domingo, 14 de novembro de 2021

Merval Pereira - Geleia tucana

O Globo

PSDB e PT, que disputaram a liderança política do país durante 20 anos, até 2014, podem voltar a ser decisivos na eleição de 2022, em situações paradoxais muito próprias da geleia geral partidária brasileira.

Uma chapa com Lula para presidente e Geraldo Alckmin para vice deixou de ser “impensável” para ser “possível”, o que pode influir decisivamente no resultado final. O ex-presidente Lula, aproximando-se de Alckmin, dá passos largos em direção ao centro, mesmo que seja apenas um gesto político, que dificilmente se transformará em mudança de seu programa de governo.

O PT deve continuar sendo estatizante e controlador de áreas estratégicas, como a informação e comunicação, a cultura, a educação. Assim como o governo Bolsonaro de início deixou a área econômica com o “Posto Ipiranga” liberalizante e acabou controlando o setor com intervenções estatais e visão estatizante.

Mas a hoje possível, mas não provável, ida de Alckmin para um partido aliado do PT, a formar uma chapa presidencial, teria inicialmente o condão de mexer com a briga interna do PSDB, que caminha para uma prévia fratricida. O partido teria em São Paulo, sua principal base política, uma cunha importante com os adeptos de Alckmin querendo derrotar o governador, que consideram um traidor.

Bernardo Mello Franco – A segunda via de Moro

O Globo

Jair Bolsonaro tem muitos defeitos, mas não é bobo. Rapidamente, farejou o apetite de Sergio Moro por sua cadeira. Em dezembro de 2019, o presidente tentou amarrar o ministro a um plano mais modesto: ser seu vice na campanha à reeleição. “Seria uma chapa imbatível”, cortejou.

No mês seguinte, Moro foi questionado sobre a possibilidade de concorrer à Presidência. “Não tenho esse tipo de pretensão”, despistou. Como a resposta soou evasiva, ele ressaltou sua condição de subordinado. “Evidentemente, os ministros do governo Bolsonaro vão apoiar o presidente”, garantiu.

O capitão, que não é bobo, continuou desconfiado. Os dois se distanciaram, e a advogada Rosangela Moro parou de repetir que seu marido e Bolsonaro seriam “uma coisa só”. Na manhã de 24 de abril de 2020, o presidente disse a aliados que o ex-juiz queria seu lugar. Horas depois, Moro deixou o governo com ataques ao ex-chefe.

A filiação de Moro ao Podemos não marcou apenas o lançamento de um novo presidenciável. Entrou em cena, agora sem disfarces, um candidato a tirar Bolsonaro do segundo turno. O ex-juiz se apresentou como alternativa para o eleitorado de direita. Reciclou, em outro tom, o discurso vitorioso em 2018.

Elio Gaspari - O PT de salto alto

O Globo / Folha de S. Paulo

O comissariado petista subiu num salto alto e teve uma recaída do negacionismo que já lhe custou a perda do mandato de uma presidente

A um ano da eleição, Lula lidera com folga as pesquisas e vive uma maré de sorte, com a desidratação de Bolsonaro e uma terceira via que tem sobra de nomes e escassez de ideias. Prever resultado eleitoral antes que a campanha imponha sua dinâmica é algo como buscar sinais de vida em Marte. Apesar disso, o comissariado petista subiu num salto alto e teve uma recaída do negacionismo que já lhe custou a perda do mandato de uma presidente.

Aos fatos:

No último domingo, o presidente Daniel Ortega, da Nicarágua, reelegeu-se pela quarta vez. Tem a mulher como vice, e durante a campanha o governo prendeu sete postulantes. Nos últimos anos, o regime sandinista produziu centenas de mortos e milhares de expatriados. Coroando esse processo, conseguiu 76% dos votos.

Na segunda-feira o secretário de relações internacionais do PT, Romênio Pereira saudou o evento dizendo o seguinte:

“Os resultados preliminares, que apontam para a reeleição de Daniel Ortega e Rosario Murillo, da FSLN (Frente Sandinista de Libertação Nacional), confirmam o apoio da população a um projeto político que tem como principal objetivo a construção de um país socialmente justo e igualitário.”

Em agosto passado, quando Ortega começou a baixar o chanfalho na oposição, Lula se afastou do companheiro, defendendo a alternância de governantes no poder. Parecia que o comissariado se dissociaria das ditaduras de esquerda, mas a nota mostrou que há no PT correntes que vão no sentido oposto. Até aí, seria o jogo jogado, com um secretário de relações internacionais pensando de um jeito, e o guia pensando de outro.

Eliane Cantanhêde - Como o diabo gosta

O Estado de S. Paulo

PSDB foca em Bolsonaro, esquece Lula e quer a centro-direita contra PT

O presidente do PSDB, Bruno Araújo, aproveitou o debate dos candidatos às prévias do partido, no Estadão, para dizer a mais pura, e melancólica, verdade: “Todos os partidos perderam controle na relação direta com as suas bancadas”. Tradução: o bolsonarismo produziu, ou aprofundou, um estouro da boiada no Congresso.

Os governadores João Doria (SP) e Eduardo Leite (RS), candidatos às prévias tucanas, faziam malabarismo para se descolar do fato de que 22 dos 31 deputados federais tucanos votaram a favor da PEC dos Precatórios, ou “PEC da Reeleição” (do presidente Jair Bolsonaro, óbvio).

ACM Neto, presidente do DEM e futuro secretário-geral do União Brasil (DEM-PSL), poderia dizer: “Viram? Não fui só eu”. Exemplo da perda de controle das bancadas, ele não conseguiu manter os votos democratas no deputado Baleia Rossi para a presidência da Câmara.

Marcos Lisboa* - Cavalo de Troia do patrimonialismo ameaça o futuro

Folha de S. Paulo

Eleições serão afetadas pelo embate entre política velha e o Estado de Direito

Conflitos que ocorriam nas sombras em Brasília vieram a público nas últimas semanas. Não se trata de coisa pequena.

As eleições de 2022 serão afetadas pelo desfecho do embate entre o patrimonialismo da política velha, que se apropria dos recursos públicos para atender seus interesses paroquiais, e o Estado de Direito, que deve garantir as regras do jogo democrático, incluindo a concorrência na política.

O patrimonialismo acena aos mais pobres com uma mão, enquanto garante seu butim com a outra. A PEC dos Precatórios tem como justificativa a obtenção de recursos para o Auxílio Brasil, cerca de R$ 47 bilhões que não caberiam no Orçamento em razão do teto de gastos.

Não é bem assim. O Auxílio Brasil serviu de cavalo de Troia para muitos interesses. A PEC permite um gasto adicional entre R$ 106 bilhões e R$ 115 bilhões, a depender da inflação no fim do ano, mais de duas vezes o necessário para viabilizar o programa social.

Parte da folga tem como destino o aumento do fundo eleitoral, emendas de congressistas e diversos benefícios para grupos de pressão, como caminhoneiros e setores beneficiados com a desoneração da folha.

O acesso privilegiado de alguns congressistas a recursos públicos para fazer obras em suas paróquias, sobretudo em ano eleitoral, resgata as práticas do Brasil velho.

O poder discricionário de distribuir verbas compromete a concorrência política, favorece os aliados dos novos coronéis e restringe a divergência, tema da coluna do dia 9 de outubro.

Governos enfrentam dilemas e deveriam fazer escolhas antecipando suas consequências. Seria possível uma ampliação significativa do Bolsa Família sem furar o teto, desde que fossem eliminados programas pouco eficientes ou não destinados aos mais pobres.

Bruno Boghossian - Bolsonaro 2: a missão

Folha de S. Paulo

Autocrata com mandato renovado nas urnas pode ser tão perigoso quanto golpista bem-sucedido

Os arranjos que Jair Bolsonaro fez para sobreviver no cargo, proteger seus aliados e disputar a reeleição têm potencial para multiplicar o estrago que ele deve fazer se conquistar um segundo mandato. O contrato político com o centrão, as nomeações para tribunais e a ocupação de espaços na máquina do governo serão ferramentas exploradas pelo presidente numa insistente tentativa de ampliar seus poderes.

O acordo de Bolsonaro com o PL é mais do que o aluguel de uma casa para a campanha. Se conseguir mais quatro anos no cargo, o presidente terá uma sociedade consolidada com um bloco disposto a articular a aprovação de projetos do Planalto em troca de acesso a dinheiro público e dividendos políticos.

Janio de Freitas A contramão de outras vias

Folha de S. Paulo

Bolsonaro no PL leva governo a centrão-militar no chamado, com impropriedade, 'velha política'

Um jato de originalidade. Assim foram os últimos dias, literalmente uma primavera política à brasileira. Novidades eleitorais capazes de instalar mais situações sem precedentes e sem destino presumível.

Não é o caso da entrada formal, em si mesma, de Sergio Moro na política, afinal um projeto evidenciado desde seu início há mais de sete anos. A originalidade, no caso, está na peculiaridade que o pré-candidato traz como futuro: Moro seria portador de uma condição única, diante da tarefa de governar.

Está aí o escândalo do R$ 1,2 bilhão (levantamento do competente Gil Castello Branco no site "Contas Abertas"), investido por Bolsonaro para comprar a aprovação do projeto dos Precatórios na Câmara. Se esse método é local, a dependência dos governos ao Legislativo é comum aos regimes não ditatoriais. Tendo-a, para Moro governante a saída pela corrupção seria a melhor das situações possíveis. Por ser, ao menos, saída.

Míriam Leitão - O retrato eleitoral e a economia

O Globo

O país está a dez meses e 18 dias do primeiro turno das eleições, o centro da preocupação dos brasileiros deslocou-se da pandemia para a economia, e o presidente Bolsonaro perdeu apoio até entre os que votaram nele. A economia dificilmente virá em socorro de Bolsonaro, porque as projeções mostram que em 2022 haverá um declínio do ritmo de crescimento, chegando ao negativo no terceiro e quarto trimestres. O desconforto econômico não desaparecerá porque nada indica uma mudança para melhor na conjuntura.

O ex-presidente Lula cresceu mesmo em silêncio, mas ele terá que se expor mais. Nos últimos dias, o PT fez nota cumprimentando Daniel Ortega, ditador da Nicarágua, por “ganhar” uma eleição fraudada, em que ele prendeu sete concorrentes e na qual a abstenção foi de 80%. Depois o PT voltou atrás, desautorizou a nota, mas não renegou seu conteúdo. O PT insiste em defender ditadores latinos.

Vinicius Torres Freire - Brasil no pódio global da energia cara

Folha de S. Paulo

Alta de preços é a segunda maior entre as economias relevantes do mundo

A inflação da energia no Brasil é uma das maiores do mundo. Dá para dizer que é a segunda mais alta entre as maiores ou mais ricas economias, aquelas que, juntas, fazem uns 97% do PIB mundial. Perde apenas para a da rica, pacata e grande produtora de energia Noruega.

Na média dos países da OCDE, o preço da energia aumentou 15,8% em um ano, até setembro. O Brasil não tem uma estatística imediatamente comparável, mas os preços dos combustíveis domésticos (como gás) subiram 33%, os de energia elétrica 28,8% e os de combustíveis para veículos 43,7%. É medalha de prata.

Samuel Pessôa - Voos da galinha

Folha de S. Paulo

Nossa democracia não tem sustentado ciclos longos de crescimento

Nas últimas semanas, alguns textos de pessoas ligadas ao grupo político petista têm avaliado a experiência do PT no governo.

O argumento é que o desempenho foi muito bom, com algumas dificuldades no primeiro mandato de Dilma, até que a Operação Lava Jato, a recusa de Aécio em aceitar o resultado eleitoral e a reversão dos preços das commodities nos jogassem em uma profunda crise econômica.

Assim, para debater nosso passado, o petismo considera que o agravamento da crise em 2015 e 2016 nada tem a ver com as políticas adotadas pelo Executivo. A conta do governo petista para o petismo termina em 2014, de acordo com a minha interpretação daqueles textos e de outras manifestações
vindas desse grupo político.

Meu argumento é que o melhor momento que vivemos desde a redemocratização, os oito anos da presidência de Lula, teve política econômica não sustentável a partir de 2006. Mais cedo ou mais tarde testaríamos os limites. Estes foram testados no primeiro mandato de Dilma. O fato de ela ter dobrado a aposta a partir de 2012 explica em grande medida a gravidade da crise.

Rolf Kuntz* - O desmonte

O Estado de S. Paulo

A PEC do Calote pode ser mais um instrumento a serviço da política destruidora conduzida pelo presidente Jair Bolsonaro

Vinte milhões de pobres serão abandonados pelo poder federal, sem acesso ao novo Bolsa Família e sem ajuda emergencial, admitiu o senador Fernando Bezerra, líder do governo e relator da PEC do Calote, oficialmente conhecida como PEC dos Precatórios. O governo, segundo ele, acredita na retomada econômica, sobretudo no setor de serviços, grande gerador de emprego informal. No Ministério da Economia, acrescentou, ainda se espera um crescimento na faixa de 1,5% a 2% no próximo ano. Faltou explicar como um desempenho tão miserável poderá gerar empregos para acomodar a multidão em busca de ocupação e de algum sustento para a família. Salve-se quem puder, danemse os outros e parem de incomodar o governo, poderia ter concluído o senador, se quisesse usar a linguagem do presidente Jair Bolsonaro. Mas preservou a compostura e o tom formal.

Pedro S. Malan* - Competentes precisam se mobilizar pelo País

O Estado de S. Paulo

O Brasil não pode abandonar sua busca por um republicano Estado Democrático de Direito

A emenda constitucional aprovada pela Câmara dos Deputados tem como objetivo “abrir espaço” no teto para maiores gastos. O calote parcial dos precatórios e as mudanças casuísticas nos indexadores de gastos (para se beneficiar da maior inflação) abriram espaço superior a R$ 90 bilhões no antigo teto. É útil colocar em perspectiva essa iniciativa momentosa, que teve evidente apoio do Poder Executivo.

Em entrevista dada em novembro de 2014, logo após sua reeleição, Dilma Rousseff afirmou: “Ao longo do governo, você descobre que várias coisas estão desajustadas. Várias contas que podem ser reduzidas, (...) o que vamos tentar é um processo de ajuste em todas as contas do governo, vamos revisitar cada uma e olhar com lupa o que dá para reduzir, o que dá para tirar”. Surpreendente declaração para alguém que naquele momento já vinha de cinco anos à frente da Casa Civil e quase quatro anos como presidente da República, apresentada que fora como a melhor gerente de que o País dispunha. Haviam se passado nove longos anos desde que, ministra-chefe da Casa Civil, havia tachado de rudimentar o embrião de proposta então em discussão na área econômica, de reduzir a velocidade de crescimento dos gastos primários do governo; e acrescentado seu famoso “gasto é vida”.

Cacá Diegues - Respeito à democracia

O Globo

Ela sempre foi mais que um regime de qualquer natureza, sendo uma forma de viver

Me encantei com a oradora indígena que representou o Brasil extraoficialmente na reunião de Glasgow sobre o meio ambiente. Os jornais informaram que ela é bissexual, fã de funk e estudante de advocacia. Mas o que mais me interessou em Alice Pataxó foi o que ela disse diante dos espertos participantes da COP26: as pessoas de poder no Brasil, inclusive o presidente da República, não se interessam pela luta contra o coronavírus, não podemos contar com nossas autoridades, elas estão em outra. Num inglês de aluna recente do IBEU, Alice fez questão de afirmar, com a força de sua juventude, que veio a Glasgow para desmentir as mentiras de Bolsonaro.

Ela tem razão. Segundo as despesas do governo, Bolsonaro autorizou que se gastasse mais com o lançamento recente da nota de 200 reais do que com a luta contra o coronavírus. Incluindo aí, claro, o custo das vacinas que já produziram visíveis resultados. Como diz em coro a “grande imprensa”, o dinheiro público deve servir sempre ao bem estar da população, né não?

Enquanto isso, nossa oposição explícita condena, por um lado, os gestos autoritários dos bolsonaristas; por outro, saúda com entusiasmo a “eleição” de Daniel Ortega, na Nicarágua, como “grande manifestação popular e democrática”. O ex-herói da luta histórica contra a ditadura de Somoza, no final da década de 1970, não vacilou em mandar prender, para se manter por mais um mandato no poder, os sete candidatos de oposição durante a campanha eleitoral. Nela, Ortega tinha sob controle o Legislativo, o Judiciário, as Forças Armadas e a justiça eleitoral, além de reprimir ou mandar matar os que se manifestavam contra ele.

Cristovam Buarque * - Sem Mandela nem De Klerk

Blog do Noblat / Metrópoles

Tanto o Brasil quanto a África do Sul se estruturavam com base na segregação e consequente exclusão, por renda ou por apartheid

O Brasil África do Sul são parecidos. Pode-se dizer que o Atlântico é um espelho que mostra um lado similar ao outro no sistema social e econômico de apartheid, com a diferença que o sistema deles separava brancos de negros, o nosso separa ricos de pobres. As escolas sulafricanas eram segregadas conforme a raça, da mesma forma que as nossas são segregadas conforme a renda. O fim do apartheid fez aquele belo país africano ainda mais parecido com o nosso.

Tanto a sociedade de um lado quanto do outro do Atlântico se estruturavam com base na segregação e consequente exclusão: por renda, no Brasil, com nossa apartação; ou por raça, na África do Sul, com o apartheid. De um lado e outro, estas sociedades se caracterizavam pela concentração de renda e de benefícios sociais, pela violência e instabilidade.

Sérgio C. Buarque* - As fogueiras virtuais

Revista Será?

Na justa luta contra o preconceito e o desrespeito à diversidade, o movimento Politicamente Correto comporta-se como um dos baluartes da intolerância, com condenações a priori e desproporcionais ao que se consideram crimes de racismo ou homofobia. As redes sociais deste movimento se transformaram em fogueiras contemporâneas de purificação dos hereges, com massacres morais a qualquer desvio do seu padrão de correção política. Condenam e partem para o ataque, sem julgamento, a falas e atitudes que deveriam ser apuradas e analisadas com base na legislação brasileira que define e pune crime de racismo e homofobia. Cadeia, se for o caso. Mas a guerrilha do politicamente correto prefere partir direto para criminalizar, demonizando e, se possível, destruindo. 

A mais recente investida da sua rede inquisitória foi contra o jogador profissional de vôlei, com uma intensa pressão moral que provocou seu afastamento do clube que defendia e da seleção brasileira. O atleta está sendo trucidado moralmente por supostas declarações homofóbicas. Ele pode até ser homofóbico, mas o que está sendo condenado foi um comentário do jogador à foto de um novo “Superman” beijando um homem: “É só um desenho, não é nada demais. Vai nessa, que vai ver onde vamos parar”. A frase contém uma referência negativa a certa tendência de glamourização da homossexualidade e não uma rejeição ou agressão à homossexualidade. Como se tivesse pensado, com certa ironia, que “do jeito que as coisas vão, daqui a pouco o heterossexual vai ser visto com desconfiança, talvez até desprezo, quem sabe mesmo como uma aberração”. Mais ou menos como diz uma amiga homossexual, também com ironia, “o heterossexual é uma espécie em extinção”. 

Dorrit Harazim - Lixo humano

O Globo

Alexander Lukashenko costuma ser astuto em sua desumanidade. Currículo para isso ele tem, como primeiro e único “presidente” da Bielorrússia desde que esse antigo Estado-satélite da União Soviética tornou-se república, em 1990. Na última das eleições fraudulentas realizadas no país — a de 2020, para um sexto mandato de Lukashenko —, ele proclamou ter obtido 80% dos votos. E foi logo avisando ao mundo democrático: “A menos que vocês me matem, não haverá mais eleições”. O cara vive às turras com a União Europeia (UE), que lhe aplica sanções múltiplas por seus modos ditatoriais, e alinha-se com fervor à Rússia de Vladimir Putin, o vizinho imperial da fronteira leste.

Em tempos recentes, Lukashenko encontrou a maneira mais infame de ostentar seu poder e azucrinar a Europa democrática. Passou a importar como gado humano milhares de errantes de nações desintegradas do Oriente Médio e da África do Norte, para socá-los na soleira da porta trancada da sonhada União Europeia — mais precisamente, nas fronteiras com a Polônia, a Lituânia e a Letônia, todos países-membros da UE.

Luiz Carlos Azedo - Dois filmes, duas histórias que se cruzam na resistência ao regime militar

Correio Braziliense / Estado de Minas

Marighella queria que a derrubada da ditadura resultasse na revolução socialista; para Giocondo a redemocratização exigia longa resistência de uma ampla frente política

Vale a pena ver o filme Marighella, dirigido por Wagner Moura, com Seu Jorge esbanjando talento na telona, no papel de Carlos Marighella, em 1969, no auge da atuação da Ação Libertadora Nacional (ALN), o grupo guerrilheiro que liderava e foi dizimado pelo delegado Sérgio Fleury.

Em contraponto, sugiro também o documentário Giocondo Dias, Ilustre Clandestino, de Vladimir de Carvalho, disponível no Canal Brasil, que reúne depoimentos sobre o líder comunista que substituiu Luiz Carlos Prestes na Secretaria-Geral do PCB. Ambos mostram um passado de radicalização política que não deve se repetir.

Moura dirigiu um blockbuster político, que utiliza os recursos da ficção e dos filmes de ação para fazer um recorte histórico da vida de Carlos Marighella, inspirada na excelente biografia de Mario Magalhães sobre o líder comunista carismático que arrastou para a luta armada jovens militantes do antigo PCB e um grupo de padres dominicanos.

Carvalho fez um garimpo de imagens, a partir dos depoimentos de militantes que participaram do resgate de Giocondo Dias, o líder comunista clandestino que havia ficado isolado, após o desmonte da estrutura do velho Partidão, em 1975, quando 12 integrantes do Comitê Central foram assassinados e milhares de militantes foram presos.

Marighella e Giocondo fizeram parte do chamado “grupo baiano”, que lideraria a reorganização do PCB no final do Estado Novo, em 1943, tecendo uma aliança pragmática com Getúlio Vargas para o Brasil entrar na II Guerra Mundial contra o Eixo: Armênio Guedes, Moisés Vinhas, Aristeu Nogueira, Milton Caíres de Brito, Arruda Câmara, Leôncio Basbaum, Alberto Passos Guimarães, Jacob Gorender, Maurício Grabois, José Praxedes, Osvaldo Peralva, Boris Tabakoff, Jorge Amado, João Falcão, Fernando Santana, Mário Alves e Ana Montenegro, nem todos baianos.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

A farsa se desvela

Folha de S. Paulo

Com o PL, Bolsonaro caminha para a sua matriz, o centrão, em união sem firmeza

A anunciada filiação do presidente Jair Bolsonaro ao PL de Valdemar Costa Neto, condenado por corrupção no mensalão, é mais um lance a desvelar a farsa, que só aos incautos iludiu, de que o capitão reformado do Exército renovaria os usos e costumes da política.

Se for confirmada a adesão, o Partido Liberal —não confundir significante com significado— será a nona sigla a abrigar Bolsonaro desde que ele entrou na política, no Rio da década de 1980, elegendo-se vereador e depois deputado federal por setes vezes seguidas.

Nesse período, constituiu em torno de seu núcleo familiar uma oligarquia provinciana, alimentada pelos votos e pelos interesses do corporativismo armado fluminense e financiada com dinheiro do contribuinte, por meios que as investigações sobre as chamadas rachadinhas vão deixando patentes.

Numa conjunção de fatores que dificilmente se repetirá, da periferia do sistema representativo foi alçado diretamente à Presidência. Sem capacidade administrativa, projetos nem quadros, acabou presa dos oligarcas federais do centrão, aos quais cedeu o manche e abriu os cofres do governo em troca de não sofrer impeachment.

Poesia | Joaquim Cardozo* – Tarde no Recife

Tarde no Recife.
Da ponte Maurício o céu e a cidade.
Fachada verde do Café Maxime,
Cais do Abacaxi. Gameleiras.

Da torre do Telégrafo Ótico
A voz colorida das bandeiras anuncia
Que vapores entraram no horizonte.

Tanta gente apressada, tanta mulher bonita;
A tagarelice dos bondes e dos automóveis.
Um camelô gritando: — alerta!
Algazarra. Seis horas. Os sinos.

Recife romântico dos crepúsculos das pontes,
Dos longos crepúsculos que assistiram à passagem dos fidalgos
[holandeses,
Que assistem agora ao movimento das ruas tumultuosas,
Que assistirão mais tarde à passagem dos aviões para as costas
[do Pacífico;
Recife romântico dos crepúsculos das pontes
E da beleza católica do rio.

*In: CARDOZO, Joaquim. Poesias completas. 2.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979. p.6-7

Música | Maria Bethânia - Frevo Nº 2 do Recife

 

sábado, 13 de novembro de 2021

Cristina Serra - Bolsonaro aparelha o Judiciário

Folha de S. Paulo

Ele vai nomear nada menos que 75 desembargadores para TRFs

Está em curso uma operação de aparelhamento do Judiciário pelo bolsonarismo, conforme alertou a colunista Mônica Bergamo nesta Folha.

Bolsonaro vai nomear nada menos que 75 desembargadores para os seis tribunais regionais federais, cortes subordinadas apenas ao STF e ao STJ no ordenamento da Justiça no Brasil. É um aumento de 50% em relação às vagas atuais.

Tamanho assalto será possível graças a dois projetos de iniciativa do Superior Tribunal de Justiça, aprovados por Câmara e Senado, que tramitaram com inusual rapidez durante a pandemia, sem ter qualquer urgência e bem longe de uma discussão sobre a real necessidade de expansão da estrutura existente. Um dos projetos aumentou o número de vagas em cinco TRFs. O segundo criou o TRF da 6ª região, exclusivo para o estado de Minas Gerais, que terá, de saída, 18 desembargadores.

Demétrio Magnoli - As vidas negras que não importam

Folha de S. Paulo

Polícia de Minneapolis, onde George Floyd foi assassinado, não será reformada

As taxas de homicídios nas grandes cidades dos EUA cresceram 30% em 2020 e, novamente, 24% nos primeiros meses de 2021. As taxas de aprovação do governo Biden retrocedem desde julho, caíram para zona negativa em agosto e, agora, situam-se ao redor de meros 43%. Inexiste correlação estatística direta entre os dois fenômenos, mas o primeiro, filtrado pelo discurso político, ajuda a iluminar o segundo.

"Cortem o financiamento da polícia" –o lema foi erguido pelo movimento Black Lives Matter ("Vida Negras Importam") durante as manifestações de protesto pelo assassinato de George Floyd, em Minneapolis, e adotado pela ala esquerda do Partido Democrata.

Nas eleições de 2020, Biden obteve mais de 70% dos votos na cidade que foi palco do crime notório. Há pouco, porém, a mesma cidade rejeitou em plebiscito uma proposta de substituição do departamento de polícia por um Departamento de Segurança Pública.

Uma folgada maioria de 56% votou contra a nova agência que "se necessário, poderia incluir" policiais. "O Império contra-ataca", tuitou D.A. Bullock, cineasta e ativista do movimento negro. De fato, porém, a proposta foi derrotada tanto nos bairros afluentes, majoritariamente brancos, quanto nos pobres, habitados por negros e latinos, onde se concentra a violência por armas de fogo. Nicole Drillard, que é negra e teme as arbitrariedades cometidas por policiais, explicou seu voto: "Precisamos de alguém para chamar –e, se não for a polícia, quem será? Já não temos policiais suficientes nas ruas."

Vários autores* - Desemprego e desindustrialização

Folha de S. Paulo

Retirada de direitos não traz modernização, mas sim políticas de fomento

Ao sancionar a reforma trabalhista em 13 de julho de 2017, o ex-presidente Michel Temer (MDB) e o então deputado federal Rogério Marinho (PSDB-RN) posaram em frente a um painel onde se lia: "Modernização trabalhista, direitos garantidos e novas oportunidades". Mais de quatro anos depois, entretanto, o Brasil sofre com baixo crescimento econômico, com a contínua retirada de direitos e confirma sua condição de exportador de matéria-prima.

Muito já foi dito sobre os graves prejuízos que a reforma de 2017 impôs aos trabalhadores. Agora vamos tratar de outro ponto que mostra que a reforma não entregou o que prometeu: a desindustrialização.

O ambiente econômico caminha hoje no sentido contrário ao da propalada modernização, como mostram diversos estudos.

Dados da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (Unido) mostram que entre 2005 e 2020 o Brasil passou do 9º para o 14º lugar no ranking de industrialização global.

Carlos Alberto Sardenberg - O auxílio eleitoreiro

O Globo

O Bolsa Família tem origem bem definida no Brasil. Nasceu em 1994, na cidade de Campinas, lançado pelo prefeito Magalhães Teixeira (conhecido como Grama), do PSDB. O nome era Programa de Renda Mínima, com foco bem determinado.

Pagava, em dinheiro, um complemento para famílias consideradas miseráveis. Para receber o dinheiro, a família deveria manter os filhos na escola, com bons resultados, receber os funcionários da Assistência Social em suas casas periodicamente e frequentar cursos profissionalizantes, entre outras obrigações.

Baseava-se em estudos desenvolvidos no âmbito do Banco Mundial, cujo objetivo era saber por que as famílias permaneciam pobres ao longo de gerações. A resposta: porque as crianças não iam à escola, já que precisavam ajudar os pais no trabalho. Daí a ideia óbvia: pagar para que as crianças frequentassem a escola e os postos de saúde.

Frequentando a escola, obtendo uma profissão, os pobres escapariam da pobreza. Aplicado em vários países em desenvolvimento, o programa foi um enorme sucesso.

Inclusive em Campinas, fazendo do prefeito Grama um nome nacional. Em 1995, o então governador do Distrito Federal, Cristovam Buarque, do PT, antigo defensor da ideia, criou o Bolsa Escola. Assegurava um salário mínimo a cada família carente em que todas as crianças entre 7 e 14 anos fossem matriculadas na escola pública.

Finalmente, em 2001, já no governo FH, Ruth Cardoso liderou o Bolsa Escola nacional e iniciou o movimento de unificação dos programas de distribuição de renda e combate à fome. Ao final da administração tucana, havia três programas principais, o Bolsa Escola, o Auxílio Gás e o Cartão Alimentação, beneficiando perto de 5 milhões de famílias.

Pablo Ortellado - Precisamos escutar

O Globo

Há algumas semanas, uma ativista de direita que protestava contra o passaporte da vacina na Câmara Municipal de Porto Alegre foi acusada de racismo por dizer que uma vereadora negra era sua “empregada”. Seu grupo foi acusado de apologia ao nazismo por carregar um cartaz com uma suástica. Não foi apenas o ativismo de esquerda que difundiu a acusação. Reportagens na maioria dos grandes veículos de imprensa também o fizeram.

Quem assistir ao vídeo com a cena, porém, verá que a ativista diz: “Eu sou o povo” e, em seguida, “tu é minha empregada”, querendo dizer que os políticos são — ou deveriam ser — funcionários do povo. Fotos do dia mostram que a suástica do cartaz não era apologia, mas crítica: estava ali para dizer que o passaporte da vacina era uma política nazista (e, por ser nazista, não deveria ser adotado).

A oposição às políticas sanitárias é uma postura muito equivocada e perigosa, na opinião deste colunista. Mas isso não dá o direito de distorcer as posições de quem a adota — se é que o que aconteceu foi uma distorção deliberada das posições dos ativistas antivacina.

Dada a dimensão da confusão, estou convencido de que nós, progressistas e oposicionistas, simplesmente não conseguimos mais escutar os bolsonaristas e, independentemente do que dizem, ouvimos apenas aquilo que nosso preconceito indica. E isso é um problema grave, porque os bolsonaristas são um terço da cidadania brasileira.

Claudio Ferraz - A volta do discurso anticorrupção

O Globo

Corrupção não é doença, é sintoma. Para colocar o Brasil no caminho do desenvolvimento econômico, é preciso haver mudanças institucionais

Na eleição de 2018, o resultado da operação Lava-Jato levou muitos eleitores a votarem contra os políticos incumbentes, elegendo o presidente Bolsonaro e gerando uma das maiores renovações legislativas da História brasileira. Com a entrada de Sérgio Moro na corrida presidencial, e a participação de Luiz Inácio Lula da Silva, o combate à corrupção voltará novamente ao centro do debate eleitoral.

Infelizmente isso será contraproducente. Não digo isso por achar que o combate à corrupção é pouco importante ou por achar que o PT e o Lula não tiveram nenhuma culpa no escândalo do mensalão.

Mas acho que será um erro focar o debate eleitoral em corrupção. Depois de muitos anos estudando o tema, tenho certeza de que, apesar de importante, a corrupção não é o grande determinante do atraso econômico e social brasileiro. É claro que muitos dos países mais pobres do mundo são também os mais corruptos, segundo o Índice de Percepção da Corrupção da Transparência Internacional.

Essa relação também existe se olharmos para a pesquisa do Banco Mundial de Empresas onde os países mais pobres têm uma maior proporção de firmas que reportam pagamentos de propinas. Mas isso não significa que uma redução da corrupção nesses países fará com que eles comecem a crescer de formas sustentável imediatamente. As instituições que causavam a corrupção continuarão lá e seguirão sendo uma barreira ao crescimento.

Adriana Fernandes - Reviravolta com Gilmar Mendes?

O Estado de S. Paulo

No meio jurídico, o voto já levanta polêmica, inclusive pela possibilidade de mudar a eleição

No cabo de guerra no Congresso, há senadores que querem derrubar a PEC dos precatórios. E há senadores não alinhados com o governo que querem mudar o coração do texto, que chegou da Câmara com polêmica, contestações jurídicas e relatos estarrecedores de compra de votos.

Duas PECS foram apresentadas – dos senadores José Aníbal (PSDB) e Oriovisto Guimarães (PSDB) – em cima da hora com soluções diferentes para conseguir espaço no Orçamento ao programa do governo após o fim do auxílio emergencial.

As duas propostas entraram no sistema do Senado dois dias depois da votação da Câmara. Dado o pouco tempo que resta, além da pressão social sufocante por uma solução para o Auxílio Brasil diante das filas que se formam em todo o País, era de se esperar que essas propostas já tivessem sido apresentadas, disparando um debate antes da votação da Câmara.

João Gabriel de Lima - Amazônia dá relevância ao Brasil no mundo

O Estado de S. Paulo

A Amazônia foi assunto central na COP-26. Precisamos dela para ter alguma relevância no mundo

Uma campanha agressiva realizada em 2006 teve função civilizatória no Brasil. Na ocasião, o Greenpeace divulgou um estudo mostrando como a produção brasileira de soja contribuía para o desmatamento na Amazônia. Foi o ponto de partida para um pacto chamado “moratória da soja”, em que empresas produtoras de alimentos, como a Cargill, e cadeias de lanchonetes, como o Mcdonald’s, se comprometeram, respectivamente, a não desmatar e a não mais comprar insumos oriundos do desmatamento.

Deu certo. A agricultura brasileira da soja passou a crescer por aumento de produtividade. Quando precisou se expandir, segundo estudo da rede acadêmica Climate Policy Initiative, foi sobre pastagens, e não florestas. “A agricultura brasileira não precisa de novas terras, e ganhamos mais com a floresta em pé”, diz o economista Juliano Assunção, um dos autores do estudo. Ele é o entrevistado do minipodcast da semana.

Apenas em uma das cinco regiões do Brasil esse padrão não se verifica: o Norte, justamente onde se situa a maior parte da Amazônia. “Lá não se cortam árvores para instalar agricultura ou pecuária relevante. É crime mesmo, que tem que ser combatido”, diz Assunção. O estudo mostra que o desmatamento – que nesta semana bateu novo recorde, segundo dados do Inpe – não gerou nenhuma atividade econômica importante na região. “Na Indonésia se desmata para produzir óleo de palma. No Brasil, o criminoso coloca bois em áreas griladas para fingir que tem alguma atividade econômica, mas não gera riqueza nem emprego”, afirma Assunção.

Antonio Cláudio Mariz de Oliveira * - Retorno do mal como banalidade

O Estado de S. Paulo

Os que propagam o negativismo e a destruição, atualmente, agem como Eichmann, não se sentem responsáveis

A banalidade do mal é o subtítulo de uma obra de Hannah Arendt que reúne várias reportagens a respeito do julgamento do criminoso de guerra Adolf Eichmann, um dos responsáveis pelo extermínio dos judeus durante a Segunda Guerra Mundial.

Após ter sido capturado em Buenos Aires, no ano de 1960, pelo serviço secreto israelense, o carrasco foi submetido a julgamento, condenado e executado em 1962.

Hannah Arendt, filósofa, escritora e jornalista, foi destacada pela revista New Yorker para acompanhar e fazer reportagens sobre o julgamento. As suas matérias foram reunidas no livro Eichmann em Jerusalém – uma reportagem sobre a banalidade do mal.

Os escritos de Hannah provocaram uma reação incandescente de seus conterrâneos, que chegaram a considerá-la persona non grata em Israel. Hannah colocou em dúvida a legitimidade do julgamento, do tribunal e do procedimento judicial adotado. Ademais, ela chamou a atenção para os Conselhos Judaicos da Europa em razão de sua inércia diante da perseguição nazista.

No entanto, a causa principal da reação contra os seus escritos foi a análise que fez do comportamento do acusado, Eichmann, e do próprio fenômeno do mal.

Marcus Pestana* - Um fantasma ameaça a administração pública

Há uma demanda generalizada na sociedade brasileira por qualidade, agilidade e eficiência na execução das políticas públicas. A percepção predominante é que o Estado brasileiro cobra muito e entrega pouco. E ainda por cima, vivemos uma brutal crise fiscal.

Para piorar, ocorre o chamado “apagão das canetas”. Diante da radicalização da atuação dos instrumentos de controle (Controladorias, Ministério Público, Tribunais de Contas), os gestores, a quem cabe operacionalizar as políticas públicas, se retraem e, intimidados, deixam de agir, tomar decisões, inovar, ousar em busca de soluções para problemas complexos e, assim, atender às expectativas da sociedade.

É evidente, que diante de sucessivos escândalos de corrupção, a sociedade buscou aprimorar os mecanismos de combate à malversação de recursos públicos e de preservação da moralidade. Mas boa parte da ineficiência governamental se deve aos excessos cometidos na aplicação de sanções, nos prazos dilatados de inquéritos e prescrição, na caracterização da improbidade administrativa e na discussão das responsabilidades individuais e da existência ou não de ato doloso.

José Álvaro Moisés* - Candidatos do PSDB erram ao discursar para a militância

O Estado de S. Paulo

Diante da crise atual, só ganhará consistência e viabilidade quem lograr representar uma alternativa real para o conjunto do País

PSDB é muitas vezes criticado por ficar em cima do muro, o que nem sempre é verdade, mas o debate entre os candidatos que disputam as prévias do dia 21 produziu um cenário no mínimo paradoxal. Por um lado, o partido adotou um método democrático – anti-oligárquico – de escolha de candidatos, o que o distingue de todos os demais partidos; mas, por outro, adotou um tom discursivo para se apresentar aos seus filiados e apoiadores que implica em uma armadilha, qual seja, a de ficar falando mais para dentro, para a militância, do que para fora, para o conjunto da Nação. É um sinal limitador.

A resposta a essa crítica é que as prévias do dia 21 são exatamente isso, uma disputa interna pela preferência dos militantes e apoiadores. Mas isso é um equívoco grave porque a crise de lideranças políticas que o País vive – de que foram expressão os escassos 4% que o candidato do partido obteve em 2018 – não tem possibilidade de se resolver nas estruturas fechadas de um único partido ou de uma facção. Só ganhará consistência e viabilidade quem lograr representar uma alternativa real para o conjunto do País em face do marasmo e da sensação de falta de rumos que o acomete. É assim que poderá empolgar o partido. 

Dora Kramer - Jogo de amarelões

Revista Veja

Além dos convertidos, difícil que alguém hoje saiba citar razões para escolher esse ou aquele pretendente da chamada terceira via

Nunca, desde a redemocratização, uma eleição presidencial foi igual a outra no Brasil. Cada qual teve características próprias. As peculiaridades estiveram presentes até mesmo naquelas em que o(a) chefe da nação foi reeleito(a). É assim, as condições objetivas mudam, as estratégias das campanhas se adaptam a elas e os discursos dos candidatos seguem as demandas do eleitorado.

Em 2022 também tudo será bem diferente do que foi em 2018, a começar pela duração da campanha. No oficial, são 45 dias. No paralelo, porém, é muito mais longa que as anteriores, pois começou quando Jair Bolsonaro, ainda no primeiro ano de governo, pôs a candidatura da reeleição na rua.

A prevista radicalização não chega a ser um dado novo, mas não faltam ineditismos como o fato de o embate reunir o atual e um ex-presidente da República. Acrescente-se à lista o bate-cabeça da oposição aos dois.

O maior problema desse campo nem é o mar de pretendentes, mas o deserto de ideias. Bem ou mal, nas eleições anteriores havia um conceito por trás das candidaturas.

Em 1998, Fernando Henrique Cardoso já não contava com o impacto positivo do Plano Real que o elegeu em 1994 e, em meio a uma crise econômica, precisou se valer do receio da sociedade de perder os ganhos obtidos com o fim da inflação.

Matheus Leitão - Nova pesquisa dá choque de realidade na terceira via

Revista Veja

Vox Populi confirma, até o momento, a incapacidade daqueles que se colocam entre Lula e Bolsonaro 

Mesmo com as eleições presidenciais ainda distantes, o cenário eleitoral vai se confirmando a cada nova rodada de entrevistas

Um levantamento divulgado pelo Vox Populi nesta quinta, 11, mostra que o ex-presidente Lula continua na liderança isolada da disputa, confirma a dificuldade que uma terceira via terá para se consolidar e mostra que o presidente Jair Bolsonaro permanece perdendo força.

A pesquisa traz, de forma inédita, um cenário sem Bolsonaro na disputa presidencial. Segundo o levantamento, numa simulação com o atual presidente, ele teria 21% das intenções de voto e Lula teria 44%. Em seguida, aparecem Ciro Gomes, com 4% dos votos, e Datena e Sérgio Moro com 3% dos votos.