CartaCapital
O genocídio perpetrado por Israel jamais
poderá ser esquecido, como não se olvidará o Holocausto praticado pelos
nazistas contra os judeus no século XX
Ninguém sabe ainda se o cessar-fogo em Gaza
se transformará num tratado de
paz ou não. Existem muitos imponderáveis em jogo. Os principais
são: o Hamas aceitará se desarmar? Israel deixará de usar qualquer pretexto
para reiniciar os bombardeios? Quem governará Gaza? E o Estado palestino?
“Finalmente, teremos a paz no Oriente Médio. Demorou 3 mil anos para se chegar a este ponto, dá para acreditar?”, celebrou Donald Trump, durante a Cúpula do Egito. De fato, é difícil acreditar em uma paz duradoura sem a resolução desses pontos cruciais mencionados anteriormente.
Trump mente sobre muitas coisas, mas, no caso
do Oriente Médio, parece realmente empenhado na paz. Faz isso porque a prometeu
e para não se desmoralizar dentro e fora dos EUA, pois nenhuma guerra pode ser
escondida. Para alcançar o cessar-fogo, Trump agiu de forma bonapartista ou
imperial: impôs essa condição tanto ao governo israelense quanto ao Hamas.
Em Israel, a condição de sobrevivência
interna do governo Netanyahu é a guerra. Por isso, o premier queria prosseguir
com o genocídio e a destruição de Gaza. Já o Hamas foi significativamente
destroçado. Os seus 30 mil combatentes foram reduzidos a cerca de 5 mil. A
ofensiva contra a cidade de Gaza, seu último reduto, poderia derrotar o grupo
definitivamente.
Trump anunciou também um “novo Oriente
Médio” de prosperidade e fartura. É certo que muitos países árabes
imaginam isso se a região tiver uma paz estabilizadora. Mas nem o presidente
dos EUA, nem as nações árabes, nem o restante do mundo podem esquecer que, se
esse “novo Oriente Médio” for construído, será não só sobre as ruínas de Gaza,
mas também sobre os corpos de ao menos 70 mil palestinos, podendo chegar a mais
de 100 mil, em sua maioria mulheres e crianças inocentes. Da mesma forma, não
se pode esquecer os milhares de mutilados de todas as idades. A dor das perdas
humanas e materiais e os horrores vividos pelos sobreviventes é algo que os
acompanhará pelo resto de suas vidas.
O genocídio perpetrado por Israel jamais
poderá ser esquecido, como não se olvidará o Holocausto praticado pelos
nazistas contra os judeus. A guerra de Gaza é a mais brutal do nosso século,
pois foi contra uma população indefesa. Foi uma guerra de limpeza étnica, de
extermínio.
Se o Estado de Israel é claramente terrorista
e genocida, a sociedade israelense também tem sua parcela de responsabilidade.
Os palestinos vêm sendo desumanizados há décadas pelos israelenses. Antes da
guerra, palestinos de Gaza viviam numa espécie de campo de concentração. Muitos
que trabalhavam em Israel eram tratados como cães de rua, com xingamentos,
cusparadas e outras ofensas.
Os israelitas têm uma história magnífica de
resiliência e abnegação em face das diásporas, dos sofrimentos e perseguições
que sofreram na história. O antissemitismo é uma ideologia racista que precisa
ser repudiada e interditada. Em 1948, receberam do mundo o direito de formar um
Estado. Um direito negado aos palestinos, que passaram a ser dispersados,
perseguidos e mortos pelo Estado judeu, por religiosos e por colonos judaicos.
O que eles reivindicaram para si negam aos palestinos com tiros, bombas, fome e
morte. A catástrofe (nakba) é a diáspora dos palestinos.
Não só o governo, não só os militares, mas
muitos civis, associações religiosas e civis usam o antissemitismo como escudo
para proteger o sionismo e a fascistização de indivíduos e grupos judeus. Usam
o antissemitismo para refutar qualquer crítica aos crimes cometidos pelo
governo e pelo Estado de Israel. É preciso denunciar e desmascarar essa
estratégia manipuladora, pois ela é protetora dos crimes de guerra, do
colonialismo, da usurpação de terras na Cisjordânia, da negação do direito de
cidadania e dignidade dos palestinos.
Os sofrimentos históricos dos israelitas e o
Holocausto não autorizam as atrocidades cometidas em Gaza e as perseguições que
o Estado de Israel vem perpetrando contra os palestinos. Os israelitas precisam
reconhecer, ao povo palestino, direitos iguais aos que o mundo lhes garantiu.
Em termos porcentuais, a Faixa de Gaza sofreu
uma devastação maior que a Rússia, país mais destruído na Segunda Guerra
Mundial. Israel deve ser responsabilizado e reparar essa destruição. A
liderança civil e militar de Israel precisa ser julgada pelos tribunais
internacionais pelos seus crimes, assim como líderes nazistas foram julgados e
condenados. •
Publicado na edição n° 1384 de CartaCapital,
em 22 de outubro de 2025.
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