O Globo
Empresários, trabalhadores, lideranças
políticas e sociedade precisam se unir para romper essa camisa de força
É inadmissível que o Brasil tenha de aceitar
com normalidade um dos maiores absurdos econômicos do mundo contemporâneo: a
taxa básica de juros (Selic) a 15% ao ano diante de uma inflação em torno de 5%
(IPCA). Mais grave ainda: a inflação em maio e junho, quando anualizada, ficou
abaixo do centro da meta. Além disso, as expectativas de inflação vêm caindo e
já estão dentro do intervalo da meta. Por que isso só é considerado quando se
trata de elevar a Selic, mas nunca quando se discute reduzi-la?
Os juros no Brasil são uma barreira intransponível ao desenvolvimento. A taxa atual asfixia as empresas, empobrece as famílias, compromete empregos e perpetua a desigualdade. Tudo isso em nome do rentismo. Afinal, nada mudou com a nova direção do Banco Central.
Não existe crescimento sustentável com juros
estratosféricos. Não há espaço para inovação, reindustrialização e crédito
acessível. O que se vê é a paralisia dos investimentos produtivos, com sequelas
para toda a sociedade.
Por que correr riscos investindo em produção
quando é possível obter, sem esforço, rendimento real de 10% ao ano aplicando
no mercado financeiro? Esse modelo condena o país a andar de lado — ou de
marcha à ré — sob a miopia de uma única e cruel ferramenta de política
monetária. Quantas economias, mesmo com inflação incômoda e quadro fiscal
delicado, impõem a seus cidadãos uma taxa real de juros de 10%?
Os juros podem parecer invisíveis, mas seus
efeitos são palpáveis e devastadores: encarecem o alimento na mesa, o crédito
no banco, o investimento na fábrica e diminuem a esperança de um emprego digno.
Impedem o crescimento do pequeno empresário, corroem a base da economia e
aprisionam o país numa armadilha de baixo crescimento e alta desigualdade.
A indústria brasileira não se calará diante
desse quadro. É hora da mobilização. Empresários, trabalhadores, lideranças
políticas e sociedade precisam se unir para romper essa camisa de força. Juros
altos não podem ser naturalizados.
Esse não é um apelo por soluções mágicas ou
canetadas improvisadas. Reconhece-se que o patamar atual dos juros reflete uma
realidade complexa: dívida pública elevada (e inflada pelos próprios juros),
gastos obrigatórios crescentes e indexados, desconfiança dos mercados diante da
incapacidade do governo em controlar despesas. Essa realidade precisa ser
enfrentada, mas não pode justificar uma política de estrangulamento econômico.
Nesse espírito, o setor produtivo está
construindo o pacto Brasil +25, a ser apresentado aos Poderes constituídos, com
propostas de reformas estruturantes e políticas de Estado. O país precisa de
uma estratégia para o futuro, não de uma política monetária que nos mantém
prisioneiros do passado.
Se fosse fácil, a questão dos juros já
estaria resolvida. Mas, por ser difícil e tão danosa, tem de ser enfrentada com
coragem e urgência. O Brasil não pode mais se contentar em ser refém de uma
política que beneficia poucos e sacrifica milhões.
Baixar os juros de forma consistente e
responsável, conjugando medidas críveis de ajuste fiscal, é imperativo.
Reformas estruturais não podem seguir sendo adiadas ou usadas como eterna
desculpa para manter os juros reais mais altos do planeta. O país precisa
alinhar-se à realidade de uma economia globalizada em plena ebulição.
A economia real exige independência em
relação ao rentismo e participação efetiva no processo de decisão. Por que não
garantir ao setor produtivo assento no Conselho Monetário Nacional? A indústria
e a economia real precisam estar representadas onde se definem os rumos do
país.
O Brasil precisa de uma nova visão. Uma visão
que reposicione o Banco Central e reoriente as políticas públicas para a
responsabilidade, a racionalidade e, sobretudo, para o compromisso com o
desenvolvimento nacional.
*Ricardo Alban é empresário e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
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