quarta-feira, 13 de agosto de 2025

Recondução de Gonet na PGR entra no xadrez - Fernando Exman

Valor Econômico

Políticos estão de olho em cada passo que o PGR dá em relação ao julgamento da tentativa de golpe e aos casos envolvendo emendas parlamentares

No xadrez político jogado em Brasília, a todo momento há quem pense algumas jogadas à frente. Fazem parte desse seleto grupo de estrategistas articuladores do governo, líderes da oposição e, sempre eles, integrantes do Centrão. Pois os jogadores já começam a formular cenários sobre a reta final do mandato do procurador-geral da República, Paulo Gonet, a grande probabilidade de o presidente Lula decidir reconduzi-lo ao posto para mais dois anos e o “timing” que o Palácio do Planalto deveria encaminhar a indicação ao Congresso.

Paulo Gonet tomou posse à frente da Procuradoria-Geral da República (PGR) no dia 18 de dezembro de 2023. Ou seja, em tese, a decisão sobre sua recondução ou substituição pode ocorrer apenas no fim do ano. Em tese. Além do calendário, neste momento existem outros fatores sendo levados em consideração.

O primeiro é a expectativa em relação à conclusão do julgamento dos atos golpistas que culminaram na invasão da sede dos três Poderes no dia 8 de janeiro de 2023. O próprio PGR pode tornar-se alvo das sanções do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, mas segue trabalhando normalmente no caso.

Um marco importante será esta quarta-feira (13), quando acaba o prazo para que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e mais seis aliados entreguem ao Supremo Tribunal Federal (STF) as suas respectivas alegações finais no processo da trama golpista. Na sequência, o relator, ministro Alexandre de Moraes, deve liberar a ação penal para que o julgamento seja pautado na Primeira Turma do Supremo.

Espera-se que ele ocorra em setembro. No entanto, um pedido de vista pode adiar a conclusão da análise para 2026, ou seja, para além do período de dois anos deste atual mandato do PGR. Isso sem falar no julgamento dos outros núcleos denunciados na detalhada peça acusatória assinada por Gonet.

Os réus respondem pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado. Tendem a pegar longos anos de prisão. Mas, do ponto de vista político, a exclusão da cúpula do PL da lista de denunciados foi bem recebida por setores do Centrão.

Se é fato que Gonet não surpreendeu governo nem oposição ao pedir a condenação do ex-presidente e seus principais aliados, também é de se esperar que a ala bolsonarista do Senado tente impor obstáculos para que seu nome seja eventualmente chancelado pela Casa em caso de recondução. Ainda assim, o maior desafio viria na sequência: há uma crescente e suprapartidária preocupação com a pilha de casos envolvendo o suposto uso ilegal de recursos de emendas parlamentares ao Orçamento.

Em fevereiro, o ministro Gilmar Mendes, decano do STF, comentou a jornalistas que já havia entre “60 a 80” investigações sobre possíveis irregularidades envolvendo as emendas. E pelo que se sabe de informações de bastidores, os inquéritos abrangem deputados e senadores de diversos partidos. Eles estão sob a relatoria de vários ministros da Corte, o que dá margem para que os enxadristas torçam para que uma visão menos punitivista possa emergir das discussões. Mas ainda assim todos os casos passarão pelas mãos do procurador-geral da República.

Não é à toa que se vê no Congresso uma ampla articulação para a aprovação de propostas que ampliam a blindagem dos parlamentares ou alteram o foro por prerrogativa de função.

É por isso, também, que se faz o cálculo de quando pode ocorrer uma próxima leva de denúncias da PGR sobre emendas parlamentares.

Para interlocutores do governo, mesmo que integrantes da base e do PT sejam atingidos, no limite essa onda pode ajudar o Executivo a recuperar o controle de parte considerável do Orçamento-Geral da União antes do início de 2026, ano eleitoral. É interessante para o governo reequilibrar logo as forças entre os dois Poderes.

Por outro lado, se as eventuais denúncias forem feitas ainda neste ano, Gonet certamente enfrentaria mais resistências durante a sabatina da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e na apreciação de seu nome pelo plenário do Senado. Tende a ser mais seguro para o PGR deixar esse trabalho para o ano que vem, ainda que não contemple estrategistas governistas.

No fim de 2023, quando foi indicado por Lula pela primeira vez para comandar a PGR, Gonet não enfrentou maiores desconfortos no Senado e teve o nome aprovado por ampla maioria. Durante a sabatina, não se falou de “emendas parlamentares”. Quando foi perguntado sobre a imunidade parlamentar, o debate se concentrou mais em relação às palavras proferidas por deputados e senadores durante a sua atuação no Congresso. Isso pode não se repetir.

Quando procurado, Gonet não fala sobre o assunto. No entanto, poderia bem dizer que tem cumprido à risca algo que prometeu em seu discurso de posse: “Não buscar palco nem holofote.” Porém, apesar de sua conhecida discrição, o meio político está de olho em cada passo que dá em relação ao julgamento da tentativa de golpe e aos casos envolvendo emendas parlamentares.

 

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