sábado, 18 de outubro de 2025

A complexidade da tarifa zero no transporte público, por Marcus Pestana

O presidente Lula solicitou à sua equipe um estudo sobre a possibilidade de implantação da tarifa zero no transporte público. No arranjo federativo brasileiro, a gestão e regulação da logística urbana cabe às prefeituras.

A mobilidade urbana e o transporte coletivo são aspectos centrais na vida cotidiana da população, sobretudo dos trabalhadores e cidadãos de mais baixa a renda. O deslocamento para o trabalho, as escolas, as unidades de saúde, o comércio, afeta visceralmente a qualidade de vida da população, que depende da eficiência e do custo do transporte. Boa parte do crescimento desordenado das cidades e da expansão das favelas se deveu ao custo elevado e às ineficiências da rede de ônibus, trens urbanos e metrôs. 

Os mais ricos e a classe média brasileira utilizam intensivamente o transporte individual seja em carros próprios, taxis e aplicativos tipo UBER e 99. Isto não é um fenômeno global. E só ver o perfil da demanda do metrô em cidades como Paris, Madrid, Nova York.

Já os mais pobres, no Brasil, dependem exclusivamente de um sistema de transporte coletivo inteligente, eficiente, rápido e barato. Há trabalhadores brasileiros que consomem quatro horas diárias se deslocando de casa para o trabalho.

É evidente que o bom mesmo é gastar. De preferência, gastar bem. Nós, os economistas, é que sempre estragamos a festa, ao espalhar a notícia que há um pequeno probleminha chamado “restrição orçamentária”. Não custa lembrar a famosa frase do economista liberal americano: “Não existe almoço grátis”.

Lula não revelou sua intenção de implantar uma política nacional nesta direção a partir do nada. Dados da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) revelam que cerca de 127 cidades brasileiras já introduziram a tarifa zero universal e outros 27 municípios adotaram tarifa zero parcial. Cento e vinte uma dessas cidades têm menos de 100 mil habitantes. A adoção da tarifa zero torna-se cada vez mais complexa nas metrópoles, grandes e médias cidades onde o transporte coletivo se apresenta como grande desafiador para a população e para a administração pública.

O sistema tem seus custos (salários dos motoristas e cobradores, encargos sociais, combustível, compra de veículos e sua manutenção, impostos, despesas administrativas etc.). Quando não há subsídio, é só dividir pelo número de usuários e se encontra o preço da passagem. Subsídio não é crime, mas precisa ser criterioso. É dinheiro que saí de outras aplicações como saúde, educação, saneamento, moradia. O único critério justo é renda, privilegiar os mais pobres.

Quando era vereador em Juiz de Fora, jovem, mais radical à esquerda, mas com formação em economia, surpreendia a muitos ao me colocar contra o passe livre para todos os estudantes, os expedicionários da FEB, pessoas com deficiência etc. Sempre falava que o critério para subsídio não deve ser renda. O trabalhador pobre não pode bancar o estudante rico. A generalização da gratuidade retira o foco social da política tarifária e joga fora o fator moderador do uso na dinâmica de mercado.

O assunto é polêmico e invoca a discussão sobre priorização nos gastos públicos de recursos, em geral, escassos. Não é o caso de Maricá e seu royalties de petróleo. Esse tema ainda vai dar pano para manga.   

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