O caminho para esta jornada é o da política que na aparência se mostra fértil para as incursões redentoras, mas basta que elas se iniciem para que se encontrem com os muros das nossas taras congênitas como as do patrimonialismo e do patriarcalismo que sempre o acompanha, engrenagens poderosas treinadas em barrar os processos de mudança, presentes em número expressivo na nossa representação parlamentar. Pois é preciso que se atente para o fato de que o atual governo não deve sua existência apenas à desastrada ação na política dos partidos democráticos, mas a uma concertação – elaborada sem dúvida açodadamente – de setores das elites cujas raízes se vinculam à formula reacionária com que o país veio ao mundo, tal como no caso exemplar das relações entre o secular latifúndio e o moderno agronegócio, uma das peças de sustentação do estado de coisas reinantes.
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
terça-feira, 11 de maio de 2021
Luiz Werneck Vianna* - Uma rota de saída do inferno
Merval Pereira - Já foi visto
Carlos Andreazza - Presidente-caô
E
o tal decreto libertador do autocrata Jair Bolsonaro? Onde está? Aquele que já
estaria pronto, mas que o presidente — numa ameaça cansada, covarde até para os
padrões retóricos bolsonaristas — não sabe se usará. Cadê? (Talvez esteja
guardado no mesmo cofre fantástico em que vão depositadas as provas de fraude
contra a eleição de 2018.) Cadê? Aquele decreto por meio do qual o populista
sustaria — sem contestação, como se imperador na República — decretos dos
tiranos governadores-prefeitos, os cerceadores do trabalho, usurpadores do
sagrado direito de ir e vir. Onde?
Quem
sabe esteja na mesma gaveta imaginária em que avança o lockdown no Brasil? O
decreto do amanhã: obra — bravata — de um governante fraco, isolado e acuado,
cujo futuro, no mundo real, depende de Arthur Lira e Valdemar da Costa Neto;
sem os quais não haveria “meu Exército” que acudisse. (O Exército do presidente
forma com Pazuello, Ramos, Braga Netto e Heleno; tudo cobra fumante dentro das
quatro linhas da Constituição.)
No mundo real: enquanto brinca de rolezinho de moto (e promete vídeo com ministros confessando o uso de cloroquina; cadê?), Bolsonaro expande a Codevasf — chegou mesmo ao Amapá — para abrigar toda a mamata que tinha acabado. (Quem dera se ele transpusesse águas assim.)
Míriam Leitão - As boas notícias e o estraga cenário
Há
notícias boas na economia, mas a incerteza permanece. O real zerou as perdas do
ano em relação ao dólar, em parte isso é resultado do forte saldo comercial
derivado da alta de produtos exportados pelo Brasil. O mais espantoso aumento é
o do minério de ferro, que é de 47% este ano no mercado chinês e só ontem teve
alta de 10%. O saldo da balança é de US$ 20 bilhões até a primeira semana de
maio, 50% a mais do que no mesmo período do ano passado. Ouvi economistas e uma
cientista política sobre esses dados e seus efeitos na economia e na política.
A conclusão é que apesar do vento a favor, o ambiente de crise permanece.
Quando há alta de commodities, as moedas dos países fornecedores, como o Brasil, se valorizam. Mas no ano passado aconteceu o oposto. O real despencou. Isso se deve à incerteza. Vacinação atrasada, os conflitos criados pelo presidente e seus ataques às medidas de proteção fortaleceram o descontrole da pandemia. A economista Silvia Matos, do Ibre/FGV, explica o que mais está alterando o fenômeno.
Hélio Schwartsman - Chocante até para os padrões do Rio
Ímpeto
assassino da polícia fluminense é inútil em relação à segurança pública
Como
já escrevi aqui, polícia é civilização. O surgimento de Estados fortes com suas
milícias e o monopólio do uso da violência, no século 16, fez, nas contas de
Steven Pinker, as taxas de homicídio despencarem para algo entre um décimo e um
quinquagésimo dos valores anteriores. Considerada isoladamente, foi a medida
que mais fez reduzir a violência inter-humana.
Mas, se a criação da polícia foi o grande passo, o controle do aparato policial para que ele não ocupe o lugar do assassino de plantão é o segundo grande passo. Este o Brasil ainda não deu.
Cristina Serra - Bolsonaro e o trator da corrupção
Brasil
de Bolsonaro é metáfora de casa abandonada onde ratos disputam os despojos
Não
é de hoje que as emendas parlamentares se prestam ao toma lá, dá cá. Mas a
coisa ganha outra dimensão quando se sabe quem pediu o quê, para quem e quanto,
como mostrou o repórter Breno Pires, de O Estado de S. Paulo. A reportagem
revela a existência de um orçamento secreto e o intrigante pendor dos
congressistas por máquinas agrícolas, especialmente tratores. A malandragem já
vem batizada: é o tratoraço de Bolsonaro.
A reportagem é o roteiro de uma investigação. Nomes, valores e destinação das máquinas estão ali. Tudo cheira mal na rapinagem de R$ 3.000.000.000,00 do orçamento público. Teoricamente, as máquinas vão ser usadas em obras de prefeituras. Algumas estão localizadas a milhares de quilômetros da base eleitoral dos parlamentares, e foi detectado superfaturamento de até 259% nas compras. Ora, mas Bolsonaro não havia acabado com a corrupção?
Ricardo Noblat - CPI da Covid vai desgastar o governo, mas não irá muito além
Relatório
final será arquivado pelo Procurador-Geral da República e não servirá para a
abertura de processo de impeachment contra Bolsonaro
O
presidente Jair Bolsonaro e seus asseclas acertam ao dizer que a CPI da
Covid-19 no Senado não os derrubará de onde estão antes da eleição do ano que
vem. Mas erram quando dizem que ela simplesmente “vai dar em nada”.
Se
não vai dar em nada, por que tudo fizeram, embora mal feito, para impedir sua
criação, depois sua instalação e tentaram indicar uma maioria de senadores que
lhes fosse favorável? Conversa para boi dormir, ou para enganar os
bolsonaristas de raiz.
O
relatório final da CPI vai apontar todos os pecados mortais e veniais cometidos
por Bolsonaro na luta que ele não lutou contra a pandemia. Deliberadamente,
deixou-a correr solta e concedeu passe livre para que o vírus matasse.
A
construção da narrativa para sustentar a acusação de que houve um genocídio
será uma poderosa arma de campanha para dificultar a reeleição de Bolsonaro. Só
isso bastaria para justificar a existência da CPI – e o presidente está cansado
de saber.
Mas para além disso, o relatório não servirá. Manda a lei que ele seja enviado à Procuradoria-Geral da República que o arquivará ou oferecerá denúncia contra os acusados. Será arquivado porque Augusto Aras, o procurador, é amigão de Bolsonaro.
Eliane Cantanhêde - Ódio, trevas e grana
Além
dos gabinetes do ódio e das trevas, o ‘Estadão’ revela mais um: o do orçamento
secreto
Sem
rumo e comando racional, o governo pode até ter ilhas de normalidade, mas, no
geral, é dividido entre ministérios onde “um manda e outro obedece” e três
“gabinetes” cercados de mistério: o do ódio, o das sombras (ou trevas) e
o gabinete secreto, revelado pelo Estadão, para jorrar dinheiro
público escondido para parlamentares aliados, sem informar o básico ao distinto
público que paga impostos: quem, como, onde e por quê.
O do “ódio” alimenta a turba bolsonarista com fake news a favor do governo e contra adversários, convocando atos golpistas contra o Supremo e seus ministros. Quando esses ministros puseram a cúpula do PT na cadeia pelo mensalão e confirmaram a prisão do ex-presidente Lula pelo petrolão, tudo ótimo. Mas, quando dão um basta no golpismo do presidente Jair Bolsonaro e seus seguidores, perderam a graça.
Rubens Barbosa* - China e Brasil
Não
temos plano claro de saída da crise nem de avanços econômicos, sociais e
tecnológicos
A
quinta sessão plenária do 19.º Comitê Central do Partido Comunista da China
(PCCh), concluída em 29 de outubro, apresentou as linhas gerais do 14.º Plano
Quinquenal econômico e social do país (2021-25), com os objetivos gerais para
os próximos cinco anos e o planejamento de médio prazo, até 2035. Mantendo a
retórica de “paz e desenvolvimento”, o PCCh traçou as principais linhas
estratégicas levando em conta, sobretudo, a crescente competição global.
Os documentos divulgados pelo PCCh, indicam que as lideranças do partido, refletindo as incertezas no cenário global, buscaram mudanças em três áreas: fortalecimento da economia, autossuficiência (mercado interno e indústria) e novas políticas sobre mudança de clima.
Felipe Salto* - Um Brasil lascado
É
difícil ter esperança em meio a tanta tristeza. Mas é preciso ter otimismo na
ação
O
bordão do economista Gilberto Nogueira, do BBB21,
caiu na boca do povo: “O Brasil tá lascado”. É a síntese deste tempo. Como ter
esperança diante do caos econômico e social? O Orçamento de 2021 não reflete a
dura realidade da crise e a necessidade de forjar a reconstrução da economia.
Pior, um novo mecanismo parece ter tornado viável espécie de barganha
assimétrica entre Executivo e Legislativo. Tudo passando ao largo do
fundamental: preservar vidas e desenhar um novo futuro.
A
gestão mal-ajambrada da crise da covid-19, a demora em tomar decisões
essenciais e a ausência de planejamento ajudam a explicar esse quadro. O
governo não está conseguindo vacinar a população no ritmo necessário e
guarnecer as famílias mais pobres. Falta tudo.
Os
que podem trabalhar de casa estão em situação melhor. Mas os mais pobres seguem
desempregados ou na luta diária arriscando-se no transporte público. Dados do
Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostram que a morte
atingiu em cheio os trabalhadores diretamente expostos ao vírus. No topo dessa
lista macabra (de abril de 2020 a março de 2021), motoristas de ônibus,
cobradores, vigias, porteiros e zeladores. É cruel.
Vai ser difícil reconstruir o País depois do desmonte. O capítulo mais recente foi revelado pelo repórter do Estado Breno Pires (9 de maio): R$ 3 bilhões do Orçamento da União de 2021 teriam sido utilizados pelo governo como moeda de barganha junto ao Congresso. O processo orçamentário já estava maculado pelo risco de paralisação da máquina pública. Agora, desvendam-se novos contornos.
Andrea Jubé - Mandetta quer ser o “radical de centro”
Mara
Gabrilli seria uma “boa vice”, diz Mandetta a tucano
Um
político experiente que opera no circuito Brasília-São Paulo vê a corrida
presidencial de 2022 como uma prova de resistência, e não de velocidade. Nesse
quesito, o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, presidenciável do DEM,
estaria com fôlego de atleta.
Depois
de suportar as nove horas de depoimento aos senadores da CPI da Pandemia na
semana passada, Mandetta submeteu-se ontem ao escrutínio de um público
igualmente severo e influente nas eleições. O ex-ministro foi ouvido durante
quase três horas pelos membros da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), que
reúne parte importante do empresariado paulista.
A
coluna procurou representantes da entidade que assistiram à conferência do
pré-candidato, que não foi aberta à imprensa ou ao público em geral. Ouviu que
Mandetta surpreendeu positivamente ao não restringir sua fala ao cenário
pessimista sobre a pandemia, e revelar-se apto ao debate de outros temas
candentes, como a defesa da democracia, reforma tributária, educação, segurança
pública e combate à desigualdade.
Segundo relatos, Mandetta colocou-se como pré-candidato, mas, também, como cabo eleitoral influente. Pesquisa divulgada ontem pelo Instituto Atlas mostrou Mandetta empatado com o presidente Jair Bolsonaro no segundo turno, e numericamente à frente de Ciro Gomes (PDT).
Maria Clara R. M. do Prado - A pobreza escancarada
Com
o auxílio aprovado, a pobreza atingirá este ano 61,1 milhões de brasileiros,
seis vezes a população de Portugal
Todos
conhecem a predominância da renda mal distribuída na economia brasileira. É,
talvez, a sua característica mais marcante e duradoura. Ganhou impulso a partir
do final da década de 60 com a política de “fazer crescer o bolo (da renda)”
para reparti-lo depois e acentuou-se com o aumento vertiginoso da inflação na
década de 80 até meados de 1994, quando o Plano Real conseguiu finalmente
estabilizar os índices de preços sem que fosse, porém, viabilizada a
redistribuição.
A
pandemia da covid-19, que colocou o mundo de cabeça para baixo, afetou a renda
de todos os países, com sérias implicações distributivas, impacto negativo na
educação e aumento generalizado de pobres. O Banco Mundial estima que o mundo
seja vítima do aumento dos níveis de extrema pobreza pela primeira vez depois
da continuada queda verificada ao longo de 25 anos, até o ano passado.
No entanto, a fatalidade do vírus afetou os países de forma diferente, do ponto de vista econômico e social. Não fosse o auxílio distribuído no ano passado a famílias de baixa renda, no total de quase R$ 300 bilhões, os números da pobreza no Brasil teriam cravado o status de calamidade. O nível de pessoas pobres, considerando a renda per capita por domicílio de R$ 469 por mês (valor de hoje) segundo critério do Banco Mundial, caiu em meados de 2020 quando comparado ao ano anterior. Isso ajudou a sobrevivência das famílias de renda mais baixa que perderam empregos e ocupações e impulsionou a economia, que se retraiu à metade daquilo que era previsto no início da pandemia.
Pedro Cafardo - Trabalhadores “invisíveis” são aqueles mais “visíveis”
Biden
se preocupa em fortalecer a representação sindical e o trabalhador, enquanto
Bolsonaro ignora a lei contra o trabalho escravo
O
ministro da Economia, Paulo Guedes, usa o termo “invisíveis” para identificar
um enorme batalhão de trabalhadores informais brasileiros, que não têm carteira
assinada nem trabalho fixo. São pessoas que diariamente saem de casa para fazer
algum “biscate”, vender água, paçoca e outras guloseimas nas ruas. São os
cidadãos mais prejudicados pela pandemia, porque se obrigam a arriscar a vida
para ganhar algum dinheiro que lhes permita viver.
Entende-se
a boa intenção do ministro, que parece gostar do termo que adotou, pensando em
pessoas desamparadas, mas a palavra é inadequada. Esses homens e mulheres,
muitos menores de idade, são na verdade os trabalhadores mais “visíveis” do
país. Não estão dentro de escritórios com ar condicionado, nem nas fábricas,
nem escondidos do vírus da covid-19 em seus “home offices”. Estão nas ruas, nas
praias, em toda parte.
Talvez o ministro, ao usar o termo, tenha se inspirado nos “intocáveis” da Índia, ou “dálits”, grupo formado por trabalhadores braçais, o mais baixo degrau do sistema de castas do país. Por influência religiosa, são considerados impuros, vivem nas ruas fazendo pequenos trabalhos avulsos e praticamente ninguém repara neles. Por isso, são tidos como invisíveis.
O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais
Regime
de liberdade
O
Estado de S. Paulo
Decisão
do TSE lembra que a necessária e constitucional liberdade de expressão não
significa autorização para cometer crimes
Por um placar de 4 a 3, o plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) condenou recentemente um contador do Maranhão por propaganda eleitoral antecipada de cunho negativo contra o governador Flávio Dino (PCdoB). Em 2018, o sr. Everildo Bastos Gomes publicou, em sua conta no Instagram, um vídeo no qual Flávio Dino era chamado de ladrão e caracterizado como nazista.
A decisão do TSE é controvertida, especialmente pelo enquadramento jurídico dado ao caso. Como advertiu o presidente da Corte eleitoral, ministro Luís Roberto Barroso, em seu voto vencido, tratar como propaganda antecipada negativa “qualquer manifestação prejudicial a possível pré-candidato por cidadãos comuns transformaria a Justiça Eleitoral na moderadora permanente das críticas políticas na internet”.
Poesia | Ferreira Gullar - A alegria
O sofrimento não tem
nenhum valor
Não acende um halo
em volta de tua cabeça, não
ilumina trecho algum
de tua carne escura
(nem mesmo o que iluminaria
a lembrança ou a ilusão
de uma alegria).
Sofres
tu, sofre
um cachorro ferido, um inseto
que o inseticida envenena.
Será maior a tua dor
que a daquele gato que viste
a espinha quebrada a pau
arrastando-se a berrar pela sarjeta
sem ao menos poder morrer?
A justiça é moral, a injustiça
não. A dor
te iguala a ratos e baratas
que também de dentro dos esgotos
espiam o sol
e no seu corpo nojento
de entre fezes
querem estar contentes.
- Ferreira Gullar, em "Na vertigem do dia", 1980
segunda-feira, 10 de maio de 2021
Paulo Fábio Dantas Neto* - A política entre universos paralelos
Esta
coluna é dedicada aos brasileiros assassinados na favela do Jacarezinho, Rio de
Janeiro, na última quinta-feira, dia 6. Seus CPFs, ou suas “folhas corridas”,
não são condições prévias para que se defenda seu direito à vida. No Brasil,
nem a Justiça pode decretar pena de morte. Menos ainda uma operação policial,
embora essa prática nefasta seja banal no mundo que existe fora da lei. Mundos
paralelos, os dos justiceiros e o da lei, não se pode ignorar nem um nem outro,
o primeiro, porque precisa ser identificado, para que possa virar passado, o
segundo, porque precisa ser valorizado, como a única possibilidade de um futuro
mais civilizado para o nosso país.
Voltando
a Jacarezinho, se parte, ou mesmo a maioria das vítimas, cometera algum crime
antes, essa mesma palavra é que exprime o que a polícia civil do Rio cometeu.
Execução e massacre são crimes, em qualquer hipótese. E o são mais ainda no
contexto de uma operação subversiva, como foi aquela, feita em flagrante
desobediência a uma proibição do STF. O tom desafiador da operação, salientado
por uma entrevista coletiva insolente de um delegado, é fato singular. Como tal
precisa ser encarado, não como se fosse apenas “mais do mesmo”, parte da violência
corriqueira de prepostos do Estado que, em nome do combate a criminosos, promovem
terror contra cidadãos indefesos. Não é corriqueiro um funcionário público
policial usar posição de comando numa operação letal para desafiar dessa forma
um poder da República. Muito grave, tanto o que ele disse, como a situação que
permitiu que dissesse.
É
inaceitável, do ponto de vista social, que quem, diariamente, em ônibus ou em
trens de metrôs, se expõe à pandemia para ganhar a vida corra o risco de perdê-la
por comportamento miliciano de uma corporação de Estado que tem como missão garantir
o oposto. E inaceitável, também, do ponto de vista institucional, que o desafio
verbalizado por esse delegado passe batido. Se instâncias administrativas da
cúpula da segurança o acobertam, cabe ao ministério público e à sociedade civil
provocar instâncias judiciárias e, a essas, agir com presteza, de modo especial
o STF que, a rigor, tendo sido flagrantemente desafiado, nem precisa ser mais
provocado. Precisa ser apoiado, sem
ressalvas, no seu esperado agir.
Inaceitável, por fim, do ponto de vista político, que autoridades eleitas não tomem providências que enquadrem as cúpulas policiais na linha da segurança pública, para que a população não se veja abandonada. E que, ao contrário, o governador do estado onde ocorreu o massacre adote, como adotou, o discurso policial, sendo nisso abertamente avalizado pelo vice-presidente da República. Aliás, o abandono, pelo General Mourão, ao falar dessa ação policial, da pele de cordeiro e das meias palavras que costuma usar sobre todos os demais assuntos, é politicamente pedagógico. Mostra o quão ilusório é o impeachment como solução estabilizadora, nas circunstâncias dramáticas do Brasil atual.
Fernando Gabeira - Morrendo pela boca
Pode
ser que eu esteja maluco. Morreu há muitos anos o amigo Chico Nélson, que me
socorria nesses momentos de dúvida e dizia: “Tranquilo, você está lúcido”.
Nada
me impressiona mais na sequência de bobagens diárias de Bolsonaro do que esta
pergunta: “Será que não estamos enfrentando uma nova guerra?”.
O
presidente da República é, pela Constituição, o comandante das Forças Armadas.
Se ele se volta para nós e pergunta se estamos enfrentando uma guerra,
deixa-nos tão inseguros quanto os passageiros de um avião questionados por um
piloto ao aterrissar: “Será que estamos com o trem de pouso acionado?”.
O
contexto da pergunta é claro: o presidente duvida da origem do coronavírus.
Essa é uma dúvida que circulou no ano passado, com inúmeras reportagens
investigativas sobre o laboratório de Wuhan de onde o vírus poderia ter
escapado.
Nenhuma delas foi convincente. A Austrália duvidou do papel da China e pediu oficialmente uma investigação. Você pode ou não concordar com a medida, mas é muito mais sério do que ficar reclamando pelos cantos, como faz a família Bolsonaro.
Irapuã Santana - Abolicionismo popular
- O Globo
No
13 de maio, muita reflexão é feita sobre o que representa essa data para a
sociedade brasileira: afinal, deve ser um dia de festa ou de protestos?
O
livro “Flores, votos e balas”, de Angela Alonso, pode nos ajudar nessa questão,
tendo em vista que conta a trajetória dos movimentos sociais na conquista da
Abolição.
Primeiramente,
era preciso difundir o discurso pró-liberdade dos escravizados, a fim de que
houvesse pressão popular sobre as autoridades. Para tanto, o movimento valeu-se
de três pilares de argumentação: compaixão, direito e progresso.
Assim,
segundo David Brion Davis, o antiescravismo bebeu de quatro fontes. A primeira
era a tese de Montesquieu afirmando que a escravidão impede a felicidade
humana. Logo após, vinha a oposição entre escravidão e progresso humano, de
Adam Smith, acompanhado do romantismo e do protestantismo, que associou
escravidão ao pecado.
Vale
também mencionar que a obra traz luz a grandes figuras brasileiras, como Luiz
Gama, José do Patrocínio, André Rebouças, Rui Barbosa e Joaquim Nabuco, todos
integrantes do Partido Liberal à época, que se destacaram por atuar nas áreas
jurídica, política, diplomática e social, levando a todo o Brasil a luta pela
liberdade.
Ricardo Noblat - Escândalo do orçamento secreto atinge em cheio governo Bolsonaro
O
presidente da República manda as leis às favas e usa parte do dinheiro
destinado a pagar emendas parlamentares à compra de apoio político
Uma
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) é pouca coisa para investigar o governo
do presidente Jair Bolsonaro, que se apresenta como inatacável e sujeito
apenas a erros comuns.
Outra
CPI, em breve, será proposta para investigar um orçamento secreto de R$ 3 bilhões, boa parte dele destinado
à compra de tratores e equipamentos agrícolas a preços superfaturados.
É
nitroglicerina pura o que descobriu o jornal O Estado de S. Paulo. A origem do
orçamento secreto está no discurso de Bolsonaro de não lotear cargos no primeiro escalão
do governo.
De
um jeito ou de outro, a moeda de troca se deu por meio da transferência do
controle de bilhões de reais do orçamento ao Congresso, tudo longe do olhar dos
eleitores, segundo o jornal.
O
Estadão teve acesso a 101 ofícios enviados por deputados federais e senadores
ao Ministério do Desenvolvimento Regional para indicar como eles preferiam usar
esses recursos.
Por “contrariar o interesse público”, Bolsonaro havia vetado a tentativa do Congresso de impor o destino de um novo tipo de emenda ao orçamento chamada RP9.
Segurança Pública vira principal consenso para a oposição no Rio
Após operação no Jacarezinho, forças políticas anti-Bolsonaro miram convergências em conversas que buscam criar aliança ampla no Estado
RIO
- O tema da Segurança Pública deve ser o principal ponto de
convergência das forças de oposição em 2022 no Rio de Janeiro, berço do
bolsonarismo e comandado hoje pelo governador Cláudio
Castro (PSC), aliado do presidente Jair
Bolsonaro. A operação policial que resultou na morte de 28 pessoas na favela do
Jacarezinho, zona norte da capital fluminense, na quinta-feira
passada, reforçou a ideia entre participantes desses grupos.
Líderes
partidários de diferentes campos ideológicos vão tentar se contrapor à tese de
que “bandido bom é bandido morto”, discurso presente na eleição de 2018 do
então governador Wilson Witzel e
que tem força dentro do bolsonarismo. Acusado de corrupção na Saúde durante
a pandemia, Witzel, que foi cassado, tinha como foco de seu discurso uma
política de segurança calcada em duras operações policiais.
Dos nomes que fazem oposição ao bolsonarismo, participam das conversas quadros importantes da política fluminense, como os deputados federais Marcelo Freixo (PSOL), Alessandro Molon (PSB) e Rodrigo Maia (DEM), além do prefeito do Rio, Eduardo Paes (DEM, mas de saída para o PSD), do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, nomes do PT e outros partidos de esquerda.
Eles têm tem destacado a necessidade de construir uma política de Segurança que vá além das operações policiais – uma bandeira histórica de Freixo, que hoje é o principal nome colocado para o pleito.
Rosângela Bittar - ‘Tratoraço’ é um clássico da corrupção com recursos do Orçamento
Reportagem
do ‘Estadão’ desfaz um sofisma insistentemente repetido pelos apoiadores de
Bolsonaro, o de não haver denúncias ou escândalos de corrupção no governo
Verbas
secretas, superfaturamento, direcionamento de valores acima da referência para
aquisição de determinados itens do cancioneiro parlamentar, como tratores e
retroescavadeiras. Esta equação, apontada em ampla e minuciosa reportagem de Breno Pires, do Estadão,
na edição deste domingo, é um clássico da corrupção com recursos do Orçamento
Federal. Detalhada em valores, responsáveis e beneficiários, a matéria desfaz
um sofisma insistentemente repetido pelos apoiadores do presidente Jair
Bolsonaro.
Impressiona a forma veemente como os fanáticos do presidente enfatizam, ao aceitar piedosamente críticas aos erros e omissões da sua administração, o fato de não haver, no governo Bolsonaro, denúncias ou escândalos de corrupção. Para muitos indícios puderam fechar os olhos, não para este.
Denis Lerrer Rosenfield* - A política do ódio
O
que Bolsonaro quer? Alastrar ainda mais a morte, num contexto de fome e
desemprego?
Apostar
na moderação do presidente Bolsonaro e sua equipe é mais arriscado que apostar
na loteria. As chances de sucesso são muito menores. Há uma questão estrutural
em jogo, a saber: a política tal como o bolsonarismo a compreende está baseada
na oposição amigo/inimigo, perpetuamente repetida. A sua ação se volta para a
eliminação do outro, qualquer que seja, basta que seja definido como inimigo.
Se é imaginário ou real, é algo secundário, contanto que a movimentação
política se paute por esse parâmetro da ação.
Quem é amigo ou inimigo, isso é igualmente objeto de definições flutuantes, tudo depende das circunstâncias, dos humores presidenciais e da instabilidade emocional de sua equipe mais direta de assessores. Não sem razão, foi ela intitulada de “gabinete do ódio”, tendo em vista que a destruição a orienta, num tipo de pulsão de morte que por tudo se propaga. Para que opere, o inimigo deve sempre estar lá, independentemente de quem ele o seja em determinado momento. Os ex-ministros Gustavo Bebianno e Santos Cruz, entre outros, mostram a volatilidade daqueles que passam a ser considerados alguém a ser eliminado, e isso sem nenhuma consideração por amizades e afinidades passadas.
Marcus André Melo* - Trump, Bolsonaro e a pandemia
O
protagonismo indesejado e suas consequências não intencionais
O
jogo da responsabilização política na pandemia foi marcado pela recusa
deliberada de protagonismo presidencial: ela foi encarada como questão
"radioativa". Bolsonaro ativamente perseguiu uma estratégia de não
envolvimento direto com a crise sanitária, buscando transferir a governadores e
prefeitos a culpa pelo colapso das unidades de saúde, a escalada de óbitos e os
lockdowns.
Buscava-se
protagonismo apenas nas ações positivas que poderiam trazer dividendos
políticos, como o auxílio emergencial e linhas de crédito.
Esse padrão caracterizou a ação do governo em relação a questões tóxicas, como a reforma da Previdência. Aqui havia um modelo a ser emulado no conteúdo e na forma: o governo Trump, que fez pouco caso da Covid após ser informado da tragédia em curso, ao tempo em que implementava um pacote de US$ 2,8 trilhões. "Quero minimizar a pandemia porque não quero criar pânico", confessou a Bob Woodward.
Celso Rocha de Barros - 'Consultório do Crime' tenta salvar Bolsonaro na CPI da Covid
Grupo
de senadores busca tumultuar investigação mentindo sobre medicina
O
Brasil deve atingir meio milhão de mortos
por Covid-19 em junho. Supondo que nenhuma grande medida de isolamento
social seja adotada de agora em diante, e mantendo-se o ritmo lento da
vacinação, é praticamente certo que ultrapassaremos 600 mil mortos nos próximos
meses.
Se
os casos subnotificados forem 30% dos notificados, como
estimou a organização Vital Strategies, é razoavelmente provável que
terminemos o ano com um milhão de mortos (entre notificados e subnotificados),
sem contar as pessoas que morreram de outras doenças, por falta de hospital
etc.
Na estimativa do Institute for Health Metrics and Evaluation,
da Universidade de Washington, se contarmos tudo isso já estamos com quase 600
mil mortos agora.
Se houver uma terceira onda de inverno agora que tudo reabriu, é perfeitamente possível que cheguemos ao milhão de mortos notificados antes do fim da pandemia.
Catarina Rochamonte - A Cloroquina de Bolsonaro e o Emplasto de Brás Cubas
Obsessões
de baixa intensidade são rotineiras; algumas, porém, agravam de modo patológico
A CPI da Covid vem
comprovando o que já se sabia: os crimes de responsabilidade do presidente
Bolsonaro no trato da crise sanitária foram muitos e graves; alguns decorrentes
de suas obsessões. Uma delas, a cloroquina, conhecida até pelas emas do Palácio
da Alvorada, está no centro das investigações.
Os depoimentos dos ex-ministros da Saúde, os médicos Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, deixaram claro que a resistência quanto à prescrição dessa droga concorreu para a demissão de ambos. Por sua vez, o depoimento do atual ministro, o médico Marcelo Queiroga, constrangeu pelo esforço em não corroborar o seu uso nem melindrar o cloroquinismo presidencial. Já o ex-ministro general Pazzuelo, que se submeteu sem restrições a todos os caprichos do presidente, esquivou-se de depor com desculpa pouco convincente.
Ana Cristina Rosa - ‘Escravidão fantasiada de liberdade'
Falta
de remuneração, estudo e dignidade levou negros à condição de inferioridade
pós-Abolição
Certas
obras de ficção são capazes de auxiliar na compreensão da realidade. O premiado
romance "Torto
Arado", de Itamar Vieira Junior, é assim. Ajuda a entender nosso país,
as bases em que foi fundado e como chegamos ao atual nível de injustiça social.
A narrativa ambientada no passado, no sertão baiano, traz à tona algumas das
causas que resultaram nas absurdas disparidades que marcam o presente da nação,
133 anos após a abolição formal da escravatura.
O cenário de preconceito e discriminação com negros e indígenas; a precariedade das moradias; o trabalho análogo à escravidão; a comida minguada; o analfabetismo; o difícil acesso dos pobres à saúde; a ausência de saneamento básico; o alto índice de mortalidade de crianças pretas. Tudo é de uma atualidade desconcertante.
Bruno Carazza* - A escuridão no fim do túnel
Reforma
Política na Câmara é tocada discretamente
Na
noite do dia 28 de novembro de 2016, às 21h58 (horário de Brasília), a aeronave
LMI2933, da companhia boliviana LaMia, caiu nos arredores do Cerro El Gordo
enquanto se preparava para aterrissar no Aeroporto Internacional José Maria
Córdova, localizado na cidade de Rionegro, região metropolitana de Medellín, na
Colômbia.
A
bordo estavam 77 pessoas, entre tripulantes, jornalistas, convidados, comissão
técnica e atletas da Associação Chapecoense de Futebol, que disputaria no dia
seguinte a primeira partida da final da Copa Sul-Americana contra o Atlético
Nacional. Apenas seis passageiros sobreviveram.
A
notícia foi divulgada na madrugada seguinte. A partir daí o país, atônito,
acompanhava as buscas e tentava, em vão, encontrar alguma explicação para a
tragédia. Um imenso luto coletivo tomou conta de todo o Brasil.
Às
13:55h daquele dia o plenário da Câmara dos Deputados iniciou seus trabalhos
respeitando um minuto de silêncio pelas vítimas do acidente aéreo. Na sequência
o presidente da sessão, deputado Carlos Manato (à época do Solidariedade,
atualmente PSL-ES), declarou que as atividades legislativas não seriam
suspensas. “Nós vamos continuar o trabalho normalmente”, anunciou.
Depois de dezenas de discursos feitos na tribuna, lamentando o ocorrido e prestando homenagens, às 18:55h iniciou-se uma Sessão Deliberativa Extraordinária, que tinha como pauta os projetos: PL nº 4.238/2012, que definia o piso salarial para a profissão de vigilante, e PL nº 4.850/2016, que tratava das famosas “Dez Medidas contra a Corrupção”.
Luiz Carlos Mendonça de Barros* - Muito barulho por nada
Abordagem
realista sobre teto de gastos, alta de juros e superávit comercial de US$ 70 bi
invertem rota do dólar
No
Brasil, acompanhar as cotações do real em relação ao dólar é um instrumento
muito eficiente para medir as pulsações do ambiente político e dos mercados
financeiros. Há mais de um ano, quando uma segunda onda da pandemia nos
atingiu, os operadores financeiros avaliaram que estávamos despreparados para
enfrentar as turbulências que viriam à frente.
A
razão principal desta leitura é que o governo Bolsonaro não teria as condições
necessárias para enfrentar os desafios econômicos e sociais que se seguiriam.
Acertaram e realmente entramos em um longo período de instabilidade política.
A
partir deste cenário quase unânime, o real brasileiro virou a Geni das moedas
emergentes, chamando especuladores do mundo todo para participar de uma festa
na B3. Muito contribuiu para esta situação um erro na gestão da política de
juros por parte do BC, como descrevi em coluna recente para o Valor. Juros
muito baixos, para um mercado habituado a taxas reais elevadas como um freio
financeiro à ação do especulador, criaram uma tempestade perfeita para nossa
moeda.
Depois de um período de calma no início de 2021, a insegurança em relação ao chamado “Teto dos Gastos Primários” em 2021 trouxe um novo fôlego aos especuladores. Entre os dias 26 de fevereiro e 14 de março o real perdeu mais de 8% de seu valor em relação ao dólar, com o mercado especulando com um dólar valendo mais de R$ 6 em futuro muito próximo.
Alex Ribeiro - BC amplia liberdade para reação nos juros
Único
compromisso da entidade monetária será cumprir as metas de inflação
Parte dos analistas econômicos acredita que o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central telegrafou que caminha para o ajuste total dos juros, o que significa retirar todos os estímulos na economia ainda neste ano. Outros acham que o BC segue agarrado com a estratégia de ajuste parcial dos juros, ou seja, de manter pelo menos um pouco do combustível monetário para evitar uma inflação muito baixa no ano que vem.
Aparentemente, porém, o Banco Central não tem nenhum plano de voo tão fechado. Talvez o que define melhor o espírito do comitê atualmente é a preocupação em assegurar flexibilidade suficiente para reagir conforme a evolução das circunstâncias, reservando-se a liberdade para cumprir as metas de inflação.
Em março, o Copom começou com força um ciclo de alta de juros, anunciando duas altas de 0,75 ponto percentual na taxa básica, que terão seguimento com uma terceira alta da mesma intensidade em junho. Mas a comunicação de política monetária tinha algumas amarras que, embora não representassem nenhum constrangimento efetivo para uma eventual ação mais incisiva se a coisa caminhasse para o lado mais negativo, foram entendidas por participantes do mercado como um certo apego a cenários mais positivos.
Fernando Henrique Cardoso* - Homenagem a um amigo
[RESUMO] Fernando
Henrique Cardoso relembra a trajetória do cientista político Leôncio Martins
Rodrigues, que morreu na
segunda (3) aos 87, de quem foi amigo por mais de meio século.
Professor exemplar, realista e lúcido, um dos principais estudiosos dos
sindicatos e dos trabalhadores industriais no Brasil, deixou ainda um exemplo
de coragem e lealdade na defesa de amigos perseguidos durante a ditadura, diz
ex-presidente.
Conheci Leôncio
Martins Rodrigues há muito tempo. Há mais de 50 anos, quase
70... Digo de que maneira: Ruth Villaça
Corrêa Leite e eu, ainda alunos da FFCL (Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da USP), começamos a nos treinar
como professores na Escola Fernão Dias Paes, em Pinheiros, um bairro de São
Paulo.
Um
senhor, Fued Boueri, casara-se com uma tia de Ruth e fora nomeado secretário de
Educação: ofereceu-nos a oportunidade de ensinar no curso colegial, no turno da
noite, quando ainda éramos alunos, em 1952, no final de nosso terceiro ano da
faculdade. Um dava história do Brasil; o outro, história geral (não me lembro
mais qual de nós dois dava cada curso).
Pois
bem, Leôncio, que fizera um curso chamado de madureza (similar ao que hoje
chamamos de supletivo), foi aluno da Ruth no secundário, no Fernão Dias. Nós
éramos mais velhos, mas não tanto assim.
Na ocasião eu pertencia ao conselho editorial da Revista Brasiliense, de Caio Prado Júnior. A revista não pertencia ao Partido Comunista, mas era-lhe próxima. Logo depois nela se concentrariam os que nos opúnhamos à linha partidária.