Quando
se olha a participação no Legislativo federal, o país está na rabeira da
América Latina
Autora
de um precioso artigo sobre a trajetória política da médica Carlota Pereira de
Queiroz (1892-1982), a socióloga Albertina Oliveira Costa gosta de contar que a
primeira parlamentar brasileira comparecia às sessões da Constituinte de 1934
com uma dama de companhia para não ficar sozinha no meio de seus 253 colegas
homens.
Nenhuma
mulher participou da elaboração da Carta de 1946, que legou ao país uma
democracia restrita aos alfabetizados. Em 1988, 26 deputadas —5% do total—
ajudaram a fazer a Constituição Cidadã. Hoje, as mulheres ocupam 15% dos
assentos na Câmara e 13% no Senado.
Progresso
houve, mas muito pouco e muito lento. Por isso, entre 2006 e agora, o Brasil
perdeu 26 posições no ranking global de igualdade de gênero do Forum Econômico
Mundial, ficando na modestíssima 93ª posição entre 156 nações.
Quando se olha apenas o Legislativo federal, o país está hoje na rabeira da América Latina. Nas três décadas em que a democracia se instalou para valer na área, políticas de ação afirmativa —com frequência por meio de cotas fixadas em lei— apoiadas em mobilização política, ativismo social e atuação do Judiciário aumentaram consideravelmente a participação feminina nas instituições políticas. Hoje, quase a metade das cadeiras na Câmara de Deputados e no Senado do México e cerca de 42% na Argentina é ocupada por mulheres.
No
Brasil, a primeira lei de cotas para candidatas ao Legislativo data de 1997. A
ela se seguiram outras normas fixadas pelo Tribunal Superior Eleitoral que
trataram de calafetar brechas. Apesar disso, progrediu-se pouco. As causas de
tão pequena mudança rumo a um equilíbrio maior de gênero na representação
política foram discutidas em debates recentes promovidos pela ONU Mulheres e
pelo Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília, acessíveis no
Youtube.
Não
há como discordar da professora Flavia Biroli, da UnB, quando afirma que os
maiores obstáculos estão nas regras eleitorais e nas estratégias dos líderes
partidários.
De
um lado, o sistema de lista aberta de candidatos dificulta a vida das mulheres,
especialmente daquelas que dispõem de poucos recursos e carecem de redes
familiares ou sociais poderosas. A experiência internacional mostra que listas
eleitorais fechadas e preordenadas favorecem a representação de mulheres e
minorias.
Foi
esse o sistema que, em 1933, permitiu a eleição da doutora Carlota. Mais
importantes, de todo modo, parecem ser as decisões dos que controlam os
partidos e que funcionam como sentinelas que, salvo exceções, os mantêm como
fortalezas masculinas.
*Professora
titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap
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