terça-feira, 28 de outubro de 2025

Malafaia e Michelle acusaram o golpe após visita de bispo a Lula, por Juliano Spyer

Folha de S. Paulo

Encontro com Samuel Ferreira pegou de surpresa o bolsonarismo evangélico

Lula passou a circular de forma favorável nas redes sociais de crentes das periferias

A visita do bispo Samuel Ferreira, da Assembleia de Deus Madureira, a Lula pegou de surpresa o bolsonarismo evangélico. O fato de seus principais nomes terem se pronunciado mostra que acusaram o golpe.

Ferreira lidera uma das igrejas mais populares e influentes do país, conhecida entre evangélicos por ser mais tradicional que a média. Ao ser fotografado com o bispo, Lula passou a circular de forma favorável nas redes sociais e nos grupos de WhatsApp de crentes das periferias. É justamente o público identificado pelo cientista político Victor Araújo como o foco do antipetismo pentecostal.

Entre os que reagiram ao encontro estão os pastores Silas Malafaia e Teo Hayashi e a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro. Hayashi é um dos organizadores do The Send, o evento para jovens evangélicos onde, em 2020, Bolsonaro fez uma aparição como convidado especial.

Ao comentar o encontro, Malafaia, Hayashi e Michelle atacaram Lula diretamente e se referiram a Ferreira apenas de forma indireta. "Pior do que herege é o falso evangélico", esbravejou Malafaia. Michelle publicou a foto do encontro citando o livro do Apocalipse: "Continue o imundo na imundícia".

Malafaia e Hayashi defendem que o afastamento dos evangélicos em relação a Lula decorre de uma incompatibilidade de valores. Para criticar o encontro, resgatam trechos em que o presidente fala sobre temas sensíveis —como aborto e apoio a países comunistas que perseguem o cristianismo.

Os três se manifestaram por causa da viralização da imagem. Mas, ao comentarem o episódio, ajudaram a expor o próprio partidarismo. Criticar um pastor por orar com o presidente é admitir que a fé se tornou instrumento político —algo de que o bolsonarismo se beneficiou amplamente.

Evangélicos menos envolvidos com política, inclusive antipetistas, estranharam os ataques ao encontro do presidente com Ferreira. Consideram positivo que Lula peça orações e tenha recebido a Bíblia presenteada pelo bispo.

O que pouco se comentou é o que levou Lula e Janja —principalmente ela— a mudarem de postura em relação a evangélicos, mesmo se expondo a críticas do eleitorado progressista.

Janja tem visitado igrejas e dialogado com mulheres evangélicas. E, neste mês, Lula fez algo inusual: uma autocrítica pública. "Evangélico não é contra nós, nós é que não sabemos falar com eles", disse em discurso em congresso do PCdoB.

Esse movimento vem sendo construído há algum tempo, mas a mudança de chave pode ter se consolidado com a aproximação entre o casal presidencial e a vereadora goianiense Aava Santiago. Socióloga e assembleiana, ela domina a linguagem pentecostal e exemplifica como há compatibilidade entre cristianismo, defesa de pautas sociais e disputa sobre costumes.

O bolsonarismo evangélico tem motivos para estar desconfortável: Lula parece, enfim, seguro para se aproximar dos evangélicos. E se continuar a buscar esse diálogo, outros pastores atenderão.

Ao mesmo tempo, isso nos deixa imaginando: qual pode ser o produto, a longo prazo, do encontro entre o sindicalismo do PT e o movimento pentecostal?

 

 

 

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