O Globo
O Brasil é um país de portas giratórias. O
banqueiro patrocinava, oficial ou informalmente, eventos dos grupos de lobby
Tudo o que ronda o escândalo do Banco Master
é estranho, do ponto de vista dos analistas econômicos. Nada no caso, porém,
provoca genuína estranheza entre os analistas políticos.
A operação de venda do Master ao Banco de
Brasília (BRB) foi anunciada em março, mas apenas em setembro barrada
unanimemente pelo BC. Há tempos, o radar detectava objetos estranhos no céu. O
banco de Daniel Vorcaro cresceu, ao longo dos últimos anos, oferecendo CDBs com
taxas de juros muito superiores às dos concorrentes.
— O Master vinha apresentando problemas desde
o ano passado, pois tinha ativos incertos e passivos certos. O BC realmente
dormiu no ponto e só acordou agora — registra o ex-diretor do BC Carlos Eduardo
de Freitas.
Por que a demora, diante da pilha de evidências do esquema de alavancagem radical?
“É a economia, estúpido!”, ensinava James
Carville, estrategista de Bill Clinton em 1992, para concentrar o foco dos
operadores da campanha presidencial. No caso Master, a advertência certa aponta
rumo diferente: é a política, estúpido! A pirâmide financeira ergueu-se sobre
as ramificadas conexões de Vorcaro nas elites política, empresarial e jurídica.
A lista de investidores públicos no Master
deveria ser interpretada pela PF como um “mapa do caminho”. Institutos
previdenciários de estados e municípios aplicaram quase R$ 2 bilhões no banco
alavancado. Quatro prefeituras colocaram ali mais de 10% de seus fundos totais.
O governo estadual do RJ aplicou 10,5%.
Sabia-se o que se fazia. O Tribunal de Contas
do Rio de Janeiro apontou “risco de investimento” no aporte de R$ 970 milhões
do Rioprevidência no Master. A conta do prejuízo segue, agora, para os
contribuintes. A investigação — haverá? — precisa separar os gestores corruptos
dos meramente incompetentes.
Os deputados do Distrito Federal aprovaram
lei autorizando a compra da caixa-forte de ativos podres do Master pelo BRB. O
governador Ibaneis Rocha (MDB) sancionou-a em tempo recorde. O Conselho
Administrativo de Direito Econômico (Cade) avalizou aquilo que singelamente
descreveu como “operação simples”.
— Nós, como acionistas majoritários de um
banco público, passamos a ter mais dividendos para investir nas obras
necessárias para a cidade — declarou o sábio governador na ocasião, proclamando
“um dia de festa” para celebrar sua decisão.
Vorcaro tinha motivos para promover uma
“festa” privada bem mais extensa. Na operação, ficaria com 36% do BRB, além da
presidência de um projetado “BRB Participações”, estrutura autônoma paralela ao
banco público, destinada a captar recursos para investir em empresas privadas.
O senador Ciro Nogueira (PP-PI), “parça” político de Ibaneis, padrinho da
indicação do presidente do Cade, construiu as pontes entre o governador e o
banqueiro.
O Master vendia seus CDBs alardeando a
segurança proporcionada pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC).
Coincidentemente, Ciro Nogueira chegou a apresentar, em 2024, projeto de
elevação do teto de garantia do FGC de R$ 250 mil para R$ 1 milhão. Dois
gerentes da Caixa foram destituídos em julho após barrarem a compra de R$ 500
milhões de ativos fedorentos do banco de Vorcaro. A PF já tem bússola e GPS.
Seguirá o rastro dos “negócios do Brasil”?
O Falcon 7X, jatinho de R$ 200 milhões, não
era o bem mais valioso no patrimônio de Vorcaro. O lugar de honra cabe a um
item nada original de uma “cartilha de princípios” que ele citava em palestras:
escolher criteriosamente as pessoas “com quem se conectar nessa jornada”.
O Brasil é um país de portas giratórias. O
banqueiro patrocinava, oficial ou informalmente, eventos dos grupos de lobby
Esfera Brasil, Lide e Voto, que reúnem empresários e políticos, além do IDP,
fundado por Gilmar Mendes e pelo PGR Paulo Gonet. Os convescotes em Paris
(2023), Roma e Londres (2024) contaram com as presenças ilustríssimas dos
ministros Gilmar, Toffoli, Barroso e Moraes, do STF, além de Lewandowski
(Justiça) e Gonet. Gente fina é outra coisa.
CPI do Banco Master? Esqueça. No Congresso,
ninguém solta a mão de ninguém.

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