O Estado de S. PauloOs arranjos institucionais e regras do jogo estabelecidos desde o imediato pós-guerra, que bem ou mal presidiram os últimos 80 anos, hoje são questionados com veemência
John Kenneth Galbraith escreveu em seu A
Short History of Financial Euphoria, publicado em 1990: “Para fins práticos,
deve-se presumir que a memória financeira dura, no máximo, cerca de 20 anos.
Esse é, normalmente, o tempo necessário para que a lembrança de um desastre
seja apagada e para que alguma variante da demência anterior surja novamente
para capturar a mente financeira. É também o tempo geralmente exigido para que
uma nova geração entre em cena, convencida – como suas predecessoras – de seu
próprio gênio inovador”.
A ideia me vem à mente porque logo terão
decorrido 20 anos desde a eclosão da grande crise de 2007-2009, a primeira
desde 1929. Seu epicentro foi a principal economia do mundo desenvolvido. Tim
Geithner, então presidente do Federal Reserve (Fed), o banco central dos EUA,
escreveu em março de 2009 que “(uma) crise como esta não tem uma causa simples
(...); como nação, nos endividamos em demasia e deixamos nosso sistema
financeiro assumir níveis irresponsáveis de risco e alavancagem”.
Expressões semelhantes, de sofrida singeleza,
podem ser encontradas em declarações à época de Ben Bernanke e Larry Summers,
entre outros. Todos reconheceram posteriormente, os elementos fundamentais da
excessiva complacência que levou à crise.
É valioso constatar, é o que se pode
concluir, que não apenas aos países em desenvolvimento aplica-se a restrição da
realidade. A expressão, que designa a capacidade de resposta da oferta aos
estímulos da demanda, é de André Lara Resende, e foi usada em artigo a ser
publicado na revista do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri).
No texto, o autor refere-se a uma observação de Paul Samuelson feita na década
de 90, em entrevista para documentário sobre Keynes, na qual o Prêmio Nobel de
Economia teria reconhecido que não existem limites objetivos para o déficit
fiscal e para o crescimento da dívida pública – e acrescentado que a
insistência na explicitação desta inexistência de limites pode promover a
aceleração dos gastos, levar à erosão da credibilidade do governo e à
expectativa de maior inflação futura. O mesmo Samuelson havia escrito em 1962, em
suas famosas Wicksell Lectures: “Uma economia moderna pode em alguns momentos
precisar de déficits fiscais e uma dívida pública crescente – e em outras
épocas, precisar de superávits fiscais, obtidos por meio de redução de gastos
e/ou aumento de tributação, para destinar recursos à necessidade de
investimento, combater a inflação e reduzir a dívida pública”. É curiosa a
continuação da frase: “Eu digo isso com toda seriedade, embora dificilmente um
em cada cem formadores de opinião consiga ainda compreender o que quero dizer.
Mas também aqui sou otimista de que a racionalidade prevalecerá sobre o
hábito.”