quarta-feira, 15 de junho de 2022

Vera Magalhães: Temporada de caça ao Judiciário

O Globo

Jair Bolsonaro inaugurou uma temporada de caça ao Judiciário que, se não for estancada agora e rechaçada sem espaço para tergiversação pelos democratas, é a antessala da agitação que ele prepara para logo após o primeiro turno das eleições, visando a melá-las.

O presidente está na fase 2 de seu projeto. Depois de semear, com relativo sucesso, a desconfiança quanto à confiabilidade das urnas eletrônicas e da apuração dos votos, ele partiu para a fulanização, na tentativa de pregar um alvo na testa dos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Supremo Tribunal Federal (STF).

As aleivosias levantadas por ele contra os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, de forma sistemática e cada vez mais mentirosa, são a deixa para que tresloucados como o ex-senador Magno Malta também passem a fustigá-los com mentiras em eventos públicos, como aconteceu no último fim de semana.

Não é de hoje que essa estratégia passou a ser usada pelo presidente, mas ele havia sido obrigado a se moderar depois das falas golpistas do 7 de Setembro, e agora, depois da graça concedida ao deputado Daniel Silveira, parou de fingir qualquer moderação.

Bolsonaro mentiu que Moraes concordara em arquivar o inquérito das fake news. Mesmo desmentido pelo ex-presidente Michel Temer, insistiu na mentira. Associou de forma irresponsável a decisão do STF de anular as condenações do ex-presidente Lula a um impedimento para que Edson Fachin presida o TSE. É o tipo de pregação que ecoa no submundo das redes bolsonaristas e poderá virar combustível para novos protestos antidemocráticos contra o Judiciário, às vésperas da eleição.

Elio Gaspari: Demos o golpe, e agora?

O Globo

A demagogia do século XXI tem tintas milicianas

Num exercício de quiromancia política, pode-se dizer que são mínimas as chances de um golpe nos dias seguintes a uma possível vitória de Lula nas próximas eleições. Mesmo assim, essa afirmação é temerária quando o presidente da República sopra ventos golpistas, e o ministro da Defesa, ex-comandante do Exército, repreende o Tribunal Superior Eleitoral.

Admita-se, portanto, que existem pessoas preferindo um golpe. Para quê?

Em 1968, quando o general Costa e Silva baixou o Ato Institucional nº 5, o Brasil vivia um raro processo de radicalização. Grupos armados de esquerda praticavam atos terroristas. Pelo menos 11 bancos foram assaltados. Em junho, seis meses antes da edição do AI-5, um hospital militar foi atacado, e uma bomba explodiu diante do Quartel-General do Exército em São Paulo, matando um soldado. Em julho, terroristas executaram um major alemão supondo que ele era um oficial boliviano. Em outubro, foi assassinado um capitão americano que vivia em São Paulo.

Noutra ponta, com o terrorismo da direita, militares lotados no Centro de Informações do Exército punham bombas em teatros e livrarias vazias. Espancavam-se atores, e um maluco que se dizia ligado a um general praticou pelo menos 14 atentados em São Paulo. Quatro pessoas foram sequestradas no Rio e levadas clandestinamente para quartéis.

Esse clima não existe hoje. Também não existem os sinais de recuperação da economia, prenunciando o que viria a ser o Milagre Brasileiro.

Bernardo Mello Franco: Foiçada na Funai

O Globo

Funai é alvo de militarização e desmonte no governo Bolsonaro

Em setembro de 2019, Bruno Pereira articulou uma grande operação para reprimir o garimpo ilegal no Vale do Javari. A força-tarefa destruiu cerca de 60 balsas que operavam em território indígena. Dias depois, o indigenista foi punido pelo serviço exemplar: perdeu o cargo de coordenador de Índios Isolados da Funai.

O desaparecimento de Bruno e do jornalista Dom Phillips jogou luz sobre o desmonte da autarquia. Desde a posse de Jair Bolsonaro, a Funai foi capturada pela causa anti-indigenista. Passou a atuar contra os povos que deveria proteger.

Um dossiê divulgado nesta semana descreve o desmanche em detalhes. O documento pinta um quadro de asfixia orçamentária, leniência com o crime e perseguição a servidores de carreira.

No dia em que vestiu a faixa, Bolsonaro transferiu a Funai para o Ministério dos Direitos Humanos, entregue à pastora Damares Alves. A mudança foi revertida pelo Congresso, embora o então ministro da Justiça, Sergio Moro, tenha manifestado desinteresse em reaver o órgão.

Vera Rosa: O desafio de Simone Tebet

O Estado de S. Paulo

A terceira via não pode ficar apenas no discurso do ‘nem-nem’ nessa campanha

Quibes, esfihas e outros quitutes árabes ornamentavam a comprida mesa de 12 lugares, na casa de Campo Grande, quando Simone entrou na sala. “Você vai ser candidata a deputada federal”, disse-lhe o pai. “Não vou, não”, reagiu a filha, então professora universitária. “Quero ser deputada estadual.”

O ano era 2002 e, à época, Ramez Tebet desfrutava de prestígio no MDB. Era presidente do Senado, havia comandado a CPI do Judiciário, que resultou na cassação de Luiz Estevão, e o Conselho de Ética nas investigações sobre a quebra de sigilo do painel de votação.

Intrigado, o pai de Simone quis saber os motivos da decisão que desafiava a lógica política num momento em que ele era poderoso cabo eleitoral. “Mas por que você não quer ser candidata a deputada federal?”, perguntou Tebet.

Fábio Alves: Copom refém da incerteza

O Estado de S. Paulo

Em cenário tão nebuloso, o Copom deveria deixar em aberto decisão sobre juros em agosto

Uma alta de 0,50 ponto porcentual da taxa Selic, para 13,25%, já é amplamente esperada para a decisão do Copom hoje, mas a grande expectativa é saber como o Banco Central vai tratar o projeto que reduz impostos sobre combustíveis e outros serviços essenciais.

Para analistas, essa avaliação no comunicado do Copom seria a principal sinalização sobre os próximos passos da política monetária, em particular se o ciclo de alta de juros poderá prosseguir em agosto. Isso porque há o temor em relação tanto à piora fiscal quanto ao efeito adverso sobre a inflação no médio prazo do que está em discussão. 

Foi mal recebida pelo mercado a proposta do governo, via PEC, para ressarcir os Estados que decidirem zerar o ICMS sobre diesel e gás de cozinha, que resultaria numa despesa ao redor de R$ 25 bilhões fora do teto de gastos.

Vinicius Torres Freire: Baixa da gasolina, baixaria Bolsonaro

Folha de S. Paulo

Desconto de combustível ocorre durante maior aumento da miséria em uma década

Talvez eu possa passear de carro com gasolina mais barata em julho, digamos. Nas madrugadas, a temperatura mínima tem andado por volta de 7º aqui na cidade de São Paulo. Em julho, não deve ser muito diferente. Do carro, vou passar mais rapidamente pelos montes de pessoas largadas pelas calçadas geladas e molhadas de chuvisco. Algumas talvez já mortas.

Jair Bolsonaro chutou que o litro de gasolina vai ficar R$ 2 mais barato quando for aprovado o pacote de redução de impostos que ele e os chefes do poderoso centrão inventaram para ganhar uns pontos nas pesquisas. O litro do diesel baixaria R$ 1.

Segundo o senador Fernando Bezerra (MDB-PE), relator de parte desses projetos de lei, a baixa da gasolina seria de R$ 1,65 por litro; o litro do diesel baixaria R$ 0,76.

É tudo uma baixaria, mesmo.

Bruno Boghossian: Contando centavos

Folha de S. Paulo

Pressão contínua sobre Petrobras mostra que governo não quer desperdiçar centavos até a eleição

O governo mostrou que tem um cobertor curto para lidar com os apertos eleitorais de Jair Bolsonaro. Nos últimos dias, o presidente e seus auxiliares lançaram cobranças sobre a cúpula da Petrobras para adiar um novo aumento da gasolina e do diesel. O plano era segurar esse reajuste e esperar a aprovação no Congresso de mudanças nos impostos estaduais sobre os combustíveis.

A pressão sobre a estatal não é nenhuma novidade, mas as movimentações sugerem que Bolsonaro opera no limite dos prejuízos políticos que pode suportar nesse tema.

O governo trata a limitação da cobrança de ICMS e outras medidas para os combustíveis como torpedos sobre os preços, capazes de reduzir o litro da gasolina em até R$ 1,65. Bolsonaro pareceu ainda mais confiante durante uma entrevista: fez uma conta de padeiro e disse que o valor cobrado poderia cair até R$ 2.

Hélio Schwartsman: Adoravelmente progressivo

Folha de S. Paulo

Título universitário confere a seu detentor um significativo aumento de renda

No Brasil, certas discussões são eternas. Estão nesse rol a liberação do aborto, a legalização das drogas e a cobrança de mensalidades em universidades públicas. Defendo todas as três, mas não creio que as verei em vida. São assuntos que se tornaram tão ideologizados que o debate fica travado. Às vezes, nessas situações, reapresentar a ideia sob uma nova roupagem pode derrubar as resistências. Dizem que a essência da diplomacia é encontrar novos "frames" (enquadramentos) para problemas velhos. Acho que há um mecanismo desses para a questão das universidades.

A meu ver a cobrança seria justa, porque o título universitário costuma conferir a seu detentor um significativo aumento de renda. Médicos e engenheiros ganham entre 15 e 20 vezes mais do que a mediana salarial do país. E isso ao longo de toda a vida laboral. Usar dinheiro dos impostos para financiar a formação desses profissionais configura um indefensável subsídio dos mais pobres para os mais ricos.

Mariliz Pereira Jorge: O Brasil é uma selva

Folha de S. Paulo

Uma selva habitada por homens desinteressados pelo paradeiro de Dom e Bruno

A imagem mais clichê que se tem do Brasil no exterior não é exagerada. O Brasil é uma selva. Mas em vez de onças, anacondas e jacarés, o animal que coloca em risco a vida das pessoas é o político brasileiro. A letargia do governo em mobilizar esforços para procurar o indigenista Bruno Pereira e o jornalista Dom Phillips é sintoma da selvageria em que vivemos.

Jair Bolsonaro nem tentou fingir alguma preocupação quando questionado sobre o caso. Classificou como "aventura não recomendada" o trabalho dos profissionais. Minimizou a violência à qual a região está exposta, afirmando que os dois podem ter sido vítimas de uma "maldade". Desde quando dois possíveis assassinatos podem ser chamados de "maldade"? No Brasil de Bolsonaro.

Fernando Exman: Um governo em busca da marca própria

Valor Econômico

Aliados do presidente Bolsonaro criticam rumos da campanha

Em uma tarde de domingo sem emoções no noticiário político, o telefone celular vibra com a notificação de mais uma mensagem do presidente Jair Bolsonaro (PL) à sua lista de transmissão. “Governo aprimora o Bolsa Família, beneficiando de forma mais justa a mais brasileiros!”, diz o título da nota disparada para 1,3 milhão de destinatários.

Horas depois, já na segunda-feira de manhã, outra postagem surge no perfil do presidente nas redes sociais. “A transposição [do rio São Francisco] era para ter concluído em 2010, no final do governo Lula. Passou para 2012 com a Dilma, para 2014 e não concluíram nada. Nós pegamos partes de obra lá completamente destruídas. Tiveram que ser refeitas novamente”, afirma o presidente na entrevista replicada. “Teve barragem que estava sendo construída desde 1952, nem eu era nascido ainda, e nós concluímos. Como é a barragem de Oiticica. Então, hoje a água está chegando no Nordeste de fato.”

Lu Aiko Otta: Por sua conta e risco

Valor Econômico

Com menos emprego, MEIs já somam 70% das empresas no país

Há algo errado num país em que 70% das empresas não são empresas, mas pessoas. É o que acontece no Brasil às vésperas de mais uma eleição.

Dados divulgados este mês pelo Ministério da Economia mostram que existem 19,4 milhões de empresas ativas no Brasil. Dessas, 13,5 milhões são individuais.

Aí estão os trabalhadores “pejotizados”. Mas a parcela majoritária são microempreendedores individuais (MEIs). Esses chegam a 11,1 milhões.

O professor Sergio Firpo, do Insper, enxerga alguns movimentos por trás desse grande número de MEIs no país.

Uma explicação está na reforma trabalhista de 2017. A partir dela, as empresas ganharam mais segurança jurídica para contratar serviços terceirizados. Isso explica em parte o crescimento na abertura de novas empresas individuais. A pandemia acelerou esse processo, especialmente na área digital.

Há também uma explicação tributária. Trabalhadores individuais podem, por opção, constituir empresa para pagar menos tributos. Ou pessoas podem ter sido pressionadas a se tornar “pejota” para seu empregador virar um contratante e pagar menos encargos e impostos.

Outra causa para o aumento do número de MEIs é o “desemprego brutal”, aponta Firpo. Demitidas e sem conseguir nova colocação, pessoas vão para a informalidade ou criam uma empresa individual para ter, ao menos, alguma proteção previdenciária.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Editoriais

Bolsonaro faz mais investidas contra urnas eletrônicas

Valor Econômico

O ponto é que só Bolsonaro julga que falta transparência a um processo eleitoral limpo e rápido, elogiado em todo o mundo

Jair Bolsonaro nunca teve problemas com as urnas, só depois de obter o maior trunfo de sua carreira política e chegar à Presidência da República. A atual aversão motivada, que inspira uma campanha com potenciais consequências perturbadoras, é tanto maior quanto mais o presidente suspeita que as pesquisas eleitorais possam estar falando a verdade e ele será derrotado em outubro. O presidente de antemão não aceita o veredito das urnas, que não julga confiáveis, e quer permanecer no poder. Em um regime democrático, isso não é possível.

O temor de ter de abandonar o Palácio do Planalto, e depois se envolver em um turbilhão judicial que pode lhe ser desfavorável, alimenta a imaginação paranóica do presidente. Com o Executivo na mão e o Legislativo na retaguarda, há uma instituição que pode frustrar seus desejos: o Judiciário. Bolsonaro afirma que o anterior, o atual e o futuro presidente do Tribunal Superior Eleitoral - Luís Barroso, Edson Fachin e Alexandre de Moraes - estão empenhados em eleger seu adversário, Luiz Inácio Lula da Silva. Fachin por um motivo especial: seria “marxista-leninista”.

Mas a trajetória de Bolsonaro em direção a causar um grande tumulto nas eleições nada tem de subjetivo. Ele dá sempre novos passos nessa direção. O ministro Barroso convidou as Forças Armadas a fazerem parte do Comitê de Transparência das Eleições, que logo foi utilizada pelo comando militar para enviar uma saraivada de 88 questões sobre tudo que poderia dar errado nas urnas eletrônicas - mas nunca deu -, várias delas na linha das suspeitas do presidente, como a da existência da “sala secreta” em que Bolsonaro acha que as eleições são de fato decididas. Em reunião com empresários, em 13 de maio, Bolsonaro disse que os militares apontaram “mais de 600 vulnerabilidades” nos aparelhos de votação. Já havia também ameaçado virar a mesa se não fosse possível auditá-los.

Poesia | João Cabral de Melo Neto: Morte e Vida Severina

 

Música | Ozi dos Palmares: Dos Engenhos de Minha Terra (Ascenso Ferreira)

 

terça-feira, 14 de junho de 2022

Merval Pereira: Empatia seletiva

O Globo

O senso de empatia do presidente Bolsonaro somente se revela quando um dos seus é atingido, como quando tomou um avião para ir ao Rio para o enterro de um paraquedista ou quando, por meio das redes sociais, lamentou a morte de Marília Mendonça, a rainha do feminejo, a música sertaneja por mulheres, ou do MC Reaça, assassinado. As mortes dos ícones da música brasileira João Gilberto ou Elza Soares não mereceram do presidente um tuíte.

Também não visitou hospitais durante a fase mais aguda da pandemia de Covid-19 e demorou meses para lamentar as mortes, que batiam recordes diários no país. Ao contrário, dizia com frequência que milhares de pessoas morriam diariamente no país de doenças variadas, tentando normalizar a tragédia que se abatia sobre nós.

Não é de admirar que agora, com a tragédia que atingiu o jornalista britânico Dom Phillips e o indigenista Bruno Pereira, tenha demorado a se pronunciar e, quando o fez, tenha sido para lamentar que os dois fizeram “uma aventura” num território perigoso. Com o passar dos dias, a pressão internacional aumentando, Bolsonaro foi tentando amenizar sua carantonha, chegando a dizer que tudo indica que “fizeram uma maldade” com os dois. Agora, tardiamente, anuncia que visitará a Região Amazônica.

Mas voltou a demonstrar insensibilidade ao criticar o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso, que deu cinco dias ao governo para explicar sua atuação no caso. Irritado com o que julga ser uma interferência indevida, o presidente disse que milhares de pessoas desaparecem todos os dias no Brasil, e Barroso nunca se preocupou com elas. Uma tentativa canhestra de se justificar, fingindo que não sabe que, no caso atual, não se trata de pessoas desaparecidas por razões fortuitas, mas de um jornalista britânico e um indigenista brasileiro que trabalhavam na região, um fato de repercussão internacional, que envolve tráfico de drogas, garimpo ilegal, invasão de terras indígenas, falta de controle do governo nessas áreas, tudo o que é criticado no mundo inteiro.

Carlos Andreazza: Doador compulsório

O Globo

Paulo Guedes não falou em congelamento de preços. Talkey? Sejamos exatos. Travamento — foi o que propôs. Trava! Ele prescinde do gelo. Vamos sem analgesia. Palestrou:

— Nova tabela de preços? Só em 2023. Trava os preços! Vamos parar de aumentar preços aí. Dois, três meses. Nós estamos em uma hora decisiva para o Brasil.

Avalie-se a carga de uma fala como esta:

— Vamos parar de aumentar preços aí.

Ele constrange. Registra, porém:

—É tudo voluntário.

Convite aos supermercadistas patriotas. (Mas que não se esqueçam: a Petrobras está sob intervenção.)

Está desesperado. Nada a ver com o futuro da economia brasileira. Apela, agora terceirizando, para um conjunto de puxadinhos — “mais Brasília, menos Brasil” — capaz de forjar baixa artificial da inflação até o fim de outubro. É guerra.

Nesse esforço de guerra, pretende-se gastar, em subsídios, uma Eletrobras — talvez mesmo duas, considerado o volume de renúncias fiscais. Daqui até o fim do ano, pelo menos R$ 30 bilhões para subsidiar indiscriminadamente, entre outras derramas eleitoreiras, a gasolina; a gasolina de quem tem dinheiro sobrando. Flávio agradece.

Marlon Cecilio de Souza*: Os gargalos do Rio

O Globo

Os estorvos na mobilidade urbana noticiados, quase diariamente, pelos meios de comunicação são consequência tanto de uma série de erros passados irreversíveis como da ausência de um planejamento contínuo e concreto, que vise a atenuar o caos do transporte na capital fluminense. Em 2021, a empresa israelense Moovit publicou uma pesquisa em que apontava o Rio como a pior mobilidade do país. Entre as reclamações dos passageiros, estão a superlotação, o tempo de espera e a falta de informação.

O Estado do Rio e sua capital sofrem duas crises internas antigas, que contribuíram para a falta de políticas públicas e infraestrutura urbana de médio e longo prazos:

1) a herança deixada pelas péssimas gestões públicas consecutivas;

2) a crise estrutural iniciada na década de 1970, após a fusão do Estado do Rio de Janeiro com a Guanabara, decorrente da transferência da capital para Brasília, que culminou numa gradual perda de riqueza.

Além disso, houve os impactos advindos das políticas em prol da implementação de um projeto nacional que visava à abertura de rodovias. A confiança nos automóveis levou a um lento e gradual desmantelamento da malha ferroviária.

As privatizações do metrô e dos trens, no fim da década de 1990, foram um alento e previam uma série de investimentos conjuntos do estado e das concessionárias. No entanto o progresso foi marginal e se restringiu à troca das composições por outras mais modernas, inseridas no mesmo contexto de dificuldades.

Míriam Leitão: Urna, floresta e soberania nacional

O Globo

O país foi tomado pela dúvida desde o dia 5 sobre o paradeiro do jornalista Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira. Ontem foi um dia dramático. No meio da bruma que cercou o caso, muito está sendo revelado. No fim de semana, a União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) forneceu à imprensa um farto material provando que eles têm reiteradamente comunicado às autoridades crimes praticados por quadrilhas naquela região. Por que mesmo o governo não se mobilizou para coibir os ilícitos? Ontem o presidente do Senado falou em “Estado paralelo” na Amazônia. Não é exagero.

Enquanto o Brasil vive essa angústia real, no mundo paralelo do Ministério da Defesa, o general Paulo Sérgio Nogueira resolveu atacar o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por um problema inexistente. A ocupação da Amazônia pelo crime é um problema de segurança nacional, concreto, verdadeiro, perigoso, mas o que move os humores do ministro da Defesa é a mentira do presidente da República de que as urnas não são confiáveis. Os termos da nota do general são inaceitáveis. Em negrito, o ministro registrou. “Cabe ressaltar que uma premissa fundamental é que secreto é o voto, não a apuração”. A apuração não é secreta, nunca foi, quem inventou isso foi Jair Bolsonaro. O general subverteu a ordem da República e quer dar ordens ao tribunal eleitoral.

Alvaro Costa e Silva: Liberdade fardada

Folha de S. Paulo

Presidente e o vice general vão às eleições com as mãos sujas do sangue de Dom e Bruno

O que diz o ministro da Defesa, tão preocupado com as urnas eletrônicas, sobre a nova tentativa de golpe programada para Sete de Setembro —a 26 dias das eleições? Paulo Sérgio Nogueira sente-se prestigiado a participar de ataques aos ministros do STF e TSE? O general mandará às ruas tanques fumacentos? Comandará a retirada de oxigênio da população para manter a liberdade fardada?

Havendo golpe para invalidar a votação desfavorável a Bolsonaro, será um movimento militar. O presidente se transformará num mito banal. Um ditador de mentira (tudo a ver, para quem sempre viveu mentindo), que poderá ser descartado a qualquer momento. Para a eventualidade, haverá um vice-presidente que é general, óbvio. Na chapa que concorre com as bênçãos do centrão e as mãos manchadas com o sangue de Dom Phillips e Bruno Pereira, o escolhido é Walter Braga Netto, que deixou o cargo de ministro da Defesa.

Hélio Schwartsman: Um presidente deplorável

Folha de S. Paulo

O presidente é ruim na parte do governo e deplorável no papel de bússola moral

Ao que tudo indica, Bruno Pereira e Dom Phillips foram mesmo assassinados. Suas mortes são mais uma mácula que o Brasil coletivamente terá de carregar, ao lado das de Chico MendesDorothy Stang e tantos outros. Mas será que dá para apontar o dedo para Jair Bolsonaro e responsabilizá-lo por essa tragédia?

No plano das causas proximais, que são as que importam para o direito, o presidente é obviamente inocente. Até onde sabemos, Bolsonaro não mandou matar a dupla nem tem vínculos diretos com pessoas ou grupos que possam estar envolvidos no crime. Um dos problemas da região é a virtual ausência de Estado, o que torna difícil para o poder público prevenir homicídios. Mendes foi morto sob a gestão de José Sarney; Stang, quando Lula estava no comando.

Cristina Serra: Quem matou Bruno e Dom?

Folha de S. Paulo

Com discurso de ódio contra indígenas, Bolsonaro é anabolizante das milícias da floresta

No momento em que escrevo, esvaiu-se a esperança de que o indigenista Bruno Pereira e o jornalista Dom Phillips sejam encontrados com vida. A família do cidadão britânico teria recebido o aviso de que dois corpos foram localizados num dos pontos de busca do Vale do Javari, na imensidão da floresta amazônica, que eles tanto amaram.

Quem os matou? Bruno e Dom foram mortos por todos os que incentivam o crime contra os povos indígenas, suas terras, a floresta, suas águas, bichos e plantas. Por aqueles que enfraqueceram os órgãos de fiscalização nos últimos anos, tirando-lhes verba e equipamentos, perseguindo e coagindo os servidores públicos. Como fizeram com Bruno, afastado da Coordenação Geral de Índios Isolados e Recém Contatados, em 2019.

Joel Pinheiro da Fonseca: Nem preservação nem soberania

Folha de S. Paulo

Fica claro que o presidente Jair Bolsonaro perdeu qualquer intenção de governar a região

desaparecimento de Dom Phillips e Bruno Pereira segue sem desfecho. Espero que sejam encontrados com vida mas, sinceramente, não é a hipótese mais provável. O caso escancara, para nós e para o mundo, o que os números já vinham mostrando: a Amazônia está entregue ao crime.

Nas discussões sobre a Amazônia é comum cair num dilema questionável entre preservação ambiental e soberania nacional. Bolsonaro e as Forças Armadas sempre batem na tecla da soberania. Por trás do discurso, contudo, a realidade é que o governo optou por ficar sem nenhum dos dois.

João Doria*: Não desisti do Brasil

Folha de S. Paulo

Os eleitores não são culpados pelo dilema no qual o país se encontra

Eu não desisti do Brasil. Ao contrário, tenho convicção do potencial que temos para superar nossos problemas históricos. Tenho orgulho de uma vida pública ilibada, com resultados expressivos para o povo de São Paulo.

Tanto na capital quanto no estado, com o apoio de uma equipe competente, nós crescemos, geramos milhões de empregos e entregamos obras consideradas impossíveis, como a despoluição do rio Pinheiros.

Com competência e seriedade provei que é possível governar para todos, resolver os mais graves desafios e deixar um legado emblemático de realizações. Não economizei esforços e fui até a China estabelecer uma parceria com um dos maiores laboratórios do mundo para comprar a vacina que salvou milhões de brasileiros. Foram 124 milhões de imunizantes contra a Covid-19. Salvamos vidas e a nossa economia.

Cristovam Buarque*: A lição da Bolívia

Correio Braziliense

No mesmo dia em que o ministro da Defesa mandou carta ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com a arrogância usual de pessoas armadas, insinuando desconfiança quanto à transparência do processo eleitoral, a democracia boliviana condenou sua ex-presidente a 10 anos de prisão, por ter contestado os resultados eleitorais que reelegeu o presidente Evo Morales. As pessoas mais velhas lembram que a Bolívia era símbolo da "democracia de banana": seus presidentes constantemente destituídos e substituídos por militares ou civis. Houve ano com mais de um presidente no espaço de poucos meses. Até que a Bolívia fez sua redemocratização e elegeu o primeiro presidente em 1982. A partir de então, todos os resultados eram respeitados.

O rigor democrático só ficou sob suspeição quando a eleição de Evo Morales foi contestada devido a uma vantagem mínima sobre seu opositor. Vale lembrar que Morales fez a primeira interferência dentro do marco legal ao induzir a reforma da Constituição que lhe permitiu reeleições sucessivas, cujos resultados apertados levaram ao golpe dado pela presidente do Congresso, sucessora legal, agora condenada a 10 anos de prisão, como golpista.

Rubens Barbosa*: Cúpula das Américas

O Estado de S. Paulo

O diálogo entre os EUA e a América Latina e o Caribe encontra-se hoje num dos piores momentos desde o fim da guerra fria.

A 9.ª Cúpula das Américas, reunindo chefes de Estado dos países da região, ocorreu na semana passada em Los Angeles, nos EUA, em circunstâncias muito diferentes da primeira reunião, organizada em Miami em 1994, quando os EUA apresentaram a proposta de uma Área de Livre-comércio nas Américas (Alca). O encontro foi realizado num momento difícil para o anfitrião, às voltas com o apoio à Ucrânia na guerra contra a Rússia e a disputa pela hegemonia global com a China. A divisão interna nos EUA impediu que propostas dos dois partidos pudessem ser formuladas e apresentadas por Joe Biden. A América Latina está bem abaixo nas prioridades da política externa dos EUA. Em pronunciamento recente sobre as prioridades do país nesta área, o secretário de Estado, Antony Blinken, nem mencionou a América Latina. O diálogo entre os EUA e a América Latina e o Caribe encontra-se hoje num dos piores momentos desde o fim da guerra fria.

Andrea Jubé: São Paulo, o difícil começo da cruzada eleitoral

Valor Econômico

Após Minas, PSD também pode se juntar a Lula no Rio

A rejeição da transferência do domicílio eleitoral do ex-juiz Sergio Moro do Paraná para São Paulo joga luz sobre a relevância estratégica do Estado como palco político nas eleições de outubro.

Basta verificar que o ex-magistrado, nascido em Maringá, teria uma eleição sem sobressaltos em seu Estado de origem, mas estimulado por aliados do União Brasil, cobiçou estrear nas urnas logo pela unidade mais rica e relevante da Federação.

O mesmo questionamento assombra a pré-candidatura ao Palácio dos Bandeirantes do ex-ministro Tarcísio de Freitas (Republicanos), principal palanque do presidente Jair Bolsonaro na empreitada pela reeleição. Ele transferiu o domicílio do Rio de Janeiro para São Paulo. Um processo já foi arquivado pela Justiça Eleitoral, mas nova contestação pode surgir no momento do registro da candidatura.

A história atesta a rejeição dos paulistas a líderes vindos de outros Estados. Às vésperas da Revolução Constitucionalista, em abril de 1931, insurgentes contra a ditadura de Getúlio Vargas publicaram um manifesto nos jornais paulistanos contra o interventor nomeado pelo caudilho: “Estamos entregues a um governo de forasteiros.”

Pedro Cafardo: A desindustrialização ao vivo do setor químico

Valor Econômico

Mudança no regime tributário especial do setor provoca insegurança jurídica

Enquanto as discussões se concentravam no ICMS sobre combustíveis, outro tema na área tributária, com mínima repercussão, mostrava como o viés ideológico continua contribuindo para a desindustrialização do país. No apagar das luzes de 2021, o governo baixou a Medida Provisória 1.095/21, que extinguiu a partir de abril deste ano o Regime Especial da Indústria Química.

Esse Reiq, como é conhecido, criado em 2013, era uma redução tributária para incentivar o setor químico, que encolhia no país. Deveria continuar, por lei, até 2024, com redução gradativa do benefício fiscal. Mas a cúpula econômica do governo, nada preocupada com a desindustrialização, resolveu antecipar sua extinção.

Na noite do réveillon, a MP caiu como uma bomba na indústria química e acabou sendo parcialmente corrigida pelo Congresso no mês passado. Em resumo, os parlamentares mantiveram a redução gradativa do benefício, mas o estenderam até 2027, criando um regime de transição. Foram elevadas as alíquotas de PIS/Cofins para os fatos geradores ocorridos entre abril e dezembro de 2022. E exigidas contrapartidas da indústria à sociedade enquanto vigorar o regime especial, uma boa iniciativa.

Maria Clara R. M. do Prado: Bolsonaro é refém de um cruel inimigo

Valor Econômico

A percepção de empobrecimento é o que leva o eleitor a votar para não perpetuar a realidade

Em 1º de janeiro de 2019, quando Bolsonaro assumiu a Presidência da República, o salário mínimo era de R$ 998 e uma cesta de 35 produtos básicos largamente consumidos nos supermercados custava R$ 465,57. Ou seja, 46,6% do piso salarial no mercado formal de trabalho comprava por mês 27 diferentes itens alimentícios como carne, frango, óleo de soja, arroz, sal, feijão, açúcar e leite, entre outros, além de oito bens essenciais para limpeza e higiene, como sabão em pó, desinfetante e papel higiênico.

Em abril deste ano, a mesma cesta de produtos custava em média R$ 758,72 nos supermercados, valor equivalente a 62,6% do salário mínimo atual de R$ 1.212,00. Em três anos e quatro meses de governo, o bolso dos eleitores brasileiros de renda mais baixa foi impactado com o aumento de 67,38% em média dos preços cobrados pelos mesmos produtos básicos, enquanto o salário mínimo subiu apenas 21,44% no período.

Para que os gastos da cesta em abril deste ano tivessem o mesmo peso no piso da renda mensal do trabalhador, o salário mínimo vigente hoje deveria ser de R$ 1.626,40. Esse é o valor que manteria o poder de compra ao nível em que estava em 1º de janeiro de 2019, levando-se em conta a variação de preços dos itens aqui considerados.

Ricardo José de Azevedo Marinho*: Com Pandemia, Sequelas & Democracia

A pandemia do covid-19 é um dos vinte episódios mais mortais dos últimos 700 anos. Temos já milhões de pessoas no mundo que faleceram enquanto as temidas ondas de infecção seguem acontecendo aqui e em grande parte da Europa e nos Estados Unidos da América (EUA). As medidas de confinamento realizadas para controlar a propagação do coronavírus causou uma desaceleração nas atividades econômicas globais. Diante desse cenário, formuladores de políticas economia (salvo os de alguns governos que negavam a pandemia, dentre os quais o nosso) responderam a perda de emprego e atividade dos negócios com medidas fiscais e monetárias agressivas.

Em geral, os países entenderam que o caminho era gerenciar a crise econômica mesmo quando produziram divergências políticas sobre como equilibrar a necessidade para controlar a propagação do vírus com as perdas econômicas causadas pela política sanitária. Eles programaram grandes pacotes de apoio fiscal para garantir as trabalhadoras e os trabalhadores desempregados. Os Bancos Centrais rapidamente desenharam políticas monetárias que deram garantias de liquidez aos mercados. As lições da crise financeira global de 2008 ainda estão frescas nas mentes de muitos gerentes de política econômica.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Editoriais

Amazônia sob o jugo do crime organizado

O Globo

A busca pelo indigenista e funcionário da Funai Bruno Pereira e pelo jornalista britânico Dom Phillips tem confirmado as piores suspeitas sobre o desaparecimento da dupla, que navegava no dia 5 de junho pelo Vale do Javari, na Amazônia, mas não chegou ao destino. De acordo com a família de Dom e diplomatas britânicos, os corpos dos dois foram achados mortos na floresta. A Polícia Federal (PF) desmentiu a informação, mas as autoridades descobriram documentos, roupas e objetos pessoais perto da casa do principal suspeito pelo desaparecimento, que continua preso.

Diante da repercussão internacional, o governo federal mobilizou Marinha, Exército, Força Nacional, Polícia Federal e Funai na busca. O presidente Jair Bolsonaro chegou a citá-la no discurso que fez na Cúpula das Américas. Infelizmente, os fatos não o eximem da responsabilidade por ter amplificado os conflitos numa região convulsionada por disputa de terras, desmatamento, garimpo e pesca ilegais. O aumento na devastação da floresta neste governo está comprovado por todos os levantamentos científicos.

Na campanha eleitoral, Bolsonaro defendia intervir no Ibama e no ICMBio para acabar com o que chamou de “indústria de multas”, tida como ameaça aos “empreendedores” — os que desmatam para extrair madeira ilegal, depois queimam a floresta para transformá-la em pasto e envenenam os rios com o mercúrio usado em garimpos.

Poesia | Carlos Drummond de Andrade: Quando encontrar alguém.

 

Música | Elba Ramalho, Alceu Valença: Ciranda da Rosa Vermelha

 

segunda-feira, 13 de junho de 2022

Opinião do dia - Manuel Castells*: ‘a hipótese do caos’

“Em tempos de incertezas costuma-se citar Gramsci quando não se sabe o que dizer. Em particular, sua célebre assertiva de que a velha ordem já não existe e a nova ainda está para nascer. O que pressupõe a necessidade de uma nova ordem depois da crise.

Mas não se contempla a hipótese do caos. Aposta-se no surgimento dessa nova ordem de uma nova política que substitua a obsoleta democracia liberal que, manifestamente, está caindo aos pedaços em todo o mundo, porque deixa de existir no único lugar em que pode perdurar: a mente dos cidadãos.”

*Manuel Castells, sociólogo e referência em teoria da comunicação, é professor emérito da Universidade da Califórnia em Berkeley. Do trecho de livro 'Ruptura', Editora Zahar, 2018. Folha de S. Paulo, Ilustríssima, 9/6/2018.

Fernando Gabeira: Fome no país do agronegócio

O Globo

Trinta e três milhões de pessoas passam fome no Brasil. O número praticamente dobrou em dois anos. É um caso de emergência nacional.

Não creio que Bolsonaro esteja se importando muito com isso. Quando morriam as pessoas com Covid-19, ele disse:

— E daí? Não sou coveiro.

Um humorista lembrou muito bem que ele pode dizer agora:

— E daí? Não sou cozinheiro.

Tenho escrito que Bolsonaro é um bode na sala. Um imenso bode. Por trás de sua incompetência e insensibilidade, há uma crise muito séria, que não se resolverá com paliativos. Desde a década passada sobem os preços de alimentos e energia, assim como se sucedem eventos extremos causados pela emergência climática.

Sergio Lamucci: A hora do populismo e do estelionato eleitoral

Valor Econômico

Como o objetivo é baixar a inflação para melhorar a popularidade de Bolsonaro, considerações sobre 2023 e depois não entram mais na conta do governo

Na semana passada, o governo avançou ainda mais na tentativa de reduzir a inflação a qualquer custo, escancarando a estratégia populista na busca para reverter a baixa popularidade do presidente Jair Bolsonaro. Primeiro, com o anúncio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para ressarcir os Estados que concordarem zerar o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do óleo diesel e do gás de cozinha, casada à ideia de jogar a zero a alíquota dos tributos federais sobre a gasolina e o etanol. Depois, com o pedido de Bolsonaro e do ministro da Economia, Paulo Guedes, para que empresários segurem reajustes de preços.

O que se prepara, às claras, é um estelionato eleitoral, como definiu Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), em entrevista ao Valor. Se aprovados em conjunto a PEC e o projeto que limita a alíquota do ICMS de itens como energia elétrica e combustíveis (o PLP 18/2022), a inflação poderá ter uma queda considerável neste ano, para voltar a subir no ano que vem. Com um Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mais elevado em 2023, a perspectiva é que os juros fiquem mais altos por mais tempo, o que deverá afetar o crescimento. Além disso, essas medidas tendem a minar estruturalmente as contas públicas.

Bruno Carazza*: Na República da desigualdade imperfeita

Valor Econômico

As cores distorcidas na política brasileira travam a democracia

A surpresa chegou pelo correio. Cortesia da editora, abri o pacote curioso para saber qual seria a novidade. A capa colorida, suas 458 páginas e o título instigante só aguçaram meu interesse.

Eu nunca havia ouvido falar do autor. Julguei se tratar de uma obra de estreia, mas, na orelha do livro, a revelação: Edson Lopes Cardoso já conta com 73 anos, e aquele era só mais um, dos vários livros escritos ao longo de sua vida.

 “Nada os trará de volta” é uma compilação de textos publicados por Cardoso nas últimas quatro décadas, ao longo das quais analisa os principais acontecimentos políticos e sociais brasileiros.

À medida em que folheava o livro, um sentimento de completa alienação tomou conta de mim. Como nunca havia ouvido falar de um intelectual com uma obra tão vasta, que se formou em algumas das principais instituições do país (UFBA, UnB e USP) e se valia de tantas referências históricas e culturais num diálogo com os principais intérpretes de nossa sociedade?