quinta-feira, 8 de abril de 2021

José Serra* - Os desafios do SUS

- O Estado de S. Paulo

Serviços e finanças do sistema precisam ser reorganizados em torno de redes integradas

No meu último artigo neste espaço sublinhei a necessidade de reforçar os laços de solidariedade social para superarmos a crise sanitária, que se agrava. A natureza das pandemias requer soluções coletivas. Não haverá solução para cada um se não houver para todos.

Neste artigo pretendo destacar um dos grandes pactos de solidariedade que fundaram nossa nova ordem constitucional e as medidas para aprimorar o complexo arranjo institucional desenvolvido para sua implementação: o Sistema Único de Saúde (SUS).

Diferentes sociedades optam por diferentes modelos de provisão de bens e serviços de saúde. A escolha de cada país é influenciada por múltiplos fatores. Não há modelo ideal: a balança de benefícios e riscos varia conforme as alternativas escolhidas. E os efeitos de equidade não devem ser negligenciados.

A sociedade brasileira incluiu na Constituição de 1988 opções básicas relativas ao seu sistema de saúde. A saúde tornou-se direito de todos; seu acesso deve ser universal, igualitário e integral em todos os níveis de atenção. Mas como financiá-lo?

Ao longo dos anos cresceu o gasto público e, com ele, os indicadores de saúde. Temos, porém, um aparente paradoxo: o Brasil optou pelo atendimento universal oferecido pelo Estado. Mas, no setor de saúde como um todo, há predominância dos gastos privados, parcialmente financiados por benefícios fiscais. Ou seja, nosso sistema combina relações de complementaridade e competição entre provedores públicos e privados, e a escolha desse modelo misto tem consequências.

Eugênio Bucci* - Os dez mandamentos do desmando

- O Estado de S. Paulo

Verás teu povo fenecer sem o sopro da vida e isso te insuflará a embriaguez de poder

1 – Profanarás o Estado laico.

A maior notícia da temporada não tem que ver com sepultamentos noturnos extenuantes ou com reuniões angustiantes entre empresários e o presidente da República. A maior notícia é que entrou em cartaz na TV Brasil – emissora da Empresa Brasil de Comunicações, a EBC, vinculada ao governo federal – a novela Os Dez Mandamentos, produzida e já exaustivamente exibida pela TV Record. Segundo foi noticiado, a EBC pagou R$ 3,2 milhões pelos direitos de sua nova atração. Com isso vem abaixo qualquer aparência de laicidade que pudesse ainda resistir na comunicação pública da União. É verdade que a TV Cultura, de São Paulo, exibe desde sempre a missa dominical de Aparecida, mas Os Dez Mandamentos chegam à TV Brasil para explodir com todos os limites. Se a TV Cultura tem uma face de coroinha, a EBC é agora um canal escancaradamente missionário, com préstimos do dízimo do erário.

2 – Transformarás a política em fanatismo.

A mistificadora novela na TV governamental pode ser vista como um curso de formação (e de deformação) política. Nela se encena a regressão do neopentecostalismo a uma forma religiosa pré-cristã, decalcada no monoteísmo judaico. O objetivo não é espiritual. Não se trata de expandir os horizontes da fé. Trata-se apenas de catequizar as massas para convertê-las às maravilhas da autocracia.

Moisés, na trama da Record, é um líder acima de todos porque está em linha direta com Deus, alegadamente acima de tudo. Em vez de dialogar, ordena. Sua liderança exige obediência, em lugar de raciocínio. Ele não tem aliados, mas fiéis. A novela reduz a fanatismo o que há de política no Velho Testamento.

3 – Xingarás a ciência de bruxaria.

Luiz Carlos Azedo - Muito além das igrejas

-Correio Braziliense

É surreal a polêmica que ocorre no Supremo, no momento mais dramático da pandemia, que registrou 3.829 mortes por covid-19 e 92.625 novos casos nas últimas 24 horas

O julgamento iniciado, ontem, no Supremo Tribunal Federal (STF), com o voto contrário do relator, ministro Gilmar Mendes, à liberação de celebrações religiosas presenciais, como cultos e missas, em razão da pandemia da covid-19, extrapola a crise sanitária e diz respeito à existência de um Estado laico e sua relação com a sociedade no Brasil. A ideia da separação entre a política, o Estado, e a religião, ou seja, as igrejas, não é um assunto tão pacificado como deveria, embora preconizada por Nicolau Maquiavel, em O Príncipe, desde o século XVI.

A discussão na Corte foi provocada por liminar do ministro Kassio Nunes Marques a favor da liberação dos cultos, a pretexto de defender a liberdade religiosa, acolhendo pedido da Associação Nacional dos Juristas Evangélicos. Sua decisão acabou confrontada por outra liminar, do ministro Gilmar Mendes, em favor do governo de São Paulo, que proibiu as celebrações em razão das medidas de distanciamento social para combater a pandemia.

Ricardo Noblat - Jantar de Bolsonaro com empresários foi uma ação entre amigos

- Blog do Noblat / Veja

O presidente reafirmou o que pensa e acabou ovacionado

Nos oito anos dos governos de Fernando Henrique Cardoso, e nos oito de Lula, não foi preciso selecionar com rigor nomes de empresários dispostos a jantar com eles para driblar o risco de serem fortemente pressionados por isso ou por aquilo. Fernando Henrique estava à vontade no meio deles. Lula, também.

Já foi o caso do presidente Jair Bolsonaro até, pelo menos, metade do ano passado. Desde então deixou de ser, daí os cuidados tomados em ocasiões como essas. Recentemente, centenas de economistas, empresários e banqueiros pesos pesados do PIB assinaram um manifesto fazendo duras cobranças a Bolsonaro.

Não se tem notícia se alguns deles participaram do jantar oferecido a Bolsonaro, ontem, em São Paulo, por Washington Cinel, dono da empresa de segurança Gocil. Mas nomes graúdos compareceram. E os primeiros relatos indicam que Bolsonaro foi muito bem recebido e chegou a ser ovacionado quando discursou.

Adriana Fernandes – Mágoas e cicatrizes

- O Estado de S. Paulo

Independentemente do tamanho do acerto do presidente Jair Bolsonaro com o comando do Congresso para a saída do impasse sobre as emendas parlamentares do Orçamento de 2021, a crise política já deixou mágoas e feridas abertas na relação entre o Senado e a Câmara e também com o governo.

As cicatrizes poderão ser maiores ou menores a depender da forma como o presidente vai bater o martelo. Bolsonaro tem prazo até dia 22 para sancionar o Orçamento. De hoje até lá, parece uma eternidade.

Foi assim em 2020, quando impasse orçamentário semelhante se instalou na República, no momento em que a pandemia da covid-19 mostrava a sua cara no Brasil. A diferença é que agora Senado e Câmara estão divididos. Lideranças já avisaram que o rancor é grande no Senado com Paulo Guedes pela postura que consideram errática do ministro da Economia em relação ao acordo feito pelo governo para acomodar o aumento das emendas parlamentares com cortes de despesas obrigatórias.

Vinicius Torres Freire - Povo perde dinheiro, Bolsonaro ataca

-Folha de S. Paulo

Renda de benefícios cai, restrições da epidemia crescem, presidente perde votos

Até março de 2020, a soma de certos dinheiros que o governo federal transfere para pessoas físicas era de R$ 69 bilhões por mês. Em abril, essas transferências passaram para R$ 105 bilhões, graças ao auxílio de renda do período de epidemia. No pico, em junho, foram a R$ 149 bilhões mensais. Em janeiro e fevereiro deste ano, a média desses pagamentos regredira a R$ 69 bilhões mensais.

Os brasileiros voltaram a sacar dinheiro das cadernetas de poupança nos primeiros três meses do ano. Tomaram menos empréstimos nos bancos no primeiro bimestre. A renda disponível para consumo caiu para a massa de pessoas sem ganhos do capital ou de aplicações financeiras.

As transferências do governo federal são benefícios de INSS, Bolsa Família, Benefício de Prestação Continuada (BPC, para idosos e deficientes muito pobres), abono salarial, seguro-desemprego e alguns outros quebrados.

Bruno Boghossian - Um RH terrível

- Folha de S. Paulo

Bolsonaro trabalha para ocupar máquina pública com operadores ultraconservadores

Quando procurava um nome para comandar a Ancine, ainda no primeiro ano de governo, Jair Bolsonaro não escondeu o perfil desejado. O presidente disse que o chefe da agência deveria andar com a Bíblia debaixo do braço, saber recitar 200 versículos e ter os joelhos machucados de tanto rezar.

Pode-se imaginar por que seu governo exigiria essa experiência tão peculiar de candidatos a gerenciar um órgão de incentivo ao cinema. A ocupação de espaços de poder por portadores de um currículo ideológico alinhado ao bolsonarismo sempre foi uma obsessão do presidente.

Maria Hermínia Tavares* - A cadeira das mulheres

- Folha de S. Paulo

Quando se olha a participação no Legislativo federal, o país está na rabeira da América Latina

Autora de um precioso artigo sobre a trajetória política da médica Carlota Pereira de Queiroz (1892-1982), a socióloga Albertina Oliveira Costa gosta de contar que a primeira parlamentar brasileira comparecia às sessões da Constituinte de 1934 com uma dama de companhia para não ficar sozinha no meio de seus 253 colegas homens.

Nenhuma mulher participou da elaboração da Carta de 1946, que legou ao país uma democracia restrita aos alfabetizados. Em 1988, 26 deputadas —5% do total— ajudaram a fazer a Constituição Cidadã. Hoje, as mulheres ocupam 15% dos assentos na Câmara e 13% no Senado.

Progresso houve, mas muito pouco e muito lento. Por isso, entre 2006 e agora, o Brasil perdeu 26 posições no ranking global de igualdade de gênero do Forum Econômico Mundial, ficando na modestíssima 93ª posição entre 156 nações.

Quando se olha apenas o Legislativo federal, o país está hoje na rabeira da América Latina. Nas três décadas em que a democracia se instalou para valer na área, políticas de ação afirmativa —com frequência por meio de cotas fixadas em lei— apoiadas em mobilização política, ativismo social e atuação do Judiciário aumentaram consideravelmente a participação feminina nas instituições políticas. Hoje, quase a metade das cadeiras na Câmara de Deputados e no Senado do México e cerca de 42% na Argentina é ocupada por mulheres.

Fernando Schüler - O que vamos aprender disso tudo?

- Folha de S. Paulo

Estado deveria agir para reduzir desigualdade, mas resultado vem sendo o inverso

Lucas tem 17 anos e foi trabalhar, leio em uma reportagem. Cursava o último ano do fundamental e largou. Foi no ano passado, em meio à pandemia. A internet em casa não era das melhores para fazer as tarefas da escola e a situação econômica apertou. Quem sabe um dia volta em algum supletivo.

Lucas não é exceção. A evasão escolar sempre foi alta no Brasil. Um estudo do Inep mostrou que, entre 2010 e 2016, apenas 49,3% dos alunos e 61,3% das alunas do sexto ano do fundamental concluíram, no tempo certo, o ensino médio.

A pandemia irá piorar isto e ampliar ainda mais o “gap” de gênero. O Unicef mostrou que o Brasil é um dos cinco países que mais permaneceu com escolas fechadas. Foram 191 dias entre março de 2020 e fevereiro de 2021, contra 52 dias na média europeia.

São evidentes os danos que isso irá gerar. A “geração Covid” terá um déficit de aprendizagem. Terá desvantagem quando for disputar espaços no mercado. O Banco Mundial diz que o percentual de estudantes sem o conhecimento mínimo para ler adequadamente um texto irá de 55% para 77% se as escolas fecharem por 13 meses. Exagero? Não creio.

Fabio Graner - Arrecadação: a crise para além das crise

-  Valor Econômico

Projeto convida ao debate sobre como elevar arrecadação

Não bastassem a segunda onda da covid-19 e a atual crise do Orçamento, está em curso uma queda de braço entre a área econômica e Congresso em torno do projeto que permite a atualização do valor de bens junto à Receita Federal, pagando-se uma tributação reduzida sobre o ganho registrado. O centro da disputa é o tamanho da alíquota, que na proposta original do senador Roberto Rocha (PSDB-MA) é de 1,5%, enquanto o bloco P da Esplanada dos Ministérios defende pelo menos o dobro.

Estimar o impacto arrecadatório dessa iniciativa está mais no ramo dos jogos de azar do que da matemática e da economia, dado que dependerá de decisões individuais, com motivações as mais variadas. Seja como for, pode representar um reforço na arrecadação nesses tempos de necessidades de recursos fiscais, sem impor mais um peso na atividade econômica.

Maria Cristina Fernandes - A boiada entalada na porteira

 

- Valor Econômico

Liberação de cultos embute disputa pela vaga no Supremo

A velocidade com a qual fluem os cadáveres da covid-19 é inversamente proporcional ao represamento dos embates produzidos na pandemia pelo processo que o ministro do Meio Ambiente, na reunião ministerial revelada há um ano, chamou de “passar a boiada”. Parlamentares, ministros, juristas e, principalmente, o presidente da República se valeram da pandemia para impor sua agenda sobre um país de ruas esvaziadas e cidadãos crescentemente amedrontados pelo vírus. São tantos e tão gordos os animais que estão a passar pela porteira que a boiada entalou.

Os rebanhos mais visíveis estão no Executivo, mas vêm dos Três Poderes. No Judiciário, a disputa pela substituição do ministro Marco Aurélio Mello congestionou a porteira. As tratativas para a escolha influenciam a pauta e movem os arranjos internos no Supremo Tribunal Federal. A sessão de ontem foi um exemplo disso. Estava em pauta a liberação de cultos religiosos, mas o que estava em jogo mesmo era a ofensiva do ministro Kassio Nunes Marques sobre as prerrogativas de Gilmar Mendes como principal interlocutor do presidente no preenchimento das vagas dos tribunais.

O próprio Nunes Marques foi submetido pelo presidente a um beija-mão de Mendes em outubro do ano passado antes de sua nomeação. Agora se arvora a disputar espaço com aquele que avalizou sua escolha. Está em jogo a sobrevivência política e a liberdade de Bolsonaro e de seus filhos. Por isso são tão gordos os bois que se espremem na porteira. O presidente vê no agrado aos evangélicos o caminho para a mobilização de uma base de eleitores que, durante a pandemia, ficou ainda mais dependente espiritualmente das lideranças religiosas. É a aposta que faz para neutralizar, neste segmento, danos sobre sua imagem advindos do genocídio que podem atingi-lo até mesmo antes da eleição.

Míriam Leitão - Escolhas erradas no pior da crise

- O Globo

Há algo profundamente errado no Orçamento, além de todos os números desencontrados. Os erros são crassos, de todos os lados, e reveladores. Mas a principal falha é que o governo e o Congresso juntos fizeram uma peça em completo divórcio com o país. Os brasileiros estão morrendo, as emergências são dramáticas na saúde e na educação, mas o Orçamento garantiu verba para submarino nuclear e corvetas dos militares, encheu os bolsos dos parlamentares de emendas, reservou verba para os palanques de Bolsonaro. É a prova, mais uma, de um governo alheio a tudo o que é de fato urgente neste pavoroso momento brasileiro.

Mauro Osorio* - Bom ‘Censo’, por favor

- O Globo

O IBGE não fez o Censo Demográfico no ano de 2020, por causa da pandemia. E corre o grave risco de também não fazer neste ano de 2021, principalmente por falta de recursos.

O recurso previsto para o Censo em 2020 era, em 2019, de R$ 3,4 bilhões. No início de 2020 houve um corte, destinando para o Censo apenas R$ 2,3 bilhões. Agora, o Congresso aprovou o Orçamento para 2021, reduzindo a quantia para míseros R$ 71 milhões.

Oito ex-presidentes do IBGE escreveram uma carta lembrando que, sem a realização do Censo este ano, o Brasil se junta a Haiti, Afeganistão e outros Estados falidos ou em guerra que estão há mais de 11 anos sem informações estatísticas adequadas para apoiar suas políticas econômicas e sociais.

O Censo é decisivo não só para uma fotografia detalhada do país a cada dez anos, mas também para servir como base de dados para a organização de pesquisas, amostragens e estimativas futuras.

A economia de R$ 3,4 bilhões no recurso do Censo significa apenas 0,08% do total do Orçamento. Ou seja, é desprezível.

Malu Gaspar - Um presidente imunizado contra a CPI da Covid

- O Globo

O requerimento para a criação de uma CPI da Covid-19, protocolado no Senado no início de fevereiro, deixou há muito de ser um pedido de investigação para ser um termômetro que afere as chances de sobrevivência política do presidente da República. Aos olhos de hoje, os líderes da Câmara e do Senado parecem ter concluído que Bolsonaro, que esteve na UTI, já pode ser politicamente desentubado.

O requerimento tem a assinatura de 31 senadores, mais do que as 27 exigidas, e o objeto da investigação é definido: “apurar as ações e omissões do governo federal no enfrentamento da pandemia da Covid-19 no Brasil e, em especial, no agravamento da crise sanitária no Amazonas com a ausência de oxigênio para os pacientes internados” nos primeiros meses de 2021.

Nessas circunstâncias, o regimento do Senado diz que o pedido deve ser lido em plenário e a CPI, instalada imediatamente. Mas Pacheco, eleito para o cargo com o apoio de Bolsonaro, está há dois meses produzindo desculpas para não fazê-lo. A última foi expressa num documento enviado ontem pelo Senado ao Supremo Tribunal Federal, em resposta a uma ação de parlamentares pedindo a instalação da comissão.

Diz que a CPI poderia ter “efeito inverso ao desejado”, produzindo “desconfiança da população em face das autoridades públicas em todos os níveis”. Menciona, ainda, um eventual “apagão das canetas”, em que os gestores públicos deixariam de tomar decisões urgentes por medo de punição.

Merval Pereira - LSN, incompatível com a democracia

- O Globo

Assim como chegou a vez de extinguir a Lei de Imprensa promulgada na ditadura militar, graças à ação, em 2009, do então deputado federal Miro Teixeira, jornalista e advogado, parece ter chegado ao fim a vigência da famigerada Lei de Segurança Nacional.

O presidente da Câmara, Arthur Lira, quer colocar em votação um pedido de urgência para a análise de um projeto de lei que revisa integralmente a LSN. As mesmas razões se impõem hoje. Conforme argumentou na ocasião Miro Teixeira, a Lei de Imprensa imposta pela ditadura militar continha dispositivos incompatíveis com o Estado de Direito inaugurado com a Constituição de 1988, como a prisão de jornalistas condenados por calúnia, injúria e difamação.

Com sua revogação, as questões envolvendo notícias ou comentários têm nos Códigos Civil e Penal sua resolução. Também a Lei de Segurança Nacional (LSN) tem servido de base para diversas ações do atual governo contra seus opositores, jornalistas e cidadãos em geral. Dados oficiais mostram que, nos últimos 18 meses, foram abertos 41 inquéritos com base na LSN, mais do que em qualquer período dos últimos 20 anos, quando foi usada 155 vezes.

Música | Leila Pinheiro e Zélia Duncan - Todas as coisas valem

 

Poesia | Joaquim Cardozo - Poesia da presença invisível

Através do quadro iluminado da janela
Olho as grandes nuvens que chegaram do Oriente
E me lembro dos homens que seriam meus amigos
Se eu tivesse nascido em Cingapura.

E aqueles que estiveram comigo nas horas concluídas
Ainda impressionam o ar
— Todos eles perderam-se no mar.

Agora, na praia deserta estou sozinho
— Caminho
Com os pés descalços na areia.

Nesta tarde morta o perfume das almas
Invade as enseadas, estende-se sobre os rios, paira sobre as
[colinas

— A Natureza assume a precária presença de um sonho;
Um trem corre sereno na planície dos homens ausentes;
Do fundo de minha memória sobe um canto de guitarras
[confusas;

Sinto correr de minha boca um rio de sombra,
A sombra contínua e suave da Noite.

quarta-feira, 7 de abril de 2021

FH sobre Lula: 'Melhor alguém novo no jogo'

Ex-presidente critica Bolsonaro, prega nome de centro, manifesta apoio a Doria e admite apoiar Ciro se ele for 'capaz de levantar votos'

 - O Globo

SÃO PAULO — O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) afirmou que “uma hora as pessoas devem passar o bastão” em referência ao também ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e defendeu um nome de centro para 2022. A declaração foi dada em entrevista à Radio CBN.

— Chega uma hora que as pessoas devem passar o bastão e me refiro ao presidente Lula. Que novidade ele vai trazer? Para o Brasil, seria melhor alguém realmente novo no jogo. Bolsonaro dificilmente vai representar algo diferente do que representou, que foi o "não ao PT". Ou rompemos essa dicotomia ou o Brasil vai atrapalhar o futuro — disse FH.

O tucano defendeu um nome de centro que seja comprometido com a ”democracia e progresso econômico”. Manifestou apoio a João Doria (PSDB), governador paulista, mas afirmou que pode apoiar Ciro Gomes (PDT), se este for “capaz de levantar votos”:

— Tem que ter alguém que expresse um sentimento de futuro. E esse futuro está altamente prejudicado agora pela saúde pública, a concentração de renda e o desemprego.

O ex-presidente afirmou que é “melhor para o Brasil” que Bolsonaro complete o mandato, pois o país já viveu vários impeachments e isso "deixa marcas". O tucano destacou, no entanto, que o futuro depende do atual presidente. "Está nas mãos dele", avaliou. Também criticou a atual gestão:

— O presidente governa para o grupo, a família, os partidários e os amigos dele.

FH afirmou ainda que Bolsonaro tem o histórico de um homem que olha apenas para um lado, seja no Brasil ou no exterior.

— Bolsonaro vê o outro lado como inimigo, e não como adversário — afirmou.

Vera Magalhães - Da farda ao distintivo

- O Globo

Nem bem deu com a cara na porta dos quartéis ao tentar bagunçar o coreto por lá com sua forma deliberada e sistemática de minar as instituições, comprometendo sua tonicidade, Jair Bolsonaro voltou-se para outra delas que muito interessa a seu projeto de aparelhamento do Estado, a Polícia Federal.

Não que o ex-ministro da Justiça, atual advogado-geral de Bolsonaro e candidato a ministro do Supremo, André Mendonça, tenha oferecido qualquer resistência a esse projeto, muito pelo contrário.

Mas o novo ocupante da pasta, o delegado da PF Anderson Torres, que chegou ao posto demonstrando grande apetite por poder e por aparecer nas redes sociais, quer colocar sua própria turma por lá.

E sendo, ele próprio, da patota de Bolsonaro e dos filhos, a troca fica em casa e serve ao propósito do chefe.

Desde que venceu as eleições, o capitão não esconde sua compreensão absolutamente peculiar do que seja o exercício da Presidência da República: o uso ilimitado da caneta Bic para nomear e destituir pessoas não pelo currículo, algo de que ele aliás desdenhou nesta terça-feira, mas de acordo com seu também muito próprio código de lealdades.

O presidente não se furta a se referir ao Exército, à Polícia Federal ou ao Ministério como “meu” isso, “meu” aquilo, deixando explícita a maneira nada republicana com que enxerga as atribuições de cada uma dessas estruturas que são de Estado, e não puxadinhos do condomínio Vivendas da Barra ou mesmo do Palácio da Alvorada.

Elio Gaspari - Uma festa séria para 2022

- O Globo / Folha de S. Paulo

O Brasil era atrasado, mas não se orgulhava disso

Tomando notas para sua obra “Efemérides brasileiras”, o Barão do Rio Branco registrou que amanhã, há 200 anos, realizou-se a “eleição primária de eleitores de paróquia no Rio de Janeiro. Foram as primeiras eleições desse gênero a que se procedeu no Brasil”.

O barão foi um obsessivo pesquisador da linda História do Brasil, e a Fundação Alexandre de Gusmão botou na rede as suas “Efemérides”, tornando-as acessíveis para pesquisadores.

Essa migalha aponta para a importância de outra data: no dia 7 de setembro de 2022, comemoram-se os 200 anos da Independência do Brasil. Afora a provável reinauguração do Museu do Ipiranga, não se tem notícia de iniciativa séria para que ela seja lembrada. Nem há muito que se possa esperar.

Em 1922, quando o Brasil fez 100 anos, viveu-se um ano de festas. O país tinha um pé no atraso, mas encantava-se com o progresso. O Rio mudou de cara, realizou-se uma exposição internacional, e várias nações ergueram pavilhões para mostrar seus produtos. O da França hospeda hoje a Academia Brasileira de Letras.

Cinquenta anos depois, no governo do general Emílio Médici, produziu-se uma patriotada circulando pelo país os ossos de D. Pedro I, até que os puseram numa cripta no Museu do Ipiranga. (Anos depois, descuidada, virou mictório.) Enquanto o mito banal ia de um lugar para outro, a verdadeira figura do primeiro imperador era escondida. Foi proibida a transcrição do decreto pelo qual aboliu a censura à imprensa. Com a economia crescendo a taxas de milagre, a ditadura podia dizer que, com censura, o Brasil era um país que ia “pra frente”.

Bernardo Mello Franco - A revolução é ser normal

- O Globo

Ao tomar posse, o chanceler Carlos Alberto França prometeu correr atrás de vacinas, valorizar o multilateralismo e apoiar o combate às mudanças climáticas. Tudo o que o Itamaraty se recusou a fazer na primeira metade do governo Bolsonaro.

O novo ministro afirmou que o diplomata deve agir como um construtor de pontes. Seu antecessor se empenhou na tarefa de dinamitá-las.

Em dois anos e três meses, Ernesto Araújo conseguiu se indispor com a China, a Índia, a Alemanha, as Nações Unidas e os EUA pós-Trump. Ele também hostilizou nosso principal vizinho. Horas depois da eleição na Argentina, tuitou que “forças do mal” celebravam a vitória de Alberto Fernández.

França lembrou que o Brasil sempre foi um ator relevante nos fóruns internacionais. Não precisou dizer que esse patrimônio foi desprezado por Ernesto. Na gestão passada, o Itamaraty renegou suas tradições e fez uma opção pelo isolamento. O país levará tempo para reparar o estrago.

Luiz Carlos Azedo - Bolsonaro no vermelho

- Correio Braziliense

Pandemia e cenário econômico puxam avaliação do governo para baixo e assustam estrategistas do Palácio do Planalto, que também perde apoio do mercado

O presidente Jair Bolsonaro tenta se reposicionar no mercado. Quer reverter o grande desgaste que vem sofrendo com o agravamento da pandemia da covid-19 e busca se reaproximar dos grandes empresários do país, dos quais se afastou em decorrência do seu negacionismo em relação à crise sanitária. A pedalada fiscal desenhada no novo Orçamento da União, fruto de uma negociação entre o Palácio do Planalto e o Centrão, que guindou à Secretaria do Governo a ex-presidente da Comissão Mista de Orçamento deputada Flávia Arruda (PL-DF), também assustou os investidores. Para o mercado, o governo está no vermelho.

Hoje à noite, Bolsonaro participará de um jantar organizada pelo ministro das Comunicações, Fábio Faria, com 20 grandes líderes empresariais, tendo por anfitrião o empresário Washington Cinel, dono da Lide Segurança e magnata da terceirização, na antiga mansão de José Ermírio de Moraes, em São Paulo, arrematada em leilão por quase R$ 40 milhões. Entre os participantes confirmados estão André Esteves (BTG), Alberto Leite (F5 Securities), Alberto Saraiva (Habib’s), Candido Pinheiro (Hapvida), Carlos Sanchez (EMS), Claudio Lottenberg (Hospital Albert Einstein), Flavio Rocha (Guararapes), Luiz Carlos Trabuco (Bradesco), João Camargo (grupo Alpha de comunicação), João Carlos Saad (Band), José Roberto Maciel (SBT), Ricardo Faria (Granja Faria) e Tutinha Carvalho (Jovem Pan). Não haverá gravações.

Cristiano Romero - Poderes eleitos têm pouco espaço no orçamento

- Valor Econômico

A rigidez atrofia a democracia e ocorre simultaneamente ao aumento de incentivos fiscais

No país a que chamamos de Brasil, muitas vezes a explicação de um conflito entre atores políticos não está no fato em si, mas, sim, nas estruturas que, ao longo do tempo, a sociedade cria para lidar com seus problemas. Em outras palavras, é possível afirmar que, nesta Ilha de Vera Cruz, a maioria dos problemas é enfrentada por meio de subterfúgios e soluções incompletas. Para não tratar da verdadeira causa de nossos desequilíbrios, forjamos acordos que, no fundo, apenas evitam o "confronto" imediato.

O futuro é sempre adiado porque vivemos numa sociedade que não pensa em seus descendentes. Prevalece, também, nas relações sociais, talvez justificável em alguns aspectos da vida nacional, um sentimento permanente de desconfiança em relação aos propósitos do vizinho, do colega de trabalho, do empresário que lhe dá emprego, do político eleito pela maioria de nós, do estrangeiro que se dispõe a vir aqui, entre outros lugares, para investir seu capital, no lucro de quem consegue lucrar, no sucesso de outrem, enfim, entre nós não há reconhecimento mútuo, mas, acima de tudo, suspeição.

Daniel Rittner - Dá para esperar algo do novo chanceler?

- Valor Econômico

França ensaia ‘revolução da normalidade’

Carlos França, o novo chanceler, deu sinais de ter entendido direitinho onde está e por que está. Tal como fora combinado por suas assessorias, a senadora Kátia Abreu (PP-TO) esperava uma reunião virtual com o ministro nos próximos dias. Presidente da Comissão de Relações Exteriores e protagonista do capítulo final da queda de Ernesto Araújo no Itamaraty, ela tem evitado sair de sua fazenda nos arredores de Palmas e prefere videoconferências desde que passou uma semana hospitalizada com covid, no fim do ano passado. Diz que ainda sente falta moderada de ar, às vezes fica sem olfato. Com tato, França se voluntariou: “A senhora não se incomodaria se eu pegar um voo e for ao Tocantins para conversarmos pessoalmente?”, questionou, prometendo seguir os cuidados sanitários. Política e diplomacia são feitas, também, de pequenos gestos. Kátia Abreu aprovou esse movimento. Sinal de alguém que se esforça para ouvir e dialogar, comentou a senadora.

Tiago Cavalcanti* - Racismo intrínseco

- Valor Econômico

Alegar que preconceito racial é menor hoje do que no passado não ajuda a enfrentar tão grave questão moral

O racismo nunca foi um tema central nas conversas de minha família em Olinda durante minha adolescência nos anos 80 e 90. Na verdade, lembro de pouquíssimas vezes ter discutido sobre preconceito racial com meus parentes. A leitura que faço é que muito provavelmente acreditávamos na democracia racial, na inexistência do preconceito racial no Brasil.

Talvez por ter aspecto físico de uma pessoa típica do nosso litoral nordestino, a minha aparência de cor parda nunca foi questão a ser discutida, não só entre familiares, mas também com amigos.

Na adolescência, recebi o apelido de “mago”, dado pelos colegas do futebol de salão, refletindo baixo índice de massa corporal, que agora luto para manter em nível razoável, mas nunca imaginei se poderia ser discriminado pela cor da pele. Fato que demonstra também certa indiferença que tinha em relação aos problemas que meus amigos negros enfrentavam na época.

Ricardo Noblat - Brasil pede socorro contra o vírus, a fome e Bolsonaro

- Blog do Noblat / Veja

Generosidade em fim de linha 

E aí? Engane-se quem acredita que o governo do presidente Jair Bolsonaro mudou de posição quanto ao enfrentamento da pandemia. Só por que Marcelo Queiroga, médico, sucedeu ao desastrado general Eduardo Pazuello no Ministério da Saúde e recomenda que as pessoas usem máscara, lavem as mãos com álcool gel e se mantenham distantes umas das outras?

É o mesmo Queiroga que se recusa a admitir o lockdown porque Bolsonaro é contra. É o mesmo que evita condenar o tratamento precoce que Bolsonaro continua recomendando, um logro que já custou muitas vidas. É o mesmo que prometeu em breve vacinar um milhão de brasileiros por dia, meta distante de ser alcançada porque a demanda é maior do que a oferta.

Mudança de posição só por que o embaixador que sucedeu o inepto Ernesto Araújo no Itamaraty revelou que seus compromissos são com a vacina, a economia e o meio ambiente? Moleza suceder Araújo e parecer sensato. É como substituir Felipão no comando da Seleção Brasileira depois dos 7 x 1. Se ganhar o jogo seguinte com gol de mão será exaltado como herói.

Rosângela Bittar - Passaram-se 27 meses

- O Estado de S. Paulo

Bolsonaro governará nos próximos 21 meses tal como o fez nos 27 passados

Centrão não é surpreendente, é implacável. Como demonstra o deputado Arthur Lira, comandante em chefe do grupo, não só por ser presidente da Câmara mas por representar um papel múltiplo e mutante. Ora é um diplomata negociador. De repente dá sinais do seu limite e pode tornar-se um cangaceiro.

Tanto que o presidente Jair Bolsonaro está ciente de que não deve fugir ao resgate negociado. O ignorou, por exemplo, na escolha do ministro da Saúde, desprezando a candidata indicada. E desde então não se esgotam as compensações que é obrigado a fazer. O presidente nunca esteve tão fraco politicamente como neste momento.

Nas cláusulas do contrato de adesão do Centrão ainda restam muitos espaços a serem ocupados. Entre eles, os ministérios da Educação e o do Meio Ambiente. Metas que, enquanto não se cumprirem, são compensadas por um adiantamento da lista de nomeações para cargos menores. Além de dinheiro na veia: as emendas parlamentares do orçamento, ainda não legalizado, mas certamente já distribuído. Parcelas do inesgotável ajuste de contas. 

Este é o panorama de hoje. Bolsonaro governará nos próximos 21 meses tal como o fez nos 27 passados. Em conflito com cada um e o universo.

Almir Pazzianotto Pinto* - Obsessão por poder

- O Estado de S. Paulo

O próximo governo deverá ser austero. A economia e o povo não suportam mais impostos

O poder é inebriante, envolvente, afrodisíaco. O imperador dom Pedro I revelou desapego ao poder. Preferiu abdicar e entregar o trono ao filho com 5 anos de idade. Voltou a Portugal, para não enfrentar manifestações de rebeldia. Dom Pedro II adotou atitude semelhante. Diante da quartelada comandada pelo marechal Deodoro da Fonseca, embarcou com a família e alguns amigos para a França, onde faleceu, pobre, em 5 de dezembro de 1891, cercado de admiração, carinho e respeito.

Na Primeira República, exemplo clássico de apego ao poder foi deixado por Getúlio Vargas. Investido na chefia do governo provisório pela Revolução de 1930, de imediato deixou claro que pretendia ficar. No Diário iniciado em 3 de outubro de 1930, data da deflagração do movimento armado, escreveu ao anoitecer do dia 25: “Osvaldo (Aranha) telegrafa-me, propondo assumir o governo para entregar-me constitucionalmente a 15 de novembro (data do encerramento do mandato do presidente Washington Luís). Respondo-lhe que as medidas excepcionais que precisam ser tomadas não comportam um governo constitucional, devendo essas medidas estender-se além de 15 de novembro” (vol. 1, Ed. Siciliano-FGV, RJ, 1995, pág. 17).

Roberto DaMatta - Quando seguir à risca é um dilema

- O Estado de S. Paulo

Como seguir à risca leis impessoais sem olhar rostos, mestiçagens e laços de família, se as relações são fundamentais?

Quem, no Brasil, segue tudo à risca? 

Quem tem certeza de cumprir com todo o oceano de leis, portarias, decretos, normas e regimentos (uma pesquisa do ministro Ives Gandra revela que são 34 mil regras, mas é preciso admitir que esse número aumentou) que compõem a escrita legal no Brasil? 

Vale notar que cinco séculos de escravidão negra formam a nossa base sociocultural e a nossa índole coletiva. Nos Estados Unidos, a escravidão foi regional. Sua abolição causou uma guerra civil e o regime mistificador do “iguais, mas separados” segregava. Aqui, depois da abolição, mas mesmo antes dela, tivemos um racismo contextual e negacionista; lá, há racismo manifesto e sociedades como a KKK. No Rio, a princesa Isabel acolhia escravos fugidos no seu palácio e uma flor (a camélia) era o símbolo discreto e aristocrático dos antiescravistas. 

Quem seguia alguma coisa à risca? 

Hélio Schwartsman - Boas e más notícias da vacina

- Folha de S. Paulo

Esse vírus não cessa de nos surpreender

É com a vacina que controlaremos a pandemia de Covid-19, mas vai dar trabalho.

A boa notícia vem de Israel e do Reino Unido. Com respectivamente 116 e 87 doses aplicadas para cada 100 habitantes, os dois países viram suas curvas de mortes, hospitalizações e infecções baixarem significativamente e parecem estar retomando algum tipo de normalidade. Em Israel, houve celebrações presenciais de Páscoa —e não porque um magistrado assim o quis, mas porque os dados epidemiológicos sugeriam que era seguro fazê-las.

A má nova vem do Chile e dos EUA. Com respectivamente 56 e 49 doses por 100 habitantes, as duas nações vinham conseguindo baixar as transmissões, mas, nas últimas semanas, viram os números voltar a subir. O principal suspeito é a disseminação de variantes virais mais infecciosas. O cúmplice é o relaxamento dos cuidados não farmacológicos, mais ou menos inevitável quando as pessoas se sentem mais seguras.

Bruno Boghassian - De papel passado

- Folha de S. Paulo

Com chegada de Valdemar, partidos fecham olhos para ação delinquente do presidente

Valdemar Costa Neto visitou Jair Bolsonaro pela segunda vez em sete dias. Depois de um encontro reservado na semana passada, o chefe do PL foi um dos convidados de honra na posse de Flávia Arruda como ministra da Secretaria de Governo. O ex-deputado ajudou a inaugurar a placa oficial do centrão no Planalto e reforçou a aliança política para proteger o presidente.

O PL já tinha cargos no segundo escalão, por indicação do próprio Valdemar. Mas a chegada ao quarto andar do palácio, com o presidente do partido na foto, mostra que esse é um acerto de longo prazo, custo elevado e alto potencial de retorno.

Bolsonaro abriu um gabinete para o centrão no momento em que o grupo farejava a fragilidade do governo. A pandemia galopante, a popularidade decadente e o buraco da economia fizeram disparar a cotação dos partidos de sua coalizão. Agora dentro do Planalto, eles devem fechar de vez os olhos para a ação delinquente do presidente na crise.

Ruy Castro - Matem-se por mim, diz Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

Um dia ele terá de responder por tentar induzir o povo brasileiro ao suicídio em massa

Numa coluna há meses ("Saída para Trump: matar-se", 10/1), sugeri a Donald Trump, ainda presidente dos EUA, que, diante de sua derrota para Joe Biden e pelo fracasso em tornar-se o novo Hitler, desse um tiro no peito e se convertesse em mártir. E a Jair Bolsonaro, seu obsceno papagaio, que o imitasse no tresloucado gesto. Bastou para que um advogado particular de Bolsonaro, então dando expediente como ministro da Justiça, anunciasse a abertura de inquérito pela PF para apurar por que eu escrevera aquilo.

Há uma lei, com que concordo, segundo a qual induzir alguém ao suicídio é crime. Mas duvido que se aplique a um colunista de província que recomenda isso ao homem mais poderoso do mundo e a um sujeito eleito com 57 milhões de votos. Imagine Trump e Bolsonaro, mesmo por um segundo, avaliando minha sugestão! A ideia era deliciosa, mas nunca esperei que a seguissem. A Casa Branca, claro, me ignorou, mas o dito ministro, atracado aos baixos meridianos do chefe, ameaçou uma investigação. Os anais da lei ainda tentam descobrir como se investiga uma opinião.