Valor Econômico
Derrota no Congresso converge com a aprovação do governo e a intenção de voto de Lula no patamar mais elevado do ano
A derrota do governo na tentativa de
encontrar uma alternativa fiscal ao aumento do IOF convergiu com notícia de que
a aprovação do governo e a intenção de voto do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva (Genial/Quaest) chegaram ao seu patamar mais elevado do ano. A
convergência marcou, no Congresso, o início do ano eleitoral. Pelo rompimento
de acordos em série, dá para imaginar o que vem pela frente: a degradação dos
costumes parlamentares ante um buraco fiscal de R$ 46,5 bilhões.
A deterioração da política evidencia ainda sua impotência para dar conta das ervas daninhas da República, cujo cerco depende única e exclusivamente do estado policial. Polícia Federal, Receita Federal e Ministério Público cercam de um lado, Congresso afrouxa do outro. Quando ficou claro que os governistas retomariam o texto original da MP, que foi modificado pelo relator, Carlos Zarattini (PT-SP), para conseguir sua aprovação na comissão especial, o PL decidiu apresentar o requerimento pela retirada de pauta da MP com amplo apoio do Centrão.
A restauração do texto original recuperaria a
proposta de elevação das bets de 12% para 18% e exporia os parlamentares que
votassem contra esta taxação. E mais, restauraria a taxação de títulos como LCI
e LCA, que desfrutam de inexplicável isenção. Ou seja, os governistas
resgatariam todas as concessões e ficariam bonitos na fita. Mostravam-se
dispostos ao tudo ou nada. Lula já tinha até exonerado os três ministros com
mandato de deputado - André Fufuca (Esportes), Celso Sabino (Turismo) e Silvio
Costa Filho (Portos e Aeroportos) - para reforçar a ofensiva. Os partidos
desses três ministros, PP, União e Republicanos, deram 115 votos pela retirada
de pauta da MP. Arrebanhasse metade desses votos, o governo teria medido forças
com a oposição.
Zarattini começou o dia expondo a articulação
das principais lideranças desses partidos, os presidentes do PP, senador Ciro
Nogueira (PI), e do União, Antonio Rueda, além do governador Tarcísio de
Freitas, contra a MP. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado, não gostou de ter
sido excluído e alardeou: votar a favor da MP é dar um presente para o governo.
Duas horas depois, a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann,
rebateu-o: “Mentalidade tacanha”.
A estratégia de restaurar ao texto original,
desidratado pelas concessões do relator na comissão especial, se pautava pela
máxima de que, ao perder (no voto), os governistas ganhariam (no apoio
popular). A retirada de pauta derrubou seu pirulito e privou os parlamentares
oposicionistas desta exposição, como já o havia feito a paralisação do PL do
devedor contumaz. Aprovado no Senado, a toque de caixa, depois das operações
policiais de setembro, o projeto chegou à Câmara, onde dorme em berço
esplêndido, não sendo incluído nas urgências de votação que marcam o último
trimestre legislativo.
Muito se falou do mapeamento que o governo
prepara dos votos contrários à MP, que findariam naqueles favoráveis à sua
retirada de pauta. Parece improvável que os cargos que o Centrão detém nos
bancos públicos sejam afetados. No limite, o que se pode assistir é a
realocação de cargos regionais, como foi feito recentemente com a
superintendência da Codevasf na Paraíba, que saiu da influência do senador
Efraim Filho (União) e foi para o colo do presidente da Câmara, Hugo Motta
(Republicanos).
O país foi poupado de distorções como a
nivelação da tributação de investimentos de curto e longo prazo, mas perdeu
oportunidades para além de mais imposto sobre as bets. Ficam suspensas a
elevação da tributação sobre criptomoedas, a equiparação das alíquotas da CSLL
entre fintechs e bancos e o fim do ralo por onde escapa o crédito do
Pis-Cofins.
Tem um inescapável buraco fiscal pela frente,
além do encontro marcado com uma LDO cujo relatório prevê um calendário
mandatório de liberação de emenda até o fim de junho de 2026, prazo máximo para
transferências voluntárias em ano eleitoral, comprometendo do custeio de
universidades a merenda escolar. O Executivo volta a depender do andamento de
processos como aquele que está em posse do ministro Flávio Dino, sobre a
obrigatoriedade das emendas parlamentares.
Além das emendas e das isenções tributárias,
parece inescapável que o Palácio do Planalto precise conter seus planos de
lançar novos programas sociais, como a tarifa zero para o transporte municipal.
O recuo pode não ser exatamente ruim para o governo. Valendo-se da série
histórica do índice de bem-estar, do Banco Central, o ministro dos Transportes,
Renan Filho, diz que o governo não precisa gastar mais. Já tem Bolsa Família,
Pé-de-Meia, Farmácia Popular, Minha Casa Minha Vida, auxílio-gás, tarifa social
de energia e outros 37 programas sociais. Só precisa manter o bem que aí está.
Este índice começou a ser confeccionado em
2002 e soma inflação e desemprego. Quanto mais baixo o índice, maior o
bem-estar. A projeção para dezembro de 2025 é que este índice tenha o melhor
desempenho desses 23 anos. O ministro dos Transportes filia-se entre aqueles
que, no governo, veem o equilíbrio fiscal, sem pressão inflacionária, como o
caminho para a redução na relação dívida/PIB e a sustentação de um ciclo de
crescimento de longo prazo. A ver se a guerra que se avizinha comporta tamanha
moderação.
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