sábado, 13 de setembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Condenação honra a Constituição e a democracia

Por O Globo

Aos réus foi assegurada defesa, houve divergência, e prevaleceu a Justiça. É hora de virar a página do radicalismo

Não há como deixar de reconhecer o caráter histórico do julgamento que condenou Jair Bolsonaro e mais sete réus por planejar e tentar pôr em marcha a ruptura da ordem institucional democrática estabelecida pela Constituição de 1988. Depois de inúmeros golpes de Estado e tentativas frustradas desde a fundação da República, pela primeira vez um ex-presidente, ex-ministros e militares de alta patente foram condenados por atentar contra a democracia no Brasil. O período mais longevo de vida democrática brasileira não apenas resistiu à intentona, mas enfim o Brasil conseguiu punir traidores da vontade popular.

Bolsonaro é um chatbot. Por Thaís Oyama

O Globo

Parte da esquerda bem gostaria de trocar de povo, mas, dado que essa não é uma opção, limita-se a escandalizar-se

Em julho, o Grok — chatbot de inteligência artificial da xAI — postou elogios a Hitler e frases antissemitas no X, obrigando a empresa de Elon Musk a remover as mensagens e prometer “melhorar” seu treinamento. Constrangimento igual já havia sofrido a Microsoft quando, em 2016, Tay, robô criada para interagir com meninas adolescentes no Twitter, saiu disparando atrocidades nazistas e insultos sexistas na plataforma. Foi tirada de circulação 16 horas depois do lançamento. Na origem dos desastres de marketing de Grok e Tay está o fato de os “robôs de conversa”, em grande medida, refletirem o que encontram no ambiente em que são treinados ou interagem — e isso inclui os padrões, vieses e preconceitos dos usuários das redes.

A democracia fica mais forte. Por Flávia Oliveira

O Globo

Ministros do STF produziram um manual de como julgar ameaças ao Estado Democrático de Direito

Numa odisseia político-judicial tomada de ineditismos, um ex-presidente, três generais, um almirante, um deputado federal foram condenados por crimes contra a democracia num 11 de setembro agora histórico no Brasil. Como simbolismos importam, registre-se que o clímax da conspiração golpista, o 8 de Janeiro de 2023, ocorreu quando o Supremo Tribunal Federal estava sob a presidência de Rosa Weber. Foi dela a promessa de responsabilização aos que conceberam, praticaram, insuflaram e financiaram os ataques. Dois anos e oito meses depois, foi o voto de Cármen Lúcia, única mulher entre os 11 ministros da Corte, que formou maioria para condenar Jair Bolsonaro e mais sete réus.

Como se fosse uma pesada porta. Por Eduardo Affonso

O Globo

Leitura escapista ou que pague o pedágio da culpa burguesa, aparentemente, é disso que o povo gosta

O GLOBO dedicou, no Segundo Caderno de 5 de setembro, duas páginas ao lançamento do novo livro de Dan Brown — um catatau que o próprio autor considera sua obra mais intrincada, ambiciosa e divertida. A resenha acrescentava que “O segredo final” é arrebatador, com uma trama instigante (adjetivo, quando se trata do autor de “O Código Da Vinci”, não pode faltar).

Teremos passado do ponto? Por Bolívar Lamounier

O Estado de S. Paulo

Ou nos valemos da eleição de 2026 para repor o País nos prumos que nunca teve ou praticamos lealmente o sistema presidencial ‘puro’

Jorge Luis Borges, o maravilhoso escritor argentino, publicou, não me l embro quando, um livrinho intitulado El tamaño de mi esperanza; hoje, fosse eu macaquear Borges, meu título só poderia ser O tamanho de minha desesperança.

Mas vamos com calma. Outro dia ouvi de um amigo entusiasmadas referências positivas a avanços no campo da política social. Declínio na mortalidade infantil, melhorias no saneamento básico e por aí afora. Avaliações pontuais, mas considerando quem as fez, senti certo alívio. O problema é que, tendo nascido em Minas, na margem esquerda do rio São Francisco, e leigo no assunto, senti-me espicaçado por uma aguda necessidade de um antídoto. E logo o encontrei num artigo publicado neste espaço pelo economista Roberto Macedo. O que ali encontrei pareceu-me mais do que suficiente para indicar que estamos longe de escapar do fundo do poço. Longe de escapar, repito, do que se tem denominado “armadilha da baixa renda” (que, a meu ver, mereceria a alcunha “armadilha do baixíssimo crescimento”). A título de memória: com nossa pífia renda per capita crescendo 2,5% ao ano, levaremos 28 anos para dobrá-la, ou seja, para permanecermos como um país em média paupérrimo, sem esquecer que essa obscena pobreza é obscenamente distribuída entre as camadas sociais.

O direito do clima político. Por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

As preliminares importam – não sejam maldosos – e as questões de Luiz Fux merecem atenção máxima. Merecem reflexão séria, ainda que depois o juiz tenha, no mérito, votado para condenar, por tentativa de abolição do estado democrático de direito, o candidato a vice e o ajudante de ordens do presidente – e não o cabeça da chapa e chefe.

Voto legítimo, de início tratado como “prova cabal” de que não estaríamos numa ditadura. Isso até que a divergência avançasse para algo além do dissenso permitido, quando a religião do ministro passou a servir de razão para xingá-lo. Não há notícia ainda de que, à luz da língua xandônica, esse discurso de ódio tenha configurado ataque ao STF e à própria democracia, e ensejado, conforme a censura do bem, a derrubada de postagens ou o bloqueio de contas.

Tarcísio e a radicalização. Por Rodrigo Zeidan

Folha de S. Paulo

Governador do maior estado ataca abertamente a principal instituição do Judiciário

A radicalização do discurso do governador de São Paulo está longe de acabar. O assassinato de Charlie Kirk provavelmente vai tornar sua radicalização ainda mais palatável politicamente. A eleição de Trump mostrou que o extremismo inflama os apoiadores mais tresloucados sem quase nenhum custo.

Políticos, como quaisquer investidores, estimam risco e retorno em tomadas de decisão. Posição política arriscada? Menor chance de que um político vá defendê-la. É por isso, por exemplo, que estadista de esquerda com aspirações nacionais não defende publicamente o direito ao aborto. Uma parte, mesmo que considerável, da base de apoio se importa com o assunto, mas há alto grau de rejeição entre indecisos e outros eleitores. O custo é alto para pouco benefício pragmático.

O custo da deslealdade à democracia. Por Oscar Vilhena Vieira e Theo Dias

Folha de S. Paulo

Condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro representa passo importante na interrupção do legado de impunidade no país

A impunidade tem sido a regra para os que conspiram contra a ordem constitucional no Brasil. Ao longo da República, mais de uma dezena de golpes, insurgências e intentonas ficaram impunes. Mesmo os autores de crimes contra a humanidade foram, ao final, anistiados.

A condenação de Jair Bolsonaro representa, assim, passo importante na interrupção desse legado de impunidade, que tem servido como incentivo para sucessivas rupturas das regras básicas do jogo democrático. Se o parlamento não forçar uma anistia, o custo para um novo golpe terá ficado mais alto no Brasil.

O Brasil antes e depois do julgamento do STF. Por Camila Rocha

Folha de S. Paulo

Podemos ser um país no qual é inaceitável que as Forças Armadas intervenham na vida democrática

Há um antes e um depois na história política brasileira. O país era um antes do dia 11 de setembro de 2025 e se tornou outro depois da data. Ainda que não exista uma nova Constituição ou uma mudança de regime, um novo espírito passou a animar a nossa democracia.

Desde a redemocratização, quatro ex-presidentes já foram presos, e dois, impedidos. São cinco de um total de oito presidentes. O número indica que não foi particularmente difícil para o Judiciário e o Congresso brasileiros imporem derrotas a chefes de Estado. Porém, o exato oposto ocorria com as Forças Armadas desde o início da República até o último dia 11 de setembro.

Motta está entre gregos e troianos. Por Adriana Fernandes

Folha de S. Paulo

Presidente da Câmara tem pela frente a proposta de anistia e a isenção do IR

O pior que pode acontecer para o país é o presidente da Câmara, Hugo Motta, tentar agradar gregos e troianos na semana seguinte à condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro pelo STF por liderar tentativa de golpe de Estado.

Avançar com a proposta de anistia aos condenados e ao mesmo tempo colocar em votação o projeto do governo Lula de aumento para R$ 5.000 da faixa de isenção do Imposto de Renda.

Condenação histórica. Por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

STF cumpriu seu papel ao sentenciar Bolsonaro e seus principais apoiadores; é preciso agora evitar reversões

STF cumpriu seu papel de guardião da ordem constitucional ao condenar Jair Bolsonaro e seus principais escudeiros por tentativa de golpe de Estado e outros crimes. Essa é uma daquelas ocasiões em que apor o adjetivo "histórico" à palavra "decisão" não constitui exagero. Estamos, porém, no Brasil, país em que até o passado é incerto.

O grande valor de uma condenação como a que foi imposta ao núcleo primordial do movimento golpista está em seu caráter dissuasório. Condena-se hoje para que, no futuro, ninguém imite quem tentou promover uma ruptura institucional.

O enigma. Por André Gustavo Stumpf

Correio Braziliense

O julgamento no STF serviu para fazer com que o Brasil acredite na força de sua democracia. Mas Lula continua candidato à reeleição, e a direita ainda não encontrou um substituto

O espetáculo midiático foi bonito, cada um dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) teve seu momento de grande exposição, mas a festa acabou. Surgiu um novo tempo, o ex-presidente e seus principais auxiliares serão presos, e há a perspectiva de a eleição de 2026 se transformar numa guerra de posições parecida com o que ocorre atualmente nos Estados Unidos, onde os divergentes se resolvem na base do tiro e da pancada. Todo mundo mata todo mundo.

O mundo está passando por um de seus períodos de loucura. A Rússia bombardeou a Polônia, que chamou os colegas da Otan a enfrentar o inimigo comum, o Exército de Moscou. A Europa está convulsionada. Israel bombardeou o Qatar para matar chefes do grupo Hamas. Nenhuma atenção foi dada ao fato de que as bombas caíram em país que não está em guerra com o país dos judeus. E Telaviv também já não dissimula que não pretende abrir espaço para um futuro país palestino. O mundo piorou nos últimos tempos, por consequência da atuação de líderes despreparados para exercer suas responsabilidades. O resultado dessa situação é a guerra, ou a política exercida por outros meios, seja chantagem econômico-financeira ou ameaça de conflito bélico.

O valor e o desvalor da divergência. Por Juliana Diniz

O Povo (CE)

Não podemos jamais confundir os desacordos salutares, próprios da pluralidade com que se faz o Direito, da absoluta falta de coerência de um determinado intérprete em circunstâncias muito semelhantes de avaliação

Juristas costumam colecionar defeitos. A vaidade, a soberba, a habilidade de complicar. O mais imperdoável deles é a incoerência, porque mina aquele que é o alicerce de qualquer ordem jurídica: a confiabilidade. No julgamento mais importante das últimas décadas, um dos ministros do STF abusou da licença para divergir: como explicar as reviravoltas argumentativas do voto de Luiz Fux sem desacreditar do próprio Direito?

Esse é um ponto delicado de explicar: por que há divergência quando se trata de interpretar as leis? Por que, em um mesmo tribunal, um juiz pode decidir de modo distinto do outro? A resposta é sempre difícil, mas honesta: interpretar o Direito (assim como as ações e motivações humanas) não é um trabalho exato, é uma operação de linguagem em que várias subjetividades concorrem na tentativa de construir um resultado objetivo.

Peixe fora d’água. Por Marcus Pestana

Tempos estranhos os atuais. Não digo isso com saudosismo, sentimento que não gosto e cultivo. Cada época tem seus sonhos, dilemas, desafios. Cada tempo é envolto em suas circunstâncias.

O grande legado do século XX parecia ser a consagração absoluta da democracia como valor permanente, inegociável, amplo, universal. E aí estamos nós, com a cara do mundo contemporâneo estampada nas faces de Donald Trump, Vladimir Putin, Xi Jinping e Benjamin Netanyahu. Nem o mais radical pesadelo de um democrata pessimista poderia traçar roteiro pior.

O STF e a defesa da democracia. Por Luiz Gonzaga Belluzzo

CartaCapital

Quando os “homens de bem” falam em liberdade, estão preparando a prisão e a tortura dos adversários

Em meio aos instantes finais do julgamento, no Supremo Tribunal Federal, da tentativa de golpe dos “democratas de passeata” é oportuno relembrar o golpe de 1964.  O famigerado golpe de Estado inspirou um ­slogan premonitório: “Basta de intermediários, Lincoln Gordon para presidente”. Gordon era o embaixador dos Estados Unidos no Brasil. Conspirava abertamente com as “forças democráticas” nativas, aquelas que permanentemente arquitetam a supressão da democracia.

Nos tempos de hoje, a conspiração assumiu contornos semelhantes, mas diferentes. Na passeata de 7 de Setembro, os “patriotas” carregaram uma enorme bandeira dos Estados Unidos. Como de hábito na Terra de Santa Cruz, a conspirata golpista envolveu os “homens de bem”, tal como os parlamentares do Centrão. Esses senhores, eleitos pelos ressentidos, patrocinam o Projeto de Lei da Anistia. Os representantes do povo envergam os propósitos golpistas para executar seus projetos pessoais à sombra da escuridão.

Anistia e Constituição. Por Pedro Serrano

CartaCapital

O Congresso não pode outorgar a si próprio a condição de guardião máximo da Carta Magna

O Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento das denúncias formuladas pela Procuradoria-Geral da República contra o ex-presidente Jair Bolsonaro pelos, dentre outros, crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado. Por essas razões, intensificaram-se as discussões relacionadas à concessão de anistia no Congresso. Ou seja, pretende-se atribuir ao Legislativo a determinação dos limites, bem como a extensão e o alcance, da nossa Constituição, substituindo o STF em seu papel de intérprete final e guardião.

Entrevista | Lenio Streck: Basta

Por Rodrigo Martins / CartaCapital

A condenação de Bolsonaro rompe com a secular tradição de impunidade aos golpistas no País, avalia Lenio Streck

Com um histórico de 15 golpes de Estado, tentados ou consumados, desde a Proclamação da República, em 1889, o Brasil parece finalmente prestar contas com seu passado. “Após a condenação de Bolsonaro e seus comparsas, a chance de sofrer mais uma investida diminui bastante”, avalia o advogado ­Lenio Streck, procurador de Justiça aposentado, professor de Direito Constitucional da Unisinos e pós-doutor pela Universidade de Lisboa. Em entrevista a CartaCapital, ele afirma que o Supremo Tribunal Federal agiu dentro dos limites constitucionais e rebate as teses levantadas pela defesa dos acusados, e endossadas no voto divergente do ministro Luiz Fux. “Nenhuma democracia madura comete haraquiri, perdoando quem tenta derrubá-la.”

Longa batalha. Por Marjorie Marona

CartaCapital

Condenação é marco, não ponto final da crise democrática. A sobrevivência da extrema-direita, articulando estratégias de impunidade e reedição política, exige vigilância redobrada

O julgamento de Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal ganhou novos contornos com o voto do ministro Luiz Fux, que acolheu preliminares da defesa e se manifestou pela anulação do processo. Embora isolada diante da tendência de responsabilização do ex-presidente e seus aliados por tentativa de golpe de Estado, organização criminosa e ataque às instituições republicanas, a posição de Fux revela a densidade política e jurídica do caso. Ela demonstra que, mesmo em julgamentos de alta voltagem, persiste espaço para leituras divergentes capazes de oferecer fôlego narrativo aos réus e combustível às suas bases de apoio.

Primeiro passo. Por Jamil Chade

CartaCapital

Trata-se de uma reparação simbólica às vítimas dos heróis de Bolsonaro

Na porta de seu gabinete, o então deputado Jair Bolsonaro mantinha um cartaz que dizia que “quem busca osso é cachorro”, numa ironia aos esforços para encontrar os restos mortais das vítimas no Araguaia. Em sua sala, exibia com orgulho as fotos dos generais que, durante 21 anos, mantiveram com repressão, censura e morte a ditadura.

Ao votar pelo impeachment de Dilma Rousseff, Bolsonaro prestou uma homenagem a um dos torturadores da ex-presidente, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra. Na Presidência, o líder do complô golpista reuniu-se com a viúva do coronel no Palácio do Planalto. O presidente chamou o agente repressor de “herói nacional”, enquanto recebia Maria ­Joseíta Silva Brilhante Ustra em 8 de agosto de 2019. Um ano depois, recebeu Sebastião Curió, o Major Curió, à época com 81 anos. Tratava-se do oficial do Exército que comandou a repressão à Guerrilha do Araguaia e que foi denunciado pelo Ministério Público Federal por homicídio e ocultação de cadáveres durante a ditadura. Em 2009, ao jornal O Estado de S. ­Paulo, Curió afirmou que o Exército executou 41 guerrilheiros no Araguaia.

Um julgamento histórico e o labirinto das circunstâncias. Por Roberto Amaral *

É de relevância insofismável o julgamento que se desenrola no STF; relevância intrínseca ao fato, mas certamente ainda maior em face da carga simbólica representada pelo banco dos réus, onde se sentam, pela primeira vez em nossa história (e isto não é pouco), um ex-presidente da República e uma choldra de generais golpistas a ele associados na tentativa de, mais uma vez em nossa história, violentar o processo eleitoral decidido pela soberania popular. E, como de regra, para fazer regredir o processo social e impor o Estado de exceção, que sempre transita do autoritarismo larvar para a ditadura.
 
Mas isto ainda não é tudo. O julgamento é também relevante pelo que encerra como defesa do sistema democrático-representativo, reacendendo brios esquecidos. Pode mesmo indicar o ponto de partida da recuperação do poder civil, tão aviltado pela preeminência da vontade da caserna, expressa nos tantos putsches, golpes de Estado e ditaduras que promoveu.

Poesia | Sociedade, de Carlos Drummond de Andrade

 

Música | Adriana Calcanhotto - Traduzir-se (Ferreira Gullar)

 

sexta-feira, 12 de setembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

*Condenação honra a Constituição e a democracia*

Por Editorial / O Globo12/09/2025 07h58 Atualizado agora

*Aos réus foi assegurada defesa, houve divergência, e prevaleceu a Justiça. É hora de virar a página do radicalismo*

Não há como deixar de reconhecer o caráter histórico do julgamento que condenou Jair Bolsonaro e mais sete réus por planejar e tentar pôr em marcha a ruptura da ordem institucional democrática estabelecida pela Constituição de 1988. Depois de inúmeros golpes de Estado e tentativas frustradas desde a fundação da República, pela primeira vez um ex-presidente, ex-ministros e militares de alta patente foram condenados por atentar contra a democracia no Brasil. O período mais longevo de vida democrática brasileira não apenas resistiu à intentona, mas enfim o Brasil conseguiu punir traidores da vontade popular.

Os ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram que Bolsonaro, os ex-ministros Braga Netto, Augusto HelenoAnderson Torres e Paulo Sérgio Nogueira, o ex-comandante da Marinha Almir Garnier, o deputado federal Alexandre Ramagem e o ex-ajudante de ordens da Presidência Mauro Cid são culpados. Pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado, a Corte condenou Bolsonaro a 27 anos e três meses, Braga Netto a 26 anos, Torres e Garnier a 24, Heleno a 21, Nogueira a 19, Ramagem a 16, um mês e 15 dias, além da perda do mandato (Cid recebeu dois anos em regime aberto, em virtude de seu acordo de colaboração).

A todos os réus foi assegurado amplo direito de defesa. Não faltou espaço para a argumentação de seus advogados, nem para divergências entre os julgadores. O relator, ministro Alexandre de Moraes, e os ministros Flávio DinoCármen Lúcia e Cristiano Zanin votaram pela condenação dos oito réus pelos cinco crimes. Terceiro a votar, o ministro Luiz Fux apresentou ao longo de 13 horas na última quarta-feira uma divergência profunda dos demais colegas. Depois de argumentar que o Supremo não era o foro adequado para o julgamento, defendeu em seu voto que os réus não incorreram nos crimes de organização criminosa e dano ao patrimônio. Fux ainda votou pela aglutinação dos crimes de tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito, condenando apenas Cid e Braga Netto por este último. Absolveu-os e a todos os demais réus — inclusive Bolsonaro — de todos os demais crimes.

A divergência de Fux, ainda que repleta de contradições — ele próprio condenara os réus do 8 de Janeiro por crimes semelhantes e aceitara a denúncia contra Bolsonaro e os outros acusados antes de considerar o STF inepto para julgá-los —, é a maior prova de que o julgamento foi justo. Num órgão colegiado, discordâncias são naturais e esperadas. É justamente para que não prevaleça a opinião de um único juiz que casos dessa complexidade e relevância devem ser submetidos a vários. Fux contemplou em seu voto todos os argumentos da defesa, garantindo aos réus o direito ao contraditório. Mas, diante da eloquência das provas, esmiuçadas pelos demais ministros, tais argumentos não prevaleceram. No confronto de opiniões, a balança da Justiça pendeu então para a condenação.

As digitais de Bolsonaro na tentativa de golpe estão por toda parte — da campanha mentirosa e premeditada para desacreditar as urnas eletrônicas às minutas jurídicas destinadas a emprestar um verniz de legalidade à intentona, apresentadas em mais de uma ocasião aos chefes militares. Há declarações gravadas em reunião ministerial, encontro com embaixadores e comícios; depoimentos dos ex-chefes das Forças Armadas; mensagens de texto, áudios, anotações e documentos impressos — uma fartura de evidências e detalhes cujo sentido está no quebra-cabeça montado pela investigação da Polícia Federal. Graças a ela, os brasileiros têm plena consciência do que aconteceu e sabem como e por que, felizmente, a democracia prevaleceu.

Terminado o julgamento, o Brasil precisa agora virar a página do radicalismo autoritário. O Supremo deu exemplo de altivez, mesmo diante da inadmissível e persistente pressão externa de Donald Trump e de outros integrantes do governo americano. É provável, diante da condenação de Bolsonaro, que novas sanções dirigidas a integrantes da Corte estejam a caminho. Mas o Brasil não pode ceder a barganhas mesquinhas. Seria uma capitulação inaceitável a votação de qualquer anistia pelo Congresso. Para além da neblina criada pela disputa política, os parlamentares precisam enxergar a realidade com nitidez.

Pesquisas de opinião mostram que o apoio à democracia é sólido no Brasil. É preciso empenho de deputados e senadores para que, findo o julgamento, o Parlamento ponha em marcha uma agenda voltada a acelerar o crescimento econômico e a melhoria de vida dos brasileiros. Anistiar os condenados equivaleria a semear novos golpes de Estado. Basta lembrar que o general Olympio Mourão Filho, o primeiro a pôr tanques nas ruas para dar o golpe em 1964, nada havia sofrido depois de ter comandado a fraude que permitiu a Getúlio Vargas dar o golpe do Estado Novo em 1937. Ou que o general e ditador Arthur da Costa e Silva antes havia sido um tenente que participou de uma tentativa de golpe em 1922, foi preso, anistiado e depois participou dos golpes de 1930 e 1964. Que o Brasil tenha a sabedoria de aprender com a própria História e consiga, como fizeram os ministros do Supremo no julgamento, continuar honrando as palavras de Ulysses Guimarães no discurso de promulgação da Carta de 1988: “A persistência da Constituição é a sobrevivência da democracia”.

A democracia ainda corre perigo em 2026. Por Fernando Abrucio

Valor Econômico

O problema maior está no silêncio ou aquiescência de boa parte da sociedade frente ao golpismo continuado e travestido de anistia

Pela primeira vez na história, o Brasil vai punir golpistas. Esse é o grande saldo positivo do processo envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro e seus comparsas. É preciso comemorar porque a democracia sempre perdeu para os autoritários de plantão. Porém, como alguns dos ministros do STF avisaram em seus votos, o dia seguinte não será fácil, pois o golpismo ainda está forte na sociedade brasileira, com a novidade de agora ter apoio internacional. Se os democratas do país não continuarem na batalha contra os antidemocratas, inclusive os que vestem pele de cordeiro, a vitória de hoje poderá se reverter num pesadelo futuro.

É inegável que a democracia brasileira venceu o seu maior teste desde a redemocratização ao evitar o golpe bolsonarista e punir exemplarmente os golpistas. As dúvidas giram em torno de quem foram os responsáveis por essa vitória. As instituições tiveram um papel central, porque tem características que dificultam a concentração autocrática do poder. O sucesso do presidencialismo à brasileira, no entanto, dependeu de atores que souberam ativar as armas institucionais por meio de pressões sociais e escolhas em prol da democracia.

Mesmo condenado, Bolsonaro permanece como ameaça institucional. Por César Felício

Valor Econômico

Donald Trump e projeto de anistia mantêm aceso risco de ruptura

ex-presidente Jair Bolsonaro, mesmo condenado, continua representando uma ameaça institucional. Sempre representou, desde que se lançou candidato à Presidência pela primeira vez, na esteira do impeachment da então presidente Dilma Rousseff. Todas as raízes da trama golpista julgada no Supremo Tribunal Federal vêm de muito longe. A acusação avaliada e aceita pela maioria da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal estabeleceu uma linha temporal com início em julho de 2021 e término em janeiro de 2023, mas essa piscina é de borda infinita, se confunde com o horizonte.

A ameaça que Bolsonaro continua a representar está consubstanciada na afirmação da porta-voz do presidente americano Donald Trump, de que os Estados Unidos não teriam receio de usar o seu poderio militar contra o Brasil em defesa do ex-presidente. A agressão ganhou ar oficial minutos depois de estabelecida a condenação, com a postagem do secretário de Estado, Marco Rubio, de que a decisão do Judiciário brasileiro é injusta e de que os Estados Unidos irão “responder”, como se parte fossem.

Brasil presta contas à História. Por Vera Magalhães

O Globo

Ao condenar Bolsonaro, país STF faz aquilo que se evitou depois da ditadura militar de 1964, em nome de um amplo acordo para a redemocratização

Após a condenação de Jair Bolsonaro e outros sete réus por tentativa de golpe de Estado e outros quatro crimes contra a democracia, o longo voto de Luiz Fux era notícia velha e superada. O peso histórico do julgamento rapidamente relegou o burburinho da véspera, todos os memes e hipóteses para as mudanças do ministro em relação a seus próprios votos anteriores a uma voz isolada diante de outras quatro pelo reconhecimento de que Bolsonaro chefiou uma organização criminosa com o objetivo de, nos dizeres do relator, Alexandre de Moraes, “se perpetuar no poder”.

O 11 de setembro de Jair Bolsonaro. Por Bernardo Mello Franco

O Globo

Tribunal resistiu a ataques e protegeu Constituição em julgamento inédito, que pune ex-presidente e generais por tentativa de golpe

Em 1999, um repórter quis saber o que Jair Bolsonaro faria se chegasse à Presidência. “Daria golpe no mesmo dia. Não funciona”, respondeu o capitão.

Naquela época, ninguém imaginava que o deputado extremista fosse capaz de vencer uma eleição majoritária. O Brasil mudou, mas ele permaneceu o mesmo. Ao vestir a faixa, passou a conspirar contra a democracia que o alçou ao poder.

Bolsonaro tentou destruir o sistema de freios e contrapesos estabelecido pela Constituição de 1988. Seu objetivo era instaurar um novo Estado autoritário, nos moldes da ditadura que sempre exaltou.

A tentação da guerra civil. Por Pablo Ortellado

O Globo

Episódios de violência política têm em comum a incapacidade dos agressores de aceitar a existência de adversários

Quem entrou nas mídias sociais entre anteontem e hoje certamente deparou com o chocante vídeo do assassinato de Charlie Kirk. O ativista conservador americano participava de um debate num campus universitário em Utah quando foi atingido por um tiro no pescoço. Morreu poucas horas depois, no hospital. No momento em que escrevo esta coluna, não sabemos ainda a identidade do assassino, mas, segundo o Wall Street Journal, o FBI encontrou um rifle e munições marcadas com slogans antifascistas, reforçando a suspeita de motivação política.

A geopolítica do quintalismo e nós. Por José de Souza Martins

Valor Econômico

Alguém nos EUA fez referência, que repercutiu na mídia, de que a América Latina é o quintal dos americanos. Continua sendo

A cada dia e cada vez mais, e com crescente dificuldade, percebemos que a realidade social e política muda e se transfigura. Tão depressa que até mesmo nossa alfabetização foi relativizada, o vocabulário inundado por uma enxurrada de palavras diferentes, muitas que dizem algo que já supúnhamos dizer com as velhas e costumeiras palavras ensinadas por nossos avós e pais.

Um sentimento desconfortável de ignorância se apossa dos que, como eu, foram educados na certeza de que o saber é progressivo e acumulativo. O de fato aprendido, supostamente aprendido está. Mesmo o nosso mundo cotidiano, tradicionalmente tão repetitivo, já não se repete. O mundo de cada manhã é uma surpresa. Além do mais, o nosso pequeno mundo de seres do dia a dia é regulado por um grande mundo que não conhecíamos.

Voto de ministra mostra que direito pode ser entendido. Por Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Cármen Lúcia compartilhou com a audiência as razões pelas quais acontecia ali um julgamento histórico

Foi a ministra Cármen Lúcia que sacramentou a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro, mas a solenidade que revestiu seu voto não a impediu de compartilhar com a audiência as razões pelas quais acontecia ali um julgamento histórico. Sem empolação, populismo ou hermenêutica poética que se finda em si mesma.

A ministra mostrou que o golpismo não é regado apenas pelo ódio mas também pela ignorância. Valeu-se de um humor que não a afastou da Constituição. A reprodução do seu diálogo com uma senhora na farmácia é lapidar. “Ele se queixa de que seria neutralizado, mas a neutralização não é ruim”, teria dito a senhora. “Meu marido fez e ficou bem”. Ao explicar à sua interlocutora que ela confundira harmonização facial com um assassinato, a ministra respondeu-lhe: “Harmonização é para não ter problema de envelhecimento. Com a neutralização você não tem problema de envelhecimento porque morre antes”.

A visão dos brasileiros sobre EUA e China. Por Andrea Jubé

Valor Econômico

Para analista, um dos principais fatores do derretimento do governo nas pesquisas é o erro na estratégia de comunicação

Sem surpresas, a conclusão do julgamento da trama golpista no Supremo Tribunal Federal (STF), que condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão, acentuou a tensão entre Brasil e Estados Unidos. O presidente Donald Trump disse que a sentença é uma “coisa terrível” e que está “muito insatisfeito”, e o secretário de Estado, Marco Rubio avisou que os EUA responderão a essa “caça às bruxas”. A reação veio do Itamaraty, que em rede social, afirmou que ameaças como a de Rubio “não intimidarão nossa democracia”, e que a soberania brasileira resistirá a “agressões e tentativas de interferência, venham de onde vierem”.

Condenação de Bolsonaro é marco da história republicana. Por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Centrão volta a articular anistia. Para o Executivo, a prioridade é evitar um "perdão legislativo" que desautorize o Supremo e comprometa a governabilidade

A condenação de Jair Bolsonaro pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) já projeta seus efeitos jurídicos, políticos e diplomáticos. Pela primeira vez na história do Brasil, um ex-presidente e quatro oficiais da mais alta patente — três generais e um almirante — são condenados por tentativa de golpe de Estado. Bolsonaro recebeu a pena de 27 anos e três meses no julgamento da tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023.

As razões históricas são conhecidas. Desde a Proclamação da República, fruto de um golpe militar, o Brasil viveu dois longos períodos ditatoriais, após a Revolução de 1930 e o golpe de 1964, ambos precedidos por várias tentativas de golpe de Estado. Sucessivas anistias permitiram que os conspiradores obtivessem êxito nos dois casos.

Na maré autoritária, o Brasil nada contra a corrente. Por Flávia Pellegrino

Correio Braziliense

O recado que damos ao planeta e ao nosso próprio país não poderia ser mais claro e vital: a democracia é inegociável, assim como a punição daqueles que contra ela ousam atentar

O dia de ontem não é um fim em si mesmo. É mais um capítulo de um processo inédito de responsabilização e um marco democrático na história do Brasil. Pela primeira vez, aqueles que orquestraram uma ruptura do Estado Democrático de Direito foram devidamente julgados e condenados. O Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o julgamento do núcleo crucial da trama golpista que, entre 2021 e 2023, tentou subverter a Constituição e instaurar um regime autoritário no país. Ao condenar militares de alta patente e lideranças políticas do núcleo central da conspiração, a Corte reafirmou que a lei e a democracia estão acima de qualquer governo, projeto de poder ou liderança política. Foi um gesto inequívoco de resiliência institucional, conduzido dentro das garantias do devido processo legal e da ampla defesa, e que ainda resistiu a pressões vindas do exterior.

A crise entre Brasil e EUA. Por Fernando Gabeira

O Estado de S. Paulo

Com todos os progressos que possam ser feitos no caminho do multilateralismo, ainda assim é importante reatar o diálogo com os EUA

Empresários brasileiros que foram aos EUA discutir a questão das tarifas foram informados que o principal problema entre os dois países é político. Mais ainda: nesse campo, os canais estão totalmente bloqueados. Talvez seja essa a maior crise na história das relações diplomáticas. Já houve outras. Na verdade, no século 19, os dois países se aproximaram por causa de uma crise entre o Brasil e o Reino Unido. Foi um momento difícil: havia uma tensão por causa do tráfico de escravos, condenado pelos ingleses. Mas o estopim mesmo foi a prisão de alguns oficiais daquele país que se embebedaram e causaram confusão no Rio. O embaixador William Christie exigiu indenização e a Marinha britânica apreendeu navios mercantes brasileiros na Baía de Guanabara. O caso foi resolvido com arbitragem internacional, mas o Brasil rompeu com o Reino Unido. Foi por aí que entrou a América do Norte.

As duas Américas. Por Simon Schwartzman

O Estado de S. Paulo

É na maneira pela qual as sociedades se constituem e funcionam internamente que devem ser buscadas as explicações de seus sucessos e fracassos

No Brasil, é comum olhar para os Estados Unidos como um exemplo que deveríamos seguir, ainda que sabendo muito bem de seus problemas. Além de desenvolvido, é – ou era, até Donald Trump – um lugar onde imperavam as leis, as instituições eram respeitadas, a economia era dinâmica, a ciência e a educação eram estimuladas, existiam políticas para lidar com os problemas de desigualdade e de pobreza, e, na política internacional, procurava combinar o interesse próprio com políticas de cooperação e apoio a valores como a democracia e os direitos humanos. Destes valores, o único que parece ainda valer para Trump é o do dinheiro, cada vez mais concentrado. Em seu livro recente sobre a história das relações entre os Estados Unidos e a América Latina ( America, América – A New History of the New World, Penguin, 2025), o historiador Greg Grandin procura mostrar que, longe de ser uma anomalia, as políticas de Trump dão continuidade a uma longa história de violência interna e imperialismo. A única exceção teria sido o período que vai do início do New Deal de Franklin Roosevelt, em 1933, até o fim da Segunda Guerra, quando os Estados Unidos, graças à influência da América Latina, desenvolveram políticas internas em favor da população mais necessitada e apoiam a criação de uma nova ordem internacional com as Nações Unidas.

Vitória da democracia, 40 anos depois. Por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Quarenta anos depois do fim da ditadura de 1965-1985, oficiais-generais golpistas são punidos

11 de setembro de 2025 foi uma "vitória da democracia", como antigamente se lia em títulos gritantes dos jornais, até porque a democracia precisava de vitórias gritadas para nos dar um pouco mais de segurança de que sobreviveria. "Antigamente": nos anos 1990.

Além do mais, como diz o clichê, "a luta continua". Antes de pensar nas próximas ameaças, porém, é preciso ressaltar aspecto menos considerado do julgamento dos golpistas. Foram condenados quatro oficiais-generais de quatro estrelas, topo da carreira. Outros militares irão para a cadeia.

Transfigurações magistrais. Por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Guinada garantista de Luiz Fux contribui para percepção de que STF é uma corte mais política do que técnica

Tivesse Luiz Fux chegado anteontem de Marte como representante-mor do garantismo intergaláctico, poderíamos nos limitar a dizer que seu caudaloso voto levanta questões jurídicas interessantes. Mas não é esse o caso.

Fux não veio de Marte, mas do Rio. E não é um recém-chegado. Está no STF desde 2011, onde se notabilizou como um magistrado penalmente severo, para não utilizar a palavra "punitivista". O rigor de Fux pode ser demonstrado numericamente, com seu histórico de votações e decisões monocráticas.

Vale o deliberado. Por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Voto de Fux abre brecha jurídica, mas, no aqui e agora da política, prevalece o escrito no tribunal

O voto divergente do ministro Luiz Fux pela absolvição de Jair Bolsonaro (PL) animou a turma da anistia, entusiasmada com a possibilidade de futura revisão criminal e a chance de utilização imediata dos argumentos jurídicos na disputa ideológica.

Quanto aos advogados, o regozijo se justifica, dado o vaivém da Justiça. Na política, a coisa se complica.

É difícil a sustentação da tese de que o ajudante de ordens Mauro Cid e Braga Netto, o vice na chapa do presidente que esperava anular as eleições para ficar no poder, ambos condenados por Fux, tenham urdido um golpe em causa própria. Sem cabeça.