O Globo
Uma pesquisa da Atlas Intel, publicada na
última quarta-feira, mostra o tamanho do desafio da Justiça ao lidar com a
direita brasileira. Por um lado, o Judiciário precisa punir — com rigor — as
movimentações antidemocráticas que tentaram derrubar o regime democrático entre
o fim de 2022 e o começo de 2023. Se os golpistas ficarem impunes, terão
incentivo para tentar outra vez. Por outro lado, a Justiça tem de fazer isso
com muito cuidado e equilíbrio, sem parecer que tem lado, ou corroeria sua
legitimidade com a metade da população que apoia Bolsonaro.
A pesquisa da Atlas Intel sobre como o público avalia o banimento da rede social X mostra que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem falhado miseravelmente na segunda missão. A situação poderá ficar ainda mais grave com as tentativas em curso na Justiça Eleitoral de impugnar a candidatura de Pablo Marçal. Talvez ainda dê tempo de corrigir o curso. Será que a liderança do Judiciário está disposta a olhar para as evidências?
A pesquisa traz números impressionantes, que
revelam as profundas divisões da sociedade brasileira. Entre os eleitores de
Bolsonaro, 96% discordam da decisão do ministro Alexandre de
Moraes de tirar o X do ar. Entre os eleitores de Lula,
92% concordam. Essa divergência se traduz na confiança no trabalho dos
ministros do STF. Entre os eleitores de Lula, 87% confiam no trabalho dos
ministros, enquanto, entre os eleitores de Bolsonaro, 95% não confiam.
Quando questionados sobre as motivações para
a suspensão do X, 97% dos eleitores de Bolsonaro enxergam viés político,
enquanto 82% dos eleitores de Lula acreditam que a medida teve base técnica.
Quanto ao impacto dessas ações, 96% dos eleitores de Bolsonaro acreditam que
enfraqueceram a democracia, enquanto 92% dos lulistas consideram que a decisão
fortaleceu o sistema democrático.
Nos Estados
Unidos, só encontramos esse grau de divisão quando olhamos para a
parte mais engajada da cidadania, para aqueles cidadãos que têm identificação
forte com um dos dois grandes partidos. No Brasil, o simples voto para
presidente em 2022 divide quase perfeitamente a opinião a respeito do Supremo.
Para os eleitores de Bolsonaro, o Supremo persegue conservadores, com decisões
motivadas por interesses políticos que terminam enfraquecendo a democracia.
Para os eleitores de Lula, a Corte defende o Estado de Direito, com decisões
baseadas em critérios técnicos.
Se já é ruim um grau de divisão desses sobre
qualquer tema, ele é particularmente nocivo quando envolve a Justiça, que
precisa contar com a confiança de todos os brasileiros e ser percebida como
equilibrada e imparcial.
O quadro pode se agravar ainda mais. A mesma
pesquisa da Atlas Intel também revela que a suspensão das redes sociais de
Pablo Marçal gerou opiniões polarizadas: 92% dos eleitores de Lula apoiam a
medida da Justiça Eleitoral, enquanto 97% dos eleitores de Bolsonaro são
contrários. Se um dos vários pedidos de impugnação da candidatura de Marçal for
acatado, a crise de confiança no Judiciário tende a se aprofundar, consolidando
a visão de que o sistema judicial persegue bolsonaristas, bloqueando suas candidaturas
e limitando sua expressão nas redes sociais.
Neste momento, é crucial que a Justiça ajuste
seu curso: aplique medidas severas contra os envolvidos nos atos golpistas, mas
aja com mais moderação ao regular a liberdade de expressão e o processo
eleitoral. Ainda há tempo para reverter a crise de legitimidade que afeta o
Judiciário. Para isso, é essencial concluir as investigações sobre os atos
antidemocráticos, suspender as medidas mais restritivas nas redes sociais e
evitar, na medida do possível, a impugnação de candidaturas com apoio
significativo, como a de Marçal.
Vivemos o auge do paradoxo daqueles que
reivindicam defender o regime democrático: uma Justiça que não conta com
confiança de metade da população ameaça a própria essência da democracia.
Um comentário:
“ Uma pesquisa da Atlas Intel, publicada na última quarta-feira, mostra o tamanho do desafio da Justiça ao lidar com a direita brasileira”
Será que o desafio realmente está em lidar com a direita brasileira ou será que essa percepção por parte da sociedade se deve exclusivamente a atuação da própria justiça brasileira que altera seu entendimento de acordo com as conveniências do momento?
Em que seus 2 últimos indicados tem relação umbilical e política com o atual governo? Advogado pessoal e ex ministro de estado…
Se reúne em convescotes fora do país regularmente como se fosse tudo normal e dentro da lei?
Em que parte da imprensa atua como assessoria do próprio governo desviando de temas espinhosos como o que acontece na Venezuela ou a “Vaza toga” para lustrar o governo e tentar aumentar sua legitimidade.
Já passou da hora da mídia e da própria justiça brasileira assumirem a sua parcela de responsabilidade pela polarização e deterioração das instituições brasileiras.
Nós não chegamos nesse ponto ontem e nem de carona com a direita…
A esquerda ganhou mais de 60% das eleições presidenciais desde 1989, já passou da hora de assumir as suas responsabilidades
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