Valor Econômico
Políticos estão de olho em cada passo que o PGR dá em relação ao julgamento da tentativa de golpe e aos casos envolvendo emendas parlamentares
No xadrez político jogado em Brasília, a todo momento há quem pense algumas jogadas à frente. Fazem parte desse seleto grupo de estrategistas articuladores do governo, líderes da oposição e, sempre eles, integrantes do Centrão. Pois os jogadores já começam a formular cenários sobre a reta final do mandato do procurador-geral da República, Paulo Gonet, a grande probabilidade de o presidente Lula decidir reconduzi-lo ao posto para mais dois anos e o “timing” que o Palácio do Planalto deveria encaminhar a indicação ao Congresso.
Paulo Gonet tomou posse à frente da
Procuradoria-Geral da República (PGR) no dia 18 de dezembro de 2023. Ou seja,
em tese, a decisão sobre sua recondução ou substituição pode ocorrer apenas no
fim do ano. Em tese. Além do calendário, neste momento existem outros fatores
sendo levados em consideração.
O primeiro é a expectativa em relação à
conclusão do julgamento dos atos golpistas que culminaram na invasão da sede
dos três Poderes no dia 8 de janeiro de 2023. O próprio PGR pode tornar-se alvo
das sanções do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, mas segue
trabalhando normalmente no caso.
Um marco importante será esta quarta-feira
(13), quando acaba o prazo para que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e mais
seis aliados entreguem ao Supremo Tribunal Federal (STF) as suas respectivas
alegações finais no processo da trama golpista. Na sequência, o relator,
ministro Alexandre de Moraes, deve liberar a ação penal para que o julgamento
seja pautado na Primeira Turma do Supremo.
Espera-se que ele ocorra em setembro. No
entanto, um pedido de vista pode adiar a conclusão da análise para 2026, ou
seja, para além do período de dois anos deste atual mandato do PGR. Isso sem
falar no julgamento dos outros núcleos denunciados na detalhada peça acusatória
assinada por Gonet.
Os réus respondem pelos crimes de organização
criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de
Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça e
deterioração de patrimônio tombado. Tendem a pegar longos anos de prisão. Mas,
do ponto de vista político, a exclusão da cúpula do PL da lista de denunciados
foi bem recebida por setores do Centrão.
Se é fato que Gonet não surpreendeu governo
nem oposição ao pedir a condenação do ex-presidente e seus principais aliados,
também é de se esperar que a ala bolsonarista do Senado tente impor obstáculos
para que seu nome seja eventualmente chancelado pela Casa em caso de
recondução. Ainda assim, o maior desafio viria na sequência: há uma crescente e
suprapartidária preocupação com a pilha de casos envolvendo o suposto uso
ilegal de recursos de emendas parlamentares ao Orçamento.
Em fevereiro, o ministro Gilmar Mendes,
decano do STF, comentou a jornalistas que já havia entre “60 a 80”
investigações sobre possíveis irregularidades envolvendo as emendas. E pelo que
se sabe de informações de bastidores, os inquéritos abrangem deputados e
senadores de diversos partidos. Eles estão sob a relatoria de vários ministros
da Corte, o que dá margem para que os enxadristas torçam para que uma visão
menos punitivista possa emergir das discussões. Mas ainda assim todos os casos
passarão pelas mãos do procurador-geral da República.
Não é à toa que se vê no Congresso uma ampla
articulação para a aprovação de propostas que ampliam a blindagem dos
parlamentares ou alteram o foro por prerrogativa de função.
É por isso, também, que se faz o cálculo de
quando pode ocorrer uma próxima leva de denúncias da PGR sobre emendas
parlamentares.
Para interlocutores do governo, mesmo que
integrantes da base e do PT sejam atingidos, no limite essa onda pode ajudar o
Executivo a recuperar o controle de parte considerável do Orçamento-Geral da
União antes do início de 2026, ano eleitoral. É interessante para o governo
reequilibrar logo as forças entre os dois Poderes.
Por outro lado, se as eventuais denúncias
forem feitas ainda neste ano, Gonet certamente enfrentaria mais resistências
durante a sabatina da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e na apreciação
de seu nome pelo plenário do Senado. Tende a ser mais seguro para o PGR deixar
esse trabalho para o ano que vem, ainda que não contemple estrategistas
governistas.
No fim de 2023, quando foi indicado por Lula
pela primeira vez para comandar a PGR, Gonet não enfrentou maiores desconfortos
no Senado e teve o nome aprovado por ampla maioria. Durante a sabatina, não se
falou de “emendas parlamentares”. Quando foi perguntado sobre a imunidade
parlamentar, o debate se concentrou mais em relação às palavras proferidas por
deputados e senadores durante a sua atuação no Congresso. Isso pode não se
repetir.
Quando procurado, Gonet não fala sobre o
assunto. No entanto, poderia bem dizer que tem cumprido à risca algo que
prometeu em seu discurso de posse: “Não buscar palco nem holofote.” Porém,
apesar de sua conhecida discrição, o meio político está de olho em cada passo
que dá em relação ao julgamento da tentativa de golpe e aos casos envolvendo
emendas parlamentares.
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