sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Claudia Safatle - A tempestade quase perfeita

• Dilma terá apenas uma bala, sem tempo para errar

- Valor Econômico

O governo que toma posse dia 1º de janeiro começou no dia 27 de outubro e já se encontra em meio a três conflitos de grande dimensão: um desentendimento com a base aliada no Congresso, o alcance inimaginável da Operação Lava-Jato que investiga atos de corrução na Petrobras e uma economia estagnada, retração dos investimentos, inflação no teto, contas públicas sob descontrole e juros em alta. Tudo conspira para elevar as incertezas na economia, que não são pequenas, agravando mais a situação e comprometendo 2015.

Trata-se de uma tempestade que só não é perfeita porque os investidores estrangeiros continuam, alheios aos problemas domésticos do país, em busca dos juros altamente positivos que o Brasil oferece, na esperança de que, ao fim e ao cabo, tudo vai se acertar. Se não acertar, há aplicações financeiras de curto prazo que podem sair a qualquer momento.

Dilma foi reeleita sem traçar planos para os próximos quatro anos e, passados 25 dias do segundo turno, ela deu alguns poucos e ambíguos sinais.

No discurso em que comemorou a reeleição, a presidente renovou o confronto com o Congresso ao propor o plebiscito já rejeitado sobre a reforma política. As investigações sobre corrupção na Petrobras durante o período em que ela foi presidente do Conselho de Administração da companhia estatal deixam Dilma vulnerável. E, na economia, o cardápio de medidas que se apresenta à presidente - que atravessou toda a campanha eleitoral sem dar uma visão de futuro - contém as mesmas ações dolorosas que ela atribuiu aos seus adversários.

Na primeira entrevista à imprensa, já reeleita, a presidente anunciou que terá que cortar gastos, mas que o fará de forma que os empregos e a renda sejam preservados.

No domingo, na Austrália, Dilma disse que cortará o gasto público que não afeta a demanda. Não explicou, porém, o que isso significa. Qualquer corte de despesa efetivo afetará a demanda e, portanto, o emprego e a renda. A não ser que ela esteja se referindo a cortes em relação à proposta orçamentária para o próximo ano. Aí é passar a tesoura em vento.

Na área fiscal, até o momento, a presidente decidiu apenas passar uma borracha no orçamento deste ano, retirando da Lei de Diretrizes Orçamentárias a meta de superávit primário e transformando déficit em superávit.

O escândalo da Petrobras assombra o Palácio do Planalto. A presidente desde março vem tentando se blindar dos respingos da corrupção. Primeiro, costurou as mudanças na diretoria da estatal "por dentro", declarou que só aprovou a compra da refinaria de Pasadena por desconhecer cláusulas contratuais e, agora, diz que não vai proteger ninguém que tiver culpa no cartório.

Mas o fato é que há um grande receio do governo em relação à eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para a presidência da Câmara, exatamente porque, apesar de ser da base, não o considera fiel, confiável, um aliado a qualquer custo.

Nessa avaliação Cunha, portanto, seria capaz de dar ritmo à tramitação de algum pedido de impeachment de Dilma que eventualmente surja no parlamento por causa do "Petrolão". O presidente da Câmara tem todas as condições de engavetar ou levar à votação um processo como esse. Aécio Neves (PSDB-MG), quando presidente da Câmara, arquivou em 2001 um pedido de impeachment de Fernando Henrique Cardoso. Inocêncio Oliveira (PR-PE) arquivou outro sobre José Sarney. Outros fizeram o mesmo no passado.

Com três crises distintas rondando o seu segundo mandato, Dilma recebeu de Lula o conselho para que acelerasse a definição de nomes para conduzir a área econômica nos próximos quatro anos. Assim, poderia criar uma agenda positiva que ocupasse o noticiário daqui para a frente, tirando das primeiras páginas dos jornais o caso Petrobras.

A presidente, segundo aliados, tem apenas "uma bala". Se errar, não terá tempo para corrigir rumos e acertar. Não bastará fazer um ajuste fiscal para que a economia volte a crescer. É preciso um programa de governo mais completo, que aponte um futuro para o parque industrial do país, que privilegie as exportações e, para isso, não dificulte as importações, que coloque o país nas cadeias globais de produção. Enfim, que dê direção e reconquiste a confiança de empresas e consumidores. Caso contrário, um corte de gastos públicos, sozinho, será insuficiente e poderá vir a ser responsabilizado como a fonte do insucesso, por forças políticas que cultivam preconceito a qualquer coisa que considerem de cunho liberal.

As primeiras iniciativas de Dilma para a formação do ministério do segundo mandato não deram certo. Sob o incentivo de Lula, ela convidou o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, para ser o ministro da Fazenda em substituição a Guido Mantega. O executivo esteve na quarta feira em Brasília, com a presidente, disposto a aceitar o convite. Mas, estranhamente, recusou. Há 25 dias outros nomes como os de Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central, e Nelson Barbosa, secretário-executivo do Ministério da Fazenda até o ano passado, estão sob intensa especulação sem que nada seja oficializado.

Ontem, após a inesperada recusa de Trabuco, novos arranjos para a área econômica começaram a surgir. Alexandre Tombini, que foi confirmado na presidência do Banco Central, seria remanejado para a Fazenda e Joaquim Levy, secretário do Tesouro no governo Lula e hoje presidente da Bradesco Asset Management, iria para o comando do BC ou vice-versa.

Levy, aliás, era um dos nomes que Trabuco cogitava para a Secretaria do Tesouro Nacional, caso aceitasse o convite.

Na história contemporânea do país não há notícia de um governo reeleito, com todo o viço comum a uma nova administração, que tenha, como esse, uma face já envelhecida, na defensiva política e o mandato sob ameaça.

Míriam Leitão - Riscos imediatos

- O Globo

O presidente de uma grande empresa foi informado por um fundo estrangeiro que, com o risco Brasil do jeito que está, ele não financiaria o negócio já negociado. Falei ontem com dois economistas: um acha que é possível evitar o rebaixamento da nossa nota; o outro está em dúvida se acontece no primeiro ou no segundo semestre de 2015. Uma das causas é o que está acontecendo com a meta fiscal.

O problema é que tanto os economistas quanto o empresário acham que esse é o ponto crucial para qualquer cenário que se possa tratar. Antonio Licha, professor da UFRJ, e José Márcio Camargo, da PUC-Rio, entrevistados ontem no meu programa da Globonews, traçaram cenários sombrios para a economia brasileira. Camargo, o mais pessimista, afirmou que o rebaixamento da dívida brasileira virá no ano que vem.

Para o executivo, com quem conversei ontem, o risco Brasil em alta já é um fato concreto, tanto que ele acaba de perder o parceiro com negócio fechado. Ele acha que o ex-presidente Lula flexibilizou a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), e a presidente Dilma, com todas as mudanças contábeis e a proposta enviada ao Congresso, está rasgando a lei.

O ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, afirmou esta semana que cumprir o superávit primário aumentará o desemprego e provocará recessão. O governo demonstra assim que não vê os benefícios do superávit. Ele ajuda a reduzir a inflação e, portanto, os juros. Aumenta a taxa de poupança e favorece investimentos. Reduz a dívida pública e afasta o risco de rebaixamento da nota de crédito.

- Agora se fala assim: já que a presidente vai ter um Waiver (perdão) por não cumprir a lei, então os estados começam também a entrar na mesma onda de não respeitar os limites de gastos - diz o executivo.

A Lei de Responsabilidade Fiscal foi o final de um edifício que levou anos para ser construído no governo Fernando Henrique. Exigiu o saneamento de entes públicos e de governos estaduais e prefeituras.

Inicialmente, foi seguido pelo governo Lula, mas depois começou a ser flexibilizado. No governo Dilma, as alquimias fiscais passaram a desmoralizar a meta de superávit e agora, com essa proposta que está no Congresso, em que no relatório de Romero Jucá até desaparece a palavra superávit, assume-se que o governo termine o ano no vermelho, pela primeira vez desde 1999. Foi a LRF que levou o Brasil a ter, anos depois, o grau de investimento, que, na prática, traz investidores e reduz o custo do financiamento para as empresas e o governo brasileiro. Como o Brasil está com déficit em conta-corrente, ele precisa de financiamento externo.

O risco que se corre hoje, no governo Dilma, é a saída do Brasil do seleto grupo de países considerados seguros para se investir. Uma das três principais agências de rating do mundo, a Standard & Poors, já rebaixou a nossa nota, e ela continua sob revisão para uma nova queda. Se acontecer, voltaremos ao nível "especulativo". A Moody"s também colocou o país sob perspectiva de rebaixamento.

O superávit primário vem minguando. Em janeiro de 2011, estava em 2,71% do PIB acumulado em 12 meses. A presidente o levou a 3,6%, em setembro. De lá para cá, o que se vê é uma queda contínua, com pequenos meses de alta. Em setembro, último dado divulgado pelo Banco Central, o primário acumulado em 12 meses foi de apenas 0,6% do PIB. No ano, está negativo.

Além do mais, a conta tem tanta maquiagem que não se sabe o real tamanho do negativo. O que mais impressiona na deterioração das contas públicas é que a carga tributária é recorde. Cresceu dois pontos percentuais em quatro anos e chegou a 36% do PIB.

Segundo o departamento econômico do banco Itaú Unibanco, as receitas estão com crescimento real zero este ano, até setembro, e as despesas estão subindo 5,3%. Se não cortar gastos, o governo terá que aumentar impostos. Ou seja, atacar o nosso bolso, que já não aguenta mais o aumento da carga tributária.

E para que fazer superávit primário? Por dois motivos a mais: porque a dívida bruta está subindo e já chegou a 60% do PIB e porque os credores somos todos nós, que aplicamos em fundos lastreados por títulos do governo ou temos papéis do Tesouro Direto. É a nós que o governo deve e, portanto, pelo equilíbrio do país, deve manter suas contas em dia.

Eduardo Giannetti - Estatais aos pedaços

- Folha de S. Paulo

O paradoxo salta aos olhos. Temos um governo de perfil estatizante, cioso da sua orientação nacional-desenvolvimentista, mas que logrou a proeza de arrebentar nossas duas principais empresas estatais. Obra de raro descortino.

A Petrobras, orgulho nacional, não só perdeu a condição de apresentar um balanço auditado crível como será forçada a republicar balanços anteriores, corrigindo as baixas referentes ao pagamento de bilhões de reais --quem saberá ao certo?-- em propinas nos últimos anos (outro exemplo da máxima, atribuída a Pedro Malan, de que "no Brasil até o passado é imprevisível").

Já a Eletrobras, vítima da MP 579, de 2012, que antecipou a renovação das concessões de energia mediante a redução das tarifas, acaba de admitir que não disporá de recursos para pagar dividendos neste ano.

Além da queda do seu valor de mercado, com ações negociadas abaixo do valor patrimonial, a Eletrobras teve prejuízo de R$ 2,7 bilhões só no terceiro trimestre deste ano, o que inviabiliza a remuneração mínima de 6% prometida aos acionistas.

Os caminhos do inferno, é claro, diferem. A ruína da Eletrobras foi fruto das boas intenções do governo Dilma (o setor elétrico, aliás, teria sido o tema da dissertação de mestrado da presidente na Unicamp), ao passo que a devastação da Petrobras resulta, entre outras coisas, da ação articulada de profissionais: uma quadrilha de empreiteiros, burocratas, lobistas e dezenas de políticos que conferiu ao lema getulista --"o petróleo é nosso"-- inédito e inadvertido significado.

Mas existe um substrato comum a esses descalabros. Ambos refletem a deformação patrimonialista do Estado brasileiro --"o capitalismo politicamente orientado", no dizer de Raymundo Faoro em "Os Donos do Poder", que aportou por aqui com as caravelas, atravessou cinco séculos de história e foi alçado a novo patamar no atual governo.

As facetas do patrimonialismo relevantes nestes casos são 1) o microgerenciamento e a tutela do Estado sobre a atividade econômica, alterando regras e revendo contratos de forma arbitrária ao sabor de conveniências circunstanciais e 2) o condomínio do poder calcado na simbiose promíscua entre público e privado aliado ao loteamento de órgãos e empresas estatais como forma de cooptação política.

A probabilidade de existir corrupção aumenta à medida que os governos se envolvem em todos os meandros da economia. A debacle da Eletrobras e o escândalo da Petrobras chocam pela magnitude, mas estão em perfeita linha de continuidade com a atual recaída patrimonialista.

O Brasil carece de instituições que mantenham os cidadãos e a economia a salvo dos abusos, inépcia, venalidade e ambições dos donos do poder.

Celso Ming - Acalmar é pouco

• A pessoa mais indicada para ocupar o Ministério da Fazenda, a principal pasta da Economia, não seria aquela que conseguiria aplacar ânimos exacerbados, mas sim que fosse capaz de executar com eficácia a política econômica correta do governo federal

- O Estado de S. Paulo

Há dias vem pipocando nos noticiários a informação de que a presidente Dilma Rousseff procura nomear para ministro da Fazenda alguém com perfil capaz de “acalmar o mercado financeiro”.

Se for para isso, recomeça errado. A pessoa mais indicada para ocupar o Ministério da Fazenda, a principal pasta da Economia, não seria aquela que conseguiria aplacar ânimos exacerbados, mas sim que fosse capaz de executar com eficácia a política econômica correta do governo federal.

O mercado financeiro não está apreensivo porque o atual ministro da Fazenda é Guido Mantega, mas porque a política econômica adotada até agora fracassou, como se vê pelo crescimento insignificante da atividade produtiva, pela inflação que estoura a meta e pela deterioração tanto das contas públicas quanto das contas externas.

Ou seja, tudo tem de começar pelo formato e pela qualidade da política econômica. Se for para continuar com o experimentalismo e a desarticulação dos fundamentos da economia, o nome importaria menos. Seria mais do mesmo, para o que bastaria chamar o atual secretário do Tesouro, Arno Augustin, para continuar com seus truques contábeis e aprofundar tudo o que está aí.

Mas se é para recobrar a consistência dos fundamentos da economia, sanear as contas públicas e colocar em marcha os investimentos, então terá de ser dada prioridade à recuperação da confiança e, aí sim, o perfil do ministro terá importância e será uma indicação da virada pretendida.

Ainda não está claro quanto a presidente Dilma entendeu que as condições em que começa seu segundo mandato são muito diferentes das que herdou em 2011. Não é apenas uma questão de mau desempenho e de piora da qualidade da política econômica que agora ameaça desembocar na perda do grau de investimento dos títulos da dívida brasileira.

O início do novo período de governo coincide com o fim do ciclo de alta das commodities e com o começo de uma longa temporada de vacas magras. Se a economia no exterior não ajudou, vai continuar não ajudando, como ainda nesta quinta-feira reconheceu a presidente Dilma, a partir do que viu e ouviu na reunião de cúpula do Grupo dos Vinte (G-20), realizada no último fim de semana, na Austrália.

Os escândalos da Petrobrás, que apenas começam a ser revelados pela Operação Lava Jato, tendem a afastar as empreiteiras e as empresas que poderiam se apresentar para executar projetos de infraestrutura. Isso significa, também, que o programa de investimentos, do qual depende o desempenho da economia, corre riscos. E ainda está para se verificar quando arrastará também os políticos, os tais 300 picaretas do Congresso e, eventualmente, outros fora dele.

E, não custa repetir, um caudal enorme de incertezas envolve o suprimento imediato de energia elétrica e de água doce à economia do Centro-Sul, para o qual ainda não há respostas adequadas do governo.

O que vem vindo aí exigirá bem mais do que a distribuição de calmantes para os administradores do mercado financeiro.

Um sinal
Mesmo depois de confirmada a recusa do presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, de aceitar o convite ao cargo de ministro da Fazenda, ficou claro o sinal de que a presidente Dilma pretende uma virada. Embora discreto, Trabuco é um forte crítico da atual política econômica e Dilma sabia disso.

Foi o quinto
Em 2002, o ex-presidente do Banco FleetBoston Henrique Meirelles foi o quinto a ser convidado a assumir a presidência do Banco Central. Os outros quatro recusaram.

No vermelho
O ministro do Desenvolvimento, Mauro Borges, torce para que apareça um superávit na balança comercial deste ano. Mas admite que feche com déficit. Está difícil evitar o vermelho. O resultado acumulado até a primeira quinzena de novembro é negativo em US$ 3,4 bilhões. Mas… vai que o governo arrume outra exportação ficta de plataforma da Petrobrás que não sairá do País, mas acabará engrossando as exportações.

Nelson Motta - O império da mentira

- O Globo

Em tempo de delação premiada, verdades e mentiras se misturam e se confundem. Mentir, todo mundo mente, mesmo sem maldade ou intenção de enganar, pelo menos 200 vezes por dia, dizem pesquisas neurológicas recentes. Sejam inocentes, triviais, piedosas, cínicas, covardes, venenosas, fatais ou criminosas, mentiras são da condição humana. Já os psicanalistas dizem que todos mentem, mas, quando a pessoa começa a mentir a si mesma, e a acreditar, não vale a pena continuar.

Entre a mentira e a ficção, entre a memória e a imaginação, vivem escritores e publicitários, historiadores e artistas, jornalistas e marqueteiros, e também as crianças e adultos que se igualam diante do maior perigo: acreditar nas próprias mentiras.

Marqueteiros políticos são uma espécie moderna de mentirosos profissionais de alta performance, que são mais eficientes quando distorcem fatos e números e ampliam supostos defeitos e suspeitas sobre os adversários. O problema é o candidato vencer as eleições e continuar acreditando na campanha do marqueteiro, mesmo diante da realidade adversa dos fatos e dos números.

E mais ainda se vive cercado e isolado por assessores que adequam suas mentiras às dele e não ousam desmenti-lo, mentindo assim duplamente.

Mentiras sinceras interessam a poetas amorosos como Cazuza, mas não funcionam e custam caro na economia. O poeta pode fingir tão completamente que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente, mas políticos são diferentes, mentem mais friamente. No autoengano, eles põem a culpa nos adversários ou no governo anterior. E na imprensa. E apelam à ancestral mãe de todas as mentiras: "Eu não sabia."

Mas Lula nunca acreditou nas suas próprias mentiras, que são tão abundantes e mutantes que contradizem umas às outras, mas sempre funcionaram no objetivo de enganar os políticos e o povo. Claro, para o bem do povo e do Brasil& rsrs.

Será estarrecedor se Dilma continuar acreditando no mundo maravilhoso de João Santana e deixar de fazer o que tem que ser feito e que ela dizia que os outros fariam. Como solucionar problemas sem reconhecer que eles existem? Nem mentindo.

Caetano Veloso - Milagres do povo

Cecília Meireles – Motivo

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Opinião do dia – Aloysio Nunes Ferreira

Eu não diria que a presidente é pessoalmente desonesta. Não diria isso. Mas que ela se beneficiou desse esquema, se beneficiou. Se beneficiou política e eleitoralmente. Ela fez parte de um governo sustentado na lama. E ela nada fez para impedir.

Aloysio Nunes Ferreira, senador (SP) e líder do PSDB no Senado Federal, Agência Senado, 19 de novembro de 2014.

Acuadas, empreiteiras chegam ao STF contra Lava Jato

• Por meio de reclamação, defesa da Engevix alega que Justiça no Paraná ‘usurpou’ competência da Corte

Fausto Macedo, Ricardo Brandt e Mateus Coutinho – O Estado de S. Paulo

Asfixiadas por uma investigação da Polícia Federal sem precedentes no País, as empreiteiras da Lava Jato bateram à porta do Supremo Tribunal Federal (STF). Elas querem tirar o processo sobre propinas e corrupção na Petrobrás da alçada da 13.ª Vara Federal de Curitiba, base da Lava Jato.

É um movimento estratégico das gigantes da construção.

Por meio de uma reclamação endereçada à Corte máxima da Justiça, o engenheiro Gerson de Mello Almada, vice presidente da Engevix Engenharia S/A, pede liminarmente a suspensão dos efeitos da ordem de prisão contra o executivo.

No dia 10 de novembro, a Justiça Federal no Paraná ordenou a custódia de Almada e de outros 24 alvos da investigação, a maioria dirigentes das principais empreiteiras do País. Jamais as maiores empreiteiras, detentoras de centenas de contratos com a administração pública, passaram por uma fase tão drástica.

A reclamação – denominação do pedido ao STF -, já está nas mãos do ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato.

Ela é subscrita pelos criminalistas Fábio Tofic Simantob, Débora Gonçalves Perez e Maria Jamile José. Fábio Tofic argumenta que as ordens de buscas e de prisão “caracterizam manifesta usurpação da competência privativa do STF, disposta no artigo 102, I, b, da Constituição Federal”.

Segundo o criminalista, o juiz federal no Paraná que conduz as ações da Lava Jato cindiu as investigações quando se deparou com indícios de cometimento de crime por autoridades com prerrogativa de foro, notadamente o deputado federal André Vargas, então no PT, “sem submeter a questão ao Supremo”.

Tofic classifica de “inaceitável cisão, em primeira instância, da investigação de suposto esquema que teria como razão de ser o locupletamento de agentes políticos com foro nesse Tribunal”.
O criminalista aponta o que chama de “usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal mediante deliberada ocultação da descoberta de indícios de crime relacionados aos deputados federais André Vargas e Luiz Argôlo” – ambos de laços estreitos com o doleiro Alberto Youssef, operador do esquema de propinas e corrupção na Petrobrás.

Fábio Tofic adotou o mesmo argumento em 2013, quando obteve decisão favorável do Tribunal Regional Federal da 3.ª Região (TRF3) para tirar das mãos de um juiz federal do município de Jales (SP) os autos da Operação Máfia do Asfalto – investigação sobre corrupção em 78 cidades do interior paulista que apontou envolvimento de parlamentares.

Na ocasião, o juiz de primeiro grau enviou à Procuradoria Regional da República da 3.ª Região parte dos autos relativa a parlamentares. O TRF3, porém, decidiu que quem detinha competência para tal medida era a própria Corte, não o juiz de primeira instância.

No reclamação ao Supremo, a defesa da Engevix assinala que “a desabrida usurpação da competência dessa Corte, o juízo singular, a um só tempo, decidiu que o suposto ‘pagamento de vantagem indevida a Paulo Roberto Costa’ não guardaria conexão com o hipotético pagamento de vantagens a parlamentares”.

Segundo Fábio Tofic, a Justiça Federal no Paraná “realizou um abrupto corte na investigação sobre tal hipotético esquema, permitindo-se deliberar acerca dos pagamentos supostamente destinados a Paulo Roberto Costa e arvorou-se na prerrogativa de manter oculta a identidade dos ‘agentes políticos’ e, mais além, de omitir dessa Corte os interrogatórios que a eles fizeram múltiplas alusões”.

Justiça encontra contas de empreiteiros zeradas

• Primeiros levantamentos em dois bancos mostram que seis empreiteiros acusados na Lava-Jato não têm saldo

Cleide Carvalho – O Globo

SÃO PAULO - As primeiras varreduras feitas para o bloqueio de até R$ 720 milhões de dirigentes de empresas presos na Operação Lava-Jato mostram que as contas bancárias dos investigados podem ter sido esvaziadas antes da determinação da Justiça Federal. O Banco Itaú informou, em ofício encaminhado à Justiça Federal, que não havia valores a serem bloqueados nas contas de Walmir Pinheiro Santana (UTC Participações S.A.), Valdir Lima Carreiro (presidente da Iesa Óleo e Gás) e do lobista Fernando Soares. O banco bloqueou apenas os R$ 4,60 que estavam na conta de Ildefonso Colares Filho, que deixou a presidência da Queiroz Galvão em abril passado, depois que a Operação Lava Jato foi deflagrada.

Os valores encontrados nas contas de alguns outros executivos também não foram altos. Sócio da Galvão Engenharia, Erton Medeiros Fonseca teve R$ 4 mil bloqueados. Já Agenor Franklin Magalhães Medeiros, diretor da área Internacional da Construtora OAS, teve R$ 6 mil retidos. Foram bloqueados ainda cerca de R$ 33 mil do empresário Sergio Cunha Mendes, vice-presidente da Mendes Junior. Apenas as contas de Gerson de Mello Almada, um dos sócios da Engevix, tinham valores mais altos, superiores a R$ 1 milhão.

Também não surtiu efeito a busca por saldo nas contas de Dalton dos Santos Avancini, presidente da Camargo Corrêa, e de João Ricardo Auler, presidente do conselho de administração da empresa, mantidas no Banco Caixa Geral do Brasil. No mesmo banco, também não havia saldo ou aplicações financeiras em nome de José Aldemario Pinheiro Filho, da OAS.

Receita pode arrecadar R$ 1 bilhão em multas
As duas instituições foram as primeiras a atender à determinação da Justiça Federal, que determinou o bloqueio de R$ 20 milhões por pessoa. No total, 16 pessoas foram alvo de pedido de bloqueio de valores. Não foi determinado bloqueio de valores de nenhuma das grandes empresas envolvidas.

O Ministério Público Federal já solicitou a colaboração das autoridades suíças para bloquear valores mantidos em contas no exterior pelo doleiro Alberto Youssef e pelo ex-diretor da Petrobras Renato Duque. O também ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa teve US$ 23 milhões bloqueados no exterior. Pedro Barusco, gerente da Petrobras subordinado a Duque, já negociou a devolução de US$ 100 milhões.

Ontem, o juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba, decidiu pelo compartilhamento de informações dos processos que envolvem as empresas com a Controladoria Geral da União, a Receita, o Tribunal de Contas da União e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), responsável pela investigação administrativa de delitos de ordem econômica, como formação de cartel. O juiz assinalou que há indícios de crimes financeiros, fiscais e de formação de cartel e que o compartilhamento de provas é necessário, inclusive, para viabilizar a investigação criminal dos envolvidos. A Receita estima que possa arrecadar cerca de R$ 1 bilhão apenas com multas e impostos sobre operações ilegais feitas pelas nove empresas que tiveram dirigentes com prisão temporária ou preventiva decretada na última sexta-feira.

Os executivos e funcionários de empresas soltos na noite de terça-feira, após o prazo de cinco dias de prisão temporária, já começaram a entregar os passaportes à Justiça Federal. O juiz informou ontem ter recebido os passaportes de Walmir Pinheiro Santana, Ildefonso Collares Filho, Othon Zanoide de Moraes Filho, Ednaldo Alves da Silva, Newton Prado Junior, Otto Sparenberg, Alexandre Portela Barbosa, Valdir Carreiro, Carlos Alberto da Costa Silva e Jayme de Oliveira Filho, este último agente da Polícia Federal.

Duque tem fortuna no exterior, diz juiz
No despacho em que determinou que o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque continuasse preso, o juiz Sérgio Moro alegou risco de o ex-dirigente fugir para o exterior. Segundo o magistrado, Duque mantém uma "verdadeira fortuna" em contas bancárias fora do país.

"Dispondo de fortuna no exterior e mantendo-a oculta, em contas secretas, é evidente que não pretende se submeter à sanção penal no caso de condenação criminal [...] Sem a [prisão] preventiva, [há] o risco do investigado tornar-se foragido e ainda fruir de fortuna criminosa, retirada dos cofres públicos e mantida no exterior, fora do alcance das autoridades públicas", observou o juiz.

Ao citar o ex-diretor de Serviços da Petrobras na decisão, Moro afirmou que o executivo da empresa Toyo Setal Júlio Camargo, um dos delatores do esquema de corrupção que tinha tentáculos na estatal do petróleo, afirmou ao Ministério Público Federal que Duque mantinha uma conta na Suíça, em nome de uma empresa off-shore, criada exclusivamente para receber pagamentos de propina.

O juiz federal também menciona no despacho que o ex-diretor de Refino e Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa e o ex-gerente da estatal Pedro Barusco, apontado como braço-direito de Duque no esquema de corrupção, também mantêm contas bancárias no exterior utilizadas para receber suborno.

"As provas apontam que ele [Renato Duque], à semelhança de Paulo Roberto Costa (23 milhões de dólares) e de Pedro Barusco (100 milhões de dólares), mantém verdadeira fortuna em contas secretas mantidas no exterior", escreveu o magistrado. "Júlio Camargo chegou a indicar a conta de Duque no exterior, em nome da off shore Drenos, mantida no Banco Cramer na Suíça, que receberia os valores da propina", complementou Moro.

Sem devolver dinheiro
Segundo o juiz, os valores mantidos pelo ex-diretor da petroleira no exterior "ainda não foram bloqueados, nem houve compromisso de devolução."

A Comissão de Ética Pública decidiu, ontem, apurar as denúncias contra Renato Duque. Os conselheiros encaminharam pedido de informações à Petrobras e ao ex-diretor.

A comissão também apura as denúncias contra Nestor Cerveró, ex-diretor da área internacional da Petrobras, na compra da refinaria de Pasadena. Mesmo se tratando de ex-diretores da Petrobras, a comissão pode aplicar a pena de censura ética, que, na prática, não tem efeito legal.

O presidente da comissão, Américo Lacombe, disse que são três processos diferentes e que a Petrobras tem colaborado, repassando informações ao órgão.

- (A comissão) Vai fazer alguma coisa, claro, vamos abrir, vamos investigar, mas eu não vou fazer prejulgamento. O que sai no jornal não é prova, é notícia. Tem de ser bem ponderado, claro - disse.

Empresa de lobista obteve contratos de R$ 71 milhões

• Fernando Baiano, que está preso, é sócio de empresa que atua em plataformas

• Desde 2007, a estatal assinou 86 contratos com a empresa de Baiano, num total de R$ 131,6 milhões

Mario Cesar Carvalho e Alexandre Aragão - Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Uma empresa que tem como sócio o lobista Fernando Soares, que se entregou nesta terça-feira (18) à Polícia Federal em Curitiba, tem contratos de R$ 71,2 milhões com a Petrobras, segundo documentos obtidos pela Folha.

Conhecido como Fernando Baiano, ele é apontado como o elo entre os desvios da estatal investigados pela Operação Lava Jato, que apura fraudes em licitações e propina a políticos, e o PMDB.

Baiano teve a sua prisão decretada pelo juiz Sergio Moro sob suspeita de intermediar o pagamento de propina para peemedebistas. O PMDB refuta ter qualquer relação com o lobista.

Um dos delatores da Operação Lava Jato, o empresário Julio Camargo, do grupo Toyo Setal, relatou a procuradores que Baiano recebeu propina de US$ 8 milhões para que a sua empresa conseguisse fechar um contrato de sondas com a Petrobras.

A empresa da qual Baiano é sócio, a Petroenge Petróleo e Engenharia, presta serviços de manutenção e de apoio para as plataformas marítimas de extração de petróleo da estatal, segundo consta dos contratos assinados.

A Petroenge fica em Macaé, no Rio de Janeiro, onde estão localizadas as empresas que atuam na bacia de Campos.

A empresa tem três filiais no Espírito Santo e uma na Bahia, todas em cidades em que a Petrobras tem unidades: Vitória (ES), Anchieta (ES), Linhares (ES) e São Sebastião do Passe (BA).

Desde 2007, quando a Petroenge fechou o primeiro negócio com a estatal, a Petrobras assinou 86 contratos com a empresa, num total de R$ 131,6 milhões, segundo dados da própria estatal, disponibilizados em seu site.

Negócios
Baiano virou sócio da Petroenge por meio de outra empresa de que ele também é sócio, a Hawk Eyes Administração de Bens.

A Hawk Eyes detém 18% do capital da Petroenge, segundo a ficha registrada na Junta Comercial do Rio. Ou seja: Baiano investiu R$ 748,8 mil numa empresa que tem capital de R$ 4,16 milhões, ainda de acordo com a ficha cadastral da empresa.

O sócio majoritário da Petroenge, Guilherme Mendes Spitzman Jordan, foi secretário da Prefeitura de Macaé quando o prefeito da cidade era do PMDB.

Segundo o empresário, Baiano apenas investiu no negócio e não tem qualquer ingerência nos contratos.

Na terça-feira (18), o juiz federal Sergio Moro determinou que o sigilo da empresa seja quebrado.

A Hawk Eeyes, por sua vez, é controlada por uma empresa que tem sede em Londres, no Reino Unido, a Falcon Equity Limited.

Depoimento
Baiano é sócio de outra empresa que deve ter o sigilo bancário quebrado por determinação da Justiça Federal do Paraná: Technis Planejamento e Gestão.

Até o ano passado ele tinha participação na Academia da Praia, um tradicional centro de ginástica na Barra da Tijuca, na zona sul do Rio.

O negócio foi vendido para o grupo Bodytech, que tem entre seus sócios os empresários Alexandre Accioly e João Paulo Diniz.

O lobista está preso na carceragem da Polícia Federal em Curitiba, sede das investigações da Lava Jato, e deve prestar depoimento nesta sexta-feira (21).

Dilma convida banqueiro para a Fazenda e Tombini a ficar no BC

Claudia Safatle - Valor Econômico

BRASÍLIA - O presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, foi convidado pela presidente Dilma Rousseff para ser o ministro da Fazenda do segundo mandato, em substituição a Guido Mantega. Na terça feira Dilma teve um encontro, em Brasília, com Lázaro Brandão, presidente do Conselho de Administração do segundo maior banco privado do país, que é quem tem o poder de afastar obstáculos à continuidade da carreira de Trabuco no banco caso ele aceite o convite e decida, depois, retomar o seu posto.

Alexandre Tombini também foi convidado a permanecer na presidência do Banco Central, no segundo mandato de Dilma Rousseff, com uma clara missão: levar a inflação para a meta de 4,5% até 2016.

Até o momento o Palácio do Planalto não fez qualquer anúncio formal a respeito da composição da equipe econômica a partir de janeiro.

Autoridades do governo disseram ontem que a presidente pretende informar a sua escolha para o comando da política econômica do país quando tiver toda a equipe definida com nomes da confiança do novo ministro. Embora o ex-presidente Lula tenha incluído Trabuco em uma lista tríplice de sugestões à Dilma, fontes bem informadas asseguram que ela própria está conduzindo essas articulações. Dilma tem grande simpatia por Trabuco que, afirmam seus amigos, é uma pessoa exemplar como profissional do mercado financeiro e de fácil trato. Falta, ainda, uma conversa pessoal.

Com uma vida toda dedicada ao Bradesco, Trabuco é o candidato natural à presidência do conselho em substituição a Lázaro Brandão. Essa é uma das razões pelas quais amigos próximos ao presidente do Bradesco têm dúvidas sobre se ele aceitou ou aceitará o convite. Uma alta fonte disse, porém, que "estão enrolando o Trabuco na bandeira nacional", referindo-se ao apelo patriótico a que ele estaria sendo envolvido.

A definição de um nome para o Ministério da Fazenda teria que preencher uma condição: ser um sinal inequívoco de Dilma aos mercados de que seu novo governo dará alguns passos em direção à ortodoxia, abandonando de vez o experimentalismo na gestão macroeconômica e recolocando a política fiscal nos trilhos. Trabuco estaria para o governo Dilma Rousseff como Henrique Meirelles foi para Lula, que assumiu o comando do Banco Central em 2003, em um momento de grande tensão e foi a garantia de racionalidade nas decisões econômicas e de uma convivência mais amigável com os mercados.

Também na terça-feira Dilma reuniu-se por mais de quatro horas com o ex-presidente Lula na Granja do Torto, uma das residências oficiais da Presidência da República em Brasília. Esse foi o segundo encontro entre ambos, o primeiro foi logo após o segundo turno das eleições. Lá estavam o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, o presidente do PT, Rui Falcão, e o governador da Bahia, Jaques Wagner, nome estratégico do novo ministério.

Os temas tratados foram a formação do novo ministério - principalmente a definição do ministro da Fazenda e da equipe econômica - e os desdobramentos da Operação Lava-Jato da Polícia Federal, que apura suspeitas de corrupção na Petrobras.

Dilma foi aconselhada a acelerar a definição do novo ministro da Fazenda para que a nova equipe econômica crie uma agenda positiva e desvie o foco do noticiário dos novos capítulos da Lava-Jato. Se era urgente o anúncio do sucessor de Guido Mantega - diante da crise fiscal e da desconfiança dos investidores - a avaliação agora é de que essa urgência agravou-se, pelo escândalo na estatal e seus reflexos no governo.

A presidente deve divulgar um bloco de nomes até o fim da semana, que além da confirmação de Tombini no BC terá também os novos titulares do Banco Central, do Tesouro Nacional, do Ministério do Planejamento e os presidentes dos bancos públicos. Ninguém espera que cesse, com isso, o noticiário ou a dimensão da ação da Polícia Federal, mas há uma constatação de que a divulgação da nova equipe solucionará uma parte dos problemas de Dilma, a paralisia da economia.

Outra pauta da reunião foi a gravidade da ação que descortinou o esquema de corrupção na Petrobras. A crise é considerada "maior que o mensalão", que devastou os dois últimos anos do primeiro mandato de Lula. O ex-presidente expôs a preocupação com o segundo governo de sua sucessora, e que a marca de partido corrupto manche o PT. Dilma busca um caminho para se descolar da crise e garantir a governabilidade do novo mandato.

Um impasse não solucionado nesta reunião é o lugar de Jaques Wagner no novo ministério. "É a segunda prioridade, depois da equipe econômica", diz um auxiliar presidencial. Convocado por Dilma para a reunião de ontem, ele já se firmou como um dos principais conselheiros, ao lado de Lula e Mercadante. Cotado para diversas pastas - Secretaria de Comunicação Social, Ministério das Comunicações, e de Desenvolvimento, Indústria e Comércio -, a única certeza é que Wagner integra o núcleo restrito de conselheiros presidenciais, e terá protagonismo no segundo mandato.

Lula desembarcou na terça-feira sem alarde, em Brasília. Dilma saiu secretamente do Palácio da Alvorada, em automóvel de vidro escuro, sem o comboio avançado que faz a sua escolta. (Colaborou Andrea Jubé)

Defesa de Alberto Youssef tenta evitar pena de 300 anos

• Para advogado, com delação doleiro pode obter direito a prisão em regime aberto

Germano Oliveira – O Globo

CURITIBA - O advogado Antonio Figueiredo Basto, que representa o doleiro Alberto Youssef, disse ontem ao GLOBO que o doleiro poderia ser condenado a até 300 anos de cadeia, se não tivesse optado pela delação premiada, ou colaboração com a Justiça, como ele prefere se referir ao acordo entre seu cliente e a Justiça Federal do Paraná. A investigação é sobre desvios superiores a R$ 10 bilhões da Petrobras.

Com o acordo, Youssef poderá sair do processo com uma condenação cuja pena ainda não é estimada pelo advogado, mas que pode lhe garantir até a prisão em regime aberto. Ele classifica a delação como um “fato histórico”, pois com ela será possível desvendar um dos maiores escândalos do país. Agora, ela espera que sejam atingidos também os políticos que estavam por trás da corrupção na estatal.

— Beto (como chama o doleiro) era apenas um operador do esquema, assim como Marcos Valério era o operador do mensalão. Se o operador sai, entra outro, e a corrupção continua. Ele não era o mentor da corrupção na Petrobras, pelo contrário. Aliás, meu cliente optou pela colaboração processual exatamente tendo em vista o caso do mensalão, onde o operador pegou uma pena de mais de 40 anos e os políticos pegaram penas bem mais leves, e quase todos já estão em casa. Esperamos que, desta vez, seja o contrário — disse Basto.

Para o advogado, que tem o doleiro como cliente desde 2000, quando negociou também a delação premiada no caso Banestado (Youssef poderia pegar 478 anos de prisão e saiu “zerado”, sem pena a cumprir), seu cliente está ajudando a desvendar a corrupção na Petrobras.

— Meu cliente não é santo, não é herói, mas também não é o demônio que falam por aí, um delinquente. Ele não era diretor da Petrobras, não era funcionário de órgão público ou dirigente de uma empreiteira, que representam todos os elos do esquema de corrupção na empresa. Então, é evidente que tinha muita gente acima dele, muito mais poderosa, que comandava o esquema. E é isso que ele está revelando à Justiça, mas para se defender e não ter que passar o resto da vida na prisão — disse.

Basto lembra que Youssef já responde a quatro ações penais (da Labogem, dos desvios na Petrobras, da lavagem de dinheiro na GDF e no caso da CSA-Dunel), além de uma centena de inquéritos policiais:

— Cada empreiteira denunciada, cada empresário preso, virou um inquérito. São centenas. E em todos está Youssef. Por isso, o acordo de colaboração vai unificar todos os processos, o diminuirá sua pena.

Basto disse que o doleiro também colaborou com o fornecimento de documentos:

— Colaboração não é só de “ouvi dizer”. Tem de apresentar fatos que podem ser comprovados.

O advogado disse que a corrupção na Petrobras tornou-se endêmica e estava se transformando em “ameaça ao estado de direito e à democracia”:

— Era uma roda-viva. A ganância e a intimidação dominaram o Estado, que ficou impassível, sem forças para combater a corrupção. Quem deixa a corrupção sem combate também está contribuindo para a sua disseminação. A Petrobras movimenta bilhões, e isso alimentou o esquema. Os políticos executam obras públicas e precisam do dinheiro para financiar suas campanhas. Os diretores da Petrobras, indicados por partidos políticos, montam o esquema para o desvio desse dinheiro, e Youssef era um dos operadores para lavar esse dinheiro, fazer chegar o dinheiro desviado da empresa para os políticos se manterem no poder.

Dilma se beneficiou do esquema de desvio na Petrobras, diz Aloysio Nunes

Agência Senado

BRASÍLIA – “Eu não diria que a presidente é pessoalmente desonesta. Não diria isso. Mas que ela se beneficiou desse esquema, se beneficiou. Se beneficiou política e eleitoralmente. Ela fez parte de um governo sustentado na lama. E ela nada fez para impedir”.

Esta foi a conclusão do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) em duro discurso em plenário nesta segunda-feira (17) sobre as responsabilidades de Dilma Rousseff no grande esquema de corrupção montado na Petrobras. Para o líder do PSDB, o grande pecado da petista foi ter todos os meios para impedir o funcionamento da engrenagem criminosa, mas nada ter feito para isto.

O senador lembrou que Dilma conhecia bem o funcionamento da Petrobras por ter sido ministra de Minas e Energia, Casa Civil e, logo depois, ter sido eleita presidente da República. Falou também da recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU) em 2009 para o Congresso de paralisar o envio de dinheiro para a superfaturada obra da refinaria de Abreu e Lima. A suspensão foi aprovada, mas vetada pelo então presidente Lula, com ordem encaminhada ao Congresso por Dilma, então na Casa Civil.

Diante do histórico, Aloysio alega ser óbvio que a presidente sabia de tudo o que acontecia. “Quem, durante este tempo todo, comandou este setor no governo do PT? A senhora Dilma Rousseff. Será que ela não sabia, não tinha condições de saber, de acionar os mecanismos de controle da Petrobras? Se não fosse diante de outras circunstâncias, pelo menos diante do aumento exponencial do custo de uma Abreu e Lima, por exemplo, para saber o que estava acontecendo. Ela tinha tudo, mas não fez. Então é responsável”, disparou.

O líder diz não duvidar da honestidade de Dilma. Porém, ao se associar a pessoas desonestas, a petista os ajuda a manter suas práticas ilegais. Assim, acredita que a conduta da presidente se assemelha ao que falou no século XVII do padre Antônio Vieira no célebre Sermão do Bom Ladrão, que teve um trecho na tribuna pelo senador para justificar sua comparação.

“Os seus príncipes são companheiros de ladrões. E por quê? São companheiros de ladrões porque os dissimulam; são companheiros de ladrões porque os consentem; são companheiros de ladrões porque lhes dão postos e poderes; são companheiros de ladrões porque talvez os defendam e, finalmente, seus companheiros porque os acompanham, e hão de acompanhar ao inferno, onde os mesmos ladrões os levam consigo.”

A pequenez da presidente - O Estado de S. Paulo / Editorial

Uma notícia que começa informando que a presidente Dilma Rousseff passou mais de 10 horas reunida com seus conselheiros na residência oficial do Alvorada para tratar do impacto da Operação Lava Jato permitiria supor que finalmente a chefe do governo resolveu mudar de atitude - se não "para sempre", como acredita que a devassa da corrupção na Petrobrás fará com o País, pelo menos para olhar nos olhos a crise que não cessa de se desdobrar. A uma leitura apressada, portanto, Dilma teria compreendido que o escândalo não se esvairá a tempo de preservar o seu segundo mandato, nem, muito menos, poderá ser neutralizado mediante bruxarias destinadas a preservar os interesses das levas de protagonistas que o cevaram. Eis por que, em um assomo de lucidez, teria se trancado com interlocutores de confiança em busca do caminho mais adequado para agir à altura da hora.

Nada disso, evidentemente. Dilma mais uma vez demonstrou que lhe falta imaginação política, para não falar em grandeza moral ou figurino de estadista: na bonança ou sob a tormenta, é a mesma mediocridade, a mesma cegueira, a mesma esperança pueril de que as adversidades se dissiparão por si mesmas e tudo convergirá para o desfrute de mais quatro anos de mando soberano. Pois o que se informa é que o motivo da interminável reunião de anteontem foi preparar uma "agenda positiva" para tirar do centro das atenções a sangria da Petrobrás, que pode ter alcançado entontecedores R$ 21 bilhões, segundo estimativas de um banco americano.
Ou, por alto, 200 mensalões. Depois de exaustiva falação, os convidados da presidente - o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, o seu colega da Justiça, José Eduardo Cardozo, e a estrela em ascensão no Planalto, o governador da Bahia, Jaques Wagner, provável ministro ainda não se sabe do que - parecem ter chegado a uma conclusão momentosa.

Diferentemente do que assessores palacianos não identificados teriam dito à chefe, a trinca avaliou que o anúncio dos primeiros membros do futuro Gabinete, a começar pelo titular da Fazenda, não dariam conta de abafar o incêndio da Petrobrás e de impedir que o fogaréu se alastre ao coração do poder. Tivessem eles concluído o oposto, ou não ter concluído nada, tanto faz. O estarrecedor, o que não pode ser minimizado, é que nenhum dos bravos companheiros da presidente, muito menos a anfitriã, parece ter se enfurnado no Alvorada para descortinar como ela poderia intervir, na condição de chefe de Estado, no escândalo que concentra as atenções nacionais. Estavam todos ali, irmanados na mediocridade, atrás de uma fresta para a qual a presidente deveria correr a fim de ficar ao abrigo dos estilhaços e não pôr em risco o suposto capital político da reeleição. Suposto porque, como se sabe, Dilma saiu apequenada da batalha.

A fragilidade da presidente aumenta na razão direta das denúncias, delações e confissões envolvendo os capitães da empreita brasileira e do acúmulo de evidências de promiscuidade entre eles com antigos e atuais figurões da Petrobrás e dirigentes petistas. O tesoureiro do partido, deputado João Vaccari, encabeça o que decerto se revelará uma lista de apreciáveis proporções. Uma planilha apreendida pela Polícia Federal indica que a cunhada do político teria recebido R$ 244 mil do onipresente Alberto Youssef, o doleiro que, em troca de redução da pena, desencapou o fio da história escabrosa. Numa hipótese caridosa, Dilma simplesmente não sabe o que fazer diante do enrosco. O mais provável, no entanto, é que sabe, mas não se dispõe a fazer, para não derrubar sobre a própria cabeça as colunas do esquema de poder às quais se mantém abraçada. De outro modo, não se explica por que ela ainda não tomou a decisão de trocar toda a diretoria da Petrobrás.

Esta é uma presidente sem estofo. Das manobras de varejo que o jargão planaltino chama de "agenda positiva", embora não seja nem uma coisa nem outra, faz parte o engavetamento das medidas de ajuste das contas públicas, como aumento de impostos. Com a mesma intenção, o ministro Aloizio Mercadante anuncia - agora! - o início das atividades de um grupo de trabalho para estimular a indústria.

Esclarecimento - A respeito do editorial A falta que faz a Lei Anticorrupção, esclarecemos que a referida lei necessita de regulamentação apenas no seu artigo 7.º - e isso não a impede de ser aplicada e produzir efeitos.

Merval Pereira - Roubalheira com método

- O Globo

A tese do advogado Mario Oliveira Filho, que defende o lobista Fernando Baiano, de que não se faz obra pública no Brasil sem propina para políticos, é uma variação da tese genérica que as grandes empreiteiras brasileiras estavam montando para uma defesa conjunta, a de que estavam sendo extorquidas pelo governo.

Com isso, queriam reduzir as suas responsabilidades no esquema desvendado pela Operação Lava-Jato e de corruptoras passarem a vítimas de um esquema político perverso. A defesa de Fernando Baiano, generalizando tanto a praga da corrupção a ponto de dizer que se o empresário "não fizer isso, não tem obra", em qualquer prefeitura do país, mistura alhos com bugalhos.

Se para elas o que interessa é misturar tudo e dar a sensação de que o megarroubo na Petrobras é igual ao de uma prefeitura do interior, para os cidadãos é preciso fazer uma distinção absolutamente essencial. A corrupção generalizada no país não é de hoje, e o fato de ter se espalhado até o mais modesto município brasileiro só mostra que a impunidade fez aumentar a possibilidade de corrupção.

Ao mesmo tempo, há montado na Petrobras, e provavelmente em outras estatais, um esquema corrupto que não é vulgar e que já mostrou suas garras no episódio do mensalão. Em vez de combater a corrupção disseminada, como prometia fazer antes de chegar ao poder, o Partido dos Trabalhadores, ao contrário, aderiu à maneira brasileira de fazer política e transformou-a em um método de dominação do Poder Legislativo e de perpetuação de poder.

Quando Lula disse que no Congresso havia 300 picaretas, em tom de crítica, parecia o líder político que queria mudar a maneira de governar o país. Mas quando chegou sua vez de mostrar a que veio, Lula comandou um governo que institucionalizou a corrupção para garantir apoio político, aperfeiçoando e aprofundando as técnicas que eram usadas naturalmente pelos políticos brasileiros há décadas.

Que havia corrupção na Petrobras muito antes de o PT chegar ao poder, ninguém discute. O que é espantoso é que essa corrupção tenha chegado ao ponto que chegou e tenha se tornado institucional a ponto de o então deputado federal Severino Cavalcanti, alçado à condição de presidente da Câmara em episódio que marca a degradação daquela Casa do Congresso, ter feito em público a exigência de nomear "o diretor que fura poço".

Os 300 picaretas do Congresso já sabiam àquela altura que as diretorias da maior estatal brasileira estavam sendo leiloadas para os partidos políticos da base, com direito a percentagens generosas de todo e qualquer contrato.

Como partido organizado e bem comandado, o PT transformou a roubalheira generalizada em instrumento de controle político, o que deu até a seus integrantes mais ideológicos uma paz de espírito com a desculpa de que agiam assim em nome "da causa". Até mesmo quando parte do desvio vai para seus bolsos privados, a manutenção do "objetivo maior" dá-lhes a certeza de que mereciam cada tostão desviado.

Será preciso separar muito bem o joio do trigo para não se confundir o que é roubo vulgar do esquema político montado às custas do dinheiro público. E se é verdade que as empreiteiras foram extorquidas pelo esquema que o governo controlava, também é verdade que sempre trabalharam dessa maneira, embutindo sobrepreços nas licitações, fosse para compensar a inflação, ou para molhar a mão de um gerentezinho ou do ministro da área.

O que mudou nos anos petistas é que a roubalheira nas principais áreas do governo foi monopolizada pelo esquema político que almeja a hegemonia. É claro que o pequeno empreiteiro do menor município do país continua tendo que pagar propina local, mas este é um problema de impunidade. O que aconteceu na Petrobras é um problema político.

Dora Kramer - O barco a vagar

- O Estado de S. Paulo

As grandes confusões do governo - a condução da economia e a crise na Petrobrás - podem até se constituir nas maiores e mais visíveis, mas não são as únicas fontes de aflição que disseminam uma sensação de desgoverno entre os partidos aliados no Congresso.

Há desconforto, extensivo a ministros, com a permanência das maneiras retraídas (para dizer de modo ameno) da presidente Dilma Rousseff, na desorganização da área política na relação com o Parlamento, na tomada de medidas irrelevantes, atos erráticos e na ausência de posição mais contundente em relação às denúncias que já atingem o atual quadro da Petrobrás.

Tomemos a CPI mista sobre os negócios nebulosos da estatal. Com a ajuda de parlamentares governistas a oposição conseguiu aprovar a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, e mais uma série de convocações que vinham sendo evitadas. Não porque o governo tenha finalmente concordado em desobstruir as investigações, mas porque perdeu o poder de mando na execução da operação abafa.

Nada disso dará mais celeridade e consistência ao que aos trabalhos da Polícia Federal, do Ministério Público e da Justiça. Serve, contudo, para dar visibilidade ao ambiente de bate cabeça que se instalou na base governista.

O "barata-voa" na CPI aconteceu na terça-feira. No mesmo dia, tarde da noite, o governo conseguiu aprovar na Comissão de Orçamento do Senado o projeto que anula a atual meta do superávit fiscal. Ganhou no grito, numa sessão tão vergonhosamente tumultuada e manipulada que a situação concordou em anulá-la para realizar nova votação ontem. Sem contar que a Casa Civil havia se atrapalhado com o pedido de urgência regimental.

A mesma Casa Civil que não dera atenção ao alerta do presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Dias Toffoli, para o fim mandato do juiz responsável pelo exame das contas de campanha da presidente Dilma e depois reclamou da redistribuição do processo porque o escolhido por sorteio foi Gilmar Mendes, considerado um inimigo do Planalto.

Para fechar o ciclo fica a dúvida a respeito da utilidade que tiveram, afinal, as cartas de demissão pedidas aos ministros com pompa de Estado pelo chefe daquela repartição, Aloizio Mercadante.

Lote de peso. Ainda antes da posse em seu primeiro mandato, Dilma Rousseff pediu a dois figurões do PMDB que se reunissem com Paulo Roberto Costa a fim de conversar sobre reforço na sustentação política (originalmente apenas do PP) na diretoria de Abastecimento da Petrobrás.

Na cúpula do partido a história do encontro é conhecida e contada como exemplo de que a presidente não esteve afastada dos acertos de loteamento partidário na estatal como quer fazer crer. Embora não se tenha conhecimento de atos irregulares, no contexto atual em que qualquer contato com Paulo Roberto sugere suspeição, os referidos pemedebistas andam apreensivos de que seus nomes venham a ser citados.

Até porque se encontram sentados nos primeiros escalões do partido e do Planalto.
Fundo do baú. Caso o ex-governador da Bahia, Jaques Wagner, seja nomeado presidente da Petrobrás, estará ocupando o cargo que ambicionava desde a primeira eleição de Lula, em 2002. Na ocasião avaliava que seria o trampolim ideal para se eleger governador.

Acabou indo para o Ministério - primeiro do Trabalho e depois à frente do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social - e chegando ao governo da Bahia em 2006. Na ocasião o comando da Petrobrás ficou com José Eduardo Dutra.

Cotado para presidir o PT, Dutra declinou da oferta e a tarefa ficou com José Genoino, para quem a história não reservou por isso um bom destino.

Luiz Carlos Azedo - Numa perna só

• A blindagem do tripé meta de inflação, superavit fiscal e câmbio flutuante foi rompida após a crise mundial

Correio Braziliense

Não deve ter sido nada fácil a conversa da presidente Dilma Rousseff com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre os rumos da economia. Ambos têm opiniões distintas sobre o que fazer para retomar o crescimento, mas Lula não é economista. É um político pragmático e assistencialista, que confronta para negociar, desde os tempos do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, apesar da retórica radical que adota nas campanhas eleitorais.

Nas eleições de 1994, Lula foi convencido pela professora Maria da Conceição Tavares e seu vice, Aloizio Mercadante, de que o Plano Real seria mais uma tentativa fracassada de acabar com a hiperinflação. Era o franco favorito, mas acabou atropelado pelo ex-ministro da Fazenda de Itamar Franco, o então senador Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que venceu a disputa no primeiro turno e acabou reeleito, em 1998, também no primeiro turno. Tudo porque o Plano Real deu certo.

Desde então, Lula passou a ter um pé atrás em relação a Conceição e a Mercadante. Mas esse nunca foi o caso da presidente Dilma, que foi aluna dos dois petistas na Unicamp. No primeiro mandato de Lula, nas reuniões ministeriais, Dilma era quem enfrentava o então ministro da Fazenda, Antônio Palocci, e o presidente do Banco Central à época, Henrique Meirelles.

Gostava de fazer contas no celular e contestar Palocci, que muitas vezes ficava sem argumentos convincentes porque é médico e não tinha condições de sustentar tecnicamente certos pontos de vista. Foi o caso da famosa proposta de zerar o deficit nominal e limitar a expansão do gasto público a um indicador abaixo do PIB. Dilma classificou a proposta de rudimentar. Palocci, porém, perdeu a guerra por causa da quebra do sigilo do caseiro Francenildo; para seu lugar foi Guido Mantega.

A blindagem do tripé meta de inflação, superavit fiscal e câmbio flutuante foi rompida após a crise mundial, que resgatou do ostracismo os economistas keynesianos, que vêem o Estado como agente indispensável de controle da economia e defendem o pleno emprego. Segundo a Teoria geral do emprego, do juro e da moeda, de Lord John Maynard Keynes, o ciclo econômico não é autorregulado, mas determinado pelo “espírito animal” dos empresários. Nesse sentido, o Estado tem o direito e o dever de garantir elevação do salário mínimo, do seguro-desemprego, da redução da jornada de trabalho e da assistência médica gratuita.

Sem tripé
Diante da crise, Mantega e Dilma convenceram Lula de que a melhor saída era a adoção das políticas keynesianas, que chamaram de “anticíclicas”. Mantega tirou da cartola o programa Minha Casa, Minha Vida, com investimentos maciços em um setor que movimenta a economia e emprega muita mão de obra, ou seja, com grande “efeito multiplicador”. De igual maneira, o setor automobilístico foi anabolizado com desonerações tributárias e oferta de crédito para compra de automóveis.

Com adoção de outras medidas, essa estratégia garantiu um crescimento do PIB da ordem de 7,5% em 2010, último ano de governo Lula, que conseguiu fazer de Dilma, até então considerada um “poste de saias”, a primeira mulher a presidir o Brasil. Findo o primeiro mandato, porém, o resultado da expansão dos gastos públicos e da leniência com a inflação é o crescimento zero. Mesmo assim, Dilma foi reeleita, porque garantiu os aumentos reais de salário e a preservação dos empregos, além de ampliação da política de transferência de renda para as camadas mais pobres da população.

Entretanto, Dilma ainda não disse a que veio em matéria de economia. Entra no segundo mandato pulando numa perna só, pois o tripé da economia foi para o espaço. A meta de inflação de 4,5% nunca foi levada a sério, o governo mira é o teto de 6,5%. O governo pretendia economizar R$ 100 bilhões, depois reduziu a meta para R$ 50 bilhões. Fechou o ano com o déficit de R$ 25 bilhões, que é uma violência contra a Lei de Responsabilidade Fiscal.

O que pretende o governo? Acabar com a meta de superavit fiscal, para não incorrer em crime de responsabilidade, mas precisa mudar a lei no Congresso. Ontem, a oposição conseguiu derrubar a proposta na Comissão Mista de Orçamento, porém, o governo não desistiu desse objetivo. Mercadante jogou nas costas da oposição a responsabilidade pela manutenção da meta de superavit fiscal proposta anteriormente pelo próprio governo, com o argumento de que isso representará recessão e desemprego. Ou seja, o governo quer dobrar a aposta.

É nesse cenário que a presidente Dilma e o ex-presidente Lula tentaram chegar a um nome de consenso para o Ministério da Fazenda. Está difícil.

Rogério Gentile - A lei do silêncio dos advogados

- Folha de S. Paulo

As revelações sobre o Petrolão têm preocupado não apenas políticos e executivos de empreiteiras, mas também advogados importantes que, normalmente, ganham muito dinheiro quando surgem escândalos de corrupção.

O motivo é a tal "delação premiada", mecanismo pelo qual vários acusados, entre os quais o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, estão entregando colegas, corruptos e corruptores, em troca da redução de suas penas.

Basicamente, reclamam que as acusações feitas mediante recompensa não merecem crédito uma vez que o delator não tem compromisso com a verdade, mas com a sua sobrevivência --falaria qualquer coisa para melhorar a própria situação. Além disso, dizem que não é ético o Estado barganhar com um criminoso.

Utilizada em países como EUA, Itália e Alemanha, a delação premiada é um instrumento incorporado há relativamente pouco tempo no sistema jurídico do Brasil. Teve origem nas Ordenações Filipinas, que vigorou de 1603 até o Código Criminal de 1830, e serviu, por exemplo, na Inconfidência Mineira --Joaquim Silvério dos Reis teve dívidas perdoadas para trair seus companheiros. Somente a partir da década de 1990 leis com esse espírito foram aprovadas.

É claro que o testemunho dos "pentitos", como são chamados na Itália os mafiosos arrependidos, feito sob a expectativa de um prêmio, precisa ser confirmado por investigações. Sem documentos ou novas provas, não podem servir de base para condenações. Mas o fato é que, sem esse tipo de instrumento, muitas vezes, não há como se quebrar a couraça das organizações criminosas.

A despeito de sinceros pruridos éticos e preocupações sobre a delação premiada, há em grandes escritórios uma indisfarçável motivação corporativa. Quem está disposto a falar não precisa, evidentemente, pagar verdadeiras fortunas a advogados brilhantes e bem relacionados no Judiciário para defendê-lo.

Jarbas de Holanda - Petrolão fragiliza mais o fim e o começo dos governos Dilma

Os desdobramentos dos últimos dias do petrolão, bem como a expectativa da revelação dos políticos e das campanhas eleitorais que, segundo as investigações, se beneficiaram das propinas cobradas e pagas em troca dos contratos de obras e serviços, ademais de acentuarem os enormes danos sofridos pela Petrobras (o grande prejuízo do represamento populista do preço dos combustíveis, desde 2011, e a forte deterioração da imagem e das ações e credibilidade nos mercados interno e externo), ademais disso agravam os efeitos da sucessão de dados macro e microeconômicos nega􀆟vos das fases pré e pós eleições de outubro. E ampliam as dificuldades políticas e institucionais da presidente Dilma para fechar seu primeiro governo, e para reverter o crescente ceticismo social e o dominante pessimismo da iniciativa privada, em especial dos investidores, em relação ao segundo mandato. Pessimismo que ela poderia ao menos reduzir rendendo-se à necessidade de mudança crível dos objetivos e da condução da economia (o que até agora tem-se recusado a fazer).

Aos dados e indicadores que justificam tais ceticismo e pessimismo (dos que não puderam ser escondidos antes das eleições, como o PIB próximo de zero, a inflação no teto da meta, e daqueles que só depois se impuseram, como a elevação dos juros, mais correções de tarifas elétricas e aumento dos combustiveis, a esses dados juntaram-se mais recentemente os relativos ao rombo das contas públicas, que o Palácio do Planalto teve de assumir, e a escalada do desemprego na indústria, reconhecida pelo ministério do Trabalho. Quanto ao rombo das contas de 2014, o superávit primário de 1,9% converteu-se num déficit fiscal que analistas já avaliam entre - 0,3% e - 0,5% do PIB. Conversão que constitui ostensivo desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal. Para o que o Executivo tenta conseguir o aval do Congresso, usando a chantagem da liberação, ou do bloqueio de emendas parlamentares.

Mas a obtenção do aval poderá ter um custo maior que o dessa liberação, pois é tentada no contexto de novas condicionantes das relações do governo com o Legislativo, mesmo com o atual. Entre as quais se destacam: o fortalecimento social e político da oposição, o desgaste do lulopetismo, nesses dois planos, e o adensamento da contraposição a ele – e de independência diante do Executivo – por parte da bancada do PMDB na Câmara dos Deputados, com o respaldo das dos aliados não esquerdistas. Adensamento que aponta para uma divisão dos peemedebistas, na qual crescente parcela de parlamentares, inclusive senadores, buscarão alternativas à postura do núcleo dirigente da legenda de aliança com o governo e o PT: uma candidatura presidencial própria em 2018 ou um acordo com a oposição liderada por Aécio Neves. Tudo isso estimulado pelo agravamento dos problemas da economia e pela pobreza das perspectivas de um segundo governo Dilma.

Cabendo assinalar, para concluir, que as relações entre o Executivo e as duas casas do Congresso, assim como atos importantes destas no início da próxima legislatura (como as eleições de suas mesas e a montagem de uma verdadeira CPMI sobre o megaescândalo da Petrobras), vão depender de outra condicionante político institucional de peso: novos desdobramentos das investigações desse megaescândalo. Com potencial de amplo comprometimento de figuras-chave da máquina estatal e da base parlamentar de sustentação dos três governos dirigidos pelo PT.

Jarbas de Holanda é jornalista

Murillo de Aragão - Mais além do petrolão

- O Estado de S. Paulo

Os acontecimentos decorrentes das investigações do petrolão estão abalando as estruturas da política nacional. É certo dizer que nada, nada será como antes, depois do escândalo. As mudanças que deverão ocorrer vão se relacionar sobretudo com a forma como empresas privadas, empresas estatais e políticos se relacionam. E, também, com o modo de financiar partidos e campanhas.

Sergio Lazzarini, em seu livro Capitalismo de Laços (Elsever), descreve de forma clara como funciona o modelo no País. O mundo político opera como grande agente dos interesses privados na obtenção de contratos de obras públicas e de fornecimento para empresas estatais.

No caso da Petrobrás, a aliança ia além da obtenção de obras e contratos. Envolvia apoio político na obtenção de financiamentos públicos. Afinal, o crédito no Brasil sempre foi escasso e conseguir recursos nos bancos públicos quase sempre dependeu de influência política. Em contrapartida, o mundo privado financiava o mundo político. De acordo com as regras e, infelizmente, fora delas. No entanto, o petrolão pôs o modelo vigente em xeque.

A questão das operações feitas de acordo com a lei já está posta juntamente com a discussão sobre a imposição do financiamento público de campanhas, que não é a melhor solução para a democracia no Brasil. Devemos avaliar com urgência o teto de despesas nas campanhas. Em sendo exclusivo de uma fonte, o melhor é que seja feito apenas por cidadãos; o financiamento público exclusivo afastará ainda mais o político e os partidos da sociedade.

Porém o que o petrolão traz à tona é o desvio de recursos para políticos e partidos por conta da obtenção de contratos na esfera pública. Ou seja, o papel de intermediação ilícita que alguns no mundo político fazem em favor de interesses privados, e recebendo por isso, seja para fins de enriquecimento próprio, seja para o financiamento de esquemas políticos. Prática mais antiga do que o guaraná de rolha!

Pois bem, mesmo que o escândalo ficasse apenas no que já se sabia antes da prisão de executivos das empresas envolvidas e de mais um ex-diretor da Petrobrás, o efeito no sistema político nacional já seria devastador. Simplesmente porque muitas empresas não estarão mais dispostas a correr o risco de financiar, por baixo dos panos, políticos e partidos, já que o modelo não é sustentável, além de ser ilegal, imoral e injusto.

Para piorar a vida dos que abastecem os esquemas, o julgamento do mensalão revelou ao mundo privado que o mundo político não tem condição de proteger seus cúmplices. Alguns políticos punidos no caso já estão cumprindo suas penas em casa. Já os "não políticos", como Marcos Valério e Kátia Rabello, vão amargar na cadeia por muitos anos. Se tivessem feitos acordos de delação estariam em situação muito melhor.

O escândalo do petrolão aprofundou uma tendência do mensalão: a de buscar não apenas os operadores dos esquemas, mas também seus financiadores e, em especial, seus beneficiários. A combinação do exemplo do mensalão com as linhas de investigação do petrolão é crítica para estimular a sucessão de delações que estão ocorrendo e ampliar as consequências do escândalo a níveis inesperados.

Mas não é tudo. O petrolão tem uma dinâmica adicional, que é a investigação internacional da Securities Exchange Commission (SEC) dos Estados Unidos, que poderá resultar em punições para os envolvidos. Sabemos que as autoridades americanas estão coletando informações sobre o episódio. No limite, a Petrobrás - que é listada na Bolsa de Nova York - poderá ser punida com multas e seus diretores e conselheiros, processados criminalmente e até mesmo inabilitados para dirigir empresas de capital aberto listadas em bolsa nos EUA.

Combinando as investigações atuais com as futuras investigações no Supremo Tribunal Federal (STF) e, ainda, com as investigações internacionais, temos o petrolão num nível de escândalo jamais visto na História do País. Algo de proporções monumentais e com repercussões profundas. Dizem que já chega a 70 o número de políticos que serão julgados no STF por causa desse caso. É um número extravagante!

As consequências das investigações já estão sendo sentidas. O Congresso está temeroso do impacto do que vem por aí. O governo está em voo cego e com poucos instrumentos para a reforma ministerial, pois tudo depende da lista de investigados. Na prática, o critério número 1 é não estar na lista, que pode crescer com novas delações. Até a total divulgação dos envolvidos, a reforma ministerial deve dar-se em espasmos.

Outras consequências poderão ser sentidas. Caso não se firme um acordo de leniência, as obras públicas com as construtoras envolvidas podem ser paralisadas. Seria mais ou menos o que aconteceu com a Construtora Delta, só que em proporções maiores. Além dos efeitos na paralisação das obras de infraestrutura, poderemos ter repercussões no emprego de milhares de trabalhadores. Não é trivial.

Partidos poderão ter importantes lideranças políticas inviabilizadas ou profundamente limitadas em suas carreiras. Dezenas de parlamentares simplesmente se transformariam em fichas-sujas. Quem vai sobrar para coordenar o espólio do petrolão? Quais as repercussões para a governabilidade?

Considerando todos os aspectos, o episódio demanda das instituições públicas e privadas e de nossas lideranças civis e governamentais imensa responsabilidade e cautela. Isso não significa acobertar malfeitos, e sim buscar o equilíbrio necessário para que a justiça seja feita de forma republicana. Sociedade e políticos terão de fazer uma ampla reflexão sobre como financiar a política e sobre como impedir que escândalos como o do petrolão se repitam.

*Murillo de Aragão é advogado, mestre em Ciência Política, doutor em Sociologia pela UNB e autor do livro 'Reforma Política - o Debate Inadiável'