sábado, 7 de setembro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Ataques à imprensa põem em risco a democracia

O Globo

Publisher do New York Times descreve roteiro de perseguição adotado por populistas autoritários no mundo todo

A liberdade de expressão entrou em foco no debate brasileiro com a suspensão da rede social X. Mas, apesar dos desafios inerentes às plataformas digitais, as ameaças à imprensa profissional mundo afora continuam a representar riscos mais preocupantes para a democracia. As investidas têm vindo de governos populistas cujas inclinações autocráticas se manifestam num roteiro comum a vários países, como HungriaÍndia, Brasil ou mesmo Estados Unidos.

“As ameaças mais perniciosas à liberdade de imprensa tomam uma forma prosaica: um ambiente de assédio, litigância financeira punitiva, burocracia atuando como arma, aliados montando operações de ataque — tudo com o objetivo de diminuir uma imprensa enfraquecida por anos de luta financeira”, escreveu A.G. Sulzberger, publisher do jornal The New York Times, em artigo publicado pelo principal concorrente, o Washington Post.

Oscar Vilhena Vieira - O campo democrático e o nosso patrimônio constitucional

Folha de S. Paulo

Será preciso reinventar a forma de fazer política para enfrentar ameaças à democracia

Estamos completando 200 anos de uma trajetória constitucional intensa e acidentada. Intensa pois o corpo das sucessivas Constituições e Cartas Constitucionais têm sido o campo onde se travaram as principais disputas em torno do destino da nação. Da unidade nacional à Abolição, passando pelo federalismo, a construção da ordem conservadora, o desenvolvimentismo, assim como a promoção da democracia e dos direitos, tudo passou pela arena constitucional.

Essa constante disputa gerou, no entanto, uma história constitucional acidentada, que nos levou a adotar diversas linhagens de constituição. Quatro Cartas centralizadoras e conservadoras, impostas por governantes autoritários; e quatro Constituições liberais ou progressistas, resultantes de processos mais ou menos inclusivos.

Além das cicatrizes deixadas pelas rupturas, há, de um lado, sequelas crônicas das promessas constitucionais não cumpridas, como a violência, as profundas desigualdades e as dificuldades econômicas. De outro lado, um forte ressentimento com tudo aquilo que ameace privilégios e a hierarquia social.

Pablo Ortellado - Justiça com lado?

O Globo

Uma pesquisa da Atlas Intel, publicada na última quarta-feira, mostra o tamanho do desafio da Justiça ao lidar com a direita brasileira. Por um lado, o Judiciário precisa punir — com rigor — as movimentações antidemocráticas que tentaram derrubar o regime democrático entre o fim de 2022 e o começo de 2023. Se os golpistas ficarem impunes, terão incentivo para tentar outra vez. Por outro lado, a Justiça tem de fazer isso com muito cuidado e equilíbrio, sem parecer que tem lado, ou corroeria sua legitimidade com a metade da população que apoia Bolsonaro.

A pesquisa da Atlas Intel sobre como o público avalia o banimento da rede social X mostra que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem falhado miseravelmente na segunda missão. A situação poderá ficar ainda mais grave com as tentativas em curso na Justiça Eleitoral de impugnar a candidatura de Pablo Marçal. Talvez ainda dê tempo de corrigir o curso. Será que a liderança do Judiciário está disposta a olhar para as evidências?

Bolívar Lamounier - Eleições 2024 – cenário e elenco

O Estado de S. Paulo

Nós, que preferimos ser governados por uma Mangustina que por uma Naja, ficaríamos aliviados se os indiferentes cogitassem apoiar o lado mais promissor

Até o momento, o brilho da eleição municipal ficou por conta dos ipês. Frondosos ipês amarelos, ipês brancos e até vermelhos. No que toca ao elenco, o que temos visto é o de sempre: gente que não deveria se candidatar nem a vereador, talvez nem mesmo a gerente de condomínio.

Mas, com um pouco de boa vontade, algo sempre se encontra. Na capital paulista, temos a grata novidade da candidatura de Tabata Amaral. Mulher, jovem, inteligente, ela pode vir a ser o impulso de renovação pelo qual temos ansiado. A questão é: será ela capaz de ganhar corpo a ponto de bater os supostamente mais fortes e experientes?

Michel Temer - A Independência e a paz

O Globo

Instituições de Estado jamais deveriam lançar combustível na fogueira das paixões políticas

A consolidação da Independência do Brasil, proclamada por D. Pedro I há 202 anos, sempre teve como força organizadora primordial a busca pela paz interna. Nações divididas e em permanente conflito intestino tornam-se vulneráveis à ação de forças externas que desejem subjugá-las. Mais ainda quando conflitos crônicos e aparentemente insolúveis passam a opor os Poderes, que a Constituição determina serem harmônicos, mesmo independentes.

Na mais que centenária história da nossa República, a pacificação interna sempre apareceu como objetivo desejável, ainda que os métodos para tentar alcançá-la tenham oscilado, de regimes concentradores de poder e força a regimes que buscaram alguma forma de conciliação entre opostos. Na verdade, esses dois vetores sempre existiram em paralelo, com um polo prevalecendo sobre o outro de acordo com as circunstâncias históricas.

Eduardo Affonso - 7 de Setembro

O Globo

‘De hoje em diante, nossas conexões, inclusive por VPN, estão cortadas. Nenhum link nos une mais’, seria o grito de Moraes

Era um sábado como este, há 202 anos. Um exausto Pedro de Alcântara — 24 anos incompletos, em trajes de tropeiro e debilitado por um desarranjo intestinal — ergueu-se nos estribos de uma mula baia gateada e, possivelmente sem forças para gritar ou desembainhar a espada, desabafou diante da pequena comitiva que o acompanhava na subida da Serra do Mar:

— As Cortes portuguesas querem mesmo escravizar-nos e perseguem-nos. De hoje em diante, nossas relações estão quebradas. Nenhum laço nos une mais.

A cena, bem pouco instagramável, foi mais tarde repaginada. Pedro ganhou um imponente cavalo castanho e figurino à altura; convocou-se a Guarda de Honra para turbinar a plateia e até um carreteiro — afinal, o povo não poderia ficar de fora, ainda que tivesse de se contentar em permanecer à margem, mero espectador.

Carlos Alberto Sardenberg - Danos colaterais

O Globo

Decisão deixou 22 milhões de brasileiros sem acesso a uma plataforma em que tinham liberdade para falar o que quisessem

De um colega:

— E agora, sem Twitter, como a gente vai derrubar o técnico? Como criticar as séries? Como falar mal do trânsito e dos políticos?

Piada à parte, a suspensão do X deixou 22 milhões de brasileiros sem acesso a uma plataforma em que tinham liberdade para falar o que quisessem. Verdade que se fala muita bobagem, cretinice, coisas de péssimo gosto. Verdade também que há baixaria da pior espécie. Mas também foi no X que tomei conhecimento de bons artigos, belos argumentos, sacadas divertidas, polêmicas inteligentes. Verdade também que o X aceita manifestações antidemocráticas e foi amplamente usado na tentativa do golpe bolsonarista.

Ana Luiza Albuquerque - Marçal e Bukele se assemelham nos cortes, na narrativa e até nos bonés

Folha de S. Paulo

Presidente salvadorenho e influenciador candidato à Prefeitura de São Paulo acumulam semelhanças no marketing, no discurso e na estética

Pablo Marçal é uma colcha de retalhos. Candidato do PRTB à Prefeitura de São Paulo, o influenciador agrega características de diferentes líderes populistas do século 21 para avançar sobre o eleitorado desiludido com a política tradicional.

Um pouco do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), um pouco do argentino Javier Milei. Mas é com o presidente salvadorenho Nayib Bukele, com quem deve se encontrar nesta semana segundo mostrou a coluna Mônica Bergamo, que mais semelhanças se acumulam.

A começar pelo boné. O apetrecho se tornou marca registrada do líder de El Salvador, que chegou à Presidência em 2019. Já Marçal tem usado em debates e agendas um boné azul com a inicial M, que logo passou a ser vendido na internet.

Miguel Reale Júnior - Arranjo inconstitucional

O Estado de S. Paulo

No caso das Emendas Pix, o STF abre mão da função precípua de guardião da Carta ao desistir de declarar a inconstitucionalidade de norma inconstitucional

A Constituição federal cria um sistema escalonado de leis por via das quais o governo estrutura a alocação de recursos para a execução de plano de ação. Assim, conforme os artigos 165 e seguintes da Constituição, no topo do sistema está o Plano Plurianual, por meio do qual se estabelecem as diretrizes e os objetivos da administração, de forma regionalizada. Segue-se a Lei de Diretrizes Orçamentárias, fixando prioridades, em consonância com a trajetória sustentável da dívida pública e orientando a elaboração da Lei Orçamentária Anual, que deve ser compatível com o Plano Plurianual.

A fragilização do Poder Executivo em 2015 levou à edição da Emenda Constitucional n.º 86, estatuindo emendas individuais ao Orçamento, dotadas de execução obrigatória, conforme o § 11 do art. 166 da Constituição. Pela Emenda Constitucional n.º 100 de 2019, criavam-se também, como obrigatórias, as emendas de iniciativa de bancada de parlamentares de um Estado (§ 12 do art. 166 da Constituição).

O Legislativo apropriava-se de parcela do Orçamento, instalando governo paralelo com as emendas de comissões permanentes de ambas as Casas e as emendas do relator. Estas últimas, decorrentes da Lei n.º 13.898/19, de iniciativa de Bolsonaro, consistem em emendas do relator-geral que promovam acréscimo em programações constantes do projeto orçamentário ou inclusão de novas programações.

Dora Kramer - O jogo recomeça

Folha de S. Paulo

A ideia na Câmara é construir consenso capaz de reduzir estresse com o Planalto

À primeira vista a cena da sucessão na presidência da Câmara ficou mais obscura, mas à luz da realidade da Casa a coisa clareou e se encaminha para a tentativa de construir um consenso. Não como previsto no roteiro até então apresentado ao público. Nele, Arthur Lira (PP-AL) colocaria o deputado Elmar Nascimento (União-BA) debaixo do braço e goela abaixo do governo e demais políticos a ele resistentes.

Agora o jogo é pela busca da acomodação de forças de governo e oposição em torno de Hugo Motta (Republicanos-PB). Não foi bem uma reviravolta clássica, porque o nome dele figurava há pelo menos três meses como uma espécie de reserva técnica para o caso de não se chegar a um entendimento forte o suficiente para não representar risco de derrota para Lira.

Amigo de Elmar, o presidente da Câmara é, antes de qualquer coisa, um pragmático. Percebeu que a hora é de aliviar tensões.

Alvaro Costa e Silva - Cláudio Castro perdido no tiroteio

Folha de S. Paulo

Perdido, governador muda outra vez cúpula da segurança

Cláudio Castro mexeu mais uma vez na cúpula da segurança. Exonerou o delegado Marcus Amin, secretário de Polícia Civil, e o coronel Leandro Monteiro, secretário de Defesa Civil e comandante-geral do Corpo de Bombeiros. Classificou as mudanças como "decisões de caráter pessoal", mas fica difícil separá-las do contexto das eleições municipais.

Eduardo Paes –que tenta a reeleição e é favorito nas pesquisas– conseguiu fugir da nacionalização da campanha apostando em outro viés: a estadualização da disputa. A estratégia é vincular Alexandre Ramagem, candidato do bolsonarismo, a Cláudio Castro, mal avaliado na cidade e cujo governo está perdido no combate à violência. "Castro é Ramagem, o Wilson Witzel das eleições de 2024. São os responsáveis pela segurança pública do Rio", disparou Paes em suas redes sociais.

Carlos Andreazza - A cor do gato

O Estado de S. Paulo

A meta para 25 não era zero. Foi rebaixada

Seria o caso de Simone Tebet e Dario Durigan – que é Haddad – conversarem. Ambos deram, com horas de diferença, entrevistas ao Estadão. O tema é revisão estrutural de gastos obrigatórios. O produto, bateção de cabeças.

A ministra do Planejamento falou antes: “Ninguém vai mexer nos pisos de saúde e educação. Nem devemos. E não tem discussão sobre a valorização real do salário mínimo e sobre desvincular o salário mínimo das aposentadorias”.

Estabelecidos o imexível e o indiscutível, não terá sobrado muito de onde cortar para valer. Este, já ido, é ano eleitoral.

O próximo, véspera daquele em que Lula concorrerá à reeleição. A ministra – informa-nos – está conformada à enxugação de gelo que chamam de pente-fino.

Fabio Gallo - Em tempos assim, melhor ficar burro

O Estado de S. Paulo

Em tempos como estes é melhor não reagir impulsivamente a cada nova informação ou oscilação do mercado

Realizar previsões econômicas é sempre difícil, mesmo para os especialistas. Afinal, são muitas variáveis sociais, de mercado, monetárias, de preços, juros, câmbio, entre outras que interagem entre si. No entanto, tentar ter uma perspectiva sobre o futuro é algo importante para os investimentos. Os investidores sempre querem ter uma visão clara do que está à frente, caso contrário mais risco é associado aos investimentos e mais difícil é saber o que fazer com o dinheiro.

Nestes últimos tempos, a exemplo de outros períodos, os sinais da economia estão mais difusos. Temos vários indicadores positivos ao mesmo tempo que outros tantos negativos. As ações no mercado brasileiro chegaram a bater recordes históricos neste ano, mas no acumulado do ano o ganho do Ibovespa, principal índice da Bolsa brasileira, foi de somente 1,44%. Nesta semana tivemos a excelente notícia de que o PIB cresceu 1,4% no segundo trimestre, o que levou as projeções de crescimento da economia para perto de 3%, embora não tenhamos certeza de que este crescimento seja sustentável. Alguns analistas acham que é mais um voo de galinha.

Fareed Zakaria - Populismo de direita veio para ficar

O Estado de S. Paulo

Se ninguém enfrentar de verdade a questão da imigração, é provável que o estilo de Trump tenha vindo mesmo para ficar

Trump até pode perder a eleição, mas o populismo de direita veio para ficar

O grande estadista alemão Otto von Bismarck tem a fama de ter dito que “Deus tem uma providência especial para os tolos, os bêbados e os EUA”. Ele pode não ter dito isso de fato, mas a frase capta a sensação que muitos em todo o mundo têm sobre a capacidade contínua dos EUA de “surpreenderem pelo lado positivo”, nas palavras de um empresário amigo meu. Mas ainda não está claro se o partido no governo, o Democrata, conseguirá se beneficiar dessa boa sorte.

A mais recente evidência de sua “providência especial” é que os EUA parecem estar fazendo o impossível: derrubando a inflação rapidamente sem desencadear uma recessão profunda. Alan Blinder, ex-vice-presidente do Federal Reserve (o Banco Central americano), ressalta que, usando definições estritas, os EUA só conseguiram alcançar uma aterrissagem inegavelmente suave uma única vez nos últimos 60 anos.

Cristovam Buarque - A solidão da USP

Revista Veja

Não faz parte das ambições do país ter as melhores universidades

Em recente debate sobre “autonomia universitária”, no Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, os professores Simon Schwartzman e Arlindo Philippi Jr. perguntaram por que o Brasil tem “apenas a USP entre as 100”, em vez de “algumas entre as cinquenta melhores”. Considerando nossa relevância demográfica e econômica, com 8 milhões de alunos no ensino superior, deveríamos estar em melhor posição. Sabe-se que sem autonomia para pensar e ensinar fica impossível um sistema universitário de qualidade.

Uma razão fundamental de nosso atraso é que não faz parte das ambições nacionais estarmos entre os países com as melhores universidades do mundo. Optamos por termos muitas, mas não as melhores universidades; por massificar o número de alunos, e não por solidificar a qualidade da formação. Nós nos concentramos na meta de superar a injustiça de que só a elite econômica tem diploma universitário. Decidimos facilitar o acesso ao diploma, ignorando que a injustiça decorre do indecente descuido com a qualidade e a equidade na oferta de educação de base.

Pedro Serrano - O município na Constituição

CartaCapital

A Carta Magna de 1988 reabilitou a autonomia municipal perdida nas décadas anteriores

Em algumas semanas, serão realizadas, em exatamente 5.565 cidades brasileiras, as eleições para prefeito, vice-prefeito e vereadores. Dada a grande relevância assumida pelos municípios no nosso pacto federativo, bem como do elevado protagonismo assumido por referidas autoridades municipais na prestação de serviços públicos, no presente artigo trataremos da posição jurídica assumida por esses entes federativos na nossa Constituição.

A primeira questão que se coloca é que a organização político-administrativa do Brasil, intitulada pela Constituição como “república federativa”, compreende a união indissolúvel entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, todos eles qualificados como autônomos. Em vista da citada premissa normativa, a segunda questão é que a garantia da autonomia constitucional foi assegurada por meio de um complexo sistema de repartição de competências baseado, em linhas gerais, na enumeração das funções da União e dos municípios, cabendo aos estados um campo remanescente.

Mais especificamente, o modelo constitucional de repartição de atribuições entre os entes federados brasileiros foi delineado tendo em vista o princípio da predominância do interesse, segundo o qual cabem à União as matérias de predominante interesse nacional, aos estados as matérias de predominante interesse regional e que não estejam elencadas dentre as competências da União ou dos municípios. Por fim, aos municípios competem os assuntos de interesse predominantemente local.

Luiz Gonzaga Belluzzo - Senhor feudal

CartaCapital

Musk é um suserano das plataformas de negociação digital

Conhecido e reconhecido economista grego, Yanis Varoufakis escolheu Elon Musk como protagonista maior do sistema tecnofeudal. “Se eu tivesse que escolher uma pessoa para ilustrar o tecnofeudalismo, tanto a palavra quanto o conceito para entender nossa situação coletiva, apontaria Elon Musk. Brilhante e deficiente, combina raros talentos de engenharia com ridículas demonstrações públicas de ostentação.”

Diz Varoufakis que a compra do ­Twitter por Musk foi considerada por muitos comentaristas apenas um episódio de mais um pirralho rico em busca de um brinquedo. “Mas havia uma lógica em sua compra do Twitter, uma lógica tecnofeudal que elucida muito mais do que a mentalidade de Musk.”

Marcus Pestana - Emendas parlamentares, orçamento e poder

As emendas parlamentares sempre foram assunto polêmico. A recente tensão entre Congresso Nacional e STF reascendeu a discussão. Há análises de todo o tipo. Desde condenações morais contra a própria existência das emendas até arguições sobre a qualidade dos gastos derivados. Como já estive dos dois lados do balcão, na Secretária de Planejamento de MG e na Câmara dos Deputados, gostaria de oferecer uma pequena contribuição à presente polêmica, escorado ainda na experiência histórica e institucional de outros países.

É preciso esclarecer de imediato que democracia, orçamento público e parlamento são almas gêmeas, faces da mesma moeda, irmãos siameses, que nasceram juntos no século XVII na Inglaterra. Diante do poder discricionário absoluto do Rei de criar impostos e determinar despesas, representantes dos nobres, do clero, de comerciantes e agricultores, rebelaram-se na Revolução Puritana (1640) e na Revolução Gloriosa (1688), para estabelecer que apenas o povo, através de seus representantes, poderia criar tributos e proceder a alocação dos recursos. O parlamentarismo nasceu assim junto com o orçamento público e em substituição à monarquia absoluta. As revoluções francesa e americana reafirmaram o rumo. Por isso, soa estranho alguns revelarem assombro de o Congresso Nacional brasileiro ter certo protagonismo na concepção e execução orçamentária.

Poesia | A arte de ser feliz, de Cecília Meireles

 

Música | Chico Buarque e Mônica Salmaso - Maninha

 

sexta-feira, 6 de setembro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

7 de Setembro traz oportunidade de paz institucional

O Globo

Oportunismo político nas celebrações previstas para a data agravaria a polarização

O pior recado que os líderes políticos poderiam transmitir nas comemorações do 7 de Setembro previstas para amanhã será o acirramento da polarização que castiga o país. É compreensível que, em ano eleitoral, qualquer manifestação se torne foco de embate político. Mas todo choque de ideias deve se dar dentro das regras democráticas. E a data nacional não deve se prestar a oportunismos partidários. Ao contrário, trata-se de momento propício para recobrar o clima de normalidade no país. A paz institucional é condição necessária para o desenvolvimento do Brasil, e todos os atores políticos deveriam ter a maturidade de compreender isso.

No evento previsto para ocorrer no Eixo Monumental, em Brasília, estarão hasteadas as bandeiras dos países que integram o G20, referência ao encontro de chefes de Estado e governo das maiores economias no Rio em novembro. Instituições como Forças Armadas, SUS e Correios, serão homenageadas, com toda a justiça, pelo desempenho fundamental para reduzir os danos da tragédia ambiental no Rio Grande do Sul. Estão previstas também a presença de atletas que participaram dos Jogos Olímpicos em Paris e mensagens sobre a retomada da vacinação. Como costuma acontecer todos os anos, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) foram convidados, além de autoridades do Legislativo e comandantes militares. O evento precisa se ater — como sugere a programação — ao aspecto institucional.

Fernando Abrucio -Antipolítica pode minar a democracia

Valor Econômico

É preciso combater os extremistas antissistema, mas também é fundamental melhorar a política democrática

Já houve época em que votar contra a classe política era uma forma de protesto bem-humorado. Foi assim em 1959, quando o rinoceronte Cacareco obteve quase 100 mil votos para vereador em São Paulo, ou com o Macaco Tião, que recebeu cerca de 400 mil votos na disputa para prefeito do Rio de Janeiro em 1988. Muitos outros tiveram sucesso no Legislativo bradando contra o sistema, como o deputado Tiririca e seu famoso lema: “Pior que tá não fica”. Ainda há excentricidades concorrendo por todo o Brasil em 2024, mas a antipolítica agora mudou de face: seu objetivo maior não é só ridicularizar as instituições democráticas. É destruí-las para instaurar alguma forma de autoritarismo.

A antipolítica ganhou força em boa parte do mundo nos últimos anos, geralmente presente em candidatos e partidos ligados a um extremismo de direita. E na maior parte desses casos, o discurso antissistema tem como propósito principal minar a democracia. Trata-se de uma mudança tanto na oferta das lideranças políticas, como também na demanda de parcela importante da população.

José de Souza Martins - Limitações da inteligência artificial

Valor Econômico

Ela não supre a carência criada pelos descartes de talentos que provoca

A principal limitação do debate sobre inteligência artificial é a praticamente nenhuma referência à superioridade e à necessidade da inteligência tradicional. O desencontro entre a expansão das funções da inteligência artificial e a lentidão de adaptação dos seus descartados à modernidade que ela representa responde por um doloroso processo de exclusão social, que é anticapitalista e inimigo da empresa.

A inteligência artificial nasce e prospera para suprir, e não para substituir a inteligência natural e tradicional, para completá-la e ampliar o domínio do que é inteligente sobre o que é espontâneo. Foi Gramsci, pensador italiano vítima do fascismo, quem sublinhou a importância do bom senso do homem comum na realidade social.

Andrea Jubé - Marçal encontra Dostoiévski: diálogos imaginários

Valor Econômico

Em mais um dia de céu cinza da fumaça de incêndios e ar insalubre, o candidato à Prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal (PRTB) esbarrou com o escritor russo Fiódor Dostoiévski (1821-1881), autor de “O idiota”, em uma avenida importante da capital. A coluna recuperou trechos do diálogo imaginário.

- Ouvi falar de você, disse Dostoiévski, iniciando a conversa, como era de se esperar de um jornalista e escritor.

- Deve ser das redes sociais, sou “influencer” de alcance internacional, disse Marçal.

- Rede social? Desconheço. Minhas ferramentas de são papel, caneta-tinteiro e a alma humana. Uma vez, contratei uma estenógrafa, e me casei com ela, relembrou o russo.

- Papel?... Ora, temos algo em comum, sou “coach” e também desbravo a alma humana. Meus seguidores e apoiadores fazem quase tudo o que eu recomendar.

César Felício - Pesquisa indica que horário eleitoral fez diferença em SP

Valor Econômico

horário eleitoral gratuito ainda é um fator importante para a definição de voto em São Paulo. A pesquisa Datafolha de intenção de voto para prefeito divulgada nesta quinta-feira (5) resolve a dúvida que havia sobre a relevância dessa propaganda, mencionada na última coluna "Pergunte aos Dados" publicada no Valor. O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), candidato à reeleição e proprietário de 65% do tempo de propaganda na TV, foi o que mais cresceu na pesquisa, passando de 19% para 22%. Pablo Marçal (PRTB), senhor absoluto das redes sociais e sem um segundo sequer no horário eleitoral, cresceu também, mas apenas um ponto percentual, indo de 21% para 22%. A variação é pequena para ambos, mas quando se olha a curva dos últimos levantamentos se nota uma mudança de tendência. É um panorama completamente diferente ao que havia até a semana passada, quando o influencer havia subido sete pontos na rodada anterior e Nunes caído.

Bruno Boghossian - Onda de Marçal ainda não virou tsunami

Folha de S. Paulo

Nova pesquisa indica que três candidatos têm base para manter o jogo aberto até o dia do 1º turno

A onda de Pablo Marçal (PRTB) na eleição da capital paulista se mostrou consistente e volumosa, mas não virou o tsunami projetado pela campanha do ex-coach. A nova pesquisa Datafolha indica que os três líderes da corrida têm uma base sólida o suficiente para manter o jogo aberto por mais algumas semanas.

A freada brusca de Marçal sugere que sua candidatura enfrenta um momento diferente da euforia do início da campanha. Alvo de quase todos os adversários, ele manteve um patamar que o consolida como nome competitivo e cercado de apoiadores convictos: 70% de seus eleitores dizem que não mudam de voto.

A artilharia que destacou o passado e as ligações do ex-coach, porém, parece ter contribuído para interromper sua trajetória de alta. Desde a última pesquisa, Marçal se tornou mais conhecido e viu sua rejeição subir de 34% para 38%. De cada dois eleitores que o conhecem, um diz que não vota nele de jeito nenhum.

Marcos Augusto Gonçalves - Com Marçal, eleição é uma roleta-russa

Folha de S. Paulo

Candidato do PRTB está mais próximo do millennial Nayb Bukele e também de Milei na visão empresarial e no individualismo selvagem

notícia da viagem ao exterior de Pablo Marçal, candidato a prefeito de São Paulo, é mais uma demonstração de que o autodenominado ex-coach não veio para brincadeiras. A ideia de buscar respaldo de marketing em encontros com líderes internacionais no campo do ultraliberalismo ou do populismo de extrema direita não é em si nenhuma novidade. Chama, contudo, a atenção o fato de o planejamento da turnê começar pelo presidente de El Salvador, Nayb Bukele.

Os paralelos entre os dois personagens, em que pese a diferença de estágio em que se encontram em suas carreiras, são reveladores. Embora Marçal possa ser inscrito no mesmo contexto político-ideológico de nomes como Donald Trump, Javier Milei, Bolsonaro e Orbán, há características e nuances que diferenciam essas figuras entre si.

Vinicius Torres Freire - Gasto federal em saúde é recorde

Folha de S. Paulo

Despesa está na mira de Fazenda e Planejamento, que vão tentar contenção fiscal duradoura em 2025

A despesa do governo federal com saúde jamais foi tão alta. Era provável que aumentasse sob Luiz Inácio Lula da Silva, pois, com o novo arcabouço fiscal, voltou a vinculação do gasto com saúde à receita; o governo de resto não diminuiria gastos ditos discricionários. Foi a 1,83% do PIB, nos últimos 12 meses. No início de Lula 3, era de 1,37% do PIB. Na média de 2009 a 2019, de 1,47% do PIB.

Em dinheiro, foi um aumento de quase R$ 60 bilhões desde o início deste governo, para R$ 209 bilhões, excluídos gastos com salários e aposentadorias de servidores (valores corrigidos pela inflação). É mais do que se destina ao Bolsa Família, que levou R$ 171 bilhões nos últimos 12 meses. Nos grandes agregados da despesa federal, o gasto com saúde fica atrás de Previdência (INSS), que leva 8,35% do PIB, e de Pessoal (salários, benefícios, aposentadorias), com 3,48%. A receita total do governo foi de 18,17% do PIB nos últimos 12 meses. A despesa, de 20,21%.

Vera Magalhães - Bolsonaro vai à Paulista esvaziado

O Globo

Ex-presidente não conseguiu unir a direita em São Paulo, vê seu candidato levar uma surra no Rio e não tem chance em sua cruzada contra o Judiciário

Jair Bolsonaro convocou mais um ato de 7 de Setembro na expectativa de reforçar sua liderança política e de novo confrontar o Supremo Tribunal Federal (STF), mas chega à data com o palanque cindido em São Paulo, com seu principal candidato, Alexandre Ramagem, levando uma surra no Rio de Janeiro e com a possibilidade de reverter sua situação de inelegibilidade bastante reduzida no próprio STF e também no Congresso.

Dificilmente o ex-presidente conseguirá repetir na Avenida Paulista o quórum de outros feriados. Mesmo a decisão do ministro Alexandre de Moraes de proibir o X no Brasil, usada para reunir a tropa, tem alcance limitado às franjas mais sectárias de uma base que parece já olhar para o lado e enxergar outras lideranças para o lugar do capitão. E, pior para ele, essas caras não são necessariamente aquelas que o ex-Mito decidiu ungir.

Bernardo Mello Franco - Jogo bruto na Câmara

O Globo

Arthur Lira puxou o tapete do aliado mais próximo. O chefão da Câmara havia prometido apoiar Elmar Nascimento em sua sucessão. Na terça-feira, rifou o amigo e fechou com Hugo Motta.

A traição muda a ordem de largada na corrida pela presidência da Câmara. Sem o padrinho poderoso, Nascimento perdeu a primeira posição. Motta, que nem figurava no grid, agora desponta na pole.

Como faltam cinco meses para a eleição, ainda há tempo para novas surpresas. Mas a reviravolta desta semana já permite algumas conclusões: o Centrão não é tão unido quanto gostaria; a palavra de Lira está longe de valer o que ele diz; esquerda e direita significam cada vez menos no jogo bruto da Câmara.

Flávia Oliveira - Cidadezinha qualquer

O Globo

Faz poucos dias, o IBGE apresentou ao país as projeções atualizadas da população. Território inteiro, grandes regiões, todas as 27 unidades da Federação, 100% dos 5.570 municípios. São números importantes para diagnósticos socioeconômicos, formulação de políticas públicas, repartição de recurso orçamentários. O Brasil é um país profundamente assimétrico, capaz de comportar, na maior cidade, São Paulo, 11,9 milhões de habitantes; e na menor, Serra da Saudade (MG), 854. Cada uma delas elegerá prefeito e vereadores em um mês.

Um em cada cinco brasileiros vive em metrópoles com mais de 1 milhão de habitantes. São 15 municípios nessa faixa, 13 deles capitais. No Rio, aglomeram-se 6,7 milhões. Quase um terço da população total de 212,6 milhões, segundo o IBGE, mora em 48 localidades com mais de 500 mil habitantes. São cidades médias, para onde famílias inteiras costumam migrar em busca de vida mais tranquila, sem a hostilidade comum aos centros urbanos.

Paulo Feldmann - Limites às gigantes da tecnologia

O Globo

As empresas precisam respeitar as regras e legislações dos países onde estão localizadas

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem insistido que é necessário taxar as empresas gigantes da tecnologia, as big techs. As principais delas — como MicrosoftGoogle, X, Amazon, AlibabaFacebook/WhatsAppApple — têm valor de mercado hoje próximo a US$ 10 trilhões, muito maior que o PIB de toda a América Latina. Haddad acerta em querer taxá-las, mas seu objetivo é apenas aumentar a arrecadação — isso, segundo ele, representaria R$ 5 bilhões adicionais aos cofres públicos. Trata-se de medida tímida diante da ameaça que elas representam à economia e, principalmente, à democracia. A reação arrogante e desrespeitosa de Elon Musk, dono do X, à decisão do STF (querendo apenas que a legislação brasileira fosse cumprida) e, portanto, a nosso país é bem típica do que está para acontecer com as big techs.

Eliane Cantanhêde - Regulamentação já!

O Estado de S. Paulo

Internet mudou o mundo, para o bem e o mal, e está por trás de jogatina, golpes, crimes e manipulação

A prisão da “influencer” Deolane Bezerra joga luzes sobre as apostas esportivas, ou bets, seus bilhões, aviões, iates e carrões. Quando você puxa o fio, vem um novelo, ficando claro o poder avassalador da internet no mundo, para o bem e para o mal, sob o risco de ficar acima de constituições, leis e instituições, até assumir o controle de estados nacionais e sociedades. Assim como a ministra Marina Silva teme o fim do Pantanal até 2050, pode-se imaginar a destruição do Estado pelo poder paralelo da internet lá adiante?

Organizações criminosas e pessoas inescrupulosas usam intensamente a internet para atrair pessoas fragilizadas para jogos em que acabam se viciando e jogando fora o que têm e o que não têm. Também usam algorítimos para capturar vítimas potenciais de golpes bancários e financeiros e se embolam com esquemas políticos e organizações ideológicas para transformar “outsiders” em candidatos, manipular o eleitor com Fake News, fraudar eleições e, em última instância, articular atentados à democracia.

Flávio Tavares - Nossa independência no abismo?

O Estado de S. Paulo

Dos desvios idiomáticos aos problemas enfrentados nas contas públicas, o Brasil corre o risco de perder sua independência

O mês de agosto terminou há pouco, mas dele fica aquela rima que virou repetido refrão: “Agosto, mês do desgosto”. E há pretextos (ou até motivos) para isso: agosto foi o mês da bomba atômica sobre Hiroshima e Nagasaki, em 1945. Nove anos depois, aqui, no Brasil, o assassinato do major Rubens Vaz desencadeou uma crise política profunda que culminou, em 24 de agosto de 1954, com o suicídio do presidente Getúlio Vargas. Em 22 de agosto de 1976, vivíamos ainda sob ditadura quando o ex-presidente Juscelino Kubitschek morreu num acidente automobilístico na Via Dutra, nunca esclarecido e que, por isso, até hoje levanta suspeitas.

Mas agosto já passou, agora estamos em setembro e, amanhã, dia 7, festejamos 202 anos da proclamação da Independência do Brasil. É o “Dia da Pátria”, rememorando o histórico “grito do Ipiranga”, atualmente comemorado com desfiles militares e outras demonstrações de que somos independentes.

Vivemos hoje, no entanto, uma invasão estrangeira que pode transformar o estilo de vida e, especialmente, o idioma e as diferentes formas de comunicação. Se isso se consumar, perderemos nossa “independência”.

O poeta Fernando Pessoa já escrevia que “minha pátria é a Língua Portuguesa”, atualmente invadida pelo idioma inglês, tal qual no século 19 fora, em parte, invadida pelo francês. Camões, poeta maior de nossa língua, tem um soneto sobre o idioma português que vai às origens da língua derivada do latim vulgar: “Última flor do Lácio, inculta e bela / és a um tempo esplendor e sepultura / ouro nativo que na ganga impura / a bruta mina entre os cascalhos vela”.

Celso Ming - Pouso suave à vista?

O Estado de S. Paulo

A redução dos juros e o fim do temor de recessão da economia dos Estados Unidos podem melhorar o ambiente da economia global

Até mesmo o desempenho da economia brasileira será fortemente influenciado pela ação do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), que dia 18 deverá dar início ao processo de queda dos juros básicos, como já prometeu seu presidente, Jerome Powell.

Esses juros estão em seu nível máximo (de 5,25% a 5,50% ao ano) desde julho de 2023. Mas Powell não passou nenhuma dica sobre a dosagem do primeiro corte e de quanto tempo levará esse movimento. E nem podia chegar a tais pormenores. Vão depender de regulagem mais fina em que serão levados em conta a intensidade da inflação, o vigor da atividade e as condições do mercado de trabalho. Há projeções e palpites de toda ordem, alguns por corte mais alentado agora, da ordem de meio ponto porcentual e outros, de que não passará de um quarto de ponto.