Correio Braziliense
Segundo a PF, várias
operações financeiras só prosperaram após pressões diretas de autoridades com
trânsito em bancos estaduais, autarquias e fundos de servidores
A liquidação do Banco Master, decretada pelo
Banco Central após a deflagração da Operação Compliance Zero pela Polícia
Federal e pelo Ministério Público Federal, nesta terça-feira (18/11),
desencadeou um abalo simultâneo no sistema financeiro e no mundo político. A
investigação aponta que a cúpula do Master montou um esquema de fraude contábil
bilionário para mascarar um rombo estrutural, mantendo a aparência de solvência
enquanto as finanças da instituição se deterioravam rapidamente.
O controlador do banco, Daniel Vorcaro, preso quando tentava embarcar para Malta, é acusado de vender ao Banco de Brasília (BRB) carteiras de crédito fictícias no valor de R$ 12,2 bilhões, apoiando-se em documentos com datas retroativas e assinaturas eletrônicas emitidas meses depois, uma evidência direta de falsificação. Tratava-se de criar ativos inexistentes e inflar o patrimônio do banco artificialmente, numa tentativa desesperada de evitar o colapso.
O Banco Central, ao examinar as operações com
o BRB, identificou inconsistências graves e concluiu que as carteiras de
crédito revendidas não existiam. Determinou, então, que o BRB desfizesse a
operação, mas o banco brasiliense continuou a enviar recursos ao Master, o que
reforçou a percepção de que o esquema seguia ativo. Por essa razão, o
presidente do BRB, Paulo Henrique Costa, foi afastado.
A operação também expôs o envolvimento do
RioPrevidência, que destinou R$ 2,6 bilhões ao Master entre 2024 e 2025,
ignorando alertas do Tribunal de Contas do Estado sobre irregularidades e
sinais de deterioração financeira. Em busca de rentabilidade acima das taxas de
mercado, seus gestores públicos assumiram riscos incompatíveis com a situação
real do banco.
A liquidação extrajudicial do Master causou
forte apreensão entre investidores institucionais, fundos de pensão, empresas e
pessoas físicas que possuíam títulos ligados ao banco. Muitos detinham
debêntures, certificados de recebíveis, letras financeiras ou cotas de fundos
estruturados pelo Master, produtos fora da cobertura do Fundo Garantidor de
Créditos.
O risco de perdas bilionárias é real, porque
o ressarcimento dependerá da capacidade da empresa liquidante de recuperar
ativos que possam compensar credores. O congelamento judicial dos bens de
Vorcaro e de outros administradores é apenas o primeiro passo para isso, mas o
processo complexo e de resultados incertos. Devido ao caso Master, a expansão
acelerada de bancos médios, com portfólios agressivos e baixa transparência,
que atraem investidores com juros elevados, mas sem lastro sólido, passou a ser
uma preocupação do mercado financeiro.
Efeito dominó
O temor inicial era uma onda de desconfiança
que poderia pressionar outras instituições de médio porte, reduzir a liquidez
de fundos de crédito privado e provocar correções forçadas de carteiras. Para
evitar um efeito dominó, o Banco Central agiu rapidamente ao decretar a
liquidação e nomear a EFB Regimes Especiais como administradora do processo,
tentando isolar o risco e impedir turbulências maiores. Ainda assim, a operação
pode levar a revisões de ativos, aumento de provisões e maior cautela
regulatória, com impacto no crédito corporativo e no mercado de capitais.
Pequenos clientes também foram afetados.
Em Brasília, a preocupação principal é com o
chamado “cinturão de influência política” dos executivos do Banco Master. Há
indícios de que políticos e dirigentes de fundos públicos atuaram para
destravar investimentos, facilitar operações e inserir o banco como contraparte
privilegiada em circuitos de crédito público e paraestatal.
Segundo a PF, várias operações só prosperaram
após pressões diretas de autoridades com trânsito em bancos estaduais,
autarquias e fundos de servidores, o que explicaria a resiliência do Master
mesmo diante de sinais evidentes de fragilidade financeira. A tentativa de
venda do banco ao Grupo Fictor, anunciada na véspera da operação, foi uma
manobra para confundir o mercado e estancar a crise iminente. Deu errado.
Nos gabinetes do Congresso e nos governos do
Rio de janeiro e Distrito Federal, o clima é de expectativa em relação a fatos
novos que possam surgir das investigações. A possibilidade de que conversas,
intermediações políticas, fluxos financeiros associados a campanhas,
consultorias ou doações indiretas venham à tona assombra aliados e
interlocutores do banco. Há receio de que novos inquéritos sobre fundos de
pensão, documentos compartilhados pelo Banco Central e eventuais delações
premiadas de executivos do Master venham a comprometer autoridades e operadores
políticos.
Segundo a Polícia Federal, a parte financeira
está praticamente elucidada pelo Banco Central; agora começa a análise do
componente político, na investigação criminal. A prisão de Vorcaro e as
relações políticas que emergem das investigações geram muita apreensão nos
meios políticos. O impacto imediato é econômico, atingindo desde fundos
públicos até investidores individuais, pode ser calculado; o impacto político,
ainda não. O Master oferecia taxas elevadas, assumia riscos extremos e contava
com a blindagem política nos bastidores do Congresso.

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