quarta-feira, 18 de outubro de 2023

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Congresso quer fundo eleitoral sem cabimento

O Globo

Mantida a vontade dos congressistas, o Brasil deverá gastar por eleitor quase o quádruplo do México

Partidos políticos articulam no Congresso um aumento inédito no fundo que financiará a campanha municipal no ano que vem. O valor cogitado está entre R$ 5 bilhões e R$ 6 bilhões, retirando recursos da Justiça Eleitoral ou das emendas de bancada no Orçamento. Nem a manobra para mudar o destino da verba, nem o valor aventado têm o menor cabimento. O bom senso e a experiência internacional mostram que os congressistas deveriam desistir da ideia e entrar num acordo para reduzir o fundo eleitoral dos R$ 4,9 bilhões gastos em 2022 para algo como R$ 2,5 bilhões (gasto em 2020, ano da última eleição municipal, corrigido pela inflação).

Bernardo Mello Franco – O dia que não terminou

O Globo

Relatora elogia Forças Armadas e propõe medidas inócuas, como incentivar "educação midiática" e criar Dia Nacional de Defesa da Democracia

O relatório final da CPI do Golpe pediu o indiciamento de Jair Bolsonaro pela prática de quatro crimes. O ex-presidente foi acusado de chefiar um complô contra a democracia. Derrotado nas urnas, tentou rasgar a Constituição e virar a mesa para se perpetuar no poder.

O texto da senadora Eliziane Gama lembra que o capitão atacou as instituições desde o primeiro dia de governo. Seu projeto sempre foi autoritário. Não tolerava a existência de Judiciário livre, oposição ativa ou imprensa independente.

Em busca do poder absoluto, Bolsonaro fomentou o ódio e a radicalização política. A aposta culminou na intentona de 8 de janeiro, que empurrou o país até a beira do precipício.

O relatório mostra que os atos golpistas não foram espontâneos nem desorganizados, como sustentava o ex-presidente. “Foi uma mobilização idealizada, planejada e preparada com antecedência”, anotou Eliziane. A senadora enumerou provas de que houve método nos ataques. Os extremistas se deslocaram em caravanas, receberam apoio logístico, sabiam o que estavam fazendo.

Luiz Carlos Azedo - A derrota dos “cavaleiros húngaros” na CPMI do 8/1

Correio Braziliense

O grupo de generais em vias de serem indiciados estava fadado ao fracasso porque o mundo mudou e a democracia brasileira tem instituições mais fortes do que imaginavam

A CPMI se reúne hoje, novamente, para apreciar o relatório da senadora Eliziane Gama (PSD-MA), que pediu o indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de mais 60 pessoas por tentativa de golpe de estado, em 8 de janeiro deste ano, quando foram invadidos e vandalizados os palácios do Executivo, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal. Oito generais e um almirante, entre 22 militares de diversas patentes, e mais oficiais do alto escalão da Polícia Militar do Distrito Federal, policiais federais e rodoviários, empresários, um influenciador e a deputada Carla Zambelli (PL-SP) poderão ser indiciados.

Os deputados e senadores de oposição apresentaram um relatório alternativo, no qual culpam o governo Lula pelos acontecimentos e pedem o indiciamento do ministro da Justiça, Flávio Dino; do general Gonçalves Dias, então o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); do ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Saulo Moura Cunha; e do ex-subcomandante da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF), coronel Klepter Rosa Barbosa. O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) também pretende apresentar um relatório paralelo, que acusa o governo Lula de omissão diante das falhas no sistema de segurança encarregado de guarnecer externamente os Três Poderes.

Vera Rosa - Alcolumbre arma cama de gato para Lula

O Estado de S. Paulo

Pressão no Senado envolve disputa com Lira e atinge até vagas no Cade e em agências reguladoras

Com o fim da CPI do 8 de Janeiro, palco de discussões que deixaram evidente a tentativa de golpe no País, a cúpula do Senado retomará a ofensiva para limitar os poderes do Supremo Tribunal Federal (STF). Mas a pressão não para aí: o plano é segurar até o limite as indicações feitas pelo presidente Lula e criar dificuldades em votações de interesse do Palácio do Planalto.

Por trás da estratégia levada a cabo pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), está o comandante da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Davi Alcolumbre (União Brasil), expoente do Centrão.

Em campanha antecipada para a presidência do Senado e desconfiado de que o Planalto quer rifá-lo, Alcolumbre age nos bastidores. Tenta emplacar no STF o presidente do Tribunal de Contas da União, Bruno Dantas, e o subprocurador Paulo Gonet na Procuradoria-Geral da República. Além disso, quer controlar mais emendas e nomear aliados em agências reguladoras.

Elio Gaspari - O golpe do juiz plantonista

O Globo

O magistrado soltou o Dadá do 'Bonde do Maluco' e foi afastado

Com um voto cirúrgico do corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, por unanimidade, o CNJ afastou de suas funções o desembargador baiano Luiz Fernando Lima. No dia 30 de setembro passado, ele determinou a transferência do bandido Dadá para um regime de prisão domiciliar.

Dadá não era um bandido qualquer, e o afastamento do desembargador baiano torna-se um exemplo de rapidez e rigor. O CNJ feriu o velho golpe do recurso ao juiz plantonista, praticado há décadas em todas as instâncias do Judiciário. Ele funciona assim: espera-se o fim de semana (ou o recesso), leva-se o pedido ao sensível magistrado que assumiu o plantão e, bingo, resolve-se o problema.

Zeina Latif - Aproximar para integrar

O Globo

Haveria possivelmente menor diferença nas taxas de desemprego caso houvesse maior fluxo migratório interno, com os indivíduos conseguindo mudar e se integrar facilmente à região da nova moradia

Confrontos sociais explícitos não são a marca de nossa sociedade. No entanto, pecamos no quesito coesão social. Pouco sabemos sobre a cultura e os costumes das diferentes partes do país. E o desconhecimento alimenta o preconceito. Já o abismo social é um capítulo à parte.

Vale recordar a História. O Brasil só conseguiu se firmar como nação — no sentido de contar com um grau de identidade nacional que permitisse a existência e a estabilidade do poder estatal — na década de 1930, e sob mão forte de uma ditadura. No Império e na Primeira República, houve vários movimentos regionais separatistas e de contestação do poder central, reprimidos com violência. Nesta jovem nação, a coesão social ainda está em construção.

Fernando Exman - Um maior cuidado com as fronteiras brasileiras

Valor Econômico

Governo Lula quer ampliar “faixa de fronteira” dos atuais 150 quilômetros para 25 quilômetros

Antes, muito antes da guerra desencadeada pelos ataques terroristas do Hamas contra Israel, o governo Lula já queria acelerar a edição de uma medida para aumentar a presença do Estado na chamada “faixa de fronteira”. Sobre a mesa, está a ideia de alargá-la dos atuais 150 para 250 quilômetros.

Considera-se, no governo, uma iniciativa estratégica para a defesa da soberania nacional. Perfeito. Contudo, ela precisa ser bem debatida com os setores econômicos que atuam nessas localidades: o agronegócio é um interessado direto.

Cristovam Buarque* - Dear Mr. Biden

Correio Braziliense

Estarrecido, porque sua biografia e sua eleição permitiam esperança de uma política mais humanista em relação à população que busca sobrevivência no desespero para sair da pobreza

O mundo assistiu estarrecido, sem surpresa e com espanto, sua decisão de concluir a construção do muro que seu antecessor começou na fronteira entre os Estados Unidos e os demais países americanos.

Estarrecido, porque sua biografia e sua eleição permitiam esperança de uma política mais humanista em relação à população que busca sobrevivência no desespero para sair da pobreza.

Sem surpresa, porque mesmo que faça sentido a hipótese de que a riqueza no chamado Norte Global decorre do escravismo, do colonialismo e do imperialismo, sabe-se que na Europa e na América do Norte não cabem todos os pobres do mundo. Também que essa riqueza vem de prioridade à educação de base, respeito às liberdades, promoção do desenvolvimento científico e tecnológico, da responsabilidade fiscal. Ainda mais, que a pobreza no Sul Global decorre sobretudo da exploração interna dos ricos sobre os pobres, da negação de educação, da irresponsabilidade fiscal, da corrupção e da insensibilidade dos que aceitam viver na riqueza ao lado da pobreza. No Brasil, construímos nossos mediterrâneos e muros cercando as casas, escolas, hospitais e supermercados para que os pobres não tomem o espaço social que os ricos consideram direito.

Guilherme Casarões* - Urgência de uma solução global

O Globo

Só ação concertada da comunidade internacional poderá sustar as agressões e criar condições para uma Palestina soberana

Na última quarta-feira (11), em meio a cenas de absoluto horror em Israel e Gaza, o presidente brasileiro publicou uma nota pessoal sobre o conflito no Oriente Médio. Nela, Lula faz um apelo em defesa das crianças palestinas e israelenses, pede o cessar-fogo na região e destaca a urgência de uma “intervenção humanitária internacional” diante da escalada de violência.

O Brasil ocupa lugar privilegiado nessa discussão. Tem histórico de boas relações com Israel e Palestina, faz comércio com ambos e sempre trabalhou pela superação do conflito no âmbito da ONU. Neste momento, ocupa a presidência do Conselho de Segurança e tem o poder de pautar a agenda do órgão.

As próximas reuniões darão o tom da resposta internacional à guerra em andamento. Mas o consenso é difícil, até mesmo para criar um corredor humanitário que possa assegurar a saída dos palestinos pela fronteira egípcia. No momento, 1 milhão de palestinos ruma ao sul fugindo dos bombardeios israelenses — e o número de mortos em Gaza só aumenta.

Biden visita Israel um dia após explosão em hospital de Gaza

Por Associated Press — Tel Aviv / Valor Econômico

Presidente americano estava programado para visitar a Jordânia após Israel, mas suas reuniões com líderes árabes foram canceladas após a explosão

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, iniciou a sua visita a Israel nesta quarta-feira com a promessa de mostrar ao mundo que os Estados Unidos são solidários com o povo judeu, um dia após a explosão em um hospital na Faixa de Gaza, que deixou centenas de mortos. Segundo o dirigente americano, a ocorrência parece ser obra “da outra equipe” e não do exército israelense.

“Com base no que vi, parece que foi trabalho da outra equipe, não de vocês”, disse Biden ao primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, durante uma reunião, em referência a militantes israelenses. No entanto, Biden disse que havia “muita gente” que não estava certa de quem causou a explosão.

Bruno Boghossian - CPI apontou para o alto, mas ficou sem apetite para ir mais fundo

Folha de S. Paulo

Acordo restringiu produção de fatos novos, e relatório se contentou com dados da PF e provas produzidas à luz do dia

CPI do 8 de janeiro deu nome aos bois que conseguiu encontrar. O relatório da senadora Eliziane Gama destaca a liderança de Jair Bolsonaro na disseminação do golpismo e recomenda o indiciamento de mais 60 pessoas entre militares, políticos e personagens da máquina do governo. A comissão poderia ter ido mais fundo, mas escolheu pisar em ovos.

O documento elenca os pontos que sustentam uma acusação direta contra Bolsonaro, auxiliares e integrantes das Forças Armadas. O relato mostra como o ex-presidente subsidiou os golpistas, toca em pontos como a politização das polícias e expõe a simpatia de oficiais graduados por uma intervenção militar.

Wilson Gomes* - Por que o debate sobre Israel-Palestina está tão inflamado no Brasil

Folha de S. Paulo

Neste conflito, os depósitos de racismo antissemita e islamofóbico são um reservatório imenso de símbolos e afetos

Quem estuda o debate público brasileiro não tem paz. A transformação digital do ativismo e da deliberação pública no início da década de 2010, juntamente com o repentino aumento do interesse dos brasileiros na política e na politização de qualquer assunto, principalmente após as mobilizações de 2013, causaram uma mudança significativa na forma como os tópicos de interesse público são discutidos.

Os teóricos da democracia deliberativa louvariam o aumento dos envolvidos na "troca pública de razões" depois de décadas de apatia, desinteresse e cinismo da população com relação a temas políticos.

Contudo, a expressão popular "treta" talvez expresse melhor o que fazemos em público, cara a cara ou em ambientes digitais. Tretamos não para servir ao princípio do melhor argumento, em um processo de esclarecimento recíproco, como sonharia Kant, mas para defender posições já assumidas pelo lado com que nos identificamos e para atacar aquilo que já não gostamos.

Vinicius Torres Freire - Fuga para o Egito pode evitar mais morte em Gaza, mas não é solução

Folha de S. Paulo

EUA e Europa querem que egípcios aceitem o êxodo; assunto será discutido no sábado

O governo do Egito anunciou que vai sediar no sábado (21) uma reunião a fim de pedir um cessar-fogo em Gaza e de dar um jeito de enviar ajuda humanitária aos palestinos. Chamou os poderes da região e os membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU.

Americanos e europeus querem que os egípcios abram a fronteira com Gaza, em primeiro lugar para receber cidadãos de seus países e estrangeiros em geral. Querem também que o Egito receba os palestinos que fogem de bombas e da escassez de víveres.

Não há informação a respeito de como o êxodo para o Egito seria possível, de estimativa de quantas pessoas passariam pela fronteira e sobre quem pagaria a conta inicial da instalação dos refugiados no Sinai (a região egípcia que faz fronteira com Gaza e Israel). Menos ainda há notícia de que há ideia de como lidar com as consequências dessa nova expulsão em massa de palestinos de suas terras.

Hélio Schwartsman - Desumanização recíproca

Folha de S. Paulo

Israelenses e palestinos põem uns aos outros numa posição quase 40% inferior em escala de humanidade

Dizer que israelenses e palestinos não se dão bem é um eufemismo. Seria mais correto afirmar que um lado considera o outro menos do que humano —perto de 40% menos, para os que gostam de precisão.
Sabe-se pelo menos desde a 2ª Guerra que a desumanização é um importante ingrediente psicológico de perseguições, conflitos e genocídios, mas foi só a partir da virada do milênio que cientistas começaram a investigar o fenômeno de forma mais sistemática. Um pesquisador prolífico na área é Nour Kteily, da Northwestern University (EUA).

Kteily e o neurocientista Emile Bruneau, morto precocemente em 2020, se debruçaram sobre as desavenças entre israelenses e palestinos.

Anna Virginia Balloussier - Hamas ampliou influência em uma Palestina que se sente abandonada por Ocidente

Folha de S. Paulo

Ressentimentos acumulados por décadas de guerras e privação de itens básicos catapultaram apoio de civis a grupo terrorista

Hamas nunca escondeu sua meta de aniquilar Israel. Em 1988, o grupo que estuprou, feriu, aterrorizou, sequestrou e matou centenas de pessoas nos ataques em solo israelense de 7 de outubro divulgou uma carta abertamente antissemita e avessa a acordos de paz.

Diz um de seus 36 artigos que "o Dia do Juízo não acontecerá até que os muçulmanos lutem contra os judeus (matando os judeus)". Outro rechaça "as chamadas soluções pacíficas" como "perda de tempo", pois "não há solução para a questão palestina exceto pela Jihad". O preâmbulo preconiza: "Israel existirá e continuará a existir até que o Islã o destrua, da mesma forma como destruiu outros antes dele".

Esse mesmo Hamas domina o dia a dia dos palestinos. Isso quer dizer que a maioria no território sempre pactuou com os propósitos terroristas do grupo? Não é por aí.

A certeza de que boa parte do mundo ocidental não dá a mínima para seu sofrimento, somada a ressentimentos acumulados pelo cerco imposto a Gaza, catapultou alguma simpatia pelo Hamas, acrônimo árabe para Movimento de Resistência Islâmica.

Dizem palestinos: quase ninguém liga, fora do mundo muçulmano, se as pessoas morrem por doenças banais numa Gaza sitiada, enquanto a poucos quilômetros israelenses recebem o melhor da tecnologia médica. Ou se elas têm acesso limitado a eletricidade e comida.

Isso sem falar no que veem como crimes de guerra que horrorizariam nações ocidentais se cometidos contra os seus. O novo conflito seria um celeiro deles.

Igor Gielow - Ataque a hospital de Gaza coloca pressão sobre Biden e Israel

Folha de S. Paulo

Ação pode ser ponto de inflexão narrativo na retaliação do Estado judeu contra o terror do Hamas

Em 11 de abril de 1996, o governo trabalhista de Israel iniciou a Operação Vinhas da Ira, que visava desarmar o Hizbullah no sul do Líbano. Houve os usuais bombardeios, e a comunidade internacional acompanhava o desenrolar dos fatos apreensiva, mas sem grande mobilização.

Sete dias depois, a artilharia israelense acertou em cheio uma base da Unifil, a missão da ONU que faz figuração no sul do Líbano desde 1978, matando 106 refugiados da vila de Qana que buscavam abrigo ali. O roteiro da guerra mudou.

A partir dali, correspondentes internacionais correram para o Líbano, e governos do Ocidente passaram a se movimentar para evitar a escalada do morticínio. Após mais nove dias, a pressão sobre Israel levou a mais um precário cessar-fogo na região.

Poesia | Sentir é estar distraído - Fernando Pessoa

 

Música | "El Manisero" El Son Pregón mas famoso que se haya compuesto hasta ahora en Cuba.

 

terça-feira, 17 de outubro de 2023

Merval Pereira - Forças Armadas podem atuar no Rio

O Globo

Forças Armadas não subirão morros. Ações combinam inteligência e operação, mas não podem abrir mão de ações sociais

O ministro da Justiça, Flávio Dino, revelou ontem, em debate com entidades de classe e representantes da sociedade civil na sede da Firjan, no Rio, que está em discussão dentro do governo o uso das Forças Armadas no combate ao crime organizado no estado. Ele e o ministro da Defesa, José Mucio, já discutem como operacionalizar a atuação, mas Dino deixou claro que não há ainda decisão, que deverá passar obrigatoriamente pelo presidente Lula. Advertiu que uma coisa é certa: as Forças Armadas não subirão morros.

O ministro Dino citou como exemplo de possível atuação das Forças Armadas a exitosa Operação Ágata, na Amazônia, em que elas atuam em cooperação com Polícia Federal, Ibama, Receita Federal e Abin para combater delitos transfronteiriços e ambientais na fronteira com a Colômbia.

Carlos Andreazza - O Lirão distribui os chocolates

O Globo

O Brasil está parado — não sem que os desafios encorpem — enquanto a República viaja. A República viaja em dólares e euros. Voltará com chocolates suíços. O feriadão se impõe; se impôs. Pediu Bis. Imposto à agenda brasileira, pelos senhores de Brasília, mais um recesso — nem sequer votada a Lei de Diretrizes Orçamentárias. (Longamente expostas à criatividade dos dispêndios ilimitados, as balizas para o Orçamento já decerto acomodaram — é impositivo — novas modalidades para o exercício do orçamento secreto.)

Quase todo mundo (poderoso) pelo mundo, enquanto — conflagrado o mundo — a situação econômica brasileira, sob incertezas, complica-se. Governo que não corta gastos — e cujas despesas aumentarão autorizadas pela regra fiscal — precisaria multiplicar as receitas. Depende do Parlamento, ao mesmo tempo mole e faminto. Ao mesmo tempo indolente (para votar) e apressado (para comerciar as votações). Sempre faminto. A conta não fecha.

Míriam Leitão - Inflação na meta após três anos

O Globo

No início deste ano, poucos acreditavam que a inflação poderia ficar na meta. Agora o mercado já vê isto como realidade

Poucos acreditavam até recentemente que a inflação terminaria o ano na meta, mas ontem a mediana do mercado apostou nisso pela primeira vez em três anos. O economista José Roberto Mendonça de Barros vinha dizendo que esse cenário era possível há algum tempo. Agora a previsão da sua consultoria é a de que o IPCA terminará o ano em 4,71%. Perto do teto, mas dentro do espaço de flutuação permitido pelo regime de metas. Esse resultado se deve em grande parte à queda da inflação de alimentos. Do fim do ano passado até o fim deste ano pode ocorrer uma inversão de 17 pontos na inflação da alimentação no domicílio.

— No ano passado, este item terminou com uma inflação de 13,2%. Nossa projeção agora, junto com a MB Agro, é que chegue a dezembro de 2023 com -3,3%, uma virada de 17pp. Isso aí equivale a um abono salarial para as classes C e D. E é justamente a inflação de alimentos no domicílio que é a mais importante —diz Mendonça de Barros.

Luiz Carlos Azedo - Quando os fatos mudam na atual desordem mundial

Correio Braziliense

"A ação de Israel na retaliação ao ataque terrorista do Hamas ao seu território tem muita semelhança com a bagunça criada pelos Estados Unidos no Oriente Médio após o 11 de setembro, principalmente depois da invasão do Iraque", avalia colunista

Argentina, Egito, Etiópia, Gana, Quênia, Paquistão, Sri Lanka, Tunísia, Ucrânia e Zâmbia estão à beira ou já entraram em inadimplência. Não podem contar com mais ajuda internacional, inclusive a Ucrânia, porque a economia global enfrenta grandes incertezas, em razão de dois fatores, principalmente: o primeiro, de natureza objetiva, as mudanças climáticas; o segundo, de características subjetivas, o fracasso da ideia de um mundo unipolar, sob hegemonia norte-americana, capaz de impor a paz mundial. A crise na Faixa de Gaza e a guerra da Ucrânia são sintomas mórbidos e patológicos desse cenário em mudança, que não se sabe ainda para onde. Com certeza, não é para onde estamos indo, apesar das nossas vãs expectativas de que a revolução tecnológica resolveria os principais problemas civilizatórios.

Mais ou menos como aconteceu com a Liga das Nações, entre a Primeira e a Segunda Grandes Guerras, a decadência dos atuais mecanismos de governança global pode se tornar irreversível. A Organização das Nações Unidas, desde quando os Estados Unidos decidiram assumir o papel de xerife do mundo, passou a ter um papel de segundo plano nos conflitos regionais. Seu Conselho de Segurança se tornou o palco da "nova guerra fria" entre o Ocidente e o Oriente, polarizados pelos Estados Unidos e a União Europeia, de um lado, a China e a Rússia de outro. Conflitos que poderiam ser resolvidos num ambiente de cooperação entre essas potências estão sendo acirrados e saem de controle, como aconteceu na Ucrânia e, agora, se repete na Faixa de Gaza.

Andrea Jubé - Itamaraty fez história com repatriações

Valor Econômico

Desde a Segunda Guerra Mundial, não havia registros de um conflito armado que tenha afetado tantos civis brasileiros

O Ministério das Relações Exteriores havia trazido de volta ao Brasil, até essa segunda-feira, 916 brasileiros e seus familiares que pediram ajuda às autoridades diplomáticas para fugir da guerra no Oriente Médio entre Israel e o Hamas, grupo terrorista que controla a Faixa de Gaza.

Com um quinto voo da Força Aérea Brasileira (FAB) que partirá de Tel Aviv nesta quarta-feira, deverão ser mais de mais de 1,1 mil brasileiros repatriados. Se houver vagas, o Itamaraty poderá trazer, também, cidadãos de nossos vizinhos na América do Sul, como Paraguai e Bolívia, que pediram ajuda ao Brasil.

Em paralelo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva acompanha, pessoalmente, as tratativas para viabilizar a retirada dos cerca de 30 brasileiros, inclusive crianças, da Faixa de Gaza pela fronteira com o Egito. Ocupando a presidência “pro tempore” do Conselho de Segurança das Nações Unidas até o fim do mês, Lula também articula com outras autoridades a criação de um corredor humanitário para a entrada de remédios e alimentos em Gaza, soma de esforços para a libertação dos reféns com o Hamas, e o fortalecimento da Autoridade Palestina. Ele pediu ao presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, que essas posições sejam reafirmadas nesta terça-feira na reunião extraordinária do Conselho Europeu, em Bruxelas.

Gideon Rachman - Apoiar Israel e proteger os palestinos não são políticas contraditórias

Financial Times / Valor Econômico

Compaixão pelas pessoas inocentes que sofrem em todos os lados desse conflito não é apenas a posição moral, é também o único caminho prático a seguir

De que lado você está – dos israelenses ou dos palestinos? Você acha que a política do Ocidente deveria ser apoiar Israel, após o maior massacre de civis israelenses desde a fundação do Estado em 1948? Ou você acha que o governo de Benjamin Netanyahu está cometendo atrocidades em massa em Gaza e que a política do Ocidente deveria exercer a pressão máxima para Israel parar?

Estes são os termos binários em que grande parte da discussão sobre o conflito israel-palestino está sendo conduzida. Mas, ao conversar com autoridades em Washington, Bruxelas e outras capitais europeias, surpreendeu-me o fato de essa não ser a abordagem da maioria dos líderes ocidentais que se envolveram com Israel na última semana. Eles afirmam que a melhor alternativa para evitar uma catástrofe humanitária em Gaza é apoiar Israel.

Isso soa paradoxal – e até mesmo hipócrita. Mas, pensando melhor, entendo a lógica. Muitos civis já morreram em Gaza e há muito mais tragédias por vir. A Organização das Nações Unidas (ONU) está alertando para um desastre iminente.

Mas a melhor chance de amenizar o sofrimento dos civis palestinos é partir da compreensão de que Israel acaba de sofrer uma tragédia sem precedentes e tem o direito e a obrigação de garantir sua própria segurança. Esta é uma política que uma autoridade de alto escalão dos EUA chama de “abraçar com força”. Ele descreve Israel como “traumatizado e assustado”. “Precisamos apresentar isso como uma situação que estamos enfrentando juntos e na qual podemos trabalhar juntos”, diz essa autoridade.

Eliane Cantanhêde - Nem vitória nem derrota

O Estado de S. Paulo

Ao presidir o Conselho de Segurança da ONU, o Brasil é só coordenador, quem manda são as potências

O governo Lula armou uma armadilha para si próprio: colocar-se como o grande articulador de uma solução ao menos humanitária, emergencial, para a guerra em Israel. Se sair uma resolução consensual no Conselho de Segurança da ONU, será um sucesso estrondoso. E se não sair? A oposição está pronta para espalhar aos quatro ventos – e ao mundo – que foi o oposto: um estrondoso fracasso.

A presidência rotativa do Conselho de Segurança, por um único mês, não transforma o Brasil em grande negociador, em “resolvedor-geral” dos problemas mundiais. Sua função é meramente de coordenador. Importante? Sim, mas quem continua mandando, tomando decisões e delimitando os termos das resoluções são as potências. As mesmas de sempre.

Paul Krugman* - O estranho declínio da pax americana

The New York Times / Folha de S. Paulo

Problema não é a falta de firmeza no topo, mas sim o inimigo interno

Quando o Hamas atacou Israel, os republicanos sabiam a quem culpar —o presidente Joe BidenDonald Trump afirmou que o ataque não teria acontecido se ele ainda estivesse na Casa Branca; Mike Pence, enquanto condenava Trump por elogiar o Hezbollah e o Hamas, afirmou que Biden estava de alguma forma colocando em perigo os interesses dos Estados Unidos ao "projetar fraqueza".

Como grande parte do que a direita americana diz nos dias de hoje, essas difamações foram tanto vis quanto infantis. Não, o presidente dos EUA não é como o Lanterna Verde, capaz de moldar os eventos mundiais apenas pela força de vontade. E Biden, de fato, adotou posições surpreendentemente duras em assuntos internacionais, muito mais do que seu antecessor.

De forma mais geral, é impressionante como tanto a extrema esquerda, que não tem influência significativa no Partido Democrata, quanto a extrema direita, que em grande parte comanda o Partido Republicano, são solipsistas americanos. Eles culpam os líderes dos EUA por tudo de ruim que acontece no mundo, negando aos estrangeiros qualquer agência.

Alvaro Costa e Silva - Guerra lá, guerra aqui

Folha de S. Paulo

O horror no Oriente Médio magnetiza atenções, enquanto o nosso não para

A partir da década de 1970 o Rio cresceu em direção à Barra da Tijuca, bairro mais ou menos planejado que oferecia, além da beleza natural de praias e lagoas, o conceito publicitário da segurança em condomínios fechados e shoppings. Uma espécie de paraíso para a classe média alta. Hoje o perigo mora ao lado.

Na semana passada, a Polícia Federal apreendeu 47 fuzis e centenas de munições calibre 556 escondidos numa mansão de um condomínio de luxo, na Barra. O arsenal veio de Belo Horizonte para abastecer traficantes de drogas, milicianos e bicheiros que estão em guerra na região. O que seria uma ilha de tranquilidade se transformou em palco de assassinatos brutais –como os que vitimaram por engano três médicos num quiosque.

Joel Pinheiro Fonseca - Entre Israel e Palestina, quem está certo?

Folha de S. Paulo

Há uma linha mínima de humanidade que, se violada, acaba com qualquer pretensão de justiça

Bilhões de pessoas depositam em Israel as esperanças e medos apocalípticos de suas tradições religiosas. No centro dela está Jerusalém, onde um dia já funcionou o Templo de Salomão, até ser destruído pelo Império Romano. Nessa mesma cidade Jesus pregou, morreu e —acreditam os cristãos— ressuscitou. É ela também um lugar sagrado para muçulmanos, lembrando que Maomé honrava os profetas judeus e cristãos e inicialmente rezava com seus seguidores não voltado a Meca, e sim a Jerusalém.

É por essa razão que ela sempre ocupou o centro das atenções de reinos e impérios muçulmanos e cristãos (dos cruzados medievais ao Império Britânico e EUA) e da diáspora judaica.

Trazendo para o plano secular, a criação de Israel em 1947 respondeu a uma demanda histórica de judeus, que sofriam perseguição onde quer que morassem, até culminar no crime monstruoso do Holocausto. Não havia um país árabe no território, que fora parte do Império Turco-Otomano e, depois da Primeira Guerra, mandato imperial britânico. Mas havia povo. E centenas de milhares de árabes foram desalojados e expulsos para que a nova nação se consolidasse.

Hélio Schwartsman - Realpolitik e moral

Folha de S. Paulo

Ditames da civilização exigem que israelenses e palestinos refreiem instintos mais primitivos

O sangrento ataque do Hamas é fruto de décadas de abusiva ocupação israelense sobre os territórios palestinos. Essa é uma observação sociologicamente irretorquível. Mas precisamos tomar cuidado para não confundir juízos sociológicos, isto é, a realpolitik, com justificativas morais. Eu não me surpreenderia se alguém demonstrasse empiricamente que mulheres que usam minissaia correm maior risco de ser estupradas. É óbvio, porém, que tal constatação jamais poderia servir de justificativa para os estupradores, por mais sociologicamente precisa que fosse.

Uma outra lição da realpolitik do Oriente Médio ensina que, se você ataca seu inimigo, ele fará o que puder para revidar com força redobrada. Na lógica local, deixar de vingar-se é mostrar-se fraco, o que é um convite a novos ataques. O Hamas sabia que suas ações de 7 de outubro provocariam uma resposta duríssima de Israel e que a vítima seria a população de Gaza.

Quem aceita a realpolitik para justificar as ações do Hamas deveria, para ser coerente, aplicar esse mesmo raciocínio em relação ao revide israelense.

Dora Kramer - A cara do Brasil

Folha de S. Paulo

Repatriação de Israel mostra a melhor face de um país que pode muito quando aciona seus reais ativos

Se nos falta cacife geopolítico para mediar conflitos mundo afora, sobra-nos capital em áreas em que o Brasil está, ou poderia e deveria estar, entre as nações influentes no mundo. Na cultura, no regramento ambiental, no acolhimento a imigrantes, na imagem de amabilidade projetada por nosso povo.

Por isso não se justifica a pretensão do caminhar a passos maiores que as pernas, um jeito gerador de frustração e descrédito, quando podemos fazer uso de nossos reais ativos para realmente nos destacar e, mais importante, ajudar na proporção de nossas capacidades.

Vivemos agora um exemplo eloquente na operação de repatriação dos brasileiros de Israel e nas negociações para a retirada de Gaza de cidadãos nacionais. O presidente Luiz Inácio da Silva foi célere na ordem, e o Ministério da Defesa, as Forças Armadas e o Itamaraty foram de notável eficiência nas ações compartilhadas.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Estados obtêm compensação dupla por perda de ICMS

O Globo

Mesmo já beneficiados com R$ 27 bilhões, governos elevam alíquotas, de olho na reforma tributária

Está em curso uma manobra de governos estaduais para inflar receitas com o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e se beneficiar na reforma tributária que tramita no Congresso. Executivo e Legislativo precisam estar atentos para impedir a perpetuação dessas distorções na arrecadação estadual e municipal em detrimento do contribuinte.

A operação, revelada em reportagem do GLOBO, é simples. De acordo com dados do Comitê Nacional de Secretários de Fazenda dos Estados e Distrito Federal (Comsefaz), 16 estados (Acre, Alagoas, Amazonas, Amapá, Ceará, Bahia, Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Paraná, Roraima, Rondônia, Sergipe e Tocantins) e o Distrito Federal já elevaram, no ano passado ou neste ano, suas alíquotas de ICMS entre 1 e 3,5 pontos percentuais. O pretexto alegado é recompor receitas perdidas quando o então presidente Jair Bolsonaro, em campanha à reeleição, cortou o ICMS sobre combustíveis, serviços de telecomunicações e eletricidade, importantes fontes de receitas tributárias dos governadores.

Poesia | Fernando Pessoa - Estou Tonto

 

Música | Dulcis Orchestra - (José Pablo Moncayo )-

 

segunda-feira, 16 de outubro de 2023

Opinião do dia – Friedrich Hegel*

“Na história política, o indivíduo, na singularidade da sua índole, do seu gênio, das suas paixões, da energia ou da fraqueza de caráter, em suma, em tudo o que caracteriza a sua individualidade, é o sujeito das ações e dos acontecimentos. Na história da filosofia, estas ações e acontecimentos, ao que parece, não têm o cunho da personalidade nem do caráter individual; deste modo, as obras são tanto mais insignes quanto menos a responsabilidade e o mérito recaem no indivíduo singular, quanto mais este pensamento liberto de peculiaridade individual é, ele próprio, o sujeito criador. Primeiramente, estes atos do pensamento, enquanto pertencentes à história, surgem como fatos do passado e para além da nossa existência real. Na realidade, porém, tudo o que somos, somo-lo por obra da história; ou, para falar com maior exatidão, do mesmo modo que na história do pensamento o passado é apenas uma parte, assim no presente, o que possuímos de modo permanente está inseparavelmente ligado com o fato da nossa existência histórica. O patrimônio da razão autoconsciente que nos pertence não surgiu sem preparação, nem cresceu só do solo atual, mas é característica de tal patrimônio o ser herança e, mais propriamente, resultado do trabalho de todas as gerações precedentes do gênero humano.

*Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831). “Introdução à História da Filosofia” (28.10.1816), p.321. Os Pensadores (Hegel). Editora Abril Cultural, 1985.

Entrevista | Francesca Albanese: Resposta global à guerra Israel-Hamas é repugnante, diz relatora da ONU

Mayara Paixão / Folha de S. Paulo

Francesca Albanese afirma que facção terrorista cometeu crimes injustificáveis, mas critica resposta de Tel Aviv

Francesca Albanese, 46, enfrenta o período mais crítico de seu trabalho desde que, há um ano e meio, assumiu a liderança da relatoria especial da ONU para os territórios palestinos ocupados, cargo criado em 1993 pelo Comitê de Direitos Humanos da organização.

Desde que eclodiu a guerra entre Israel e Hamas, em 7 de outubro, a italiana condena de maneira enfática o que chama de crimes de guerra cometidos pela facção terrorista, ao mesmo tempo em que critica as ações de Israel e defende os direitos de civis palestinos.

Albanese tem clamado por um cessar-fogo imediato e afirma, nesta entrevista, que a comunidade internacional, cujas ações descreve em termos como "repugnantes" e "cínicas", tem falhado.

A relatora diz que a guerra trouxe à tona o antissemitismo e a islamofobia. E diz que a ocupação dos territórios palestinos, que chama de um movimento colonizador feito por Israel, agride os dois povos. "A colonização de povoamento aprisiona tanto os palestinos quanto os israelenses. Claro, com responsabilidades diferentes."

A italiana considera os ataques do Hamas, "crimes hediondos", injustificáveis. Mas dia que a resposta de Tel Aviv "vai muito além do que é razoável". A maneira como Israel age, diz, tende a fortalecer o Hamas —que, afirma, não representa todos os palestinos de Gaza.

Em quais termos descreve os ataques do Hamas em 7 de outubro?

Fernando Gabeira - Desumano, demasiadamente desumano

O Globo

É possível demonstrar empatia pelo sofrimento do povo palestino e condenar com firmeza ataques terroristas

Quando acontecem as tragédias, policiais, ecológicas ou políticas, os jornalistas reportam, fotografam e comentam. Aparentemente, voltam para casa e se preparam para novos acontecimentos. Mas não é isso que experimentamos na vida real. As tragédias impactam nosso cotidiano, nosso inconsciente, nosso lazer e o próprio sono.

Foi assim que aconteceu comigo depois de entrar no Carandiru, após o massacre, depois de fotografar os mortos de Vigário Geral, acompanhados de uma vela solitária. Foi assim também depois de cobrir os desastres em Mariana e Brumadinho.

O ataque terrorista do sábado, 7 de outubro, em Israel, apesar da distância, amargou minhas férias anuais, que começariam na segunda-feira. Muita tristeza e desolação. Dizem que ficamos mais sentimentais com a idade. Mas o massacre de famílias israelenses e jovens que dançavam numa rave, além de tudo, acentuou meu sentimento de frustração e impotência diante de um conflito que parece não ter fim.

A resposta para isso é o bombardeio de Gaza, invasão armada e morte de civis. São acontecimentos que abalam a crença no ser humano. Em 50 anos de vida política, acompanho o que se passa no Oriente Médio com uma esperança de que a solução de dois Estados, Israel e Palestina, acabe triunfando e estabeleça a paz e a cooperação entre os dois vizinhos.