sexta-feira, 17 de outubro de 2025

Lula ganha tempo para Trump e IR, por Vera Magalhães

O Globo

Alcolumbre ajuda presidente a não acumular nova derrota, de olho em indicação de aliado ao Senado

Não foi pequeno o refresco que o governo obteve graças à ação do presidente do Senado, Davi Alcolumbre. Aos poucos, ele vai somando créditos importantes junto a Lula e se credenciando como o principal avalista do Executivo no Congresso. O adiamento da votação dos vetos presidenciais, que evitou a esperada derrota do governo na queda de braço em torno da questão do licenciamento ambiental, foi providencial.

Não que alguém no Planalto acredite que seja possível, no prazo que for, mudar o ânimo da maioria do Parlamento em relação a esse tema. Ele conta com amplo apoio nas duas Casas para uma flexibilização geral dos critérios. Mas uma nova derrota agora, uma semana depois de a Medida Provisória destinada a tapar o buraco do IOF caducar, seria uma reversão muito grande da maré positiva que o governo vem tentando aproveitar para melhorar sua avaliação e as chances de reeleição de Lula.

O roteiro dos sonhos dele é deixar essa questão indigesta para depois do até aqui não confirmado encontro com Donald Trump e da aprovação, pelo próprio Senado de Alcolumbre, da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil.

Com essas duas vitórias no portfólio, a comunicação de Sidônio Palmeira alardeará um presidente que enfrentou o boicote internacional da família Bolsonaro ao Brasil com altivez, defendendo os interesses do país, e que assegurou, com o Congresso, a correção de uma distorção histórica em que aqueles de menor renda eram excessivamente tributados.

Se conseguir armazenar essas cartas na manga, arriscam aliados de Lula, até o mau humor persistente do mercado, do agronegócio, dos evangélicos e do Centrão tende a arrefecer. Caso esse cálculo se confirme ou se aproxime da realidade, há quem, no entorno presidencial, diga que até a derrubada geral de vetos poderia ser evitada. Parece torcida exagerada, com os dados da realidade atual. Mas, com tudo o que está no tabuleiro e a quantidade de acontecimentos potencialmente positivos, ganhar tempo equivale a obter uma vitória.

Não se sabe de que maneira a dobradinha com Alcolumbre terá força para movimentar peças em outras frentes em curso. Ou para influenciar na relação do governo com a Câmara. Num primeiro momento, Hugo Motta não gostou nada de o Senado ter bancado o bonzinho e derrubado a PEC da Blindagem depois de, nos bastidores, trabalhar por ela. P

assado o mal-estar inicial, no entanto, o próprio Motta parece se mover para uma posição de maior proximidade com Lula, provavelmente percebendo a desarrumação no campo da direita e intuindo a partir de sua base eleitoral, o Nordeste, que o poder de recuperação do petista é real. Tanto que até o “pito” deselegante que Lula passou no Congresso diante de Motta foi relevado por ele, e a relação com Fernando Haddad, que andou distante, tem melhorado nas últimas semanas.

O outro contencioso em que Alcolumbre pode ter influência é a indicação do sucessor de Luís Roberto Barroso ao STF. Ele não faz questão nenhuma de ser discreto no lobby pelo antecessor, Rodrigo Pacheco, também convencido a sair da postura de esfinge e ir à luta para mostrar que está no páreo pela cadeira.

No momento em que o favoritismo de Jorge Messias se evidencia, com direito a uma espécie de culto com a presença do advogado-geral da União, do próprio Lula e de representantes de igrejas evangélicas dentro do Planalto, só o cálculo de que o trânsito com o Congresso dependeria da escolha de Pacheco pode ser um argumento capaz de virar o jogo. É nesse convencimento que o prestativo Alcolumbre atua de maneira explícita neste momento.

Com tantos movimentos interligados em curso, não ter de se preocupar com a análise de vetos neste momento é um presente antecipado de aniversário para Lula. O tipo de presente em que a etiqueta vem com o preço.

 

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