Folha de S. Paulo
Leis de outro país não têm eficácia no Brasil
se ofende a soberania nacional
Trocando o juridiquês por uma linguagem que humanos entendam, o que o ministro Flávio Dino decidiu é simples: no Brasil vale a lei brasileira, como nos EUA vale a lei americana. Em outras palavras: no Brasil, as pessoas —jurídicas ou físicas— estão sujeitas às normas adotadas pelo Legislativo e aplicadas pelo Judiciário das bandas de cá. Data vênia o alarde que causou, a decisão de Dino sobre leis e atos estrangeiros não tem absolutamente nada de novo, a rigor aplica-se às partes daquele caso, não a Moraes, e apenas repete o que a lei já diz.
A lei internacional (tratados, decisões de
cortes internacionais, por exemplo) pode ter eficácia direta porque é aceita
pelo Brasil como norma válida; leis estrangeiras não. Se amanhã a China decidir
sancionar colunistas deste jornal que critiquem o país asiático por, digamos,
falta de liberdade de expressão naquela nação, esses colunistas procurarão as
cortes brasileiras para reforçar a ideia básica de que neste parquinho quem
manda somos nós. É o mesmo direito que Alexandre de
Moraes e qualquer cidadão brasileiro possuem.
Leis, atos e sentenças de outro país não
possuem eficácia no Brasil quando ofenderem a soberania nacional, e empresas
estrangeiras devem respeitar as leis locais em suas operações. Quem diz isso? A
lei brasileira, nestes exatos termos, desde 1942. Se juridicamente Dino disse
apenas o óbvio, o espanto, no entanto, advém da consequência que pode ensejar.
A margem para conflito espacial de leis, no
entanto, é menor do que parece. Uma leitura mais atenta da ordem dos EUA contra
Moraes mostra que ela se aplica tão somente a bens de Moraes sob posse ou
controle de empresas dos EUA e a transações de Moraes dentro dos EUA ou que
passam por lá. A simples existência de um ente ou contrato nos EUA por uma
empresa que também opera aqui não deveria servir de gatilho para aplicação de
sanções.
Se o óbvio que é a soberania nacional causa
tanto furor, é porque já naturalizamos a condição de vira-lata. Como nos
lembrou Nelson Rodrigues, na voz da brasileiríssima Fernanda
Montenegro: se o Brasil é vira-lata, que sejamos gloriosamente
vira-latas.
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