente, mesmo diante de eventos tão negativos?

Em pesquisa de opinião desenvolvida com o apoio do Estadão, identificamos que os eleitores que se autodenominam de direita e de centro direita (27% da amostra de 7.020 respondentes) são majoritariamente homens (71%), brancos (73%), acima de 40 anos de idade (67%), possuem renda superior de 5 salários mínimos (70%), são profissionais liberais ou trabalham na iniciativa privada (51%) e dizem possuir alguma religião, notadamente judaica (39%), evangélica (38%) ou católica (33%). Apresentam perfil predominantemente conservador, baseado nos valores morais e da família, e preferem políticas econômicas liberais.

Cacá Diegues - Direita volver

- O Globo

A sorte dos democratas é que certos métodos servem para eleger um candidato, mas não garantem um bom governo

Em política, quando não se tem um projeto claro e preciso para o futuro, o ativista rodopia em torno de um vazio que ele mesmo não consegue admitir. Nada mais angustiante para o ativista do que não poder dizer pelo que luta, para o que serve seu empenho. Aos olhos dele, o conformista é um aliado da desgraça, o esperto finge que não a vê, o homem de ação tenta vencê-la a qualquer preço. E o combatente deve contornar o infortúnio sem descanso, até encontrar o buraco por onde abordar o verdadeiro sentido das coisas, no momento oportuno, avançando mais um passo, mesmo que mínimo, em direção ao paraíso.

Os Bolsonaro têm um projeto. Eles são responsáveis pelo primeiro projeto clara e inapelavelmente de direita neste país. O presidente está à frente de alguma coisa que, mesmo que nem sempre o confesse, corresponde a uma transformação radical de nossas estruturas públicas e até psíquicas. Não se trata de uma mudança, trata-se de uma transformação.

Nunca vi, no Brasil, defesa tão clara da direita como essa dos Bolsonaro e seus aliados. E, para glória deles, nunca vi tanta gente, importante ou não, botando a cabeça de fora para anunciar-se, desde sempre ou convencida por eles, de direita. É como se a chegada de pastores inesperados encontrasse um bando de ovelhas malocadas, adeptos mudos de ideias secretas, novos convertidos ou libertos de longo silêncio culpado. Todos doidos para anunciar o que, até aqui, não tinham coragem de confessar, por falta de convicção e apoio público. Os mais radicais se diziam em luta contra a esquerda corrupta e, claro, contra os comunistas de sempre. Foi essa a desculpa, às vezes sincera, daqueles que fizeram o golpe de estado de 1964.

Demétrio Magnoli - A esquerda no espelho da epidemia

- O Globo

O vírus tem lado ideológico

A crise ensina. A emergência sanitária do coronavírus evidenciou o negacionismo criminoso de Jair Bolsonaro, desmoralizando seu governo aos olhos de todos que não sucumbiram ao fanatismo ideológico da extrema direita. Contudo, de um modo menos óbvio, ela também lançou um penetrante jato de luz sobre a esquerda, expondo suas vísceras. A imagem resultante não é bonita.

Capítulo um: hipocrisia.

A esquerda ocupou a linha de frente do exército que clamava pela imposição de lockdown. Na Itália, na Espanha e na França, rígidas medidas de lockdown travaram o avanço dos contágios, circunscrevendo regionalmente as epidemias. Lockdown não é, porém, um ato de pura vontade. O congelamento geral da vida econômica e social exige uma ditadura totalitária (China) ou a conjunção de dois fatores inexistentes na paisagem brasileira: consenso político e coesão social.

Não se faz lockdown sob um governo central em campanha permanente contra o distanciamento social. Não se faz lockdown com vastas parcelas das populações metropolitanas carentes de renda e redes de proteção social, que se concentram em cinturões periféricos e favelas desassistidas. A esquerda que ignora essas realidades escolheu dialogar exclusivamente com as classes médias.

Ricardo Noblat - Como o vírus, Bolsonaro também passará

- Blog do Noblat | Veja

Sob o freio dos militares e da conjuntura

Até quando os generais que cercam Jair Bolsonaro conseguirão impedir que ele detone novas crises como vinha fazendo com regularidade ao longo dos últimos meses? E até quando o ex-capitão, expulso do Exército por planejar atentados a bomba em quarteis, manterá sob controle seus instintos mais primitivos?

Não deve estar sendo fácil para ninguém – nem para os militares que transformaram o Palácio do Planalto num puxadinho do Quartel-General do Exército a pouca distância, nem para um presidente que já proclamou muitas vezes que é ele quem manda. Um dia desses, chegou a dizer que a Constituição era ele.

Sem saber, uma vez que é reconhecidamente ignorante e não gosta de livros porque eles contém “muitas letrinhas”, Bolsonaro lembrou Luiz XIV, Rei da França e de Navarra entre 1638-1715, a quem se atribui a frase famosa: “O Estado sou eu”. Luiz XIV governou 72 anos. Luiz XVI foi deposto e guilhotinado em Paris.

Os porta-vozes informais de Bolsonaro sugerem que ele amadureceu e está disposto a cumprir a Constituição tal como disse que o faria ao se eleger e ao tomar posse. Só não explicam porque ele a afrontou toda vez que pode. Negam que a mudança de comportamento se deva apenas à conjuntura difícil que enfrenta.

Leandro Colon - Paz e amor por conveniência

- Folha de S. Paulo

Bolsonaro age para blindar os filhos e porque foi aconselhado por aliados

Surgiu um Jair Bolsonaro "paz e amor" nos últimos dias. Fez acenos de pacificação aos Poderes, prestou homenagem às vitimas do Covid-19, e escolheu um ministro da Educação fora do nocivo "olavismo", que afundou o MEC até agora.

O presidente tem ainda buscado um distanciamento dos extremistas que pedem intervenção militar e estimulam a crise com o STF.

Teria caído a sua ficha sobre o desastroso governo que conduz até aqui? Provavelmente, não.

Bolsonaro age para blindar os filhos e também porque foi aconselhado por aliados a baixar a temperatura diante dos recentes embates.

O entorno do presidente sabe do seu isolamento, hoje pendurado na estabilidade da aprovação por 32% da população.

Mas os sinais de enfraquecimento são evidentes, como diz a própria pesquisa: o apoio cai para 15% entre os que avaliam que ele sabia do esconderijo de Fabricio Queiroz.

Bolsonaro flerta com um armistício, faz gestos neste sentido, mas nada que leve a crer que suas convicções tenham mudado.

Marcus André Melo* - A pandemia afetou a democracia?

- Folha de S. Paulo

Abusos ocorreram apenas nos países com 'comorbidades institucionais'

Difundiu-se o argumento que a atual pandemia teria exacerbado o processo global de erosão da democracia na última década. As evidências disponíveis até agora sugerem algo inteiramente diverso. Na maioria dos países, os freios e contrapesos têm atuado de forma robusta.

A deterioração ocorre só nos suspeitos usuais como a Hungria de Orbán ou as Filipinas de Duterte, e na franja de países que foram os últimos a serem atingidos por surtos esporádicos do vírus democrático, como Nicarágua e El Salvador, onde o retrocesso autoritário não significa outra coisa que uma “regressão à média”; a volta à normalidade autoritária.

Em outras palavras, a erosão da democracia em virtude de abusos do Executivo devido à situação de emergência só ocorreu onde havia “comorbidades institucionais”, tais como escassa experiência com regimes constitucionais, além de outras “patologias pré-existentes”. A Hungria, por exemplo, foi governada por ditadura comunista durante 50 anos ( 1949-1989) e por regimes autoritários ou ditaduras por várias décadas antes disso.

Celso Rocha de Barros* - Uma semana sem Jair

- Folha de S. Paulo

Instituições aproveitaram que presidente estava fugindo da polícia e deram uma funcionada

Na semana passada, as instituições aproveitaram que o presidente estava fugindo da polícia e deram uma funcionada.

O Congresso aprovou o marco do saneamento básico, que talvez seja o começo de uma solução para um problema difícil. Os militares conseguiram desalojar os olavistas da direção do MEC, e, sim, o novo ministro mentiu que tinha doutorado, mas o outro cara era o Weintraub, o novo já seria melhor se só soubesse ver hora.

Ao longo da semana, ninguém falou em golpe de Estado, ninguém agrediu jornalista, ninguém fingiu que Olavo de Carvalho era uma opinião a ser levada em conta no debate.

Tudo isso parece ridículo diante da total imobilidade do Estado frente a dezenas de milhares de brasileiros mortos, mas as expectativas no Brasil de 2020 são muito baixas.

Nas semanas anteriores, Bolsonaro ameaçou um golpe de Estado para tentar parar as investigações contra ele e sua família. Os militares não se empolgaram com a ideia de um golpe para abafar um esquema com rachadinhas, milicianos e seja lá o que for que Wassef seja.

Mathias Alencastro* - Ecologia é o grande ausente do debate progressista no Brasil

- Folha de S. Paulo

Discussões para fazer emergir Frente Ampla deixaram de lado a urgência climática

A ecologia está em todo lado. Os partidos verdes triunfaram nas eleições municipais deste domingo (28) na França, ganhando força em cidades disputadas pelo partido de Emmanuel Macron.

Prestes a anunciar uma nova leva de ministros, o presidente francês deve inaugurar a última fase do seu mandato com uma virada ecológica.

Seguindo o caminho de Áustria e Irlanda, que formaram as primeiras coalizões europeias entre verdes, centristas e conservadores, a Alemanha olha para o ambientalista Robert Habeck como ator-chave no processo de sucessão de Angela Merkel.

Os ecologistas são vistos em todo o lado como o antídoto à ascensão do populismo.

Nos Estados Unidos, Joseph Biden abraçou a bandeira da luta contra a mudança climática para mobilizar o eleitorado mais jovem e progressista.

Bruno Carazza* - Os números estarão certos desta vez?

- Valor Econômico

Temporada de pesquisas nos EUA favorece Biden

George Gallup chegou a Madison Avenue muito antes de Donald Drapper, o fictício publicitário da aclamada série Mad Men. Aos 31 anos ele foi contratado para ser diretor da agência Young and Rubicam, levando para o centro criativo da publicidade em Nova York o seu revolucionário método de aferir a opinião pública por meio de levantamentos por amostragem.

Gallup aplicava suas técnicas para medir a efetividade de anúncios e comerciais de produtos em jornais, revistas e rádio, mas naquele ano (1932) resolveu fazer um experimento familiar. Sua sogra, Ola Babcock Miller, iria se candidatar a um cargo em Iowa, e o estatístico começou a realizar algumas pesquisas de opinião para aferir suas chances. Ela acabou vencendo, pegando carona na onda democrata de Franklin Roosevelt, com suas propostas para tirar o país da Grande Depressão - e Gallup percebeu que estava diante de uma grande oportunidade de negócios.

Nas eleições presidenciais seguintes veio a sua consagração. Uma revista popular na época, a The Literary Digest, enviou 10 milhões de formulários para seus assinantes pedindo que eles respondessem em quem votariam: no presidente Roosevelt ou no republicano Alf Landon. 2,27 milhões responderam à enquete e, quatro dias antes da eleição, a revista anunciava que o desafiante Landon venceria com 57,1% dos votos.

Sergio Lamucci - O derretimento da demanda privada

- Valor Econômico

Garantir uma trajetória fiscal sustentável será essencial para manter os juros em níveis baixos, um trunfo decisivo para a retomada

O primeiro semestre chega ao fim com a certeza de que 2020 vai registrar o maior tombo do Produto Interno Bruto (PIB) da história brasileira, e com muitas dúvidas sobre as perspectivas de recuperação da atividade. Há grande incerteza sobre a reação de famílias e empresas, muitas das quais vão sair machucadas da crise, num cenário marcado pela resposta desastrosa do governo federal à pandemia da covid-19 e pelo relaxamento prematuro do isolamento social por vários Estados e municípios. Além disso, o cenário político segue outra fonte de incerteza.

As medidas para combater os efeitos da doença levarão a uma forte piora das contas públicas, necessária num quadro de forte retração da economia, mas que terá de ser enfrentada a partir do ano que vem. O déficit primário deve superar 10% do PIB, e a dívida bruta tende a encostar em 100% do PIB. Será preciso retomar o ajuste fiscal a partir de 2021, obviamente não de modo abrupto, mas de maneira a indicar a sustentabilidade das contas públicas. Com isso, os juros poderão continuar baixos, o que será essencial para estimular a demanda e facilitar a dinâmica do endividamento do setor público e do setor privado, como ressalta o economista-chefe da corretora Tullett Prebon, Fernando Montero.

Em suas análises, Montero tem afirmado que o baque na economia não decorre tanto da perda de rendas na pandemia que, “ao contrário, são mais que substituídas por despesas e transferências públicas financiadas com endividamento público”. Segundo ele, “foi a propensão ao gasto privado - o consumo e o investimento - que derreteu, antes que sua renda”. É claro que há muitos casos de perda de renda durante a crise, mas Montero avalia que o tamanho total da expansão de despesas e transferências é superior a essa queda. “Haverá aumento no endividamento líquido de parte da sociedade, que gastará mais que sua renda. Mas haverá outra parte que gastará menos.”

Dissimulada, ditadura militar criou miragem de separação de Poderes

Regime manteve Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal abertos e tolerou oposição, mas cassou deputados e magistrados

Fábio Zanini | Folha de S. Paulo (28/6/2020)

SÃO PAULO - A máquina política que sustentou a ditadura brasileira não foi apenas autoritária e repressora. Foi também dissimulada.

Durante seus 21 anos, o regime militar cultivou uma miragem democrática.

Ao contrário do Chile, não concentrou poder em um único general, mas o dividiu entre cinco presidentes (além de uma breve junta militar).

Diferentemente da Argentina, manteve o Congresso aberto por praticamente todo o período e tolerou a existência de uma oposição formal.

“Foi uma ditadura em condomínio. Mas era ditadura do mesmo jeito”, diz o historiador Boris Fausto, estudioso do período militar.

“Nunca houve eleição. O Alto Comando do Exército discutia, brigava e votava. Fazia as vezes de povo”, prossegue.

Na teoria, havia respeito a um dos princípios basilares da democracia, o da separação de Poderes. Mas era apenas um verniz, diz o professor, porque o Executivo era um Poder armado, e portanto, superior aos demais.

“Havia separação de Poderes com subordinação ao Executivo. Forte subordinação.”

Não foram poucas as vezes em que a condição de primus inter pares do Executivo se manifestou, entre 1964 e 1985.

Seu instrumento principal foram os Atos Institucionais (AIs), dando formatação jurídica ao regime. Houve 17.

A interferência sobre o Legislativo não tardou, começando já no décimo dia do golpe, 9 de abril de 1964, com o AI-1, que cassou 41 deputados.

Passou pelo AI-5, de 1968, que consolidou a castração do Congresso, e chegou ao Pacote de Abril, de 1977, com a nomeação de senadores “biônicos”, escolhidos em colégio eleitoral controlado pelo Executivo.

Um dos atos institucionais que tiveram consequências mais duradouras para o arcabouço político foi o nº 2, de outubro de 1965, que instituiu o bipartidarismo, fixando a Arena (Aliança Renovadora Nacional) como representante do governo e confinando a oposição ao MDB (Movimento Democrático Brasileiro).

Ditadura Militar: Regime agigantou as empreiteiras e foi rico em escândalos financeiros

Imagem de que período militar foi mais honesto se deveu a falta de transparência e fragilidade de órgãos de controle

Felipe Bächtold | Folha de S. Paulo (28/6/2020)

SÃO PAULO - “O negócio é lucrativo sob qualquer aspecto: a Odebrecht pode cobrir todos os seus gastos e exigir também adicionais. Quanto mais cara a construção, maiores os rendimentos para os acionistas.”

A afirmação pode soar familiar ao noticiário recente do país, mas estampava as páginas da Folha no longínquo ano de 1978, ainda no penúltimo dos governos do regime militar.

À época, o jornal repercutia reportagem da revista alemã Der Spiegel sobre supostas irregularidades em um acordo firmado entre Brasil e Alemanha que viabilizou a construção das usinas nucleares de Angra.

A publicação europeia questionava ligações de ministros com as empresas contratadas, atrasos das obras e o encarecimento do projeto.

Aliados do então presidente Ernesto Geisel repudiavam o teor das acusações da revista. E, assim como aconteceria 36 anos mais tarde no âmbito da Operação Lava Jato, o principal nome da empreiteira foi convocado para depor em uma CPI: Norberto Odebrecht, fundador da construtora, falou aos parlamentares em abril de 1979.

A comissão parlamentar, criada por causa da reportagem, ouviu outras dezenas de testemunhas, mas teve escassas consequências.

Engrenagem de abusos perseguiu, matou, torturou e saiu impune

Comissão da Verdade apontou 434 mortos e desaparecidos, além de milhares de denúncias de abusos; Anistia descartou responsabilizar culpados

Bruno Boghossian | Folha de S. Paulo (28/6/2020)

BRASÍLIA - Dois dias após o golpe de 1964, o ex-sargento Gregório Bezerra foi preso no Recife. Dirigente do PCB, ele foi amarrado pelo pescoço e puxado pelas ruas da cidade, enquanto um oficial incentivava a população a linchá-lo.

Exibidas na TV local, as cenas simbolizaram a inauguração de um regime que adotou a repressão violenta como método. Pesquisadores retratam Bezerra como a primeira vítima de tortura do período.

Os casos registrados nos meses iniciais da ditadura foram tratados por integrantes do governo militar como um reflexo do "calor da hora". A prática, porém, foi adotada como ferramenta para interrogar e combater opositores, em especial personagens considerados subversivos.

A partir de 1968, a repressão violenta formatou uma estrutura dedicada a tortura, mortes e desaparecimento —até o início da abertura, na segunda metade dos anos 1970.

Os números da repressão são pouco precisos, uma vez que a ditadura nunca reconheceu esses episódios. Auditorias da Justiça Militar receberam 6.016 denúncias de tortura.

Estimativas feitas no terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos, aprovado no governo Dilma Rousseff (PT), apontam para 20 mil casos.

Presos relataram terem sido pendurados em paus de arara, submetidos a choques elétricos, estrangulamento, tentativas de afogamento, golpes com palmatória, socos, pontapés e outras agressões. Em alguns casos, a sessão de tortura levava à morte.

Em 2014, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) listou 191 mortos e o desaparecimento de 210 pessoas. Outros 33 desaparecidos tiveram seus corpos localizados posteriormente, num total de 434 pessoas.

Ditaduras que dominaram países vizinhos superaram os dados brasileiros. No Chile (1973-1989), o governo registrou mais de 3.000 mortos. Já na Argentina (1976-1983) foram acima de 30 mil vítimas."

Isso é tido, às vezes, como indicação de que a ditadura brasileira teria sido menos feroz ou absoluta. Não é verdade. A razão desse número é o absoluto controle que o governo tinha do processo repressivo", diz o advogado Pedro Dallari, que coordenou a CNV em 2013 e 2014.

A geopolítica do pós-pandemia – Editorial | O Estado de S. Paulo

No auge da guerra fria entre os Estados Unidos e a então União Soviética, dizia-se que apenas uma grande e inesperada ameaça comum, como uma invasão alienígena, seria capaz de unir as duas superpotências em torno de um projeto de cooperação global. Hoje o planeta se vê às voltas com um problema bem mais concreto e letal do que um ataque de marcianos hostis, a pandemia de covid-19, mas nem Donald Trump nem Xi Jinping parecem dispostos a conduzir um entendimento entre os Estados Unidos e a China, os superpoderosos do século 21, na direção de um plano global para enfrentamento dos efeitos da doença.

E quão profundos serão esses efeitos no atual equilíbrio geopolítico? O Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), em parceria com o Instituto Fernando Henrique Cardoso, realizou um webinar para tratar do tema com Joseph Nye, professor emérito e ex-reitor da Kennedy School of Government, da Universidade Harvard, o embaixador Sérgio Amaral e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Política ambiental multiplica os riscos para o agronegócio – Editorial | O Globo

Grupo que representa US$ 4 trilhões em ativos advertiu governo sobre incertezas para investir no país

Governo e Congresso dão sinais de que pretendem se concentrar, a partir de agosto, no necessário equilíbrio fiscal, com reforma tributária, renda mínima e privatizações. É inquestionável a relevância dessa agenda. Porém, será incompleta e à margem do redesenho do capitalismo no mundo pós-pandemia, se no topo não estiver a mudança de rumo na política ambiental.

Deixou de ser opção de governança, porque se acumulam ameaças ao país, cujas fragilidades econômicas já estão expostas. Tem razão o presidente do grupo Itaú Unibanco, Candido Bracher, que alertou: “As consequências do perigo ambiental até podem vir de uma maneira mais lenta do que o da Covid-19, mas são mais duradouras e difíceis de reverter. Precisamos nos mover contra isso.”

Um grupo de 29 instituições (US$ 4 trilhões em ativos) de Estados Unidos, Japão, França, Reino Unido, Noruega, Suécia, Dinamarca e Holanda advertiu o governo, por escrito, a respeito da “incerteza generalizada sobre as condições de se investir ou fornecer serviços” no país. Repetiu o aviso já dado por 230 fundos globais.

MEC sem partido – Editorial | Folha de S. Paulo

Novo ministro, com currículo em xeque, acertará se de fato adotar gestão técnica

Dado o ambiente de conflagração instituído pelo governo Jair Bolsonaro na gestão do ensino no país, as palavras iniciais do novo ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli, representaram um alento.

Ainda que o escolhido já esteja às voltas com questionamentos a suas credenciais acadêmicas, importa mais, a esta altura, a sinalização de um MEC mais propenso ao diálogo com o setor —e menos a escaramuças ideológicas pueris ao gosto da militância bolsonarista.

Em outro contexto, soariam como meras platitudes as declarações de Decotelli em favor de trabalho, projetos e respeito ao marco regulatório da educação. Depois da trágica passagem de Abraham Weintraub pela pasta, porém, mostras de temperança e disposição produtiva são boas-novas.

É prematuro, decerto, apostar numa guinada rumo à racionalidade. Parece mais prudente interpretar a nomeação à luz de uma espécie de recuo tático ainda incipiente de Bolsonaro, que tem feito movimentos no sentido de distensionar a cena política e institucional.

Decotelli, informa-se em Brasília, contou com o aval da ala militar do governo, tem perfil conciliador e não desagradaria aos políticos do centrão nem aos discípulos do ideólogo Olavo de Carvalho que atravancam o ministério.

BC recria o direcionamento de crédito para empresas – Editorial | Valor Econômico

O direcionamento de crédito é uma solução tolerável, mas deve ser transitória

O Banco Central se afastou dos dogmas liberais no mais recente pacote de crédito, anunciado na semana passada, ao estabelecer uma punição para as instituições financeiras que não sacarem recursos dos depósitos compulsórios para emprestarem para as micro, pequenas e médias empresas. É o tipo de ação pragmática compreensível numa crise sem precedentes como a atual. Mas será importante não perder a direção de longo prazo de reduzir gradualmente o sistema de crédito direcionado no país.

Depois de forte aumento em março, o crédito começou a perder fôlego a partir de abril. Segundo dados dessazonalizados do Banco Central, as concessões de empréstimos e financiamentos a pessoas jurídicas tiveram uma expansão de 29% em março, seguida de quedas de 22% em abril e de 6% em maio.

O crédito foi distribuído de forma desigual. As grandes empresas, que antes vinham se financiando no mercado de capitais e tinham linhas de crédito abertas com os bancos, saíram na frente e absorveram boa parte dos recursos disponíveis. As operações com empresas de menor porte também aumentaram, mas muito abaixo da demanda, gerando a sensação generalizada de falta de crédito para o segmento.

Ruy Castro* - O último músico de Carmen

- Folha de S. Paulo

Com a morte de Russinho, ex-Bando da Lua, uma grande história chega ao fim

Agora, sim, é o fim da linda história que começou em Lisboa, em 1909, quando a pequena Maria do Carmo, dez meses, embarcou para o Rio com sua família, tornou-se Carmen Miranda aos 20 anos, em 1929, e zarpou para a glória na América aos 30, em 1939. Morreu Russinho, seu último músico ainda vivo —o último a nos poder contar como Carmen entrava em cena, suava a baiana e hipnotizava a plateia com aqueles olhos verdes.

Russinho era José Soares, carioca, 92 anos e morador havia quase 70 da Baja Califórnia, no México. Integrou o grupo que tocou com Carmen nos EUA a partir de 1949, o segundo Bando da Lua —o Bando original, que partira com Carmen para Nova York, dissolvera-se em 1943. Russinho era o arranjador vocal do conjunto, com a tarimba que ganhara no Rio ao fazer parte, muito jovem, dos Namorados da Lua, de Lucio Alves, e dos Anjos do Inferno, de Leo Villar.

Era também o pandeiro do grupo, como se vê em “Romance Carioca”, musical de Carmen na Metro em 1950 , em que ela dança com o turbante de sombrinhas e Russinho, vestido de palhaço, abre o número no alto do cenário. Era o músico favorito de Carmen, mais do que Aloysio de Oliveira, seu ex-namorado e que ela relegara a funções profissionais. Só o doce Russinho poderia ter reagido com um soco à arrogância de David Sebastian, marido americano de Carmen, e, em vez de ser demitido, ouvir dela: “Você tem uma direita, hein, Russinho?”.

Música | Marisa Monte - Feitio de Oração

Poesia | Carlos Drummond de Andrade - Amar

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer, amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal,
senão rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o cru,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e
uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor,
e na secura nossa amar a água implícita,
e o beijo tácito, e a sede infinita.

domingo, 28 de junho de 2020

Cristovam Buarque* - Renda inclusiva

- O Globo

Renda mínima merece apoio mas não tem consequência emancipadora da pobreza real

A crise social e econômica pela Covid-19 criou unanimidade na defesa da Renda Básica da Cidadania Universal. Este apoio à generosidade de uma renda para os pobres é natural, mas é incorreto passar a ideia de que ela promove inclusão social. Deve-se apoiar a ideia da renda mínima, alertando para o fato de que se trata de um gesto sem consequência emancipadora da pobreza real. Uma ferramenta positiva para reduzir a penúria, sem superar a realidade da pobreza.

Quando a ideia da Bolsa Escola foi divulgada, em 1987, no livro “A revolução nas prioridades”, seu nome era Renda Mínima Vinculada à Educação. Reconhecia o papel inspirador de Eduardo Suplicy, mas explicitava a diferença estratégica com a Renda Mínima. A adoção posterior do nome Bolsa Escola teve como propósito deixar claro que no lugar da renda era a educação que faria a inclusão, a bolsa era um salário à mãe para que seus filhos não faltassem às aulas.

A Renda Mínima parte do conceito de que a pobreza pode ser atendida pelo aporte de dinheiro à família para ela comprar o que precisa no mercado. Distribui uma pequena renda, sem distribuir patrimônio. A Renda Vinculada parte do conceito de que a pobreza decorre da falta de acesso a uma cesta essencial, composta por, no mínimo: comida; endereço com água potável, coleta de lixo e esgoto; educação de base com qualidade; atendimento ambulatorial e hospitalar; transporte público.

Vera Magalhães - Sapo na festa do céu

- O Estado de S.Paulo

Enquanto esquerda discute quem pode integrar frente, Bolsonaro lhe rouba a agenda

A discussão em torno da formação de uma frente, que se pretendia “ampla”, em defesa da democracia e dos direitos e em reação às investidas de Jair Bolsonaro contra esses dois pilares empacou em critérios tão adultos e democráticos como birra, picuinha, ciúme, ressentimento e cálculo eleitoral para 2022.

Enquanto entidades, políticos e partidos do espectro que vai da centro-direita à esquerda discutem quem pode integrar a frente, tirando dela qualquer amplitude, Jair Bolsonaro vai, na surdina, lhes roubando a principal agenda: a discussão da renda básica universal.

Mais esse erro crasso dos que se opõem a Bolsonaro me remeteu à fábula da festa no céu. Poderiam participar todos os animais voadores. Mas o sapo deu um jeito de burlar as restrições e entrar no céu escondido na viola do urubu.

O sapo é Bolsonaro. Assiste subitamente calado aos desdobramentos do caso Fabrício Queiroz, sabendo que pode se complicar feio por aí, enquanto vai, por meio do auxílio emergencial, entrando no baile da esquerda, que se perde na distração de discutir quem pode ou não fazer parte da tal frente.

Sergio Fausto* - Trump e Bolsonaro, não há mal que sempre dure

- O Estado de S.Paulo

A maré montante de líderes direitistas de índole antidemocrática parece retroceder

Após 155 anos da aprovação da emenda constitucional que pôs fim à escravidão e 56 anos depois da entrada em vigor do Civil Rights Act, que tornou inconstitucional a segregação racial e quaisquer outras formas de discriminação nos Estados Unidos, milhões de norte-americanos foram às ruas para protestar contra a sistemática prática policial de violência contra os cidadãos negros daquele país.

“The arch of History is long, but it bends towards justice”, dizia Martin Luther King. O longo arco da História americana curvou-se em direção à justiça sempre que negros e brancos se juntaram para fazer valer a mais importante passagem do documento que em 1776 fundou a nação. “Todos os homens são criados iguais e com direitos inalienáveis à vida, à liberdade e à busca da felicidade”, se lê na Declaração de Independência. Em dois séculos e meio, a História americana alternou períodos de conformismo com momentos em que uma maioria social e política se formou para encurtar a distância entre o ideal proclamado e a realidade vivida. Vivemos uma dessas conjunturas críticas.

O assassinato de George Floyd por um policial da cidade de Minneapolis pode vir a ser o gatilho de um realinhamento de forças sociais e políticas de longa duração nos Estados Unidos, com efeitos para além das fronteiras do país. As manifestações que se seguiram não apenas reduzem ainda mais as chances de reeleição de Donald Trump, já abaladas pela avaliação negativa do seu desempenho diante da pandemia, como também dão impulso a tendências que podem levar a uma derrota histórica do Partido Republicano em novembro deste ano.

O partido de Abraham Lincoln foi colonizado ao longo das últimas décadas pelo fundamentalismo religioso, pela xenofobia e pelo racismo (não dito, mas praticado, como transparece nas diversas medidas aprovadas em Estados dominados pelo partido para dificultar o exercício do voto por negros e latinos). O Grand Old Party, quem diria, terminou sequestrado por um político sem ideais ou escrúpulos, como Donald Trump.

Merval Pereira - Centenário de Castelinho

- O Globo

Frio, pragmático, Castelinho sabia lidar com as autoridades de Brasília sem perder de vista sua condição de repórter

Esta semana comemora-se o centenário de nascimento de Carlos Castello Branco, o maior jornalista político de sua geração, que marcou com suas colunas a história recente da política brasileira, especialmente nos momentos mais difíceis da ditadura militar, quando foi preso e censurado devido a seu trabalho em favor da redemocratização, no que escrevia e também na ação nos bastidores.

Eleito para a Academia Brasileira de Letras, foi recebido por outro acadêmico, o ex-presidente José Sarney, seu amigo da vida inteira, que classificou Castelinho, como era carinhosamente chamado, como um político que usou o jornalismo como sua tribuna.

Conheci Castelinho quando morei em Brasília, a partir de 1974, e tive com ele um convívio agradável e, sobretudo, proveitoso, pois gostava de contar histórias dos bastidores políticos, atuais e antigas, de quando a Capital era no Rio de Janeiro.

A Academia Brasileira de Letras está publicando em seu site depoimentos de vários acadêmicos sobre sua vida e obra. Eu leio texto que redigi sobre ele para o livro “Brasileiros”, da Nova Fronteira, recém lançado nesses tempos de pandemia para celebrar brasileiros que se destacaram em suas atividades, e nos dão motivos de orgulho. Seguem trechos:

Eliane Catanhêde – ‘Caráter inusitado’

- O Estado de S.Paulo

PGR em chamas, MP, PF, Receita e ex-Coaf são peças do quebra-cabeças lançado por Moro

A Procuradoria-Geral da República está em chamas e a força-tarefa da Lava Jato reclama do “caráter inusitado” da ação da subprocuradora geral Lindôra Araújo, braço direito de Augusto Aras e ligada à família Bolsonaro, que desembarcou em Curitiba exigindo arquivos e dados sigilosos das investigações e criando a impressão de uma devassa na Lava Jato que pode atingir até o ex-ministro e ex-juiz Sérgio Moro. Esse, porém, é apenas mais um fato “inusitado” num país com quase 60 mil mortos de covid-19.

A audácia de Lindôra corresponde à sucessão de mentiras ridículas do advogado Frederick Wassef, capaz de inventar até “forças ocultas” que queriam matar Fabrício Queiroz para atingir o presidente Jair Bolsonaro. E lembra o pedido inusual da delegada da PF Denisse Ribeiro para o Supremo suspender as investigações sobre bolsonaristas golpistas e, assim, evitar “risco desnecessário para a estabilidade das instituições”. Tudo muito inusitado.

O mais grave, porém, é que a ida da procuradora a Curitiba ocorre quando o presidente Jair Bolsonaro é investigado pelo Supremo justamente pela acusação, feita por Moro, de intervir politicamente na Polícia Federal. E tudo num contexto maior de controle dos órgãos de investigação do País, não só para proteger filhos e amigos, como admite o presidente, mas também para perseguir adversários, como suspeitam governadores, ministros do STF, cúpula do Congresso e o próprio Moro. Ou seja, os alvos.

Luiz Carlos Azedo - Aras versus Moro

-Nas entrelinhas | Correio Braziliense / Estado de Minas

“A base de dados da força-tarefa de Curitiba guarda informações obtidas por escutas telefônicas, apreensão de documentos, celulares e computadores”

Tudo indica que o procurador-geral da República, Augusto Aras, decidiu mesmo domar a Operação Lava-Jato, neutralizando completamente o que ainda resta de influência junto ao Ministério Público do ex-ministro da Justiça Sergio Moro — idealizador e líder da operação, quando juiz titular da 13ª Vara Federal de Curitiba. Nos bastidores, Aras vem repetindo a interlocutores que sua principal missão à frente da Procuradoria-Geral da República (PGR) é “despolitizar” o órgão. Na avaliação dele, a PGR vinha sendo palco de disputas políticas entre grupos internos. Indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para o cargo, fora da lista tríplice eleita pelos procuradores, parece ter sido esse o grande pacto firmado entre ambos.

O problema é que a Lava-Jato é uma linha de força do processo político brasileiro, uma espécie de fronteira entre a ética e a política, que deveriam andar de mãos dadas, mas não é bem assim que acontece. Mesmo que os procuradores da Lava-Jato percam o protagonismo nas investigações, permanecerão tendo enorme influência no comportamento da opinião pública e no processo eleitoral. Quando nada porque já promoveram um notável expurgo na vida política brasileira, ao conseguir a aprovação da Lei da Ficha Limpa e denunciar boa parte da atual elite política do país. É ilusão imaginar que Moro e seus aliados serão carta fora do baralho nas eleições de 2022. Eles já têm até um partido pronto para oferecer uma alternativa: o Podemos, do senador Álvaro Dias (PR).

Por isso mesmo, é bom prestar atenção na queda de braço entre a subprocuradora da República Lindora Maria de Araújo, atual responsável pela condução da Lava-Jato na PGR, e a força-tarefa de Curitiba. Na sexta-feira, os procuradores Hebert Reis Mesquita, Victor Riccely Lins Santos e Luana Macedo Vargas pediram exoneração das funções, permanecendo no grupo que trabalha com Lindora apenas Alessandro José Fernandes de Oliveira e Leonardo Sampaio de Almeida. Antes, a procuradora Maria Clara Noleto, também por divergências, já havia chutado o balde. A crise foi provocada por uma visita de Lindora Araujo à força-tarefa de Curitiba, na quarta e na quinta-feiras, que gerou, inclusive, uma reclamação desses procuradores junto à Corregedoria Nacional do Ministério Público Federal, “como medida de cautela” e “para prevenir responsabilidades”.

Míriam Leitão - No futuro, não acreditaremos

- O Globo

Parece ficção: o país enfrenta um vírus fatal enquanto o governo se preocupa com armas e pontos na carteira de motorista

Se nos disserem daqui a algum tempo que no dia em que o Brasil contava 52 mil mortos por um vírus violento a prioridade do governo era proteger infratores do trânsito, nós tomaremos um susto. Somos testemunhas do inacreditável. Na última terça-feira, o governo mobilizou sua base parlamentar, agora engordada com o centrão, para aprovar a sua menina dos olhos: os motoristas terão mais chance de cometer infrações de trânsito, antes de chegar ao ponto de perder a habilitação. No dia seguinte, o secretário de Vigilância Sanitária, usou 184 palavras para comunicar uma notícia curta e dura: que a curva dos infectados e mortos ainda cresce no Brasil.

Naquela mesma quarta-feira, em que morreram 1.103 brasileiros pela covid-19, o presidente e seu filho e divulgador, conhecido pela alcunha de Carluxo, foram à Polícia Federal. Aquela que está investigando o presidente da suspeita de intervir nela mesma. Ao lado de um receptivo diretor-geral Rolando de Souza, o presidente se exibiu dando tiros com várias armas, o que pode ser conferido no vídeo postado nesse jornal pela competente Bela Megale. Quem olhar no futuro essa cena, e for informado do contexto do país naquele dia, se perguntará: que presidente é este? Teremos dificuldade de explicar.

No tempo de hoje vamos vivendo o insólito. Um ex-ministro da Educação, investigado por racismo e por ameaça às instituições democráticas, foi indicado para diretor executivo do Banco Mundial. A instituição passou os últimos anos atualizando seus valores para fugir exatamente do que o ministro leva na bagagem das suas convicções.

Bernardo Mello Franco - O vírus da cartolagem

- O Globo

A pandemia adiou a Olimpíada de Tóquio e cancelou o torneio de Wimbledon, mas os cartolas do futebol não podem esperar um pouco mais pelo retorno do carioca

Entre 40 milhões de rubro-negros, só um podia dizer que conquistou a América duas vezes. Jorge Luiz Domingos integrou a comissão técnica do Flamengo nas Libertadores de 1981 e 2019. Foi massagista das duas gerações mais vitoriosas do clube, onde trabalhou por quase quatro décadas.

Jorginho morreu no início de maio, vítima da Covid. A tragédia comoveu os atletas, mas não interrompeu a cruzada dos cartolas contra a quarentena. Duas semanas depois, o Flamengo atropelou decretos do estado e da prefeitura e retomou a rotina no Ninho do Urubu. No dia do treino clandestino, o presidente Rodolfo Landim voou para Brasília e almoçou com Jair Bolsonaro.

O repasto uniu dois negacionistas que ignoram ou fingem ignorar a gravidade da pandemia. Eleitos no fim de 2018, Landim e Bolsonaro forjaram uma aliança de interesses. A tabelinha colou a imagem do Flamengo, que já teve nove jogadores infectados, à extrema direita no poder. Uma mistura entre bola e política que ofende torcedores e desonra as tradições do clube.

Dorrit Harazim - Sobras de guerra

- O Globo

Mortandade tão vasta e tão abstrata dificulta o luto individual, exceto quando ele nos atinge de perto

Não é de hoje que números redondos são ferramentas infalíveis para atrair leitores, concentrar homenagens, turbinar emoções. Não fosse a pandemia que imobiliza este 2020 fantasmagórico, o 250º aniversário do nascimento de Beethoven e os festejos pelos 75 anos do final da Segunda Guerra na Europa seriam mais tonitruantes. Basta comparar com o passado recente: em 2019 o mundo se entregou a comemorações voluptuosas pelos 50 anos de Woodstock, os 30 anos da Queda do Muro de Berlim, e tantos outros marcos históricos.

Em tempos de coronavírus, números redondos também são ferramenta de primeira linha, só que às avessas — eles nos arrancam do torpor de um amanhã incerto. Sabidamente o medo que mais imobiliza o ser humano é o medo de ver o que está à sua frente. Isso inclui o presidente da República. Para Jair Bolsonaro, cada novo número-choque da pandemia no Brasil tem impacto dobrado, pois atesta sua falha histórica como governante da nação em tempos turvos.

Na linha desse tempo pandêmico o mundo mal teve tempo de atravessar o choque do primeiro milhão de infectados. No momento rumamos para 10 milhões mundo afora, e logo mais a régua terá de ser levantada. Na manhã da última sexta-feira dados apontavam para 55.304 mortos no Brasil. Portanto nova barreira redonda derrubada, com a anterior (50 mil) já esquecida.

Como nossas mentes dificilmente registram o número por inteiro, é mais provável que em conversas de quarentenados tenhamos arredondado para 55 mil. Em textos jornalísticos ou legendas noticiosas, o número completo acaba encurtado para “mais de 55 mil”. Ou, “55,3 mil”. Acabam ficando de fora do nosso imaginário as chamadas “sobras da guerra” — no caso, os 4 últimos dessas 55.304 vidas perdidas para a Covid. É natural: quem pensa nos centavos diante de um cheque de 10 mil reais, certo?

Elio Gaspari - Decotelli poderá explicar o edital do FNDE

- Folha de S. Paulo / O Globo

Empossado, ministro poderá acabar com o silêncio oficial, desvendando o mistério

Como ministro da Educação o doutor (?) Carlos Alberto Decotelli poderá contar como foi concebido o edital 13/2019, que licitava a compra de 1,3 milhão de computadores, laptops e notebooks para a rede pública de ensino, coisa de R$ 3 bilhões. Afinal, ele presidia o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação no dia 21 de agosto de 2019, quando o edital foi publicado.

Tratava-se de um imenso e silencioso jabuti. O próprio FNDE havia anunciado no dia 8 de agosto que Decotelli deixaria o cargo. Ele saiu semanas depois, e o novo presidente suspendeu o edital.

A Controladoria-Geral da União havia estudado o jabuti e descobriu o seguinte:

Armava-se uma despesa de R$ 3 bilhões sem que o Ministério da Economia tivesse sido ouvido.

Trezentos e cinquenta e cinco colégios receberiam mais de um laptop por aluno. A Escola Municipal Laura de Queiroz, de Minas Gerais, receberia 30.030 laptops para seus 255 estudantes. Na Chiquita Mendes, de Santa Bárbara do Tugúrio (MG), cada aluno ganharia cinco laptops.

Duas das empresas que encaminharam orçamentos ao FNDE mandaram cartas com o mesmo erro de português: “Sem mais, para o momento, colocamo-nos à disposição para quaisquer esclarecimentos que se façam necessária”. Noutra coincidência, as duas empresas pertenciam à mesma família.

A CGU interpelou o FNDE e recebeu respostas pífias, até que em novembro ela emitiu um relatório de 66 páginas. Como o jabuti andava sem fazer barulho, o caso ficou no escurinho da burocracia e o edital foi cancelado. Em dezembro o repórter Aguirre Talento expôs o caso. Seria natural que viesse alguma explicação do governo. Passaram-se sete meses e nada. Abraham Weintraub, aquele que propôs botar os “vagabundos” do Supremo Tribunal na cadeia, trocou mais três vezes o presidente do FNDE, mas nunca tocou no assunto.

Janio de Freitas - Um mundo de coisas acintosas

- Folha de S. Paulo

A recente decisão da Justiça sobre Flávio Bolsonaro merece uma investigação

A mais recente decisão da Justiça sobre Flávio Bolsonaro, favorecendo-o contra a investigação que mais abala seu pai, merece ela mesma uma investigação. Nada acontece por acaso nesse inquérito sobre anos e anos de apropriação de salários no gabinete de Flávio quando deputado estadual.

Em torno desse tema, emergem interações com milícias, exóticos negócios imobiliários e outros indícios. Todos do tipo que, nas ocorrências de combinação entre submundo e política, em geral são causa de ameaças, chantagens e subornos.

Os desembargadores Mônica Oliveira e Paulo Rangel têm comprovado conhecimento do acórdão do Supremo contra o qual votaram para transferir o inquérito, do juiz de primeira instância ao Órgão Especial do Tribunal de Justiça-RJ. Como desejado por Flávio. E com possível anulação de tudo até agora apurado por decisões do juiz Flávio Itabaiana, como movimentações financeiras anormais e a reveladora prisão de Fabrício Queiroz.

Em tentativa anterior da defesa de Flávio, Mônica Oliveira negou a transferência do caso. Como fixado pelo Supremo para o investigado que deixou a função privilegiada com instância especial. Hoje senador, Flávio não pode ter os privilégios dos deputados estaduais. Paulo Rangel deixou em livro seu apoio à norma contra a qual votou agora. Contradições tão acintosas, em oposição também à relatora Suimei Cavalieri (Flávio foi favorecido por dois votos a um), precisam de mais do que recurso ao Supremo para repor o respeito à norma, lá mesmo decidida e já aplicada.

Hélio Schwartsman - O segredo da democracia

- Folha de S. Paulo

Não faltam teorias românticas, quase religiosas, para justificar esse regime político

Por que a democracia é boa para nós? Não faltam teorias românticas, quase religiosas, para justificar esse regime político, que se consolidou nos países mais avançados a partir do século 20.

Uma delas, de forte apelo popular, diz que a democracia faz sua mágica ao promover escolhas conscientes por parte dos cidadãos. Quanto mais instruída for a população, melhores decisões ela tomará. Outra, mais comum nos meios acadêmicos, sustenta que a democracia funciona porque permite que os governantes sejam recompensados (reeleitos) ou punidos (postos para fora) de acordo com seu desempenho.

É bobagem, e há um bom número de obras de divulgação de que já tratei aqui, como “The Myth of the Rational Voter”, “Democracy for Realists”, “Democracy Despite Itself?” e vários títulos de Adam Przeworski, que desmontam, até com algum humor, essas e outras teorias. Mas, se não é isso, perguntar-se-á o leitor, o que é então.

Ricardo Noblat - Você perdeu, Bolsonaro! Apoio à democracia bate recorde

- Blog do Noblat – Veja

País dividido quanto ao risco de uma nova ditadura
Em dezembro passado, pesquisa nacional do Datafolha conferiu que 62% dos brasileiros apoiavam a democracia e 12% uma ditadura. O apoio à democracia aumentou para 75%, de acordo com nova pesquisa aplicada por telefone junto a 2.016 pessoas nos últimos dias 23 e 24. E o apoio a uma ditadura caiu para 10%.

O que aconteceu de relevante no país entre dezembro e agora para que o apoio à democracia tenha batido seu recorde desde quando o Datafolha começou a medi-lo em 1989? Naquele ano, pela primeira vez, os brasileiros foram às urnas eleger o presidente da República depois de 21 anos de ditadura militar.

Os últimos seis meses foram os mais tensos do ponto de vista político por obra e graça do presidente Jair Bolsonaro. Ele afrontou o Congresso e o Supremo Tribunal Federal, testou os limites da democracia e compareceu a manifestações de rua em Brasília onde seus seguidores pediram uma intervenção militar.

Elio Gaspari - Foi fácil entrar na ditadura, difícil foi sair

- Folha de S. Paulo

Estabilidade se deveu à primeira conciliação nacional partida da oposição, graças à genialidade de Tancredo

O primeiro general entrou no Palácio do Planalto em 1964 e o último (o quinto) saiu por uma porta lateral em 1985.

Contada assim, a ditadura durou 21 anos, mas ela se diferenciou de outras latinoamericanas, comunistas, africanas e até mesmo de algumas europeias.

Sua maior singularidade esteve na rotação da Presidência. Enquanto pelo mundo afora os ditadores só deixavam o poder mortos ou depostos, no Brasil todos tiveram mandatos. O regime intitulava-se “revolução”.

Disso resultou que o governo do marechal Castello Branco (1964-1967) pouco se parece com o de Arthur da Costa e Silva (1967-1969).

A Presidência de Emílio Garrastazu Médici (1969-1974) pouco teve a ver com a de Ernesto Geisel (1974-1979). Foi Médici quem escolheu Geisel para sucedê-lo e anos depois diria que, “se arrependimento matasse, eu já teria morrido”.

Nenhum dos quatro se pareceu com João Baptista Figueiredo (1979-1985). Quando ele saiu pela porta lateral do Palácio, estava afastado de Geisel, o país estava quebrado, o regime havia perdido a credibilidade.

A estabilidade política foi salva pela primeira conciliação nacional partida da oposição, graças à genialidade de Tancredo Neves. (Ele viria a ser eleito indiretamente, mas morreu sem tomar posse.)

As duas décadas de ditadura produziram progresso e pleno emprego, bancarrota e recessão, ordem pública, censura e torturas, moralidade e corrupção (numa escala centesimal).

O coronel-deputado Costa Cavalcanti, que construiu a hidrelétrica de Itaipu, morreu com patrimônio irrelevante.

Até hoje, as viúvas da ditadura fingem que as ruínas não aconteceram, e seus adversários relutam em admitir que algumas coisas deram certo.

Fulanizando: o general Augusto Heleno disse em 2018 que “a Colômbia ficou 50 anos em guerra civil porque não fizeram o que fizemos no Araguaia.”

Igor Gielow - Ditadura formou geração de militares que hoje povoam governo Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

Uma das bases de sustentação do atual governo, fardados trazem do regime autoritário a mentalidade de que as Forças Armadas são importantes para a união nacional

A ascensão do capitão reformado do Exército Jair Bolsonaro ao poder fez brilhar os olhos de uma geração de oficiais-generais brasileiros.

Após 33 anos fora do núcleo decisório do país, os fardados enxergaram uma oportunidade de redenção.

Em aproximação mediada por generais da reserva que haviam encampado a candidatura, houve, depois do primeiro turno, a bênção do Alto-Comando do Exército, principal órgão da estrutura militar brasileira, a Bolsonaro.

O resultado, passado um ano e meio de governo de fato, é a maior crise existencial recente das Forças Armadas.

“Há uma confusão institucional. Chama a atenção o grande número de militares no governo”, diz o primeiro general da reserva que deixou o primeiro escalão, Carlos Alberto dos Santos Cruz (ex-Secretaria de Governo).

Em uma “live” do Instituto Brasiliense de Direito Público no sábado (20), ele classificou de desequilibrado o papel dos militares na política. “Há excesso. Isso começa a deteriorar o comportamento.”

Hoje, 10 dos 23 ministros do governo vieram da caserna, incluindo aí o interino da Saúde, general Eduardo Pazuello. A exemplo do sucessor de Santos Cruz, Luiz Eduardo Ramos, Pazuello é da ativa. “Para ir ao governo, todo mundo tem de passar para a reserva”, afirma o ex-ministro.

Ramos prometeu adiantar sua saída do serviço ativo. Mais próximo militar, historicamente, de Bolsonaro, ele personifica um conflito que remonta ao regime de 1964.

A ditadura foi a última de uma série de intervenções militares desde a proclamação da República, em 1889, um clássico golpe fardado.

A República Velha terminou em 1930 com outro golpe. Os anos de 1945, com o fim do Estado Novo, e 1954, marcado pelo suicídio de Getúlio Vargas, também veriam ações decisivas de alteração do poder civil pelas mãos militares.

Rolf Kuntz * - A doutrina do esgoto e a reputação do Brasil

- O Estado de S.Paulo

Bolsonaro dificulta combate ao vírus, ameaça o ambiente e assusta investidor

Brasileiro pula no esgoto, sai, mergulha e nada acontece com ele, disse o presidente Jair Bolsonaro em 26 de março, minimizando a pandemia e criticando a quarentena. Até aquele dia 77 pessoas haviam morrido de covid-19 e 2.915 casos de infecção tinham sido confirmados, segundo o balanço federal. Não se sabe quantos brasileiros se banharam no esgoto a partir daí nem quantos tomaram a cloroquina receitada por sua excelência. Mas três meses depois 55.102 haviam morrido e os casos acumulados eram 1,23 milhão, informou a imprensa na manhã da última sexta-feira.

Esses números são de secretarias estaduais. Um consórcio jornalístico passou a consultar essas fontes quando o governo central, depois de perder dois ministros da Saúde em menos de um mês, limitou a comunicação sobre casos e mortes.

A piora das expectativas econômicas acompanhou a expansão do contágio e a multiplicação das mortes. Ao atualizar suas projeções, o Fundo Monetário Internacional (FMI) passou de 5,3% para 9,1% a contração estimada para o produto interno bruto (PIB) do Brasil neste ano. O primeiro número foi divulgado no começo de abril, quando o País, assim como outros da região, registrava o impacto inicial da covid-19. A nova estimativa foi anunciada na última quarta-feira.

O alongamento da pandemia e da incerteza sobre sua evolução foi levado em conta na revisão das projeções para 2020 e 2021, disse a economista-chefe do FMI, Gita Gopinath. Esse fator foi relevante no caso brasileiro e nos de outros países, acrescentou. Dados populacionais do Brasil e de outros emergentes, segundo ela, também foram vistos como um desafio adicional no combate ao novo coronavírus.