Raphael Di Cunto e Thiago Resende - Valor Econômico
BRASÍLIA - Menos de 24 horas após rejeitar, por cinco votos, a proposta de emenda constitucional (PEC) que reduz a maioridade penal de 18 anos para 16 anos, a Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta quinta-feira o projeto com uma mudança para angariar mais apoio no plenário: a exclusão do tráfico de drogas como motivo para prisão dos jovens infratores.
A proposta, que ainda precisa passar por um segundo turno de votação antes de ser encaminhado à análise do Senado Federal, foi aprovada por 323 votos a 155, com duas abstenções. Como se trata de emenda constitucional, era necessário o apoio de 308 dos 512 deputados.
Na votação do relatório do deputado Laerte Bessa (PR-DF), que saiu derrotado na madrugada de quarta-feira, foram 303 votos a favor e 184 contra, com três abstenções. Já na madrugada desta quinta-feira, o projeto virou um braço de ferro entre o governo, contrário ao projeto, e o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que pautou a proposta depois de 22 anos parada nas comissões da Casa.
Com críticas dos deputados contrários, que chamaram a nova tentativa de golpe e afirmaram que recorrerão ao Supremo Tribunal Federal (STF) para anular a votação, a mudança na PEC foi articulada pelo grupo de parlamentares favoráveis à redução da maioridade penal e assinada pelo líder do PSD, deputado Rogério Rosso (DF), com apoio de PSC e PHS.
O texto foi construído em negociações que avançaram durante a madrugada de quarta-feira. Ao longo do dia, parlamentares favoráveis — e também eleitores nas redes sociais — pressionaram deputados que eram contrários ao projeto a mudarem de ideia e até convocaram os que estavam viajando para votar.
O próprio Cunha ligou para deputados contrários para tentar aprovar a PEC. À noite, durante a votação, o presidente da Câmara telefonava de cima da mesa diretora para os deputados ausentes – 17 parlamentares registraram presença na Casa, mas não apareceram para votar.
Nos bastidores, o governo pressionou deputados da base aliada que tinham votado a favor da PEC a não comparecerem à sessão. As ausências, no caso, ajudariam a derrubar o projeto.
Embora a proposta tivesse apoio da maior parte de PMDB, PR, PP, PTB, PSDB, DEM, entre outros, as críticas dos deputados de PT, PSB, PDT e PSOL se dirigiram ao presidente da Câmara, que promoveu semelhante durante a reforma política, quando colocou em votação o financiamento privado de campanhas um dia depois de outra versão da proposta ser derrubada em plenário.
O deputado Glauber Braga (PSB-RJ), contumaz crítico de Cunha, reclamou dos métodos “ditatoriais” do presidente da Câmara. “Se o resultado da votação não agrada Vossa Excelência, Vossa Excelência coloca em votação novamente, e de novo e de novo, até que a votação agrade Vossa Excelência. Não vamos tolerar isso”, afirmou.
Para a líder do PCdoB, deputada Jandira Feghali (RJ), a votação abre um “precedente gravíssimo” ao permitir a votação de emenda com um texto que não era objeto de debate pelo plenário antes de derrotarem o relatório de Bessa. “Não podemos aglutinar texto morto”, protestou. “É uma pedalada regimental”, acusou o vice-líder do PDT, Weverton Rocha (MA).
Aliados de Cunha, como o líder do DEM, Mendonça Filho (PE), usaram uma decisão proferida pelo ex-presidente da Câmara Arlindo Chinaglia (PT-SP) em 2007 para argumentar que a emenda era admissível. “O regimento é claro. Quando a matéria é aprovada, para se aglutinar texto necessitasse de um destaque. Quando não é aprovada, não há necessidade de destaque”, disse. Cunha cobrou respeito e disse que “quem quiser, recorra à Comissão de Constituição e Justiça, quem quiser, recorra ao Supremo Tribunal Federal”.
O texto aprovado prevê que jovens entre 16 e 18 anos ficarão internados em unidades separadas — construídas pela União e governos estaduais — caso cometam crimes hediondos (estupro, latrocínio, homicídio cometido por grupos de extermínio ou qualificado, extorsão em que ocorrer morte ou sequestro, favorecimento da prostituição infantil e falsificação de medicamentos), homicídio doloso ou lesão corporal seguida de morte.
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