sexta-feira, 17 de outubro de 2025

Luta e bravura de Moacyr Luz, por Ruy Castro

Folha de S. Paulo

Diagnosticado com Parkinson em 1988, o sambista foi em frente e enfrentou a doença no palco

Operado no Einstein, voltará a tocar como antes e roubar comida na geladeira sem derrubar tudo

Moacyr Luz não cabe num verbete de enciclopédia. Sambista, cantor, compositor, autor, com parceiros queridos, de "Vida da Minha Vida", "Pra Que Pedir Perdão", "Choro das Ondas", "Som de Prata", "Saudades da Guanabara" e muitas mais. Gourmet da baixa gastronomia carioca, expert em asas de galinha e bochecha de porco e padroeiro de botequins pelo país. Veio ao mundo para fazer amigos. Encontra-os onde quer que esteja. Mas só os 500 mais íntimos o chamam de Moa.

samba lhe deve uma multidão de convertidos. Desde 2005, eles cruzam a cidade ou as fronteiras dos estados para comparecer ao Samba do Trabalhador, sua roda de toda segunda-feira no Clube Renascença, no Andaraí. A roda extrapolou para São Paulo, aos sábados, no restaurante Pirajá, fora as frequentes incursões a Lisboa, Paris e, se duvidarem, Adis Abeba. Mas o que, no começo, era só o trabalho de um artista para ganhar a vida tornou-se, para Moacyr, sua maneira de salvar a vida.

Em 2008, aos 50 anos, ele foi diagnosticado com Parkinson. Desde então, a rigidez no corpo, as dores, o tremor, a dificuldade motora, começaram seu lento e cruel processo. Mas, em vez de entregar-se, Moacir resolveu lutar. Em todos esses anos, nunca faltou ao Samba do Trabalhador. Embora tudo tenha se tornado difícil, continuou a enfrentar a rotina de aeroporto, avião e hotel e o desafio de cantar e tocar violão com a voz e os dedos que às vezes fogem de seu controle. Nunca escondeu a doença ou se escondeu. Sua luta se passa no palco, para plateias que, quando percebem sua condição, torcem por ele.

Nesta terça-feira (14), a ciência juntou-se à sua bravura. Moacyr submeteu-se a uma cirurgia de estimulação cerebral profunda, no Einstein, em São Paulo. As chances de recuperação são enormes. Aos poucos, voltará aos estágios mais toleráveis da doença.

O suficiente, segundo ele, para voltar a tocar e cantar com desembaraço e, de madrugada, "roubar comida da geladeira sem derrubar tudo". Mas ele não vai esperar. Daqui a 15 dias, tem show de novo.

 

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