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O Globo
O
esquema de desviar verbas através de emendas do Congresso, já usado em governos
anteriores, como no escândalo dos “anões do Orçamento”, se repete agora de
outra maneira, demonstrando como a criatividade dos corruptos é infindável.
Fica claro que precisamos inventar um outro tipo de relacionamento do Congresso
com o governo central, porque nosso sistema de presidencialismo de coalizão
virou um instrumento de distribuir dinheiro para políticos e corromper o
Estado.
Os “anões do Orçamento” eram deputados, de baixa estatura física e moral, que
manipulavam a Comissão do Orçamento no Congresso com manobras para inclusão de
obras regionais mediante propina recebida de empreiteiras e governantes
estaduais e municipais. Agora, ao que tudo indica, o esquema, denunciado pelo
jornal “O Estado de S. Paulo”, é centralizado no próprio Palácio do Planalto,
que indica verbas de um “orçamento paralelo” a seus correligionários e até a
oposicionistas que se disponham a votar com o governo em ocasiões especiais,
como a eleição dos presidentes da Câmara e do Senado.
A esse “orçamento”, só têm acesso os parlamentares indicados pelo Centrão, e as
ordens de pagamento saem do Ministério do Desenvolvimento Regional e de outros
órgãos, sem que se saiba o que será feito do dinheiro, que não tem controle,
pois não consta do Orçamento oficial.
Centenas de requisições informais de deputados indicando para que obras deveria
ser encaminhado o dinheiro, num caso até compra de tratores, foram revelados
pelo jornal. Bastava que o parlamentar dissesse que fora “contemplado” com tal
verba ou que tinha direito a ela, para que o dinheiro fosse liberado, após
evidentemente ser checada a planilha do chefe da Secretaria de Governo da
Presidência, anteriormente o ministro Luiz Eduardo Ramos, hoje a deputada
Flávia Arruda, colocada estrategicamente na pasta para facilitar o trânsito dos
acordos feitos pelo Centrão que ela representa.
O superfaturamento de obras continua sendo a raiz desses esquemas fraudulentos.
Os tratores financiados pelo orçamento paralelo, segundo especialistas, estão
mais de 200% acima do preço de mercado. A maior parte dessas verba vai para a
Codevasf, Companhia do Desenvolvimento do Vale do São Francisco, que hoje
abrange também o Vale do Parnaíba. Criada para atender cerca de 500 municípios,
hoje abrange quase três mil em 15 Estados e o Distrito Federal, ou 37% do
território nacional.
É uma das estatais mais cobiçadas pelo políticos, tradicionalmente dominada
pelo Centrão. O esquema do “orçamento paralelo” é mais um para limpar dinheiro
desviado do Orçamento público. No mensalão, parte do Congresso foi comprado com
dinheiro público; no petrolão, o esquema montou-se especialmente em torno da
Petrobras e de suas subsidiárias, com outras estatais envolvidas.
Entre as novidades descobertas pela Operação Lava-Jato, o dinheiro de corrupção
não raro vinha de “doações” oficiais aos partidos políticos, que assim lavavam
o dinheiro recebido. Agora, a lavagem de dinheiro é feita por meio do próprio
Orçamento. As emendas parlamentares são impositivas, e todos têm direito a elas
na elaboração do Orçamento. No primeiro ano do governo Bolsonaro, porém, foi
criada a figura da “emenda do relator”, que ganhou o poder adicional de
distribuir verbas.
Além disso, há uma disputa entre o ministro Paulo Guedes, da Economia, e seu
mais direto adversário dentro do governo, o ministro do Desenvolvimento
Regional, Rogério Marinho. Guedes sugeriu a Bolsonaro que vetasse essa emendas
no ano passado, e os parlamentares derrubaram o veto, mantendo a distribuição
de emendas sem identificação pelo relator.
Não pode ser essa a base da nossa política partidária. Nenhum país aguenta um
sistema político que tenha de ser regado a dinheiro e verbas desviadas para
funcionar. Não há país sério que se baseie numa relação corrupta entre o
governo central e os parlamentares. Quem controla esses esquemas todos é o
Centrão, criado na Constituinte de 1988, formalizando a união de partidos como
PMDB, PP, PFL, PTB, o mesmo grupo que sempre esteve no poder, e que hoje domina
o Congresso.
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