terça-feira, 25 de novembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Sabatina de Messias deve se concentrar no aspecto jurídico

Por O Globo

Como manda a Constituição, cabe ao Senado avaliar credenciais técnicas, deixando de lado inclinações políticas

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva indicou o ministro Jorge Messias, advogado-geral da União, à vaga aberta no Supremo Tribunal Federal (STF) com a aposentadoria antecipada do ministro Luís Roberto Barroso há pouco mais de um mês. A despeito da demora no anúncio, não se pode dizer que tenha causado surpresa. Messias sempre foi favorito. Por mais que fosse esperada, a escolha gerou mal-estar no Senado, onde ele será sabatinado. O presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP), queixou-se de não ter recebido ao menos um telefonema sobre a indicação. Alcolumbre defendia o aliado Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para a vaga.

Escolhas sempre ensejarão elogios e críticas. É fato normal numa democracia. A indicação de ministros ao Supremo, vale lembrar, é prerrogativa do presidente da República, respeitadas as condições previstas na Constituição: reputação ilibada e notório saber jurídico. Messias é o terceiro nome indicado ao STF por Lula no atual mandato, depois de Cristiano Zanin (seu advogado na Operação Lava-Jato) e Flávio Dino (ex-ministro da Justiça e Segurança Pública). Em todos esses casos, ele privilegiou fidelidade e proximidade pessoal em vez de carreiras bem-sucedidas na academia ou nos tribunais. Não que os indicados não tivessem qualificação, ao contrário. Mas não foi esse fator que pesou na decisão. Lula não esconde a frustração com indicados para o Supremo em mandatos anteriores, que votaram contra os interesses dele e do PT. Se aprovado, Messias será o quinto ministro indicado por Lula entre os que permanecem na Corte.

Ex-integrante da gestão petista de Dilma Rousseff e próximo ao PT, Messias é advogado, mestre e doutor em Direito pela Universidade de Brasília. É um dos ministros que atuam como bombeiro em conflitos envolvendo o governo. Entre outras ações, criou um grupo de trabalho para tratar das fraudes dos descontos indevidos a aposentados e costurou um acordo com o STF para ressarcir os lesados. É considerado o principal interlocutor de Lula junto ao Supremo, com trânsito entre todos os ministros, inclusive os indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.

Em sua sabatina, porém, é possível que Messias encontre um clima belicoso. Não só por divergências na indicação, mas pelos atritos políticos entre oposicionistas e governistas que cercaram a escolha. Depois do anúncio, Alcolumbre, que até agora vinha atuando como aliado do Executivo, ressuscitou uma pauta-bomba prevendo aposentadoria especial a agentes de saúde, com prejuízo óbvio para o quadro fiscal.

É inadequado tomar decisões desse tipo por impulsos de natureza política. Cabe ao Senado, como manda a Constituição, submeter Messias a uma sabatina rigorosa. Ele precisará do aval de pelo menos 41 dos 81 senadores em plenário depois de passar pela Comissão de Constituição e Justiça. Não é comum a Casa rejeitar indicações do Executivo — a última rejeição ocorreu no governo Floriano Peixoto. Mas a recondução de Paulo Gonet à Procuradoria-Geral da República por apenas 4 votos além do necessário despertou dúvidas. Quaisquer que sejam as inclinações dos senadores, a sabatina deve passar ao largo dos dissensos políticos e se concentrar no aspecto jurídico, avaliando se Messias tem as qualificações técnicas exigidas para integrar a mais alta Corte. O essencial é que demonstre compromisso com os interesses do Brasil, não com políticos ou ideologias.

Negociação de paz para a Ucrânia é positiva, mas não a qualquer preço

Por O Globo

Apaziguamento benéfico aos russos pode funcionar como incentivo a novas investidas de Putin na Europa

A proposta de 28 pontos para encerrar a guerra na Ucrânia foi ideia de Donald Trump, mas poderia muito bem ter sido sugerida por Vladimir Putin. O texto é inaceitável não apenas para os ucranianos, mas também para União Europeia (UE) e Reino Unido. A iniciativa americana de abrir as conversações é sem dúvida positiva. Mas um complicador paira sobre a negociação: mesmo com todas as concessões à Rússia, até que ponto se poderá confiar em Putin? Os países europeus veem um tratado de apaziguamento, benéfico aos russos, como incentivo para novas investidas russas não apenas na própria Ucrânia, mas também noutros países do continente.

É verdade que a situação ucraniana tem se deteriorado no campo de batalha. Desde a agressão de fevereiro de 2022, a Rússia conquistou 20% do país. É temido para breve novo ataque russo com objetivo de dominar toda a região do Donbass, onde se situa a principal frente de batalha. O próprio presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, reconheceu que a Ucrânia poderia “se ver diante de uma escolha muito difícil”. “Ou a perda da dignidade, ou o risco de perder um parceiro fundamental [os Estados Unidos]”, disse. Depois da reunião em que os americanos apresentaram a proposta em Genebra, ele afirmou ter conseguido “manter pontos extremamente sensíveis na mesa” e reiterou buscar acordos “que nos fortaleçam, não nos enfraqueçam”.

Não é o caso da proposta original dos Estados Unidos. Por ela, a Rússia ficaria com todo o Donbass, inclusive áreas da província de Donetsk ainda em poder dos ucranianos. A capitulação numa região onde tantos ucranianos tombaram na guerra representaria um baque para a opinião pública, num momento em que o governo já tem sofrido com acusações de corrupção.

Pelo plano de Trump, os 14% de Donetsk hoje controlados pela Ucrânia seriam transformados em zona desmilitarizada, e o país abriria mão de soberania sobre um quarto de seu território. Mais que isso, o texto veda a entrada na Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), e os países da Otan ficariam proibidos de manter soldados em território ucraniano. Para compensar, o texto fala em dar aos ucranianos garantias de segurança “confiáveis” e autoriza o ingresso do país na UE. Vale lembrar que, com o fim da União Soviética, a Ucrânia independente também recebeu garantias de segurança, e isso não impediu a invasão russa. Além do mais, a proposta torna letra morta o plano europeu de formar uma retaguarda para se proteger da Rússia.

Mais de 250 mil soldados russos já morreram na guerra, e outros 700 mil ficaram feridos, segundo o Center for Strategic & International Studies — o quíntuplo da soma de vítimas em todos os conflitos envolvendo Rússia ou União Soviética desde o fim da Segunda Guerra. Do lado ucraniano, a estimativa é que até 100 mil soldados tenham morrido e outros 300 mil ficado feridos. Sem falar nos 14 mil civis mortos e 37 mil feridos, de acordo com a ONU. Trump não está errado em querer acabar com a guerra depois de tanta dor. Mas não a qualquer preço.

Ucrânia reage a presente de Trump para Putin

Por Folha de S. Paulo

Plano de paz anunciado pelo presidente americano manietava soberania de Kiev e premiava Rússia

Zelenski está em apuros domésticos, com um escândalo de corrupção, e na frente de batalha, onde a Rússia ameaça a defesa do país

Quando ninguém mais esperava uma solução rápida para a Guerra da UcrâniaDonald Trump sacou da cartola um acordo de paz escrito a quatro mãos por um negociador americano e outro russo. Ucranianos e seus aliados europeus só foram informados do fato.

A Casa Branca deu prazo até a próxima quinta-feira (27) para que Volodimir Zelenski aceitasse o prato feito. Chegou a sugerir medidas drásticas, como o fim do fornecimento de armas a Kiev, para pressioná-lo.

O mandatário ucraniano está em apuros domésticos, na forma de um escândalo de corrupção que derruba ministros, e na frente de batalha, onde a Rússia faz pressão máxima e ameaça a estabilidade da defesa do país que invadiu há quase quatro anos.

A fragilidade de Zelenski era visível em seu desabafo inicial, quando disse que seu governo se via diante de uma "escolha difícil: ou perder a dignidade ou um grande aliado". A partir daí, com ajuda externa, buscou reagir.

No domingo (23), equipes negociadoras de Ucrânia e EUA se reuniram em Genebra. Os 28 pontos do plano anunciado por Trump, amplamente favoráveis à Rússia, tornaram-se 19 mais equilibrados. O Kremlin, claro, já disse que não aceitará as mudanças.

Se perdas territoriais seriam incontornáveis e demandas russas precisam ser ouvidas, o primeiro documento ia além, ao manietar a soberania ucraniana.

O fazia em temas amplos, como a limitação de suas Forças Armadas ou a exigência de eleições em cem dias, mas também em minúcias como a proteção da perseguida Igreja Ortodoxa Russa no país. Tudo isso está em revisão, e a data-limite fixada por Trump dificilmente será respeitada.

A questão é que Vladimir Putin não pode ganhar a guerra e dobrar uma Ucrânia apoiada pelo Ocidente, à diferença do que apregoam generais russos, e tampouco Zelenski é capaz de expulsar os invasores como querem crer próceres europeus.

Logo, concessões se impõem, mas Putin não deveria ser recompensado pelo uso da força que fez em pleno século 21. Ficará no ar o fantasma do Acordo de Munique, de 1938, quando Reino Unido e França deixaram Adolf Hitler tomar pedaços da Tchecoslováquia na esperança de aplacar seu belicismo. Deu no que deu.

Naturalmente, o fim da guerra seria excelente notícia, em especial se incluir um cronograma para a normalização das relações entre a Rússia e o Ocidente.

Críticos dizem que Putin quer remontar um império, o que pode ser verdade, mas é fato que o englobamento do antigo bloco socialista pelo clube militar ocidental mostra que os EUA foram no mínimo pouco magnânimos na vitória sobre a União Soviética.

Se houver impasse insuperável nas negociações em curso, Trump também terá dado mais um presente para Putin. O russo, que se afastou da autoria da proposta, fingirá que o problema não é seu, ganhando mais tempo para prosseguir com sua guerra.

Moradia para famílias do Moinho

Por Folha de S. Paulo

Plano para reassentamento acordado entre governos Lula e Tarcísio esbarra em entraves burocráticos

Gestões federal e estadual fazem acusações mútuas, enquanto deveriam unir forças para garantir o direito à moradia às famílias

Seis meses depois da assinatura do acordo para reassentar cerca de 800 famílias residentes na favela do Moinho, na região central da capital paulista, ainda perdura a jornada de parte delas para encontrar alternativas habitacionais. O caso revela dificuldades do poder público em tirar seus planos do papel.

Em maio deste ano, em exemplo virtuoso de parceria entre rivais políticos, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o estadual de Tarcísio de Freitas (Republicanos) firmaram acordo para subsidiar a compra de imóveis no valor de até R$ 250 mil —R$ 180 mil da União e R$ 70 mil do estado. Enquanto buscam novas moradias, as famílias receberão um auxílio de R$ 1.200 mensais.

Segundo as autoridades paulistas, das 832 famílias que aderiam ao programa (94,5% do total), 692 deixaram o local, das quais mais de 140 para moradias definitivas. Apesar disso, ainda há uma tarefa considerável pela frente.

Moradores do Moinho relatam dificuldade em encontrar alternativas de moradia pelo preço delimitado no acordo e questionamentos reiterados sobre a previsão de saída por parte dos funcionários da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU), além de denúncias de truculência e assédio policiais.

Famílias que residem no local realizaram um protesto no último dia 18, na faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, contra o que qualificam como recrudescimento da violência e demolições com moradores ainda dentro das casas. O governo paulista refuta as acusações.

Ademais, de acordo com os residentes, as péssimas condições de vida no local, um problema antigo, persistem com o acúmulo do entulho de cerca de 250 habitações demolidas ou parcialmente desmontadas e infestações de ratos, baratas e escorpiões.

A gestão de Tarcísio reclama da ausência de equipes da Caixa Econômica Federal no entorno da comunidade e da recusa de atendimento a famílias que não entram nos critérios de renda do programa federal Minha Casa Minha Vida ou que têm pendências no Cadastro Único nacional.

Já o governo Lula afirma que a Caixa analisou o processo de 797 famílias, sendo 636 delas classificadas como compatíveis, e que os casos remanescentes seriam de responsabilidade da CDHU.

Mas entraves burocráticos entre órgãos estaduais e federais não justificam procrastinação. Com o ano eleitoral se aproximando, faria bem às duas esferas mostrar à população que conseguem colocar o interesse público acima de disputas políticas.

A COP como ela é

Por O Estado de S. Paulo

Belém não expôs o esgotamento do multilateralismo, mas sim da fantasia de uma transição energética feita à força, sem tecnologia, sem consenso, sem aritmética e à custa da prosperidade

Mesmo antes do fim da COP-30, brotou forte na imprensa a leitura do “esgotamento do processo multilateral”, cujo emblema maior seria o fracasso em desenhar o “mapa do caminho” para a eliminação dos combustíveis fósseis. Mas o processo da COP funcionou como sempre: consensos mínimos, avanços graduais e acordos procedimentais. O que naufragou em Belém não foi a forma diplomática, mas o conteúdo de uma agenda que exige a supressão dos fósseis em ritmo acelerado, como se a física, a economia e a política fossem negligenciáveis.

Se esse voluntarismo energético foi frustrado, não é porque os países tenham desistido do clima, mas porque a aposta de que seria possível substituir rapidamente os fósseis a golpes de subsídios em energia eólica e solar – sem infraestrutura adequada ou capacidade de armazenamento – provou-se uma ficção cara. O mundo real puniu essa fantasia com inflação energética, perdas industriais e revolta do eleitorado. A Europa é um exemplo contundente: metas ambiciosas demais exauriram sociedades incapazes de absorver seus custos.

Países pobres e emergentes também se recusam a pagar a conta, notificando que não sacrificarão crescimento e industrialização. Energia barata e confiável é precondição de prosperidade. Os renováveis seguem crescendo, mas apenas somam – não substituem – a capacidade existente. Sem flexibilidade, transmissão e armazenamento, não há transição acelerada; há slogans.

O divórcio entre diplomacia climática e realidade material ficou claro em Belém. O palco segue maximalista, enquanto o mundo real migra para outra lógica: transições mais lentas, foco em adaptação e prioridade à segurança energética e à prosperidade como condição de resiliência climática.

Em três décadas, a obsessão por cortar na marra a oferta de combustíveis fósseis praticamente não alterou a trajetória das emissões. A insistência num modelo que não entrega resultados, mas multiplica custos, corroeu a legitimidade política da agenda. O cansaço dos eleitores não é negacionismo: é aritmética doméstica. Energia cara destrói o consenso social. A já folclórica coxinha a R$ 45 – ainda que os preços em Belém durante a COP não tenham relação direta com a energia – serviu involuntariamente como um aperitivo indigesto do custo de vida global se vierem a prevalecer as políticas energéticas exigidas pelo ambientalismo radical.

Sintomaticamente, a COP avançou justamente onde há realismo: adaptação, proteção florestal baseada em incentivos, métricas para resiliência e financiamento híbrido. Não é coincidência. Mais do que cortar emissões a qualquer custo, as nações querem fortalecer infraestrutura, saúde, saneamento, redes elétricas – elementos que, de fato, reduzem vulnerabilidades. A inflexão do tecnólogo e filantropo Bill Gates simboliza a ascensão de uma nova agenda climática, que coloca energia abundante, inovação tecnológica e desenvolvimento no centro.

O eixo que ganha força – e que a COP, ainda que a contragosto, confirmou – é simples: a transição energética só será viável se for barata, segura e politicamente vendável. Isso exige inovação maciça, barateamento tecnológico e crescimento. Países em desenvolvimento – que cada vez mais responderão pela esmagadora maioria das emissões – não serão convencidos por metas abstratas, mas por benefícios concretos: empregos, eletricidade confiável, agricultura forte.

Dizia-se que a COP-30 seria a “COP da Verdade”. E foi. Não a verdade idealizada pelo radicalismo ambiental, e sim a verdade vivida pelo mundo real. Mesmo as previsíveis falhas de infraestrutura serviram para mostrar ao mundo as necessidades sociais urgentes de populações pobres, como as da região amazônica. O que realmente fracassou foi a fantasia de que cúpulas de elite poderiam decretar, por chantagem moral, uma mutação histórica na oferta de energia sem antes resolver questões elementares de engenharia, capital e tempo. Quando o debate abandonar o pensamento mágico da “eliminação” dos fósseis e voltar a se orientar por prosperidade, tecnologia e realismo energético, o multilateralismo deixará de parecer impotente – e recuperará sua utilidade.

A caixa-preta dos fundos de servidores

Por O Estado de S. Paulo

Os investimentos temerários em títulos do Banco Master por essas entidades demonstram que aprimorar a sua governança é tarefa urgente, para o bem dos próprios funcionários públicos

O caso do Banco Master certamente terá ainda muitos desdobramentos em vários âmbitos. Um deles, que não poderá faltar, é a governança dos fundos de Estados e municípios, também conhecidos como Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS). Descobriu-se que várias dessas entidades aplicaram quantias astronômicas em títulos do Banco Master, caracterizando uma gestão temerária, para dizer o mínimo.

Instituídos pela Lei n.º 9.717, de 27/11/1998, os RPPS são os veículos que permitem aos funcionários públicos das três esferas de poder fazerem a sua poupança previdenciária complementar, o que se tornou especialmente importante depois que várias legislações estabeleceram tetos para a aposentadoria do funcionalismo, sendo que o complemento viria das contribuições dos próprios funcionários públicos a essas entidades. Note-se, portanto, a importância da boa gestão desses recursos.

Boa gestão que, com certeza, não se viu no caso da compra de títulos do Banco Master. Não que não se possa errar na escolha dos investimentos. Afinal, pela sua própria natureza, todo investimento tem risco – não existe almoço de graça. Mas o que se exige do gestor é que administre o dinheiro de terceiros com a prudência com que faria a gestão dos seus próprios recursos. Não é o que se viu no caso dos RPPS que tinham títulos do Banco Master em suas carteiras de investimento.

O caso mais grotesco é o do Rioprevidência, RPPS dos funcionários do Estado do Rio de Janeiro. O montante em títulos do Banco Master somava quase R$ 1 bilhão, o que representa cerca de 10% do patrimônio da entidade no final de 2024. Quem, em sã consciência, aplicaria 10% da sua carteira em um único investimento, ainda mais sendo títulos de um banco pequeno e com práticas para lá de arriscadas?

Mas o Rioprevidência não está só. Segundo reportagem do Estadão, outros 17 fundos de Previdência de Estados e municípios aplicaram recursos em títulos do Banco Master. Uma dessas entidades, o RPPS de Maceió, afirmou em nota que “os títulos do Master representam menos de 10%” do total do patrimônio da entidade. Inacreditável. Como se “menos de 10%” fosse prova de gestão prudente, e não o contrário.

Agora, algumas dessas entidades querem jogar o prejuízo causado por suas decisões na conta da viúva. Em nota, o Rioprevidência afirmou que vai tentar converter essas aplicações em precatórios federais. Era só o que faltava. De qualquer forma, o rombo causado pela incúria deverá recair sobre os funcionários públicos ou sobre os contribuintes de cada unidade da Federação, a depender de quem for chamado a cobrir o prejuízo.

Algumas dessas entidades podem ter sido levadas a investir em títulos do Banco Master por simplesmente seguirem regras internas de leilão de taxas, como se a gestão de investimentos pudesse ser feita seguindo a mesma lógica de certames de contratação de serviços pelo poder público. Outras entidades podem ter tido motivações menos republicanas para entrarem nesse tipo de operação. Mas um fato é inescapável: todas, de uma forma ou de outra, mostraram falhas imperdoáveis de governança.

Como contraste, não houve registro de nenhum fundo de pensão ligado a empresas, sejam estatais ou privadas, que tivessem investido em títulos do Banco Master. Mesmo os fundos de pensão estatais – que já serviram, em várias ocasiões, como veículos de decisões de investimentos duvidosos por motivações políticas – neste caso mostraram uma governança exemplar. Essas entidades são supervisionadas pela Previc, um órgão federal, ao passo que os RPPS respondem aos governos e tribunais de contas regionais, abrindo espaço para a influência política nas decisões de investimento.

Pela sua própria natureza, o patrimônio dos RPPS pode servir como instrumento financeiro nas mãos de políticos inescrupulosos, ou como fonte de recursos para funcionários corruptos. É tarefa urgente rever a governança dessas entidades. Essa é uma agenda que os próprios funcionários públicos afetados deveriam abraçar.

A bola do INSS está com Lula

Por O Estado de S. Paulo

Presidente tem de sancionar o fim do desconto de contribuições a sindicatos nos benefícios

Desde que foi aprovado pelo Senado, no dia 12 passado, o projeto de lei que proíbe descontos de contribuições a sindicatos e associações nos benefícios do INSS aguarda sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para que não restem dúvidas sobre o impedimento da cobrança em folha de qualquer valor, o artigo 6.º do PL ressalta que a dedução é vetada “ainda que com autorização expressa do beneficiário”.

A caneta presidencial deve estar pesando na mão do ex-sindicalista Lula, mas o fim dos descontos automáticos em aposentadorias e pensões é a medida mais contundente no combate a fraudes como as verificadas no recente escândalo do INSS. Não há como ignorar que 97% das vítimas do golpe disseram que não autorizaram o desconto, como mostrou auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU).

A Coluna do Estadão noticiou recentemente que o presidente foi aconselhado a não vetar a medida, apesar da avaliação corrente no Palácio do Planalto de que o projeto seria uma tentativa da direita de sufocar o movimento sindical. Ora, não é preciso muito esforço para isso: foram os próprios sindicatos que perderam relevância ao atuarem como braços de partidos políticos, sobretudo do PT, em vez de representarem os trabalhadores.

Lula, em sua época de metalúrgico do ABC paulista, nos idos da década de 1970, defendia maior independência dos sindicatos para combater o que classificava de camisa de força do peleguismo. Era, então, contra a contribuição obrigatória que alimentava o sindicalismo de Estado.

Mas os tempos mudaram, e a extinção da contribuição compulsória, enfim sacramentada na reforma trabalhista de 2017, teve forte oposição do PT, que denunciava a intenção de liquidar os sindicatos. Era a desculpa ideal para quem já não conseguia ter relevância no mundo do trabalho, que passava por substancial transformação em razão de novas tecnologias que deram liberdade ao trabalhador e revolucionaram sobretudo o setor de serviços.

Segundo o IBGE, o total de trabalhadores sindicalizados passou de 8,4% (8,3 milhões de pessoas) em 2023 para 8,9% (9,1 milhões) no ano passado, o que demonstra que os sindicatos podem ser relevantes sem que os trabalhadores sejam obrigados a sustentá-los. Mesmo o batalhão de motoristas por aplicativo e microempreendedores individuais precisa se agrupar em associações e outras entidades de classe para ser capaz de defender seus interesses, mas o modelo sustentado por contribuições compulsórias parece esgotado. Por isso, o desconto no benefício de aposentados do INSS em favor de sindicatos se tornou uma espécie de balão de oxigênio para sindicatos moribundos.

Até o fim de outubro, 3,4 milhões de beneficiários vítimas da fraude do INSS haviam aderido ao acordo de ressarcimento, mas este é o típico caso em que indenizar apenas não basta. Impedir a dedução automática é uma forma de o governo comprovar empenho em proteger os cidadãos contra novos abusos.

Método de decisão das COPs é insuficiente para deter aquecimento

Por Valor Econômico

As decisões nas COPs têm de ser tomadas por consenso, em um mundo em que a polarização faz enormes estragos

A COP30, conferência do clima em Belém, fez a diferença não pelo que conseguiu decidir em relação às reuniões anteriores, mas pelo que tentou conseguir: aprovar um roteiro claro para reduzir a queima de combustíveis fósseis, responsável por 80% das emissões, e eliminar o desmatamento. Pode parecer surpreendente, mas quase três décadas se passaram até que se chegasse, em Dubai (COP28), a uma conclusão que é a razão de ser desses encontros, ter uma solução para dar um fim ao principal responsável pelas emissões de CO2 na atmosfera. Ainda assim, a “transição para longe” dos fósseis, frase apressada arrancada a fórceps em Dubai, sumiu no ano seguinte. A Presidência brasileira fez a coisa certa: tornou-o o objetivo principal a ser perseguido, ao lado do fim do desmatamento. Fracassou por oposição de muitos países, grandes e pequenos — não há sequer menção aos combustíveis fósseis na declaração final. Enquanto isso, o limite traçado pelo Acordo de Paris, de aumento de temperatura não superior a 1,5° C, está sendo ultrapassado, sem que o senso de urgência requerido permeie as COPs.

As discussões decisivas sobre redução gradual do uso de combustíveis fósseis, porém, não estavam na pauta oficial da COP, por incrível que possa parecer. Nem o desmatamento, mesmo que a COP se realizasse diante de uma das vítimas principais do aquecimento global, a floresta amazônica. O avanço nessas questões seria uma mudança de jogo na inércia decisória das conferências. Após 30 anos de debates e progressos, a COP30 foi demonstração importante de que o multilaterialismo sobrevive e de que o mundo precisa dele. Mas é uma virtude duvidosa apontar que sem o Acordo de Paris a temperatura projetada para 2100 seria 4° C superior ao nível pré-industrial, e não de 2,3° C a 2,5° C de hoje — em ambas as situações a Terra estará muito perto de se tornar ambiente hostil à vida humana.

O Brasil conseguiu arrastar cerca de 80 países, dos 194 na conferência, para a intenção de criar um caminho para cortar o uso dos combustíveis fósseis. Mas as decisões nas COPs têm de ser tomadas por consenso, em um mundo em que a polarização faz enormes estragos. Ainda assim, a Presidência brasileira levará adiante uma reunião em abril para organizar a discussão e a ação. Da mesma forma, diante do impasse sobre a eliminação do desmatamento e da eterna reticência do financiamento pelos países desenvolvidos, o Brasil lançou um expediente criativo de obter recursos públicos e privados para manter as florestas em pé e evitar sua destruição, as TFFF (Fundo Florestas Tropicais para Sempre).

A ausência dos Estados Unidos não diminuiu o número de países participantes do Acordo de Paris, embora não lhe tenha dado maior fôlego decisório. A China teve papel discreto e ajudou a obstruir a proposta sobre combustíveis fósseis ao lado de Índia e Rússia, todos membros fundadores do Brics. O presidente Lula teve participação que supreendeu a todos, indo duas vezes a Belém e reiterando a necessidade de um cronograma para que o planeta fuja dos combustíveis fósseis. A atitude, no final, não é incoerente com sua pregação pela exploração de petróleo na Margem Equatorial. O presidente, auxiliado pela ministra Marina Silva, é a favor da ideia, mas desde que todos os países a adotem, inclusive os produtores de petróleo. Não faria sentido uma atitude inócua de o Brasil ser o único país a abandonar a exploração e os outros, não.

Não apenas as principais questões que estavam fora da pauta não avançaram, mas também as que nela estavam. A discussão sobre barreiras ambientais protecionistas, como a da taxa de carbono europeia, criticada pela China e muitos outros países, não saiu do lugar. No comunicado final, planeja-se uma reunião de “alto nível” para debater o assunto, embora a União Europeia passe a cobrar a taxa na virada do ano. Finanças, o fantasma das COPs, pouco evoluiu. Mais uma vez foi feito um apelo a que os países desenvolvidos elevem sua contribuição para US$ 300 bilhões ao financiamento climático. A demanda para que eles triplicassem os recursos oferecidos para adaptação foi aceita, sem que, entretanto, conste quanto de fato esteve disponível para essa finalidade e quanto seria o triplo dessa incógnita.

Houve progressos na inclusão dos oceanos no centro dos debates e ampliação de metas para protegê-los. Fiel ao espírito de Belém, onde houve participação das comunidades locais, indígenas e quilombolas, a COP30 reconheceu o papel da sociedade civil como agente indispensável e beneficiário do combate às mudanças climáticas. O conceito de transição justa, inclusiva e participativa foi detalhado.

Quase um terço de século depois, há urgência em rever o método de decisões das COPs por consenso. O mínimo denominador comum de ações climáticas aceitas revelou-se absolutamente insuficiente para conter o aquecimento global. Os maiores poluidores mundiais, China, EUA, Índia (que sequer atualizou suas metas) e Rússia, passam ao largo das decisões, que, por sinal, não são mandatórias. É preciso mudar isso, sob risco de as COPs se tornarem irrelevantes.

Violência doméstica afeta mulheres e crianças pretas ou brancas

Por Correio Braziliense

A maioria dos atos de brutalidade contra as mulheres, independentemente de raça/cor, ocorreu na frente de crianças. Em 40% dos episódios, nenhuma testemunha ofereceu ajuda

Hoje, Brasília  será palco da 2ª Marcha das Mulheres Negras do Brasil,  que levará para a Esplanada dos Ministérios o tema "A reparação e o bem-viver", uma reivindicação  para que haja equidade nas políticas públicas.  São esperadas mais de 300 mil mulheres de todo o país.  Ontem, véspera desse grande evento, foi divulgada a 11ª edição da Pesquisa Nacional de  Violência contra Mulher,  deste ano, realizada pelo Instituto DataSenado e pela Nexus, em parceria com o Observatório  da Mulher contra Violência (OMV), que entrevistou 3,7 milhões de brasileiras. Embora a pesquisa não tenha trazido dados específicos sobre às afrodescendentes, elas são maioria não só na população feminina, mas também em número de vítimas das mais diversas formas agressões.

Segundo a pesquisa, a maioria dos atos de brutalidade contra as mulheres, independentemente de raça/cor, ocorreu na frente de crianças. Em 40% dos episódios, nenhuma testemunha ofereceu ajuda. A sondagem deste ano teve como foco mulheres com 16 anos ou mais, residentes no país, em um universo de 21.641 entrevistadas.

"Essa foi a primeira vez em que a pesquisa investigou a presença de outras pessoas no momento da agressão. O fato de 71% das mulheres serem agredidas na frente de outras pessoas e, dentre esses casos, sete em cada 10 serem presenciados por pelo menos uma criança, mostra que o ciclo de violência afeta muitas outras pessoas além da mulher agredida", ressaltou Marcos Ruben de Oliveira, do Instituto de Pesquisa DataSenado.

Mais da metade das agredidas (58%) buscou o apoio com os familiares; 53% recorreram à igreja e 52% buscaram conforto com amigos, antes de recorrer ao poder público. Só 28% registraram um Boletim de Ocorrência em delegacias da Mulher, e 11%, apelaram para a central de atendimento pelo Ligue 180. A pesquisa evidenciou  que a maioria das vítimas da violência doméstica no país tem baixa renda, pouca escolaridade e desconhece as leis e os mecanismos de proteção contraas agressões — 30% são analfabetas e 20% têm ensino fundamental incompleto. Na média geral, 67% das brasileiras conhecem pouco a Lei Maria da Penha, 11% admitiram desconhecer e  21%  disseram conhecer bem a legislação. No período entre 2023 e 2025, a Delegacia da Mulher era o órgão com maior índice de conhecimento das mulheres, seguida pela Defensoria  Pública e serviços de assistência social. 

As  respostas colhidas pela pesquisa sugerem a necessidade de as políticas públicas promoverem a divulgação dos mecanismos de proteção das mulheres, uma vez que a moradia é um dos lugares mais perigosos . Mas, além disso, é preciso criar meios de reeducar os para evitar que os homens  agressores cometam um ato letal contra a mulher, antes agredida, como vingança, pelo tempo de privação de liberdade, elevando o número de feminicídios.  A  18ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública evidenciou que 64,3% desse tipo de crime ocorre dentro de casa. Quanto a crianças e adolescentes, é essencial um acolhimento adequado para mitigar os traumas provocados pelas cenas de violência no ambiente familiar e impedir que reproduzam o mesmo comportamento deplorável na juventude e na fase adulta. Boa educação é fundamental  para combater qualquer ato de violência.

Polícia Federal investiga possível fraude no Enem

Por O Povo (CE)

As eventuais falhas não reduzem a importância do Exame Nacional do Ensino Médio, nem comprometem a sua credibilidade

Suspeita de que teria havido antecipação de questões aplicadas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) levou ao cancelamento de três itens nas provas deste ano. As questões similares foram divulgadas em vídeo no Youtube por Edcley Teixeira, estudante de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), em Sobral (243 km de Fortaleza). Ele atua em ambientes virtuais como professor e orientador voltado para as provas do Enem. A Polícia Federal foi acionada e fez buscas na casa dele, levando material para análise.

Segundo o estudante de Medicina, seria possível "prever" algumas questões participando do "pré-teste" do Enem, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), como ele fez. Edcley disse que não é exigido nenhum termo de sigilo dos participantes e que não há nem aviso verbal quanto a isso.

Ele afirma que as três perguntas anuladas no Enem 2025 estavam no Prêmio Capes Talento Universitário, promovido pelo Ministério da Educação (MEC), do qual ele participou, no ano passado. O estudante diz que não existe nenhum termo de sigilo para quem faz o pré-teste do Enem, e também nega que tenha praticado algum tipo de fraude.

Em entrevista ao programa Fantástico, da Rede Globo, o presidente do Inep, Manuel Palácios, afirmou não haver "qualquer risco" de fraude no Enem, mesmo com a investigação da PF sobre o uso de itens do pré-teste no exame.

O ministro da Educação, Camilo Santana, reforçou que nenhum estudante será prejudicado devido à anulação das questões.

Essa não é a primeira vez que itens são cancelados em uma prova do Enem. Nos seus 27 anos de existência, houve vários casos de anulação de perguntas. A situação mais grave aconteceu em 2009, o primeiro ano no atual formato, quando o Enem foi cancelado, após comprovado o vazamento das provas dois dias antes de sua aplicação.

O Exame Nacional do Ensino Médio nasceu como uma prova para avaliar o conhecimento dos estudantes brasileiros, que se tornou a principal porta de entrada dos estudantes para o ensino superior em instituições públicas e privadas. Neste ano 4,81 milhões de pessoas se inscreveram no exame, das quais 3,5 milhões compareceram para fazer as provas.

No entanto, é preciso deixar claro que as eventuais falhas não reduzem a importância do Enem, nem comprometem a sua credibilidade. O Inep sempre procura aperfeiçoar os mecanismos de segurança para garantir justiça e equidade na aplicação das provas. Assim, é preciso que a Polícia Federal investigue com rigor para esclarecer se houve algum tipo de fraude, de modo a punir eventuais responsáveis.

 

 


 

 

 

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