sábado, 1 de novembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

 

Denúncia comprova necessidade de ataque ao CV

Por O Globo

Operação deveria ser seguida de ocupação permanente, com policiamento e serviços públicos

São estarrecedores os métodos do Comando Vermelho (CV) para manter o controle do complexo de favelas do Alemão e da Penha. A denúncia do Ministério Público que serviu de base à megaoperação das polícias do Rio na última terça-feira é repleta de revelações sobre práticas repugnantes da facção. Mensagens interceptadas demonstram que o CV montou uma estrutura complexa de domínio, altamente hierarquizada e militarizada, levada a cabo por meio de tortura, execuções sumárias determinadas por um “tribunal” do tráfico e até um departamento para cuidar de propinas pagas a agentes da lei. Não há como nenhuma sociedade civilizada tolerar esse abominável estado de exceção.

Pejotização é inconstitucional, por Miguel Reale Junior

O Estado de S. Paulo

A fraude da pejotização não pode ser legitimada pelo Judiciário

O Supremo Tribunal Federal (STF) está julgando a licitude de contratos de prestação de serviços adotados em substituição ao contrato de trabalho para cumprimento de atividades-fim da empresa empregadora.

Diante do elevadíssimo número de processos sobre essa questão, objeto também do Recurso Extraordinário com Agravo n.º 1.532.603/PR, o ministro Gilmar Mendes, relator, determinou a suspensão de todos os feitos, atribuindo, assim, à matéria o caráter de repercussão geral. Logo, a decisão de mérito a ser proferida deverá ser observada por todos os tribunais.

Urgência Lewandowski; Xandão corregedor, por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

É instrutivo observar a forma modesta como reagem Lula e Tarcísio de Freitas aos eventos havidos no Rio de Janeiro. O protagonismo da questão “segurança pública” para 2026 parece incômodo a ambos. Já que não podem ter sido pegos de surpresa pela centralidade eleitoral do tema, a hipótese é de que esse incômodo derive da existência concreta do fato “maior operação policial da história contra uma facção criminosa”; como se esperassem que o assunto se derramasse etereamente ano que vem adentro.

Esse era o desejo. O mundo real se impôs. Aí está o episódio; enclave material – um marco – a pressioná-los. Estão cobrados. Instados a se posicionar; e tendo ambos pouco a oferecer em matéria de realizações para segurança pública. Lula, ademais, limitado sob a dificuldade histórica da esquerda em se apropriar da atividade policial como valor, ao mesmo tempo ciente de que a maioria da população aprova a operação. Daí que, não lhe faltando chances de falar a respeito, tenha privilegiado a prudência de comentar em rede social.

Falta nome para isso, por Flávia Oliveira

O Globo

Foi o episódio mais letal da História do país, num território tragicamente acostumado a contar óbitos às dezenas

Quem vive, circula pelos bairros, acompanha a (in)segurança pública no Rio de Janeiro já se acostumou a superlativos. No estado, faz tempo, perdeu-se a conta dos inimigos públicos número um; apreensões de fuzis batem recordes sucessivos; confrontos armados multiplicam cadáveres. O que aconteceu nesta semana nos complexos do Alemão e da Penha, contudo, foi além dos padrões do ambiente hiperviolento da metrópole. Uma única operação contra o Comando Vermelho, a facção majoritária no estado, deixou mortos quatro policiais e 117 suspeitos. Foi o episódio mais letal da História do país, num território tragicamente acostumado a contar óbitos às dezenas.

Das cinco ações policiais de maior letalidade já registradas no Rio, segundo o Grupo de Estudos de Novos Ilegalismos (Geni/UFF), quatro ocorreram sob a gestão de Cláudio Castro, governador reeleito em 2022. Até a última terça-feira, o número máximo de mortes fora na operação da Polícia Civil no Jacarezinho, em maio de 2021, quando morreram um policial e 27 civis. O Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) costumava classificar como chacina as ocorrências com três ou mais mortes. Nos últimos anos, a mudança de escala fez o Geni batizar de megachacinas os episódios com pelo menos oito óbitos. Não há nome para o que aconteceu no Alemão e na Penha nesta semana.

A leucena e o Alemão, por Eduardo Affonso

O Globo

A tal pacificação incluía implantar um policiamento mais presente e mais humano, permitir acesso aos serviços básicos

A leucena é uma planta exótica que prolifera de forma desenfreada. Sua estratégia é produzir muitas sementes, que germinam com facilidade, e liberar um composto que inibe o crescimento de outras espécies ao seu redor. Virou uma praga nas margens do Canal de Marapendi, sufocando a vegetação nativa e ameaçando a biodiversidade.

Volta e meia acontece uma “revitalização” do canal. As folhas são varridas (as amendoeiras que as produzem continuam lá, sem dar frutos comestíveis, sem atrair pássaros, sem permitir que a flora se desenvolva). Mesmo as árvores mortas permanecem. É trabalhoso remover o tronco e as raízes, plantar no lugar uma quaresmeira, um ipê, um jequitibá. As leucenas são cortadas — arrancá-las também dá trabalho — e rebrotam com ainda mais vigor. A erva-de-passarinho que estiver ao alcance da mão vai para a caçamba — o resto é deixado e se espalha para parasitar (até matar) o que tiver sobrevivido às espécies invasoras.

Dependente e ocupado ideologicamente, o Brasil resiste, por Roberto Amaral*

“Onde o poder público descuidou da integridade física dos mais pobres, o regime democrático não passa de uma fachada de papelão esburacada por tiros, chamuscada por pólvora queimada e borrifada de sangue.”
Eugênio Bucci, O Estado de SP, 30/10/2025
 
Nascemos como mera feitoria, ponto de apoio para naus sedentas de água, remanso de piratas e aventureiros. Na Colônia, sem povo, nosso destino foi traçado como economia primário-exportadora fundada na escravidão de negros e indígenas, a serviço das demandas do consumo europeu, via Lisboa — a metrópole decadente, salvando-se como entreposto de nosso comércio: pau-brasil, açúcar, minérios, algodão, carne, café... — que exportávamos, e de entrada do que necessitávamos, que era quase tudo.

Essa economia e esse comércio estabeleciam as bases da aliança do latifúndio e da incipiente burguesia comercial (que incluía os comerciantes, os traficantes de gente e os contrabandistas, de um modo geral) com a Coroa portuguesa e seus primeiros agentes — exatores do fisco, militares e o clero. Eram as raízes de uma estranha nação sem povo e, assim, sem projeto.

No Império, exportávamos mão de obra escrava (sob a forma de açúcar, minérios etc.) e tudo importávamos, como reclamava Joaquim Nabuco ainda no Segundo Reinado:

“[...] o Brasil é uma nação que importa tudo: a carne-seca e o milho do Rio da Prata, o arroz da Índia, o bacalhau da Noruega, o azeite de Portugal, o trigo de Baltimore, a manteiga da França, as velas da Alemanha, os tecidos de Manchester, e tudo o mais, exceto exclusivamente os gêneros de imediata deterioração. A importação representa assim as necessidades materiais da população toda, ao passo que a exportação representa, como já vimos, o trabalho apenas de uma classe.” (Discurso no Senado, 1884)
Esqueceu-se de dizer que importávamos também ideologia.

Sobre a mão de obra escrava se estabeleciam a economia e a política do Império, quando — é ainda a voz de Nabuco — “o espírito comercial e industrial do país parecia resumir-se na importação e na venda de africanos”, prenunciando o atraso relativo que se acentuaria nos dois séculos imediatos. 

A preeminência dos interesses agrários, conservadores do statu quo, sobre o desenvolvimento das demais forças produtivas — o comércio e a indústria — sobreviverá na Primeira República: um longo pacto que assegurará os interesses da lavoura.

No nascimento da República, o Brasil era ainda uma feitoria colonial. Rui Barbosa, seu primeiro ministro da Fazenda, atualizaria as palavras do grande tribuno do Segundo Império:

“Sem indústrias manufatureiras, [o Brasil] é exportador só de produtos da lavoura e matérias-primas, que recebe depois, em produtos fabricados, pelo duplo do seu valor. É exportador de moeda, não só porque tem de pagar juros da grande dívida externa e de capitais estrangeiros empregados aqui, como também porque supre as grandes despesas dos nossos compatriotas que vivem na Europa, ou por lá passeiam exibindo sua ociosidade, nenhuma compensação nos vindo desses fatos, porque os estrangeiros não procuram o Brasil para consumir suas rendas; ao contrário, por dolorosa experiência sabemos quanto nos custa o seu capital empregado aqui.” (Relatório de 1891)

No século XX, exportávamos mão de obra sobre explorada na forma de commodities. No século XXI, ainda economia periférica, prosseguimos no mesmo destino e na mesma dependência, cumprindo o papel de supridores do centro hegemônico com alimentos (que faltam à mesa de nosso povo), minérios in natura e commodities, e importadores de tecnologia, ciência e conhecimento — além de ideologia.

Nossa classe dominante, colonizada, reproduz os valores e os interesses do colonizador. Exportamos minério de ferro e importamos lingotes. Exportamos soja e proteína animal, enquanto importamos valores, hábitos e tecnologia.

A modernização se dá naqueles setores necessários à produção de matérias-primas de baixo custo para o consumo dos países desenvolvidos — o motor da expansão do agronegócio, que alimenta o PIB com divisas, ao preço da devastação ambiental e do despovoamento do campo.

A dependência ao capital estrangeiro não é, pois, um acaso. A crise, como lembrava Darcy Ribeiro, é um projeto.

Em que implica uma economia voltada para fora? O comerciante, o latifundiário, o senhor de engenho no Nordeste e os traficantes de escravos e mercadorias, os mineradores de Minas Gerais e do Centro-oeste e os grandes estancieiros do Sul não careciam de um país rico para desenvolver seus negócios; não careciam de mercado interno para o consumo de seus produtos. Essa elite — ou essa classe dominante — estava, nestes termos, desvinculada dos destinos do país e de seu povo, os pobres e os não brancos, com os quais jamais se identificou.

Qual seria a classe dominante produzida por essa economia? Meia dúzia de latifundiários, uns poucos comerciantes exportadores/importadores, uma sociedade sem povo e uma classe dominante dependente dos negociantes do mercado internacional, que ditavam o que comprar, como comprar e a que preço comprar.

Preocupava-a, então, a movimentação da bolsa de mercadorias de Londres — como hoje se volta para os indicadores de Wall Street, as políticas do FED e os humores da Faria Lima. Economia voltada para fora não precisa cuidar da formação de mercado interno; daí sempre desinteressar-se pelo desenvolvimento nacional, fazer vistas grossas para a miséria e as desigualdades sociais.

Esse é o caráter da casa-grande que chega aos nossos dias descomprometida com o destino do país — ou seja, sem identidade a perseguir. Não havia no passado, e não há no presente, por que pensar ou cuidar de um projeto nacional. E não há ainda a consciência de povo, uma comunidade imaginária unificada por um coletivo de valores comuns. Há, sim, população: um coletivo disperso pela desigualdade social.

Ainda hoje, o país se move não para prover às necessidades de seu povo, mas para manter o enriquecimento da minoria dominante — seja o senhor de engenho do século XVI, sejam os rentistas do sistema financeiro — ontem como hoje, de costas para as necessidades nacionais e a serviço de interesses que não são os nossos.

Na Colônia e no Império era o mercado externo quem decidia o que deveríamos importar e o que deveríamos ou poderíamos produzir. Na contemporaneidade, os países da periferia do capitalismo — nosso caso — estão submetidos à lógica da economia globalizada. O Estado dependente cede o poder de regular sua própria economia.

Refletindo sobre a sociedade capitalista de nossos dias, Celso Furtado observa:

“As decisões sobre o que importar e o que produzir localmente, onde completar o processo produtivo, a que mercados internos e externos se dirigir, são tomadas no âmbito da empresa [transnacional], que tem sua própria balança de pagamentos externos e se financia onde melhor lhe convém.”

Para o autor de Formação econômica do Brasil, a subordinação do crescimento econômico à iniciativa das grandes empresas multinacionais, em países ainda em formação, como o Brasil, é a boa receita para a inviabilização de um projeto de país — e a boa explicação para os bolsões de miséria em que tentam viver milhões de brasileiros, acossados pelo desarranjo social, o crime organizado e a violência do Estado.

Não há, portanto, qualquer surpresa em que o Brasil, sendo uma das dez maiores potências econômicas do mundo, seja também uma das campeãs em desigualdade social. Em 2024, o índice de Gini medido pelo IBGE ficou em 0,506 (a escala de Gini varia de 0 a 1; quanto mais perto de 0, menos desigual é o país). Há razões de surpresa para a tragédia social?

A dependência política e econômica, a renúncia a um projeto próprio de soberania e desenvolvimento, foi — e é, ainda — a opção da classe dominante brasileira, desde os primeiros momentos de construção do país, engenho político-administrativo que antecedeu a Nação.

Furtado apresenta a disjuntiva: a) saber se temos um futuro como nação que conta na construção do devir humano, ou b) se prevalecerão as forças que se empenham em interromper nosso processo histórico de formação de um Estado-nação.
Até aqui, as forças do atraso é que têm prevalecido — e nada está a indicar sua próxima derrogação.

Nossa classe dominante é herdeira legítima do país-colônia: supostamente branca, refratária à miscigenação, reacionária, beneficiária do statu quo, de que dependem seus privilégios e o mando, que se expressa sobre todas as formas possíveis — a miséria, a segregação, a violência estatal —, que se abate preferentemente nas periferias das grandes cidades, onde os pobres mais pobres tentam sobreviver.

Por isso, a classe dominante não se confunde nem com os interesses do povo nem com os do país, e reage negativamente a qualquer sinal de reforma — principalmente daquelas que possam alterar o estatuto da propriedade, base do mando que é o mesmo da Colônia à República dos nossos dias, de um país que, em pleno terceiro milênio, ainda trata a reforma agrária como tabu.
Produtor de devastação ambiental, concentração fundiária e expulsão do camponês de seu habitat, além de pressão inflacionária e commodities que não enchem barriga de gente, o agronegócio é a grande vedete dos nossos dias. Anúncios veiculados insistentemente na maior rede de televisão do país enaltecem o modelo predatório: “Agro é pop, agro é tech, agro é tudo”. Por volta dos anos 1950, cerca de 80% da nossa pauta de exportações e do ingresso de dólares derivavam das vendas de café para o exterior; hoje, quando o Brasil parecia haver alcançado o estágio da industrialização, cerca de 60% dependem do agronegócio.
Nos anos 1940/1950, nossa atrasada classe dominante ainda discutia a díade agricultura–industrialização. Eugênio Gudin, ícone do pensamento conservador, certamente o mais influente economista brasileiro do século XX, delegado brasileiro à Conferência Monetária Internacional de Bretton Woods (1944), ministro da Fazenda de Café Filho (1954–1955), criticava a industrialização e defendia o que denominava “vocação agrícola” do país.

Não é de estranhar a destruição da indústria manufatureira, levada a cabo pelo neoliberalismo. A participação da indústria no PIB nacional, que já foi de 35,8% em 1984, caiu para os atuais 13%, quando essa participação chega a 43,1% na China, 30,4% na Coreia do Sul e, para citar um país da Europa desenvolvida, chega a 20,8% na Alemanha (dados da ONU para 2021).

O passado não é só herança; ajuda a explicar o presente, mas não o determina, pois a história é um processo vivo — uma construção humana. Já sabemos o que devemos evitar e sabemos o que devemos fazer. 
E, nada obstante tantos fracassos, há registros de conquistas, como a resistência do processo democrático burguês, resistência tão mais significativa quanto mais ameaçador é o avanço, entre nós, do projeto da extrema-direita. O fato de havermos vencido a tentativa de golpe de Estado de janeiro de 2023 e sustentado até aqui um governo inspirado por princípios social-democratas, que serve de contenção ao avanço do fascismo, indica ganhos que devem ser festejados pelo povo brasileiro.
 
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Mais uma chacina — Comandado há muito pelo reacionarismo mais tosco, sem política de segurança pública digna de qualquer consideração, o Rio de Janeiro amanheceu de luto na última terça-feira (28/10), após catastrófica operação policial nos complexos proletários do Alemão e da Penha, na capital, deixar mais de 130 mortos — muitos deles com claros sinais de execução, alguns degolados. E o massacre ainda está por ser apurado. É a maior chacina de uma história de chacinas recorrentes. Um Carandiru a céu aberto.


Mais uma chacina II— Na velha imprensa, comentaristas aplaudem a operação como “bem-sucedida e necessária”, embora os mais empertigados disfarcem a euforia, ressalvando que a brutalidade policial (planejada, e sabidamente inútil como tática de repressão ao crime organizado) “talvez tenha sido excessiva”. Entre o desamparo e a atração pelo fascismo, parte da população — exatamente aquela mais exposta à violência — aplaude o morticínio e vê com bons olhos a conversão de policiais em bestas-feras, dispostos a agir com o máximo de letalidade e o mínimo de inteligência. E, dentre estes, boa parte não se percebe, ainda, como vítima potencial de uma política assassina.

Mais uma chacina III — O horror atiça o campo da direita, desorientado em face dos sinais — tímidos embora — de avanço social, e que, afora a violência, nada tem a oferecer ao país. Governadores esboçam uma frente neofascista, na esperança de levar uma população amedrontada às urnas em 2026. Há os que insuflam a retórica do “narcoterrorismo”, ansiosos por uma intervenção estrangeira no Brasil (o exemplo de Nayib Bukele, que transformou El Salvador num grande presídio privado internacional a céu aberto, os faz sonhar). É, sem dúvida, um momento desafiador para as forças progressistas, que precisam ofertar à sociedade uma política sensata de segurança pública — a PEC que tramita no Congresso pode ser um primeiro passo, bem como a ADPF das Favelas (mas, sempre, apenas um primeiro passo). Do luto e da indignação surge uma oportunidade para apresentarmos um outro projeto de país, um outro modelo civilizatório. Precisamos, antes de tudo, saber de que lado estamos — e repelir a barbárie.

O chefão ainda impune — O deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) foi preciso na denúncia: o bandido mais perigoso do estado do RJ está solto, dando entrevistas e despachando no Palácio Guanabara. Acumula uma extensa ficha corrida, repleta de crimes covardes e brutais, e com ela espera se cacifar para novos mandatos. A carnificina produzida nesta semana desperta na cidadania uma dúvida que reflete nossos tempos: a que facção criminosa o governador terá buscado beneficiar, ao atacar redutos do Comando Vermelho, impondo um revés pontual a essa organização? Dada a deletéria situação do comando político do estado, uma autópsia independente dos cadáveres recolhidos pelos moradores (abandonados pelo poder público) é uma exigência inegociável. 
 
*Com a colaboração de Pedro Amaral.
 

Crime organizado não será combatido pelos gigolôs da violência, por Oscar Vilhena Vieira

Folha de S. Paulo

A macabra operação no Rio evidencia o fracasso país em dar segurança aos cidadãos

Governantes tem baixíssimo interesse em realmente enfrentar o problema da criminalidade

O estado de exceção é a antítese do Estado de Direito. Enquanto no Estado de Direito estamos todos submetidos ao império do direito, no estado de exceção imperam a violência e o arbítrio. Nestas quatro décadas de democracia não fomos capazes de universalizar o respeito às leis, especialmente para as populações pretas e pobres.

É cada vez maior o número de brasileiros que estão cotidianamente submetidos ao domínio perverso do crime organizado, que ocupa o vácuo deixado pelo Estado. Estima-se que facções criminosas e milícias dominem hoje mais de 20% da região metropolitana do Rio de Janeiro, explorando não apenas o tráfico mas todos os tipos de atividade. O Rio, no entanto, é apenas a ponta do iceberg.

A guerra de Castro, por Demétrio Magnoli

Folha de S. Paulo

Terrorismo, em qualquer de suas definições, inscreve-se no campo da política

Face à mexicanização do Brasil, o governo ainda não criou um diretório unificado antifacção

"Narcoterrorismo" –a palavra saltou da boca de Trump para a de Cláudio Castro, governador do Rio, enquanto tramita a PEC patrocinada por Derrite, secretário de Segurança de SP, que reclassifica as facções do tráfico como "terroristas". Palavras, às vezes, geram atos. A transferência das facções do universo da segurança pública para o da guerra propicia execuções sumárias, extrajudiciais, de supostos "combatentes inimigos". É o que fazem as bombas dos EUA no Caribe e no Pacífico. É o que fez no Rio a megaoperação de Castro.

Crise no Rio é deixa para bolsonarismo priorizar segurança e largar Bolsonaro, por Igor Gielow

Folha de S. Paulo

Agenda da violência é tema espinhoso para Lula e a esquerda, que nunca soube lidar com o problema

Gradação de reação de governadores no apoio a Castro mostra que há temor de associação com barbárie

A crise decorrente da ação mais letal da história da polícia do Rio, que até aqui deixou 121 mortos, tornou-se uma tábua de salvação discursiva para a direita e encurralou o governo Lula (PT), que vinha surfando uma onda de boas notícias rumo a 2026.

O embrião da reação é a criação do Consórcio da Paz, mais um grupo de trabalho num país acostumado a anunciá-los quando não tem solução para um problema. Assim, a associação entre governadores do espectro anti-PT serve de palanque de uma disputa retórica num campo em que a direita costuma ter vantagem.

É evidente que matar gente, promover encarceramento em massa e outras medidas "simples" (aspas compulsórias) não resolvem fundamentos da segurança pública.

O presente de Lula para Trump, por Adriana Fernandes

Folha de S. Paulo

Há consenso no governo de que o Brasil terá de ceder e reduzir a tarifa do combustível

Impasse é político também porque o agro pressiona líderes do Congresso

Já há consenso no governo Lula para reduzir a taxa extra cobrada sobre o etanol norte-americano em troca de avanços nas negociações em relação ao tarifaço de 50% aplicado por Donald Trump a produtos brasileiros.

Integrantes do governo já comentam nos bastidores sobre a possibilidade de zerar a tarifa do etanol. Nos últimos dias, passou também a ser discutida a oportunidade de um anúncio da medida antes mesmo da primeira reunião de negociação do tarifaço, em Washington, com o vice Geraldo Alckmin e os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Mauro Vieira (Relações Exteriores).A reunião pode acontecer na semana que vem ou na próxima.

Todos que apoiam a chacina são fascistas? Por Mariliz Pereira Jorge

Folha de S. Paulo

Foi chacina sim, mas nem todo apoio à chacina é de extrema direita; parte é medo antigo, dor acumulada e certeza de abandono

Brasil é conservador e se agarra a respostas autoritárias quando o Estado some

A foto dos corpos alinhados no chão não pede legenda. Foi chacina. Chacina não é um desastre natural que mata por acaso, como um terremoto ou uma enchente. A operação comandada pelo governador do RioCláudio Castro, teve planejamento, fuzil, aval e coletiva de imprensa. É bom lembrar que no Brasil não existe pena de morte –oficialmente, não.

As reações, como sempre, vieram no automático da nossa rinha: um lado romantiza a violência estatal, o outro finge que segurança pública se resolve com discurso. Tratar morto como "dano colateral" é covardia travestida de coragem. E, ainda assim, há algo que precisa ser dito com a mesma franqueza: para parte de quem aplaude, não é ideologia — é desespero.

Uma pesquisa da AtlasIntel, divulgada nesta sexta (31), mostra que oito em cada 10 moradores de favelas do Rio de Janeiro apoiam a "ação" contra o Comando Vermelho nos Complexos da Penha e do Alemão. Sim, foi uma chacina. Portanto, é preciso olhar com mais atenção porque tanta gente aplaude o discurso criminoso de que a mortandade produzida pelo Estado foi um sucesso.

Inovação e desenvolvimento no Brasil, por Marcus Pestana

O incremento da produtividade no Brasil, nos últimos anos, tem sido muito baixo. Entre 2019 e 2024, o aumento médio da produtividade por hora trabalhada foi de apenas 0,28% ao ano. A produtividade do trabalhador brasileiro corresponde a ¼ do norte-americano.

A produtividade está essencialmente ligada a três fatores: qualidade do capital humano (educação de alto nível e qualificação profissional); poder de inovação científico-tecnológico; e, infraestrutura (economias externas com efeitos multiplicadores sobre a geração de renda e a competitividade da economia).

Teríamos algum traço genético que nos impede de alçar voos maiores na corrida pela inovação e ganhos relevantes de produtividade? Claro que não. Vejamos, através de 3 exemplos concretos, como o brasileiro sabe fazer.

A mina de futuro, por Cristovam Buarque

Veja 

A revolução é oferecer escola de qualidade independente da renda

O Brasil sempre transformou suas terras em riqueza, mas ainda se recusa a aproveitar a mina de conhecimento dos cérebros de seus habitantes. Preferimos gastar bilhões de reais para perfurar o solo no fundo do mar a investir em escolas com qualidade para todos. Da ideia de que o atraso dos países vinha da exploração de nossas minas, difundiu-se o conceito, criado pelo escritor uruguaio Eduardo Galeano, de “veias abertas” pelo colonialismo. A globalização acabou com a nitidez entre centro e periferia, mas ainda não percebemos os “neurônios ofuscados” pelas elites nacionais que impõem colonização interna ao manter o sistema educacional dividido entre escola-senzala e escola-casa-grande, que nega o aproveitamento de milhões de cérebros.

Massacre inútil, por André Barrocal

CartaCapital

As facções criminosas estão mais poderosas e não vão desaparecer com a execução de seus integrantes, como aposta o governador do Rio

A violência é a maior preocupação dos brasileiros em diversas pesquisas. Por trás do medo está o crime organizado. O PCC, de São Paulo, e o Comando Vermelho, do Rio, são as maiores entre 88 facções mapeadas pelo Ministério da Justiça. Grupos do gênero espalham-se nas ruas e nos negócios, estão por trás de muitos dos 40 mil assassinatos anuais e ajudam a, digamos, girar a roda da economia. A um ano das eleições, a população vê em cena dois modelos para enfrentar o problema. Um é do governo Lula, cristalizado em operações da Polícia Federal de agosto que atingiram o mercado financeiro e tomaram 1,2 bilhão de ­reais do PCC. Sem disparar um único tiro. É a aposta na inteligência. O outro é o do governador Cláudio Castro, do Rio, que prefere o confronto e acaba de liderar a maior chacina policial da história do Brasil, graças a uma violenta incursão no quartel-general do CV. Certos governadores direitistas apoiam a solução “tiro, porrada e bomba” e viajaram ao Rio para parabenizar Castro pela matança.

Início da caminhada, por Jamil Chade

CartaCapital

Pedido de perdão pelos crimes da ditadura foi histórico, mas novos passos terão de ser dados

Em um ato histórico, a presidente do Superior Tribunal Militar, Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha, pediu desculpas pelos crimes da ditadura. Diante de uma Catedral da Sé lotada, durante a cerimônia que marcou os 50 anos do assassinato de Vladimir Herzog, sua atitude pode ser considerada como um divisor de águas na história da instituição. O gesto acena para o futuro. Em seu discurso, a ministra deixou claro que não tolerará novos atentados contra a democracia. Em outras palavras, o STM não fechará os olhos para generais envolvidos em conspirações golpistas.

O tour asiático rende frutos, por Aldo Fornazieri

CartaCapital

Durante a visita oficial à Indonésia e à Malásia, Lula amealhou ganhos políticos, diplomáticos e também econômicos

viagem de Lula à Indonésia e à Malásia, para o encontro da Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean), foi bastante exitosa, tanto do ponto de vista político quanto do diplomático e econômico. Poderia ter sido perfeita não fosse a infeliz declaração do presidente de que “os traficantes são vítimas dos usuários de drogas também”.

Do ponto de vista político, o maior feito foi o encontro com o presidente dos EUA. A reunião transcorreu de forma cordial, sem os constrangimentos que Donald Trump frequentemente impõe a mandatários de outros países. A foto dos dois líderes se cumprimentando e sorrindo alcançou recorde de visualizações e engajamentos nas redes sociais de Lula.

Não confunda Cupom com Copom, por Luiz Gonzaga Belluzzo e Manfred Back

CartaCapital

Economistas desconhecem a importância do Cupom Cambial na fixação de câmbio, juros e inflação

O que será, que será?… / O que não tem certeza nem nunca terá / O que não tem conserto nem nunca terá / O que não tem tamanho… (O Que Será, música de Chico Buarque).

Miragem é um fenômeno óptico causado pelo desvio da luz (refração) que ocorre através de camadas de ar com temperaturas diferentes, que cria imagens deslocadas ou invertidas de objetos distantes. A imagem que sempre nos vem à mente é de uma pessoa morrendo de sede, vagando moribunda no deserto, pensando em encontrar um oásis. O desditado corre e se joga ansiosamente atrás de água, cai na real, mergulhado na areia.

Nas miragens da macroeconomia mainstream, muitos vivem a ilusão do Banco Central de um país de moeda não conversível com total independência para fixar a taxa de juros básica. Essa miragem está inscrita no regime de meta de inflação. Um delírio teórico não causado pelo cansaço de caminhar exaustivamente no deserto, mas por achar que somos o Federal Reserve (Banco Central norte-americano) e nossa moeda igual ao dólar. Cansaço algébrico, econométrico, miragem de manual de macroeconomia.

Acreditam como Abel Ferreira, técnico do Palmeiras, na consigna: todos somos um! Os donos da certeza não tomam conhecimento da arbitragem entre câmbio e juros. Tal fenômeno não existe: é uma miragem do setor financeiro internacional.

O Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil (Copom) seria uma espécie de encontro entre os Cavaleiros da Távola Redonda e Ricardo Coração de Leão. Decidem de forma totalmente independente, sem dar a mínima para a relação câmbio–juros submetida inexoravelmente às valorizações e desvalorizações do ativo subjacente: o dólar.

Poesia | Vinicius de Moraes - Dia da Criação (Porque hoje é sábado)

 

Música | Zeca Pagodinho - Toda a hora