domingo, 9 de novembro de 2025

Chuvas no Sul respingam no Pará, por Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Tornados do Sul desabam na COP do Norte, onde Lula defende etanol, mas investe em petróleo

O tornado no Sul do Brasil, com efeitos destruidores, em especial no Paraná, serve como um alerta drástico e contundente para os perigos do aquecimento global, exatamente quando a COP 30 ocorre no Pará. Não se trata de uma “coincidência feliz”, porque não há nada feliz nisso, mas de uma “coincidência útil” para cobrar seriedade e responsabilidade na questão climática.

Tornados, enchentes e tragédias semelhantes não são novidade nem incomuns no Cone Sul das Américas, como acabamos de ver no Rio Grande do Sul e vemos agora em toda a região. Logo, são eventos históricos e não se pode dizer que sejam causados pela crise climática que se aprofunda no mundo. Mas...

... Os especialistas estão roucos de gritar, na academia, nos parlamentos e nos governos que a emissão de gases de efeito estufa e o aquecimento global impactam a frequência e o grau de intensidade desses eventos. Têm efeito direto na piora da situação.

Se a fase pré-COP-30 foi tomada pela (justa) discussão sobre preços abusivos das estadias e falta de estrutura em Belém, com um certo pânico de fiasco, a logística funcionou na hora H e a conferência centrou no debate, liderado pelo Brasil, sobre a responsabilidade dos países ricos com a preservação do ambiente natural nos países pobres.

Como os tornados do Sul, a cobrança não é nova e ganha senso de urgência diante de algo bastante objetivo: a realidade. O mundo rico se desenvolveu destruindo suas florestas, mas hoje qualquer um sabe que uma coisa não se contrapõe à outra e, quanto mais preservação, mais desenvolvimento. Se destruíram o que havia, os ricos devem ajudar a salvar o que sobrou.

A grande aposta do Brasil foi no Fundo Florestas Tropicais para Sempre, que, claro, encontra apoio dos beneficiários e resistência de quem é chamado a financiar. A previsão de uma arrecadação de US$ 25 bilhões é considerada excessivamente alta, até inviável. Talvez Lula tenha pedido o máximo, para chegar no possível.

Em paralelo, corre solta a discussão sobre combustíveis fósseis, com o anfitrião Brasil tentando compatibilizar a defesa da transição energética com estudos para a exploração de petróleo na Margem Equatorial e Lula fazendo uma ginástica retórica para justificar a dubiedade.

Depois de criticar os pesados investimentos dos maiores bancos privados do mundo em óleo e gás, ele defendeu a exploração de petróleo... “para financiar a transição energética”, com menos combustíveis fósseis e mais etanol. Bom pretexto, mas soou como um jeitinho para encobrir a incoerência e como o slogan da “transição gradual, lenta e segura” da ditadura militar. 

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