sábado, 13 de setembro de 2025

O direito do clima político. Por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

As preliminares importam – não sejam maldosos – e as questões de Luiz Fux merecem atenção máxima. Merecem reflexão séria, ainda que depois o juiz tenha, no mérito, votado para condenar, por tentativa de abolição do estado democrático de direito, o candidato a vice e o ajudante de ordens do presidente – e não o cabeça da chapa e chefe.

Voto legítimo, de início tratado como “prova cabal” de que não estaríamos numa ditadura. Isso até que a divergência avançasse para algo além do dissenso permitido, quando a religião do ministro passou a servir de razão para xingá-lo. Não há notícia ainda de que, à luz da língua xandônica, esse discurso de ódio tenha configurado ataque ao STF e à própria democracia, e ensejado, conforme a censura do bem, a derrubada de postagens ou o bloqueio de contas.

O cronista se desculpa pela digressão excessiva, provocada pela especulação sobre os perigos dos precedentes – o gênio que não voltará à lâmpada.

Se não houve organização criminosa, assim sustentou Fux, não poderia haver liderança – donde teríamos, com todos longamente enfurnados no Alvorada, o caso do sujeito, dono do palácio, que não viu a traição passar, também impressa, diante de si. Por excesso de exposição aos fatos, a impossibilidade de os dominar. É uma hipótese.

Fux é Fux. Defendeu, contra o Xandão fonte do direito, a legalidade estrita. Os fatos devem se encaixar à lei penal como luva à mão. Rigor que não aplicaria ao validar a “tibieza” da delação eterna de Mauro Cid. “O colaborador esteve sempre acompanhado de advogado.”

Fux é Fux é Fux é Fux. Não obstante, as preliminares que propôs merecem preocupação, se temos memória sobre o texto enfim vencedor no julgamento da Lava Jato. A “tese Zanin”, investida em denunciar o vício de competência do juízo, produziria a nulidade – a inexistência – da corrupção no Brasil.

“Tese Zanin” – de Cristiano Zanin, então advogado de Lula e ora um dos quatro votos pela condenação de geral, mestre em lawfare que, ante as alegações de cerceamento ao direito de defesa pelo chamado data dumping, sugeriu que os réus se virassem para contratar profissionais de informática capazes de auxiliálos no exame dos terabytes.

Zanin é Zanin; o que não impediu – nem deveria – que sua tese baixasse precedente e produzisse efeitos que ainda se desdobram. Fux advertiu. O Supremo mudou a regra sobre sua competência depois do cometimento dos crimes pelos golpistas e – dirá o maledicente – em função do objetivo de julgá-los.

Seria a tal brecha, identificada pelos analistas, no voto divergente. O risco – projetado no futuro, sob a memória ainda quente. O gancho para que, da mesma forma que reabilitados ontem os corruptos, reabilitados amanhã sejam os golpistas. A história ensina. Porque o mar vira. Porque um dia os ventos políticos mudarão, mudado também – e admitimos isso com espantosa naturalidade – o clima político na Corte Constitucional. E pronto. •

 

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