sexta-feira, 3 de julho de 2015

Bernardo Mello Franco - Aperte o cinto, a base sumiu

- Folha de S. Paulo

A semana forneceu novos exemplos do desmanche acelerado da base parlamentar de Dilma Rousseff. Em dois dias, a presidente sofreu duas derrotas duríssimas no Congresso. O Senado aprovou o aumento dos servidores do Judiciário, e a Câmara abriu caminho para a redução da maioridade penal.

Em ambos os casos, o Planalto perdeu de lavada. No Senado, o PT ficou isolado, e o massacre tomou proporções épicas: 62 votos a 0. Dilma vai vetar o reajuste bilionário, mas corre o risco de ter a decisão derrubada pelo Legislativo.

A bomba orçamentária foi detonada com o apoio de nada menos que oito partidos que comandam ministérios: PMDB, PDT, PP, PR, PSD, PTB, PRB e PC do B. A tropa de infiéis é tão grande que não faz mais sentido falar em traição. A palavra que resume a nova atitude das siglas em relação a Dilma é abandono.

Com a presidente batendo recordes de impopularidade, sumiram os aliados dispostos a se sacrificar por ela. Bastam algumas buzinas para que qualquer grupo de servidores passe a ter mais força que o Planalto em votações importantes.

Criou-se uma equação boa para os partidos e ruim para o governo. Como Dilma não tem condições políticas para demitir ministros, as siglas continuam a se lambuzar de verbas sem apoiá-la. Casos pontuais, como as MPs do ajuste fiscal, são negociados no balcão de secos e molhados do vice Michel Temer.

Quando Marina Silva decolou na campanha de 2014, Dilma assombrou o eleitor com a ameaça de que a rival não teria maioria para governar. "Sem apoio no Congresso, não é possível assegurar um governo estável, sem crises institucionais", afirmou, em debate no SBT.

No dia seguinte, a propaganda petista comparou a adversária a Jânio e Collor, presidentes que tentaram governar sem maioria e não conseguiram completar o mandato. Marina perdeu, mas o fantasma agora se volta contra Dilma.

Rogério Furquim Werneck - Risco de rejeição

- O Globo

• Na farra fiscal de 2014, a presidente apostou na leniência do Tribunal de Contas da União

Afirmar que a presidente vem passando por longo período de inferno astral seria atribuir aos astros culpa que não lhes cabe. Dilma está apenas colhendo o que plantou. E, nessa colheita farta, vem mostrando espantosa capacidade de tornar cada revés bem mais desgastante do que poderia ser.

Sem ir mais longe, basta ter em conta seu destempero diante de novas delações que deixaram o Planalto especialmente irritado. A presidente se permitiu comparar os delatores da Lava-Jato a Joaquim Silvério dos Reis, suposto alcaguete da Inconfidência Mineira, figura que, no imaginário brasileiro, representa o arquétipo do traidor desprezível. Não lhe ocorreu que tal comparação ensejaria imediata indagação sobre a razão pela qual o Planalto viu traição tão grave na delação de Ricardo Pessoa.

Em meio às suas muitas atribulações, a presidente terá de encaminhar ao Tribunal de Contas da União (TCU), até meados de julho, explicações que possam evitar que suas contas de 2014 sejam rejeitadas. Os apuros do governo no TCU vêm sendo bem cobertos pela mídia. Mas a questão tende a ser percebida como matéria árida, de digestão difícil para leigos. A aridez dos detalhes, contudo, em nada impede percepção clara da essência dos problemas que o governo vem enfrentando no Tribunal.

É preciso não perder de vista o quadro mais amplo que acabou dando lugar a tais problemas. É mais do que sabido que, no ano passado, a condução da política econômica foi inteiramente pautada pelas prioridades da campanha de reeleição da presidente Dilma. No caso da política fiscal, o atrelamento às urgências da campanha eleitoral foi particularmente inconsequente. E exigiu precária conciliação, ainda que por poucos meses, de dois movimentos patentemente conflitantes.

De um lado, o governo se permitiu uma farra fiscal sem limites, quando já não cabia mais dúvida sobre a extensão da devastação que vinha ocorrendo nas contas públicas, na esperança de que isso pudesse mascarar a rápida desaceleração do crescimento da economia. De outro, fez o possível para maquiar as contas públicas e impedir que o eleitorado tomasse conhecimento em tempo hábil das reais proporções dessa devastação.

Apesar de todos os sinais de que a política econômica era insustentável e das pressões, inclusive de parte do próprio PT, para que a equipe econômica fosse mudada, a presidente insistiu em manter a mesma tripulação até o último momento. No sufoco de uma campanha que se desdobrou em dificílimo segundo turno, a candidata entendeu que não poderia prescindir de uma equipe fazendária que não titubeasse diante da necessidade de levar adiante, a qualquer custo, a gestão fiscal que a campanha eleitoral parecia requerer.

Por irresponsável que tenha sido, a aposta de Dilma foi coroada de sucesso. A presidente acabou reeleita. E, como estelionato eleitoral não é crime, conquistou mais quatro anos de mandato. Mas o diabo mora nos detalhes. Na história dos grandes golpes supostamente perfeitos não faltam casos de quem acabou apanhado por se ter esquecido de um pequeno detalhe.

Na pressa e na euforia da campanha eleitoral, Dilma esqueceu-se da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Ou talvez tenha simplesmente confiado na leniência passada do TCU com infrações anteriores, sem dar a devida atenção ao fato de que, desde que a LRF foi aprovada, em 2000, nunca houve nada parecido com o descalabro fiscal que se viu em 2014.

Entre os muitos problemas agora detectados, o TCU acusa o governo de, no afã de maquiar as contas de 2014, ter deliberadamente permitido que o Tesouro recorresse a vultosos financiamentos de instituições financeiras federais, em séria violação da Lei de Responsabilidade Fiscal.

A se julgar pelas explicações esfarrapadas que vêm sendo alinhavadas pelo governo, é bem possível que a presidente acabe tendo suas contas rejeitadas pelo TCU. O que a deixaria perigosamente exposta à confirmação da rejeição das contas pelo Congresso.

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Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio

Celso Ming - Sem data para a virada

- O Estado de S. Paulo

• A pergunta cuja resposta vale mais de 1 milhão de dólares consiste em saber quando afinal a economia brasileira começará seu processo de recuperação

A presidente Dilma vinha declarando que o ajuste é passageiro e que dentro de pouco tempo - não disse quanto - a inflação será recolocada nos trilhos e que o crescimento voltará, sólido e sustentável.

As autoridades da área econômica garantiam mais ou menos a mesma coisa. Mas tudo ficou pior, os indicadores econômicos não apontam para nenhuma recuperação imediata e o início da retomada vai sendo adiado à medida que o ano avança.

Esqueletos fiscais e os efeitos das pedaladas aparecem todos os dias, o cumprimento da meta fiscal deste ano está cada vez mais improvável, as projeções do PIB encolhem, pouca gente acredita em que a inflação convergirá para a meta de 4,5% ao final de 2016, como insiste o Banco Central, e o mercado de trabalho, medido pelas estatísticas de emprego, está em franca deterioração.

O problema é que não dá para exigir a observância de cronograma de recuperação. Estados Unidos e Europa há quase oito anos tentam deixar a crise para trás e ainda não conseguiram voo de cruzeiro. Com a queda dos preços das commodities e o mercado internacional tão arredio, como o de agora, a volta por cima do Brasil também ficou mais difícil.

A mola que falta para a arremetida do fundo do poço é o investimento. A Petrobrás, cujos investimentos corresponderam a 8% de toda Formação Bruta de Capital Fixo do Brasil em 2014, acaba de cortar em quase 40% seu plano de negócios. As empreiteiras, paralisadas pela Operação Lava Jato, também não conseguem mais se apresentar para o jogo. E, mesmo depois de anunciado com foguetório, o Programa de Investimento em Logística 2015-2018 não consegue decolar.

A presidente Dilma é a primeira a reconhecer que os obstáculos são grandes. Entre eles está a excessiva lentidão das instituições de proteção ambiental em despachar certificados de licenciamento.

O que de alentador nesse panorama cinzento se pode dizer é que a recessão não produz apenas estragos. Começa a mostrar resultados positivos. A queda do consumo derrubou em 18,5% as importações do primeiro semestre (em relação ao primeiro semestre de 2014) e contribui com força para que a balança comercial volte a mostrar saldos positivos. E, como ficou apontado nesta Coluna no domingo, a queda do consumo de energia elétrica é o principal fator que afasta o risco de um apagão ou de um racionamento.

Mais cedo ou mais tarde, os tarifaços também mostrarão sua força saneadora. O setor de energia elétrica está em franca recuperação. O mesmo se pode falar do caixa da Petrobrás . Outra consequência positiva do reajuste das tarifas de energia elétrica e de combustíveis é a recuperação da arrecadação dos Estados e municípios, na medida em que a participação desses dois produtos no ICMS é muito importante.

Pode ser pouco. Mas esses sinais têm de ser vistos como os primeiros passos ainda inseguros do paciente que está dispensando a cadeira de rodas.

Míriam Leitão - Decisões da Petrobras

- O Globo

A Petrobras poderá refazer contratos com as empresas investigadas na Operação Lava-Jato, desde que elas se submetam aos critérios de transparência e fiscalização que a petrolífera adotará, segundo o presidente Aldemir Bendine. Ele disse que a estatal está estabelecendo esses novos termos de contratos. As empreiteiras só serão impedidas caso sejam condenadas.

- Estamos estabelecendo novos critérios da relação com fornecedores e de compliance (obediências às regras). Se as empresas, hoje suspensas, se submeterem, podem continuar trabalhando com a Petrobras. Se elas forem condenadas, ficarão inidôneas e, então, não poderão mais ser fornecedoras — disse Bendine. A Petrobras está em uma fase de redução de investimentos, metas de produção mais realistas, revisão da relação com fornecedores e venda de ativos. Na entrevista que fiz com Aldemir Bendine, e que foi ao ar na Globonews, ele comentou que a abertura de capital da BR Distribuidora poderá ser feita tanto através da busca de um sócio nacional ou estrangeiro, quanto através de um IPO, lançamento de um bloco de ações ao mercado. Ou uma combinação das duas formas. Bendine já fez uma operação bem sucedida no Banco do Brasil, quando vendeu ações da BB Seguridade. Quer repetir o modelo na BR. Perguntei se ele achava que este seria um bom momento do mercado, e ele disse que sim.

A Distribuidora tem 37% do mercado brasileiro, e quase oito mil postos de combustíveis. Isso a faz um ativo atraente. O presidente da Petrobras acha que a entrada de novos sócios ajudará inclusive na governança. Os preços dos combustíveis poderão aumentar, segundo ele, dependendo das condições de mercado. Ponderou que agora não é necessário porque a venda dos combustíveis continua sendo lucrativa. Perguntei sobre a avaliação de alguns analistas de que recentemente a empresa voltara a operar com prejuízo na venda da gasolina. Bendine negou, dizendo que os analistas não consideram todas as variáveis. Oque ele disse, ao lançar o novo plano de negócios, é que os preços internos seguiriam as cotações internacionais, mas que não seria repassada a volatilidade. Perguntei que diferença havia entre o que ele estava dizendo e o que dizia — nesses mesmos termos —o ex -presidente José Sérgio Gabrielli. Na época de Gabrielli, a empresa acumulou grande prejuízo com a defasagem de preços.

Evitando comparação com outras administrações, Aldemir Bendine disse, no entanto, que a empresa ser á livr e para definir os preços dos combustíveis e que mensalmente vai avaliar todas as variáveis que entram na composição do custo . Deu um exemplo de que tipo de volatilidade ele não re passaria: — Ontem mesmo (terça-feira), o Brent caiu 5% de uma forma inesperada. Isso não me faria reduzir o preço imediatamente. Caso ele tenha independência na formação de preços , será a primeira vez, porque os antecessores tiveram que esperar autorização de Brasília. O presidente explicou que agora a formação do conselho mudou, e há apenas pessoas de for a do governo. Bendine disse que é contra a proposta de mudar o marco regulatório do petróleo agora, argumentando que ela tem sido discutida no Congresso pelas dificuldades conjunturais da Petrobras.

Mas admite que, se houvesse hoje um leilão de pré-sal, a companhia não teria como acompanhar. Pela lei que regulamenta a exploração do pré- sal, a estatal tem que ter 30% de todos os campos. Se tivesse que comprar, não teria caixa. A prioridade é reduzir o endividamento e por isso está diminuindo investimento e vendendo ativos. Perguntei se ele achava possível que o comando executivo da empresa e o conselho de administração não tenham tido conhecimento da corrupção que ocorreu na Petrobras. Segundo Bendine, a estatal tinha uma estrutura de decisão muito verticalizada e que agora está sendo re formulada para que o processo decisório passe por um colegiado. Ponderei que se as decisões eram concentradas no comando, mais uma razão para que a diretoria soubesse . Bendine defende que a corrupção ficou restrita àquelas diretorias nas quais foram encontrados desvios. E pediu, novamente, um voto de confiança para a companhia neste momento .

Claudia Safatle - Um piquenique na boca do vulcão

- Valor Econômico

• A economia vai mal e a situação política vai de mal a pior

Está pior. Encerrado o primeiro semestre, a situação da economia se mostrou mais grave do que era imaginado no início do novo mandato de Dilma Rousseff. E o esgarçamento das condições políticas é, também, maior do seria razoável supor em janeiro.

A inflação esperada para 2015 pelo grupo de instituições que mais acerta nas pesquisas do Banco Central era de 6,4%. Hoje, a expectativa está na casa dos 9%. A elevação estimada da taxa Selic para o ano é de 14,25%, em comparação com 12,50%, conforme a expectativa no início de janeiro. A despeito de todo o aumento dos juros, "a alta da Selic de janeiro a junho ainda é inferior à surpresa inflacionária", apontou uma autoridade do governo.

As condições fiscais estavam mais deterioradas do que a equipe que assumiu o Ministério da Fazenda poderia cogitar. Nessa área, as informações foram chegando aos poucos e só após um par de meses é que se teve acesso ao quadro completo. A divulgação do déficit primário de 2014, de 0,64% do PIB, foi precedida do estabelecimento da metas de superávit para este ano, de 1,1% do PIB e para no mínimo 2% nos anos seguintes. A meta, porém, ficou ambiciosa diante da queda real das receitas em uma economia que afunda. Previa-se, no início do ano, uma contração de 0,5%. A recessão, porém, é mais acentuada e pode chegar a menos 2%.

A dívida bruta do setor público - principal indicador de solvência do país - prossegue em ascensão. Era de 58,9% do PIB no encerramento de 2014 e chegou a 62,5% do PIB em maio. O déficit nominal, que era de 6,29% do PIB no início do exercício, em maio subiu para 7,9% e o superávit primário originalmente concebido não se realiza.

O desemprego aumenta em ritmo acelerado, a renda média do trabalho está em queda, a oferta de crédito secou e o país está à beira de novo rebaixamento do rating concedido pelas agências internacionais. Se isso ocorrer, ficará a um passo de perder o grau de investimento, evento que geraria forte desvalorização cambial, reacenderia as pressões sobre a inflação e levaria a um redobrado aperto fiscal e monetário.

A confiança dos agentes econômicos, que precederia à expansão dos investimentos, não se recuperou e os investimentos seguem em queda pelo sétimo trimestre consecutivo.

Um atenuante no quadro de dificuldades é a expectativa de inflação para 2016 em diante que, por força da elevação dos juros, não foi contaminada pelo aumento da inflação deste ano. A taxa Selic deve aumentar mais 0,5 ponto percentual.

Do Congresso saíram nas últimas semanas decisões na direção exatamente oposta ao esforço de ajuste das contas públicas. A sequência de medidas começou com a mudança no fator previdenciário. Em seguida o parlamento aprovou a indexação dos benefícios acima de um salário mínimo ao reajuste legal que vai prevalecer para o mínimo. Esta semana adicionou uma fatura de R$ 25 bilhões na folha de salários da União, nos próximos quatro anos, ao aprovar o reajuste reivindicado pelo Judiciário. E, ao adiar a votação da revisão das desonerações, subtraiu mais R$ 1 bilhão do caixa do Tesouro Nacional.

Diante das frustrações de receitas, o governo deverá reduzir a meta de primário para este ano este e a oportunidade para fazer isso é quando o Ministério do Planejamento divulgar a avaliação bimestral de receitas e despesas, este mês.

"Estão fazendo piquenique na boca do vulcão", comentou uma alta fonte do governo, referindo-se à destreza do Congresso em aprovar novos gastos enquanto as contas públicas não fecham. "Não podemos flertar com a espiral negativa", advertiu um ministro, ao comentar a aprovação do insustentável reajuste médio de 58% para o Judiciário.

A área econômica argumenta que dispõe dos instrumentos necessários para tirar a economia brasileira do buraco em que se meteu por erros de políticas do passado recente, mas, para utilizar o amargo remédio na dosagem necessária, o Palácio do Planalto teria que ter respaldo político do Congresso. "É preciso um consenso político para a solução das dificuldades econômicas", disse o ministro.

Se a situação da economia é ruim, a da política é dramática. E ainda não chegou agosto - mês considerado aziago na história do Brasil. As conversas travadas com grande naturalidade nos partidos da base aliada indicam que o governo Dilma, cuja aprovação caiu para apenas 9% segundo pesquisa do Ibope, tem um prazo de validade. A data é outubro. Até lá os parlamentares pressupõem que vai estar claro para onde a economia está indo.

Se não houver indícios de recuperação da atividade e o desemprego continuar aumentando, haveria duas saídas concebidas por lideranças políticas: deixar Dilma na Presidência sob a tutela do PMDB, com anuência do ex-presidente Lula; ou uma solução mais extremada como o "impeachment", levando o vice-presidente Michel Temer à Presidência da República.

Essas articulações já chegaram ao Palácio do Jaburu, residência oficial do vice-presidente, e o grande problema para a eventualidade de um processo de "impeachment" seria a falta de um acordo entre Lula e Temer para a sucessão em 2018. Encontrar motivação jurídica para um processo dessa natureza não seria problema, asseguram interlocutores qualificados.

A tranquilidade com que se trata de assuntos dessa gravidade é um sinal preocupante da ansiedade com que se aguarda o "pós-ajuste", quando o ajuste em si está apenas no começo e cheio de tropeços. A visão prematura de passar logo do estágio de aperto para notícias positivas, como tem reivindicado o ex-presidente Lula, mostra que a condescendência política com o governo Dilma Rousseff é limitada e a compreensão dos processos de ajuste econômicos, também.

Uma das questões que aflige a área econômica é que todas as iniciativas que olham para o pós-ajuste, singelas ou ousadas, representam gasto de dinheiro inexistente no Tesouro Nacional. São incentivos para uns, isenções para outros ou financiamentos a juros subsidiados para terceiros, como se depois de um rápido esforço de contenção do déficit fosse possível voltar a ter farto acesso ao dinheiro público.

Potências europeias querem derrubar governo grego, diz economista

Eleonora de Lucena – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - James Galbraith fala diariamente com Yanis Varoufakis, ministro grego das finanças. Seu diagnóstico é contundente: as potências europeias querem derrubar o governo da Grécia, que não aceita implantar mais medidas de austeridade, e substituí-lo por um comando mais complacente.

Professor da Universidade do Texas em Austin (EUA) e autor de "The End of Normal", o norte-americano elaborou com o colega grego um novo projeto de "New Deal" para a Europa.

Descartando a saída grega do euro, ele defende o "Não" no plebiscito do próximo domingo. "A independência do país está em jogo", diz.

Para Galbraith, 63, o atual momento lembra o que antecedeu a Primeira Guerra Mundial, em agosto de 1914, e o Tratado de Versalhes, de 1919. "A política vingativa das potências em relação à Grécia vai envenenar toda uma geração contra a Europa", afirma.

Veja abaixo entrevista concedida por Galbraith à Folha.

Folha — Quais são as possíveis consequências da atual crise na Grécia?

James Galbraith — Nesse momento, as potências europeias estão esmagando Grécia de todas as maneiras possíveis. Claramente, elas pretendem derrubar o governo eleito da Grécia e substituí-lo por um governo mais complacente.

Qual deve ser o voto no próximo domingo? Se você fosse grego, como o sr. votaria?

Eu certamente votaria "Não". A independência política do país está em jogo.

A Grécia deve sair do euro?

Não. Não há nenhum mecanismo legal que possa forçar a Grécia a sair, e o país não vai deixar voluntariamente o euro sob este governo.

Quais seriam as consequências políticas e econômicas de uma saída da Grécia do euro?

As consequências da política vingativa das potências europeias em relação à Grécia serão muito graves. Ela vai envenenar toda uma geração contra a Europa e encorajar partidos anti-europeus. Incluindo, especialmente, a Frente Nacional, na França.

Em qual dimensão essa crise pode afetar o projeto de Europa?

A liderança europeia parece inclinada a sacrificar a Europa para o seu próprio projeto de controle político e financeiro.

Como o sistema bancário europeu deve reagir a esta crise? Há risco de quebras?

O Banco Central Europeu pode lidar com o sistema bancário e poderia também ter protegido os bancos gregos se não se guiasse por forças políticas para destruí-los.

Há paralelos entre a situação grega atual e Argentina no início do século 21?

Possivelmente.

Há paralelos entre a situação atual e a que antecedeu a Primeira Guerra Mundial?

Certamente. O momento lembra agosto de 1914, quando a Europa tombou em uma guerra destrutiva. Também se assemelha à "Paz cartaginesa" de 1919, quando o Tratado de Versalhes impediu a criação de uma solução de paz justa e durável, exigindo o pagamento de dívidas impagáveis pela Alemanha.

Por que as alegações de que a Grécia é "preguiçosa" e "perdulária" estão erradas?

São estereótipos racistas, vis e condenáveis como são todos os estereótipos racistas.

Qual é o papel do sistema financeiro na crise grega?

Não há "crise grega". É uma crise da Europa e uma consequência da crise financeira global. É claro que o sistema financeiro tem desempenhado um papel central.

Nas causas da crise, é correto afirmar que a dívida privada grega se transformou em pública e que houve fraude de bancos?

A dívida grega, em grande parte para bancos franceses e alemães, foi assumida em 2010 pelos outros Estados europeus, o BCE e o FMI, a fim de resgatar esses bancos. A Grécia não obteve nenhum benefício dessa operação. Os bancos, que fizeram empréstimos terríveis, não tiveram perdas e escaparam.

Diretores não-europeus do FMI objetaram e previram que poderia ser um desastre.

Com Yanis Varoufakis [ministro grego], o sr. defendeu um novo modelo de desenvolvimento para o continente. Como seria este modelo? O sr. tem falado com ele?

Estamos em comunicação todos os dias. Estou orgulhoso de estar com Yanis Varoufakis que é, a meu ver, uma das pessoas mais extraordinárias que tive o privilégio de conhecer.

Qual é a sua avaliação do desempenho do governo grego e das instituições europeias nesta crise?

Nenhum governo lida com tudo perfeitamente. Mas o governo grego tem tido uma posição honesta. As instituições europeias (e o FMI) têm um comportando que a história julgará.

Como explicar a posição da Alemanha no caso? O país não é o maior beneficiário do euro e não deverá perder muito se o projeto fracassar?

A Alemanha, a França e os países do Norte europeu são comandados por lideranças com visão tacanha, mais interessadas em se manter no poder e avançar em suas ambições políticas.

A Grécia deveria buscar apoio na Rússia ou na China?

Não há esperança razoável para afirmar que isso iria funcionar.

Autonomia (Cartola) - Sacudindo o Choro e Fernanda Brito

Carlos Drummond de Andrade - Carta

Há muito tempo, sim, não te escrevo.
Ficaram velhas todas as notícias.
Eu mesmo envelhecí: olha em relevo
estes sinais em mim, não das carícias
(tão leves) que fazias no meu rosto:
são golpes, são espinhos, são lembranças
da vida a teu menino, que a sol-posto
perde a sabedoria das crianças.

A falta que me fazes não é tanto
à hora de dormir, quando dizias
"Deus te abençoe", e a noite abria em sonho.

É quando, ao despertar, revejo a um canto
a noite acumulada de meus dias,
e sinto que estou vivo, e que não sonho.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

Opinião do dia – Elio Gaspari

Há ainda outra diferença entre os presos que eram torturados nos DOI e os que passam pela Lava-Jato. Uns sequestravam diplomatas, assaltavam bancos e roubaram o cofre onde a namorada de um ex-governador de São Paulo guardava dois milhões de dólares, parte dos quais vindos de empreiteiras. Seus alvos faziam parte do arco de interesses que todos, inclusive a doutora, pretendiam destruir. Nenhum deles pensava em aumentar seu patrimônio. Os empreiteiros da Lava-Jato buscavam o enriquecimento pessoal e o PT enfiou-se nesse mundo de pixulecos porque quis.

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Elio Gaspari é jornalista. Dilma e os delatores. O Globo, 01 de julho de 2015.

Dilma já disse que delação é 'método legítmo'

Leticia Fernandes – O Globo

• Presidente assinou decretos que validaram o instrumento judicial

Ao responder uma pergunta sobre a Operação Lava-Jato, seis dias antes de ser reeleita, a presidente Dilma Rousseff disse à revista "Carta Capital": "Para obter as provas, a Justiça e o Ministério Público valeram-se da delação premiada, um método legítimo, previsto em lei. E muito útil para desmontar esquemas de corrupção. Na Itália, contra a máfia, funcionou muito bem". A declaração, em outubro do ano passado, contrasta com o juízo feito por Dilma na última segunda-feira, em viagem aos Estados Unidos, para comentar a delação premiada de Ricardo Pessoa, dono da empreiteira UTC.

O empresário disse que doou para a campanha de Dilma para manter contratos na Petrobras. Dilma reagiu dizendo que "não respeita delator", fez analogias entre o esquema de corrupção na Petrobras e a Inconfidência Mineira e ainda comparou o instrumento da colaboração premiada às delações obtidas sob tortura na ditadura:

- Em Minas (Gerais), na escola, quando você aprende sobre a Inconfidência Mineira, tem um personagem que a gente não gosta porque as professoras nos ensinam a não gostar dele. Ele se chama Joaquim Silvério dos Reis, o delator. Eu não respeito delator. Até porque eu estive presa na ditadura e sei o que é. Tentaram me transformar em uma delatora; a ditadura fazia isso com as pessoas presas. E eu garanto para vocês que eu resisti bravamente, até em alguns momentos fui mal interpretada, quando eu disse que, em tortura, a gente tem de resistir, porque senão você entrega seus presos. Então, não respeito nenhum - afirmou, na saída de um seminário em Nova York.

Se no ano passado Dilma defendia o instrumento que hoje ataca, foi durante o seu primeiro mandato, em 2013, que a colaboração premiada foi institucionalizada no país. No dia 2 de agosto, um dias depois de ter aprovado a Lei Anticorrupção - que criou os acordos de leniência, uma espécie de delação para empresas -, Dilma sancionou, sem vetos, a Lei de Organizações Criminosas. Foi a primeira vez que o termo "colaboração premiada" apareceu, por escrito, na legislação brasileira. Em março deste ano, a presidente lançou em cerimônia o Pacote Anticorrupção.

Nessa lei, há uma seção que detalha os direitos e deveres do colaborador e define que o juiz responsável pode, em caso de contribuição efetiva e voluntária do réu, reduzir a pena privativa de liberdade do acusado em até dois terços ou mesmo conceder o perdão judicial. A concessão do benefício, no entanto, deve levar em conta características como "a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato criminoso e a eficácia da colaboração".

A primeira lei brasileira a prever redução de pena com colaboração foi a de crimes hediondos, de 1990. Cinco anos depois, foi incluída nas leis de crimes contra a ordem tributária e o sistema financeiro nacional. A lei sobre lavagem de dinheiro e ocultação de bens, de 1998, foi a primeira a detalhar os benefícios dos colaboradores e a conduta do juiz: além da redução de pena do autor ou coautor do crime, o colaborador passou a poder cumprir pena em regime aberto ou semiaberto. Em 2006, também foi incluída na lei sobre tráfico de drogas a possibilidade de colaboração com redução de pena.

Órgãos do governo se eximem de responder sobre 'pedaladas'

Vinicius Sassine e Martha Beck – O Globo

• BC transfere responsabilidade de parecer para Fazenda Nacional

BRASÍLIA - O Banco Central, o Ministério da Fazenda e a Advocacia-Geral da União estão fazendo um jogo de empurra para se eximir da necessidade de dar parecer formal sobre a existência ou não de infração à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) na prática das chamadas "pedaladas fiscais". Diante do risco de o Tribunal de Contas da União (TCU) rejeitar as contas de 2014 da presidente Dilma Rousseff, ninguém quer ser o responsável por botar mais lenha na fogueira.

A Procuradoria-Geral do Banco Central foi instada a se manifestar sobre o assunto, mas transferiu a responsabilidade de um parecer sobre as pedaladas e a LRF à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, como mostra documento de agosto de 2014. O órgão da Fazenda, por sua vez, diz que o assunto é da AGU, que afirma se tratar de um assunto sigiloso.

Os ministros do TCU, em sessão no último dia 17, decidiram dar um prazo de 30 dias para a presidente Dilma se explicar sobre 13 indícios de irregularidades nas contas de 2014, entre eles as "pedaladas". Existe um risco de aprovação de parecer pela rejeição das contas, o que não ocorre desde 1937. O julgamento definitivo será do Congresso Nacional, com base no parecer do TCU.

As "pedaladas" consistiram num atraso nos repasses de recursos do Tesouro Nacional para os bancos públicos, constatados em auditoria do TCU. A prática ocorria desde 2009, segundo o tribunal. A demora obrigou os bancos oficiais a pagar despesas da União (como seguro-desemprego, benefícios do Bolsa Família e abono salarial) com recursos próprios. Para os ministros do TCU, isso caracterizou descumprimento à LRF, pois configura-se empréstimo de instituição controlada (no caso, os bancos) ao controlador (a União), o que é vedado pela lei.

No governo, no entanto, as áreas responsáveis por essa avaliação vêm fugindo de produzir um parecer formal sobre o assunto. Em agosto de 2014, a Procuradoria do BC foi instada a se manifestar e produziu um parecer. O órgão concluiu o parecer dizendo não ter atribuição para analisar a LRF, e que essa era uma competência do Ministério da Fazenda.

"A análise dessa questão, entretanto, extrapola as atribuições legais do Banco Central, pois não se confunde seu papel de entidade responsável pela manutenção da estabilidade financeira, na condição de regulador e supervisor do sistema financeiro", afirma um trecho do parecer da Procuradoria. O documento foi encaminhado à Procuradoria da Fazenda Nacional, que atua no âmbito do Ministério da Fazenda. A instituição, por sua vez, remeteu a responsabilidade à Advocacia Geral da União (AGU).

Procurado pelo GLOBO, o Ministério da Fazenda limitou-se a dizer que "o assunto está sendo tratado pela AGU". A AGU preferiu não se posicionar. O advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, tem dito publicamente que não houve desrespeito à LRF nas operações, pois elas não seriam empréstimos e sim contratos de prestação de serviços nos quais quando há atrasos de uma parte, a outra tem que ser ressarcida com correção. No entanto, a AGU informou ao GLOBO que "a política da PGFN é no sentido de não se manifestar em assuntos que estão em sigilo, como a investigação que ora o TCU realiza em relação às contas do governo".

Delator diz que doação fazia parte de 'lobby' do PT

Fausto Macedo, Mateus Coutinho e Ricardo Brandt – O Estado de S. Paulo

CURITIBA - O lobista Julio Gerin Camargo confirmou à Justiça Federal o pagamento de propina em contratos que intermediou na Petrobrás, via Diretoria de Serviços, que teriam como destino o PT. Ouvido pelo juiz federal Sérgio Moro, o delator disse que fez "doações" ao PT a pedido do ex-tesoureiro João Vaccari Neto para "estar bem com o partido". "O doutor Vaccari me procurou nos anos de 2008, 2010 e 2012 dizendo que precisava de doações, como todo partido precisa, e seu eu podia ajudar e cooperar. E evidentemente era o interesse meu, que obtinha sucesso com os contratos (da Petrobrás), de estar evidente favorável ao poder", afirmou Camargo, em depoimento na tarde desta terça-feira, 30, em Curitiba, sede da Lava-Jato, ouvido em processo em que Vaccari e o ex-diretor de Serviços da Petrobrás, Renato Duque, são réus acusados de ocultação de propina desviada de contratos da Petrobrás ao PT por meio de uma gráfica de São Paulo.

No entender da força-tarefa que comanda a operação, a "doação" também pode ser entendida como "propina". Camargo foi questionado pelo procurador Roberson Pozzobon se os pedidos de doação ao PT de Vaccari eram explicitamente associados por ele aos contratos e o que ele quis dizer ao citar "estar bem com o poder". "O PT era e é o partido do governo. E o partido que nomeava então seus diretores na Petrobrás, ou então, quando eram indicados por outros partidos, o PT, no final, ou a presidente da República tinha que aprovar esses nomes. Então, evidentemente, fazia parte de um lobby você estar bem com o partido." Camargo diz nunca ter havido por Vaccari citação nominal aos contratos.

O ex-tesoureiro, preso em Curitiba desde março, nega envolvimento em esquemas criminosos. Segundo ele, toda doação do partido foi legal. Os pedidos diretos partiram de Duque. O lobista confirmou que a Diretoria de Serviços era da cota do PT, no esquema controlado por PT, PMDB e PP de loteamento de diretorias por meio das quais eram arrecadados de 1% a 3% de propina. "Era um coisa conhecida dentro da Petrobrás que a Diretora de Serviços foi indicada pelo PT". Camargo afirmou que chegou a encontrar algumas vezes com Duque e Vaccari em restaurantes.

O delator confirmou ao juiz Sérgio Moro que pagamentos de propina intermediados por ele seguiram dois caminhos: depósitos no exterior e entregas em reais no Brasil, retirados no Rio e São Paulo. "As reuniões eram presenciais e basicamente eram feitas em restaurantes, uma ou duas vezes na própria Petrobrás. Tudo era acertado de maneira bastante amistosa." Camargo era parceiro do empresário Augusto Mendonça Ribeiro, dono do grupo Setal. Para desviar recursos de obras da Petrobrás de forma aparentemente legal, Vaccari e Duque teriam usado dois contratos de prestação de serviços ideologicamente falsos" feitos entre duas empresas do Grupo Setal e a Editora Atitude.

Assim, emitiram "18 notas fiscais frias" que cobriram "22 transferências bancárias fraudulentas" entre o grupo e a editora. O PT afirmou na noite de ontem que não iria comentar o depoimento de Camargo. Os advogados de Vaccari e de Renato Duque negam que as acusações contra seus clientes, que se encontro presos pela Polícia Federal em Curitiba.

Avaliação positiva da presidente cai para um dígito

Ricardo Brito, Daiene Cardoso – O Estado de S. Paulo

• Avaliação negativa da gestão Dilma subiu de 64% para 68%, segundo pesquisa CNI/Ibope, superando índice alcançado pelo ex-presidente José Sarney

BRASILIA - Pesquisa CNI/Ibope divulgada ontem mostrou, mais uma vez, piora na avaliação do governo da presidente Dilma Rousseff. A parcela dos brasileiros que avaliam o governo como ruim ou péssimo subiu de 64% para 68% desde a pesquisa anterior, realizada em março. A avaliação negativa é a pior da série histórica dos levantamentos do Ibope.

No fim de março, Dilma havia igualado a taxa de reprovação obtida em julho de 1989 pelo então presidente José Sarney, em seu pior momento: 64% de avaliação ruim ou péssima. Os 68% alcançados agora são o novo recorde nos 29 anos de dados compilados pelo Ibope. De acordo com o levantamento, caiu de 12% para 9% a parcela dos que avaliam o governo Dilma como ótimo ou bom - o que representa empate técnico com os 7% obtidos por Sarney em 1989.

Também houve piora na avaliação do desempenho pessoal da presidente no cargo. Subiu de 78% para 83% a desaprovação da maneira de governar de Dilma. Já a confiança na presidente mostra trajetória de queda: 2o% dos entrevistados disseram confiar na petista, quatro " pontos porcentuais a menos no levantamento anterior. Os que disseram não confiar nela subiram de 74% para 78%.

Período. O levantamento foi realizado entre 18 e 21 de junho, antes da divulgação do conteúdo da delação premiada de Ricardo Pessoa, dono da empreiteira UTC. Em depoimento à Procuradoria Geral da República, Pessoa, um dos alvos da Operação Lava Jato, detalhou supostos repasses de recursos a políticos de diversos partidos, entre eles tesoureiros das campanhas de Dilma à Presidência.

No ranking das notícias lembradas pela população, as sobre corrupção ficaram em primeiro lugar: 20% disseram ter recebido informações sobre a Lava Jato e desvios na Petrobrás.

A erosão da popularidade da presidente ocorre mesmo entre seus eleitores. Dos entrevistados que afirmam ter votado na petista, apenas 27% aprovam sua maneira de governar - eram 34% na pesquisa feita em março. Entre os eleitores que dizem ter optado por Aécio Neves (PSDB) no 2° turno das eleições de 2014, apenas 2% avaliam positivamente o desempenho pessoal da petista.

A pesquisa, realizada por encomenda da Confederação nacional da Indústria, mostra que subiu de 76% para 82% o total de entrevistados que consideram o segundo mandato da presidente pior que o primeiro. O Ibope ouviu 2.002 pessoas em 141 municípios. A margem de erro máxima do levantamento é de dois pontos porcentuais para mais ou para menos.

Temer nega haver 'crise institucional'; tucano pede renúncia
No dia em que a pesquisa CNI/ Ibope apontou recorde de avaliação negativa do governo desde a redemocratização, o presidente em exercício, Michel Temer, afirmou que o País não atravessa "de jeito nenhum" uma crise institucional, que definiu como "a maior das crises".

O peemedebista disse que o Brasil parece ter "necessidade de ter uma crise a cada 25, 30 anos" e defendeu o rompimento desse ciclo, ao negar que a atual conjuntura configure uma situação de ruptura institucional, "Não temos crise e não vamos ter", afirmou Temer.

Já o Líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB), aproveitou a pesquisa e as investigações da Operação Lava Jato para defender a renúncia da presidente Dilma Rousseff, de modo que "o Brasil tenha seu sofrimento abreviado" e "possa se reencontrar e ter um pouco de esperança".

Rejeição a Dilma é a maior em 30 anos

Raquel Ulhôa e Andrea Jubé – Valor Econômico

BRASÍLIA - A conjugação das crises política e econômica fez desabar para um dígito a aprovação do governo Dilma Rousseff, segundo pesquisa CNI-Ibope divulgada ontem. O percentual de entrevistados que considera o governo ótimo ou bom caiu de 12%, em março, para 9%. A rejeição chegou a 68%. O resultado levou lideranças da oposição a defenderem a renúncia da presidente. Já lideranças governistas atribuíram o resultado da pesquisa à retração da economia e pediram tempo para que o ajuste fiscal mostre resultados. Em viagem nos Estados Unidos, Dilma limitou-se a dizer que não comenta pesquisa, "nem quando sobe nem quando desce"

"Não há mais como governar com níveis tão baixos de confiança. A renúncia seria uma postura de estadista, que a presidente insiste em não ter", afirmou o líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO). "Para que o Brasil tenha seu sofrimento abreviado, renuncie, Dilma Rousseff", afirmou da tribuna o líder do PSDB, senador Cássio Cunha Lima (PB).

A pesquisa não mediu a reação dos brasileiros à delação premiada do presidente da UTC, Ricardo Pessoal, no âmbito da Operação Lava-Jato. O depoimento implicou dois ministros do governo Dilma, e veio a público no dia 26, enquanto o levantamento que ouviu 2002 pessoas foi feito entre os dias 18 e 21 de junho.

Em tom de cautela, o presidente da República em exercício, Michel Temer ponderou que todo governo tem "altos e baixos". Ele reconheceu que Dilma "está em uma posição de baixa", mas lembrou que ela está em "bem sucedida" viagem oficial aos Estados Unidos, de onde trará "melhores notícias". Segundo ele, em "pouquíssimo tempo teremos um crescimento da popularidade do governo e da presidente".

Na mesma linha, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que a pesquisa é um "retrato do momento". Cardozo ressaltou que o governo "vai no caminho correto" e que haverá "grande reversão" da popularidade de

Dilma até o fim do mandato.

Temer minimizou, ainda, o ambiente de crise política que traz instabilidade ao governo. Segundo o pemedebista, o que existe é uma "dificuldade econômica", que pode ser superada com o engajamento dos três poderes. Ele discursou na posse da nova presidente do PCdoB, Luciana Santos, na presença dos presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que representam o Legislativo.

"Não há crise institucional, vivemos um período de extraordinária tranquilidade democrática", disse Temer. "O que existe é uma dificuldade econômica", que segundo ele será superada com o engajamento dos três Poderes.

Também atribuindo à crise econômica a má avaliação de Dilma, o presidente do PT, Rui Falcão defendeu a redução da meta de superávit primário a fim de liberar mais recursos para investimentos. "A economia precisa voltar a crescer e ela [Dilma] está tomando medidas para isso", disse Falcão.

O dirigente citou itens da pauta positiva do governo, como o Programa de Investimentos em Logística (PIL) e o novo plano de exportações, que podem impulsionar a economia. Falcão ressalvou que a população ainda não foi influenciada pela agenda positiva do governo.

Em sintonia com o dirigente petista, o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), disse que a má avaliação de Dilma é momentânea e deve melhorar com os efeitos das medidas de ajuste fiscal. "Vejo com absoluta tranquilidade [a pesquisa]", disse Guimarães. "O ajuste ainda está em processo de execução para equilibrar as contas e até retomar o crescimento, no fim do ano coisas vão continuar nesses patamares", reconheceu.

A conjuntura revelada pela pesquisa é de pessimismo. O percentual da população que considera o governo ruim ou péssimo subiu de 64% para 68% e é o pior desempenho de um governante nos últimos 29 anos, segundo a série histórica divulgada pela CNI. Fora o governo Dilma, somente a gestão de José Sarney (1985-90), do PMDB, atingiu 64% de ruim e péssimo em julho de 1989.

Já a desaprovação da presidente cresceu cinco pontos percentuais desde março, quando estava em 78%, e chegou a 83% da população. A aprovação pessoal de Dilma caiu de 19% para 15% nesses três últimos meses. Já o percentual de entrevistados que confiam nela recuou de 24% para 20% no período, enquanto 78% não confiam na presidente (eram 74% em março).

O gerente de pesquisa da CNI, Renato Fonseca, disse não descartar nova queda de aprovação do governo porque, segundo ele, essa avaliação está muito atrelada ao desempenho da economia e do emprego, e não há sinais de recuperação até o fim do ano.

"A aprovação pode cair ou ainda se recuperar, mas o quadro econômico não é favorável", apontou. Ele pondera que os brasileiros consideram a evolução dos preços nos supermercados, nas lojas, nas farmácias, e no momento avaliam que não param de subir. "Inflação e desemprego assustam a população", definiu.

O gerente de pesquisa da CNI acrescentou que estudos realizados no mundo mostram que a questão econômica afeta a popularidade dos presidentes. "A pessoa responsabiliza o presidente pelo desemprego e por não conseguir manter o mesmo padrão de vida", disse. No caso do Brasil, ele lembra que o país passa por um ajuste fiscal, que implica medidas impopulares.

"Esperamos que o ajuste seja feito rapidamente, e o período negativo passe rápido. Acho que o governo aposta nisso, que precisa controlar a inflação rapidamente para que as pessoas recuperem a confiança no governo", afirmou Fonseca. Para ele, a conjugação dos fatores político e econômico é muito ruim.

O gerente de pesquisa da CNI lembra que uma conjuntura como essa, com problemas na política e na economia, só ocorreu na história recente do país no governo Sarney, no fim dos anos 80, quando frustraram os planos econômicos e o então presidente estava enfraquecido politicamente.

A pesquisa revela, ainda, que a agenda positiva do governo, com o lançamento de novos programas, não teve repercussão na população. Isso porque, ao serem perguntados sobre as notícias mais lembradas, os entrevistados citaram denúncias de corrupção, a Operação Lava-Jato - que investiga desvios na Petrobras - e mudanças na aposentadoria e seguro-desemprego. "A inflação e o medo do desemprego estão mais próximos das pessoas", sublinha.

A pesquisa CNI-Ibope revela que a população está mais pessimista. O percentual de entrevistados que considera o segundo mandato de Dilma pior que o primeiro subiu de 76% para 82% desde março. Pelo levantamento, 61% dos brasileiros estão pessimistas, enquanto em março esse índice era de 55%. Os otimistas caíram de 14% para 11%.

A maior insatisfação é com a política monetária: 90% desaprovam as taxas de juros praticadas pelo Banco Central e 90% reprovam a cobrança de impostos. Na sequência, as áreas pior avaliadas no governo são o combate à inflação e as políticas de saúde, reprovadas por 86% dos brasileiros. Em seguida, 84% dos brasileiros rejeitam a política de segurança pública e 83%, o combate ao desemprego.

De outro lado, os temas com menor rejeição da população são o combate à fome e à pobreza, e as políticas de meio ambiente e educação. A pesquisa mostra que 29% aprovam o combate à miséria, enquanto 27% aprovam a proteção ao meio ambiente, e 24%, as políticas de educação.

Na região Nordeste, onde a presidente sempre foi bem votada, ocorreu a maior queda no percentual dos que consideram o governo ótimo ou bom. Foram cinco pontos percentuais, chegando a 13% na região. Mesmo assim, a popularidade de Dilma continua maior nessa região. (Colaboraram Letícia Casado, Raphael Di Cunto,Thiago Resende, de Brasília; Sergio Lamucci e Pedro A. L. Costa, de Mountain View - EUA)


Alvo de pressão do PT, Cardozo diz que poderá deixar governo

Gabriel Mascarenhas, Andréia Sadi – Folha de S. Paulo

• Alvo de cobranças do PT, ministro da Justiça dá sinais de esgotamento, mas diz que sua saída depende de Dilma

• Avanço da Operação Lava Jato levou partido a criticar atuação da Polícia Federal, que é vinculada ao ministério

BRASÍLIA - Quatro anos e seis meses após assumir o Ministério da Justiça, José Eduardo Cardozo (PT) confidenciou a amigos que deseja deixar o governo Dilma Rousseff.

Um dos últimos remanescentes do primeiro mandato de Dilma, o ministro já dava sinais de esgotamento desde o fim do ano passado. Ficou no cargo devido à turbulência da Operação Lava Jato.

Mas a situação se agravou com as pressões petistas para que ele deixe a cadeira justamente porque a Lava Jato avança sobre os principais expoentes do partido.

A Polícia Federal, que investiga o esquema de corrupção na Petrobras, é subordinada ao ministro.

Procurado, o ministro disse apenas que "permanece no cargo durante o tempo em que a presidente avaliar que devo permanecer"".

Aos mais próximos, Cardozo tem dito estar "de saco cheio" e lembra que todo ministro tem "prazo de validade"". Ele afirma, em conversas reservadas, que há uma "fadiga de material"" ao lembrar ser o ministro da Justiça mais duradouro do período democrático.

O segundo é Márcio Thomaz Bastos (1935-2014), que ficou quatro anos e dois meses no cargo. Cardozo diz em privado que o cargo representa custo pessoal alto. Recentemente, ele passou por uma cirurgia na tireoide.

Parte dos seus interlocutores desconfia da real intenção de Cardozo em deixar o cargo. Eles acreditam que o ministro busca, na verdade, um afago de Dilma para permanecer no governo fortalecido, em meio ao tiroteio petista contra sua permanência.

Na semana passada, a executiva nacional do PT decidiu convidar Cardozo a dar explicações ao partido sobre a atuação da PF.

Não houve nenhuma defesa pública de Cardozo, justamente o ministro escalado por Dilma para defender o governo em momentos de crise.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se queixa a interlocutores de que o ministro, da cota pessoal de Dilma, perdeu o controle da PF.

Se Cardozo sair, o único nome citado para substituí-lo é o do secretário nacional de Justiça, Beto Vasconcellos, próximo de Dilma, mas com pouca densidade política.

É quase certo que uma saída de Cardozo levaria a mudanças no alto escalão da PF. O atual diretor-geral, Leandro Daiello, é homem de sua confiança, e é ele quem define quem comanda a polícia nos Estados.

Lava-Jato deflagra 15ª fase e prende ex da Petrobras Jorge Zelada

André Guilherme Vieira – Valor Econômico

SÃO PAULO - A Polícia Federal (PF) deflagrou hoje a 15ª fase da Operação Lava-Jato e prendeu o ex-diretor de Internacional da Petrobras Jorge Luiz Zelada no Rio de Janeiro.

Batizada de "Conexão Mônaco", a nova etapa da investigação que apura desvios de recursos da estatal cumpre quatro mandados de busca e apreensão no Rio de Janeiro e em Niterói.

Zelada é apontado como beneficiário de propinas localizadas pela investigação e congeladas no Principado de Mônaco. Ele será encaminhado de avião para a carceragem da PF em Curitiba.

Haverá entrevista coletiva dos integrantes da força-tarefa da Lava-Jato às 10 horas na sede da PF em Curitiba.

Na 2ª tentativa, Câmara aprova redução da maioridade penal em 1º turno

Raphael Di Cunto e Thiago Resende - Valor Econômico

BRASÍLIA - Menos de 24 horas após rejeitar, por cinco votos, a proposta de emenda constitucional (PEC) que reduz a maioridade penal de 18 anos para 16 anos, a Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta quinta-feira o projeto com uma mudança para angariar mais apoio no plenário: a exclusão do tráfico de drogas como motivo para prisão dos jovens infratores.

A proposta, que ainda precisa passar por um segundo turno de votação antes de ser encaminhado à análise do Senado Federal, foi aprovada por 323 votos a 155, com duas abstenções. Como se trata de emenda constitucional, era necessário o apoio de 308 dos 512 deputados.

Na votação do relatório do deputado Laerte Bessa (PR-DF), que saiu derrotado na madrugada de quarta-feira, foram 303 votos a favor e 184 contra, com três abstenções. Já na madrugada desta quinta-feira, o projeto virou um braço de ferro entre o governo, contrário ao projeto, e o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que pautou a proposta depois de 22 anos parada nas comissões da Casa.

Com críticas dos deputados contrários, que chamaram a nova tentativa de golpe e afirmaram que recorrerão ao Supremo Tribunal Federal (STF) para anular a votação, a mudança na PEC foi articulada pelo grupo de parlamentares favoráveis à redução da maioridade penal e assinada pelo líder do PSD, deputado Rogério Rosso (DF), com apoio de PSC e PHS.

O texto foi construído em negociações que avançaram durante a madrugada de quarta-feira. Ao longo do dia, parlamentares favoráveis — e também eleitores nas redes sociais — pressionaram deputados que eram contrários ao projeto a mudarem de ideia e até convocaram os que estavam viajando para votar.

O próprio Cunha ligou para deputados contrários para tentar aprovar a PEC. À noite, durante a votação, o presidente da Câmara telefonava de cima da mesa diretora para os deputados ausentes – 17 parlamentares registraram presença na Casa, mas não apareceram para votar.

Nos bastidores, o governo pressionou deputados da base aliada que tinham votado a favor da PEC a não comparecerem à sessão. As ausências, no caso, ajudariam a derrubar o projeto.

Embora a proposta tivesse apoio da maior parte de PMDB, PR, PP, PTB, PSDB, DEM, entre outros, as críticas dos deputados de PT, PSB, PDT e PSOL se dirigiram ao presidente da Câmara, que promoveu semelhante durante a reforma política, quando colocou em votação o financiamento privado de campanhas um dia depois de outra versão da proposta ser derrubada em plenário.

O deputado Glauber Braga (PSB-RJ), contumaz crítico de Cunha, reclamou dos métodos “ditatoriais” do presidente da Câmara. “Se o resultado da votação não agrada Vossa Excelência, Vossa Excelência coloca em votação novamente, e de novo e de novo, até que a votação agrade Vossa Excelência. Não vamos tolerar isso”, afirmou.

Para a líder do PCdoB, deputada Jandira Feghali (RJ), a votação abre um “precedente gravíssimo” ao permitir a votação de emenda com um texto que não era objeto de debate pelo plenário antes de derrotarem o relatório de Bessa. “Não podemos aglutinar texto morto”, protestou. “É uma pedalada regimental”, acusou o vice-líder do PDT, Weverton Rocha (MA).

Aliados de Cunha, como o líder do DEM, Mendonça Filho (PE), usaram uma decisão proferida pelo ex-presidente da Câmara Arlindo Chinaglia (PT-SP) em 2007 para argumentar que a emenda era admissível. “O regimento é claro. Quando a matéria é aprovada, para se aglutinar texto necessitasse de um destaque. Quando não é aprovada, não há necessidade de destaque”, disse. Cunha cobrou respeito e disse que “quem quiser, recorra à Comissão de Constituição e Justiça, quem quiser, recorra ao Supremo Tribunal Federal”.

O texto aprovado prevê que jovens entre 16 e 18 anos ficarão internados em unidades separadas — construídas pela União e governos estaduais — caso cometam crimes hediondos (estupro, latrocínio, homicídio cometido por grupos de extermínio ou qualificado, extorsão em que ocorrer morte ou sequestro, favorecimento da prostituição infantil e falsificação de medicamentos), homicídio doloso ou lesão corporal seguida de morte.

Pautas-bomba no Congresso põem em risco o ajuste fiscal

Deco Bancillon – Brasil Econômico

• Nelson Barbosa, dos EUA, já adiantou que a presidenta Dilma deverá vetar reajuste de 59,5% aprovado pelo Senado para servidores do Judiciário. Medida custará aos cofres públicos mais de R$ 25 bilhões em quatro anos

BRASÍLIA - As recentes derrotas do governo em votações no Congresso de medidas que propõem aumento de gastos públicos acenderam um sinal de alerta no Palácio do Planalto. Em menos de uma semana, a base aliada do governo contabilizou seguidas derrotas em votações de "pautas-bomba" para as contas públicas. Entre elas, a aprovação na terça-feira, pelo Senado, do reajuste de 59,5% a servidores do Judiciário, medida que custará aos cofres públicos, em quatro anos, cerca de R$ 25,7 bilhões. Não por acaso, ontem, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, adiantou que a presidenta Dilma Rousseff deverá vetar o aumento e indicar uma alternativa que envolva todos os poderes. 

Em viagem aos EUA, onde acompanha a comitiva presidencial, Barbosa considerou a proposta como "indefensável do ponto de vista social e fiscal" e frisou que o reajuste aprovado pelo Congresso aumentará "ainda mais" a diferença entre os salários dos servidores do Judiciário e carreiras similares do Executivo. "Atualmente já há um ganho a maior de até 60% em favor do Judiciário. Com a proposta, essa diferença subiria para 170%", disse o ministro, via assessoria de imprensa.

Em São Francisco, a presidenta Dilma comentou que a aprovação pelo Congresso do reajuste seria "lamentável" em função da necessidade do governo em cortar gastos para conseguir cumprir a meta de superavit primário de 1,1% do Produto Interno Bruto (PIB), mas evitou indicar, de forma clara, se vetaria ou não a proposta aprovada no Senado. "É insustentável para um país como o nosso, em qualquer circunstância, dar níveis de aumento tão elevados (de 59,5%)", disse Dilma. A presidenta mencionou que a maior preocupação do governo, no momento, é assegurar o ajuste fiscal, e afirmou que derrotas no Congresso são vistas com naturalidade.

"Como estamos na democracia é assim: tem dia que você ganha e tem dia que você perde. Mas nós ainda teremos oportunidades de avaliar como vai ser a questão do aumento (do Judiciário). Agora, de fato, (essa medida) compromete o ajuste fiscal", contou.

Mas não é só a aprovação do reajuste do Judiciário que tem tirado o sono do governo. Na semana passada, o Planalto também foi derrotado na votação pela Câmara que estendeu a regra de correção do salário-mínimo acima da inflação a todos os aposentados e pensionistas do INSS. Caso entre em vigor ainda este ano, a medida custaria aos cofres da Previdência Social cerca de R$ 4,6 bilhões. A partir de 2016, no entanto, o gasto aumentaria para cerca de R$ 9,2 bilhões por ano. O governo ainda espera derrotar a medida no Senado, mas já admite que, se não houver acordo, o desfecho deverá ser mesmo o veto presidencial. "Da forma como a proposta foi aprovada pela Câmara, a presidenta vetaria, porque não caberia nas contas públicas neste ano", frisou um assessor presidencial.

Também entrou no radar do Palácio do Planalto a discussão, que deverá chegar ao Senado nas próximas semanas, do reajuste pedido por servidores do Ministério Público da União e do Conselho Nacional do MP. Eles querem os mesmos 59% de reajuste que foram concedidos aos servidores do Judiciário da União, na votação do Senado de terça-feira. A ideia do governo é tentar atrasar ao máximo a votação no Congresso e oferecer à categoria um reajuste em linha ao que foi apresentado aos demais servidores do Executivo civil. Ou seja, um reajuste de 21,3% escalonado em três anos, a partir de 2016.

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) já avisou que, se governo e sindicalistas não chegarem a um acordo, porá o assunto em votação.

Também tem sido motivo de preocupação da articulação política do governo a negociação com os senadores do projeto de lei que propõe a reversão parcial da desoneração da folha de salários. A medida que foi aprovada na Câmara ganhou substitutivos do relator do projeto, deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ), que reduzem de R$ 12,5 bilhões para menos de R$ 9 bilhões a possibilidade de arrecadação para o governo. Porém, a ordem no Palácio do Planalto é votar a medida da forma como ela foi proposta, para que possa entrar em vigor "o mais rápido possível". "Cada mês de atraso na aprovação da desoneração da folha, o governo perde cerca de R$ 1 bilhão em receitas", disse uma fonte do Planalto.

Caso não consiga vencer essas votações, a presidenta Dilma já avisou que vetará qualquer projeto que ponha em risco o ajuste fiscal. Nem a queda da popularidade será um problema, avisou um interlocutor da presidenta: "É preciso assegurar o ajuste fiscal".

Crise muda hábitos de consumo

- Brasil Econômico

Estudo realizado pela empresa de pesquisa web-mobile MeSeems identificou que a maioria dos brasileiros alterou hábitos de consumo em função do cenário econômico mais adverso. Dos 1.650 entrevistados, das regiões Nordeste, Sudeste e Sul, 43% afirmaram que passaram a procurar alternativas mais baratas para seus hábitos de consumo, ou deixaram de consumir a maioria dos produtos ou serviços que costumavam adquirir.

Os demais 40% continuaram a consumir os mesmos produtos e serviços e apenas 17% não sentiram os efeitos da crise em seus cotidianos.

A pesquisa revelou ainda que, nos últimos dois anos, as atividades que mais sofreram com a desaceleração da economia foram o comércio de imóveis e automóveis novos e seminovos. Cerca de 60% dos entrevistados diminuíram a frequência com que efetuavam tal tipo de compra e só 30% a mantiveram.

Entre as prioridades de consumo, os entrevistados apontaram a compra de mantimentos no supermercado (86%), seguida de medicamentos na farmácia (75%) e consumo de roupas e calçados (62%).

O levantamento revelou também a mudança nos hábitos de lazer. Do total de entrevistados, 45% reduziram as idas ao cinema e ao teatro.

Maria Lydia entrevista Alberto Aggio, prof. de História/Unesp

Merval Pereira - Poderes em conflito

- O Globo

Ninguém sabe aonde isso vai dar, mas há um sentimento de regozijo entre os políticos fora do PT com o protagonismo que o Congresso vem assumindo, mesmo que algumas medidas aprovadas possam significar prejuízos ao orçamento público, como o aumento dos servidores do Judiciário.

Esse aumento, aliás, também é consequência do papel ampliado que vem exercendo o Judiciário, em especial o Supremo Tribunal Federal. O presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça, Ricardo Lewandowski, foi um ativo lobista a favor desses aumentos, que devem ser seguidos pela aprovação de reajustes na mesma proporção para os servidores do Ministério Público.

No centro dessas decisões está o Congresso, que cada vez mais assume o controle da agenda política do país, no que é classificado como "uma experiência extremamente rica" em avaliação da cúpula do PMDB, neste momento com papel ambíguo a desempenhar.

Ao mesmo tempo em que o vice Michel Temer é o responsável pela coordenação política do governo, os presidentes de Câmara e Senado são os responsáveis pelo estouro do Orçamento, prejudicando o ajuste fiscal proposto pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, cuja aprovação é a principal responsabilidade de Temer.

Na avaliação política da situação, os peemedebistas entendem que as consequências de curto prazo de certos exageros nas votações no Congresso poderão até ser contidas, na medida em que a presidente vete alguma dessas propostas, dê nova configuração a outras. "Mas é preciso ter autoridade para isso", ressaltam.

E quem acompanhou a votação do aumento dos servidores do Judiciário certamente anotou que o provável veto da presidente Dilma, prenunciado pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, e confirmado pela própria em declaração ainda nos Estados Unidos, já estava nas contas do rebelado Senado.

Não foram poucos os senadores que já convocavam reação ao veto presidencial, para derrubá-lo no plenário. O senador Cristovam Buarque disse que, ao se deparar com o placar eletrônico marcando 62 votos a favor e nenhum contra, já que nem mesmo o PT teve coragem de anunciar um voto contrário à medida e liberou seus senadores, percebeu que aquele era o sinal mais claro do fim da hegemonia do PT.

O governo manobrou para adiar a decisão, na tentativa de usar os argumentos de sempre para "convencer" senadores a reprovar o aumento, que é realmente abusivo. Ainda mais neste momento de crise. Cristovam lembra que o PT sempre atuou como rolo compressor no Congresso, sem se importar com a minoria.

Hoje, não tem mais condição de segurar nem sua bancada no Senado, e nem os senadores mais alinhados ao Planalto, como Lindbergh Farias, que procurou um microfone para dizer que votaria a favor dos aumentos. Não foi possível, pois o voto simbólico de liderança foi o bastante para aprovar, sem que nenhum senador se dispusesse a checar a maioria, que era avassaladora.

Desde a ditadura que não temos relação do Legislativo com as outras instituições com tanto protagonismo, tanta autonomia. A ditadura impôs o presidencialismo imperial com o decreto-lei. A medida provisória, do ponto de vista do arcabouço legal, é quase um substitutivo do decreto-lei. Vem sendo mitigada desde Sarney, mas é ferramenta extremamente eficaz para impor a dominação do Executivo.

Ou era, pois, como o Executivo está muito fraco, o Congresso ganhou nova dimensão e hoje tem condições de derrubar vetos presidenciais ou MPs. E, para compensar os desmandos que vêm sendo aprovados no plenário das duas Casas, há medidas econômicas importantes que devem ser aprovadas pelo Congresso, como a mudança da legislação da exploração do petróleo do pré-sal.

Acabar com a obrigatoriedade de a Petrobras participar com pelo menos 30% em todos os campos é fundamental para a economia; a própria Petrobras está torcendo para isso, pois não tem dinheiro para investir.

E o país precisa atrair investimentos nessa área para garantir, inclusive, as empresas que estão na cadeia de produção do petróleo. Por isso os governadores de Rio, ES e SP estão apoiando essa mudança, extremamente favorável para o ambiente de negócios do país.

Essa será, por sinal, uma derrota que até mesmo o Planalto vai receber de bom grado, criticando, embora, a mudança, para não perder o viés ideológico.

José Roberto de Toledo - Só o consumo salva

- O Estado de S. Paulo

É a economia, sabichão! A popularidade de Dilma Rousseff só atingiu o pré-sal depois que a confiança do consumidor quebrou seu recorde negativo no mês passado – de novo. O eleitor está cada vez mais desconfiado de que vai consumir cada vez menos. A maior parte acha que seu poder de compra despencou e aposta que vai continuar caindo no futuro próximo. Nenhum órgão humano explica melhor a sorte de um presidente do que o bolso do "homo consumens" – e as novas pesquisas CNI/Ibope só confirmam isso.

A corrupção – exposta repetidamente pelo farto noticiário sobre a Operação Lava Jato – é a cereja do bolo. Misturada ao bolso furado, populariza o senso comum de que a economia vai mal porque rouba-se demais. Os dois fatos, apesar de incontestes, infelizmente não se alinham de modo tão simples nem automático. A não ser que se acredite que, quando o bolso estava cheio, todo mundo era honesto. Por esse raciocínio, bastariam as prisões de corruptos e corruptores para a economia melhorar.

No curto prazo, as canas – mesmo se justas e necessárias – aumentam a incerteza, retraem investimentos e aprofundam a crise. Se perenizadas por condenações em última instância, espera-se que ajudem a sanear as relações público-privadas. Mas o saneamento depende também da reforma do sistema político e eleitoral que alimenta a corrupção – reforma da qual não há sinal. E no longo prazo? Estaremos todos mortos, ensina Keynes.

Enquanto essa hora não chega, talvez valesse a pena fazer algo para matar o tempo. Trabalhar, por exemplo. Mas, como a opinião pública percebeu antes de o IBGE divulgar qualquer estatística, arrumar emprego está cada vez mais difícil. A geração "V", que relutou enquanto pôde a entrar no mercado de trabalho porque seus pais e avós tinham tido ganhos de renda suficientes para sustentá-la, está agora tendo que disputar vagas cada vez mais raras com a geração de seus progenitores desempregados.

Não é por acaso que a impopularidade de Dilma é um pouco menos desastrosa entre os brasileiros com mais de 55 anos de idade. A faixa etária onde se concentram os aposentados sentiu menos os efeitos da deterioração do mercado de trabalho. Tampouco é coincidência que os mais críticos em relação à presidente – e que deram início à avalanche de opiniões negativas que a afoga desde 2013 – sejam os jovens de menos de 25 anos.

A inclusão social pelo consumo funciona eleitoralmente, como funcionou em 1994 para Fernando Henrique Cardoso, em 2006 para Lula e em 2010 para Dilma. Mas, além de depender do vaivém da economia mundial e da habilidade de quem executa a política econômica, essa tática sucumbe à saturação do mercado. E as ruas das metrópoles brasileiras provam diariamente que falta espaço para abrigar mais automóveis. Com seu carro-chefe engarrafado, uma das cadeias produtivas que alavancaram a era petista é das pioneiras nas demissões em massa e férias compulsórias.

Mesmo quando seu apelo positivo não funciona, a inclusão pelo consumo reelege presidentes pelo medo de que a festa acabe. Foi assim em 1998 com FHC e com Dilma em 2014. A ressaca, porém, é sempre maior quando a vitória é medrosa. O tucano só ganhou uma chance em vida de reabilitar sua popularidade porque Dilma estabeleceu um novo parâmetro negativo de comparação tão alto que relativiza quaisquer insucessos do passado.

O dígito de opiniões positivas sobre seu governo pode morrer solitário se Dilma não inspirar algum otimismo econômico. Nem Barack Obama dizer que os EUA enxergam o Brasil como potência global faz diferença. Publicitários gostam de dizer aos anunciantes: se não gosta do que estão dizendo sobre você, mude a conversa. O governo está tão frágil que perdeu a capacidade de mudar de assunto. Só lhe resta falar de economia e ser muito mais convincente do que foi até hoje. Ou fim de papo.

Bernardo Mello Franco - Os humanos direitos da Câmara

- Folha de S. Paulo

"Direitos humanos são para os humanos que são direitos." A voz inconfundível de Paulo Maluf ecoou no plenário da Câmara à 0h03 da madrugada de quarta-feira. Os deputados terminavam a longa votação da emenda que reduz a maioridade penal para os 16 anos.

Antes dele, seis delegados, dois majores e um cabo da PM defenderam a mudança na Constituição, patrocinada pelo presidente Eduardo Cunha. Os contrários eram acusados de proteger bandidos, incentivar o crime e até usar drogas.

"Senhor presidente, quem escreveu isso aqui ou fumou maconha estragada ou não sabe o que diz", disse Alberto Fraga, dublê de delegado e deputado do DEM. Ele se referia a um panfleto contra a emenda da redução. "Sou sim da bancada da bala, mas não sou da bancada da mala", prosseguiu, em tom raivoso.

A retórica do medo dominava o plenário. Major Rocha, do PSDB, afirmou que a população "está sitiada dentro das suas casas". Nilson Leitão, também do PSDB, disse que àquela hora alguma moça era "estuprada por um jovem de 17 anos". O delegado Moroni Torgan, do DEM, chamou jovens infratores de "feras urbanas". André Moura, do PSC, revelou a curiosa existência de "marginais disfarçados de menores".

No momento de maior apelo dramático, Keiko Ota, do PSB, exibiu uma foto do filho morto aos 8 anos, em 1997. "Nós precisamos dar uma basta a essa violência que tanto machuca as mães e os pais do Brasil", disse. Faltou informar que os três assassinos do menino eram maiores de idade, sendo dois PMs.

Apesar da pressão da tropa, a emenda foi rejeitada por cinco votos. "Ô Cunha, pode esperar, que a sua hora vai chegar", cantaram os estudantes. Irritado, o peemedebista mandou a polícia esvaziar a galeria e começou a manobrar para repetir a votação no dia seguinte.

Para o presidente da Câmara e seus "humanos direitos", o jogo só vale quando ele não perde.