segunda-feira, 24 de novembro de 2025

Master é um banco político, por Demétrio Magnoli

O Globo

O Brasil é um país de portas giratórias. O banqueiro patrocinava, oficial ou informalmente, eventos dos grupos de lobby

Tudo o que ronda o escândalo do Banco Master é estranho, do ponto de vista dos analistas econômicos. Nada no caso, porém, provoca genuína estranheza entre os analistas políticos.

A operação de venda do Master ao Banco de Brasília (BRB) foi anunciada em março, mas apenas em setembro barrada unanimemente pelo BC. Há tempos, o radar detectava objetos estranhos no céu. O banco de Daniel Vorcaro cresceu, ao longo dos últimos anos, oferecendo CDBs com taxas de juros muito superiores às dos concorrentes.

— O Master vinha apresentando problemas desde o ano passado, pois tinha ativos incertos e passivos certos. O BC realmente dormiu no ponto e só acordou agora — registra o ex-diretor do BC Carlos Eduardo de Freitas.

Por que a demora, diante da pilha de evidências do esquema de alavancagem radical?

“É a economia, estúpido!”, ensinava James Carville, estrategista de Bill Clinton em 1992, para concentrar o foco dos operadores da campanha presidencial. No caso Master, a advertência certa aponta rumo diferente: é a política, estúpido! A pirâmide financeira ergueu-se sobre as ramificadas conexões de Vorcaro nas elites política, empresarial e jurídica.

A lista de investidores públicos no Master deveria ser interpretada pela PF como um “mapa do caminho”. Institutos previdenciários de estados e municípios aplicaram quase R$ 2 bilhões no banco alavancado. Quatro prefeituras colocaram ali mais de 10% de seus fundos totais. O governo estadual do RJ aplicou 10,5%.

Sabia-se o que se fazia. O Tribunal de Contas do Rio de Janeiro apontou “risco de investimento” no aporte de R$ 970 milhões do Rioprevidência no Master. A conta do prejuízo segue, agora, para os contribuintes. A investigação — haverá? — precisa separar os gestores corruptos dos meramente incompetentes.

Os deputados do Distrito Federal aprovaram lei autorizando a compra da caixa-forte de ativos podres do Master pelo BRB. O governador Ibaneis Rocha (MDB) sancionou-a em tempo recorde. O Conselho Administrativo de Direito Econômico (Cade) avalizou aquilo que singelamente descreveu como “operação simples”.

— Nós, como acionistas majoritários de um banco público, passamos a ter mais dividendos para investir nas obras necessárias para a cidade — declarou o sábio governador na ocasião, proclamando “um dia de festa” para celebrar sua decisão.

Vorcaro tinha motivos para promover uma “festa” privada bem mais extensa. Na operação, ficaria com 36% do BRB, além da presidência de um projetado “BRB Participações”, estrutura autônoma paralela ao banco público, destinada a captar recursos para investir em empresas privadas. O senador Ciro Nogueira (PP-PI), “parça” político de Ibaneis, padrinho da indicação do presidente do Cade, construiu as pontes entre o governador e o banqueiro.

O Master vendia seus CDBs alardeando a segurança proporcionada pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC). Coincidentemente, Ciro Nogueira chegou a apresentar, em 2024, projeto de elevação do teto de garantia do FGC de R$ 250 mil para R$ 1 milhão. Dois gerentes da Caixa foram destituídos em julho após barrarem a compra de R$ 500 milhões de ativos fedorentos do banco de Vorcaro. A PF já tem bússola e GPS. Seguirá o rastro dos “negócios do Brasil”?

O Falcon 7X, jatinho de R$ 200 milhões, não era o bem mais valioso no patrimônio de Vorcaro. O lugar de honra cabe a um item nada original de uma “cartilha de princípios” que ele citava em palestras: escolher criteriosamente as pessoas “com quem se conectar nessa jornada”.

O Brasil é um país de portas giratórias. O banqueiro patrocinava, oficial ou informalmente, eventos dos grupos de lobby Esfera Brasil, Lide e Voto, que reúnem empresários e políticos, além do IDP, fundado por Gilmar Mendes e pelo PGR Paulo Gonet. Os convescotes em Paris (2023), Roma e Londres (2024) contaram com as presenças ilustríssimas dos ministros Gilmar, Toffoli, Barroso e Moraes, do STF, além de Lewandowski (Justiça) e Gonet. Gente fina é outra coisa.

CPI do Banco Master? Esqueça. No Congresso, ninguém solta a mão de ninguém.


Nenhum comentário: