Folha de S. Paulo
Bolsonaro no PL leva governo a
centrão-militar no chamado, com impropriedade, 'velha política'
Um jato de originalidade. Assim foram os
últimos dias, literalmente uma primavera política à brasileira. Novidades
eleitorais capazes de instalar mais situações sem precedentes e sem destino
presumível.
Não é o caso da entrada formal, em si
mesma, de Sergio Moro
na política, afinal um projeto evidenciado desde seu início há mais
de sete anos. A originalidade, no caso, está na peculiaridade que o
pré-candidato traz como futuro: Moro seria portador de uma condição única,
diante da tarefa de governar.
Está aí o escândalo do R$ 1,2 bilhão (levantamento do competente Gil Castello Branco no site "Contas Abertas"), investido por Bolsonaro para comprar a aprovação do projeto dos Precatórios na Câmara. Se esse método é local, a dependência dos governos ao Legislativo é comum aos regimes não ditatoriais. Tendo-a, para Moro governante a saída pela corrupção seria a melhor das situações possíveis. Por ser, ao menos, saída.
Só uma pessoa é tão repulsiva no conceito
de imensa parte do Congresso, de esquerda e direita, quanto Moro: é seu
parceiro Deltan
Dallagnol. Mesmo congressistas abjetos resistiriam às mais
tentadoras negociações com Moro, por falta absoluta de confiança. Da
hostilidade frontal e insuperável porque fundada, Moro não teria a esperar
senão o estado de crise. E vivê-lo com inexperiência e luzes mentais de
baixíssima voltagem.
O lançamento de Moro tem a originalidade de
oferecer, não a possibilidade de um governo, mas a perspectiva de agravamentos
insondáveis da adversidade trazida por Bolsonaro. Madame Moro, aliás, depois de
soltar rojões pelo resultado eleitoral em 2018, lançou aos ventos:
"Bolsonaro e Moro são um só". Frase perigosa para ela, mas preventiva
para todos. De fato, tão semelhantes os dois, que não puderam viver no mesmo
espaço de ambições e autoritarismos.
As motivações de Moro e Dallagnol
assemelham-se só na procedência. Moro resulta de plano antigo, com missão, seja
encomendada ou autoincutida. Fisionomia de mármore, olhar árido, desprezo a
limitações, Dallagnol é expressão do fanatismo. O poder acusatório do
Ministério Público deu-lhe as oportunidades para aplicá-lo. Os superiores
deram-lhe a conivência covarde da liberdade ilegal e imoral, reduzidos os
reparos obrigatórios a petelecos infantis.
Sobreveio o pior dos inesperados: Lula lidera
as pesquisas eleitorais. O medo que acometa o perseguidor ignora a natureza
nunca vingativa de Lula, a culpa sabe impor seu domínio. Se eleito, o deputado
federal Deltan Dallagnol terá imunidades, em dose suficiente para manobrar os
processos há tempos imóveis e outros tantos ainda possíveis.
Em tal circunstância, vale a pena
sujeitar-se ao ambiente em que a espada de fogo não terá aplicação. E a
hostilidade responderá à presença insultuosa entre os acusados e os caluniados
do procurador transtornado. Pelas mesmas razões, o procurador-geral na era
curitibana, Rodrigo Janot, pretende dar a Dallagnol, outra vez, uma companhia
cúmplice.
Nem tanto por novidade a mais, senão pela
dimensão do despudor, a entrada de Bolsonaro no
PL dá ao governo uma denominação, como outrora as de governo do
PMDB, PSDB, PT. Agora é o governo centrão-militar. Bolsonaro, Valdemar Costa
Neto, general Augusto Heleno, Roberto Jefferson, general Luiz Eduardo Ramos,
Ciro Nogueira, Arthur Lira, general Pazuello, mais generais, almirantes,
brigadeiros, mais 6.000 militares da ativa, da reserva, reformados e todo o
centrão, irmanados no mais inescrupuloso do que é chamado, com impropriedade,
de "velha política".
Minhas continências.
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