terça-feira, 25 de novembro de 2025

Reeducando Bolsonaro, por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Sistema permite abater quatro dias de pena para cada livro lido

Sugiro que ex-presidente comece seu programa de leitura por Hegel

Dentro de mais alguns diasJair Bolsonaro se tornará oficialmente um reeducando, que é como chamamos os presos com sentença condenatória que cumprem a pena que lhes foi imposta. O radical "educ" entra aí porque um dos objetivos do Estado ao punir um criminoso é reintegrá-lo à sociedade, um processo no qual a educação é variável-chave.

Não é por outra razão que o sistema prevê a remição de pena por leitura, o que significa que reeducandos podem abater quatro dias de prisão para cada livro lido, até o limite de 12 livros anuais ou 48 dias. O ano do preso bibliófilo fica um mês e meio menor.

Otimista que sou, acho até que Bolsonaro já foi mordido pelo bichinho da busca do saber. Ele, afinal, disse que violou a tornozeleira eletrônica por curiosidade, e a curiosidade, como todos sabemos, é o sentimento que move o homem em direção à ciência e ao conhecimento.

Para fazer as pazes consigo mesmo (e com Alexandre de Moraes), sugiro a Bolsonaro que comece seu programa de leituras por "Princípios da Filosofia do Direito", de GWF Hegel. Ali o filósofo alemão argumenta que criminosos deveriam querer ser condenados.

A pena, afinal, é a negação do crime, que é, por sua vez, a negação do direito. A condenação, ao restaurar o direito, corresponde à vontade do próprio criminoso que, enquanto ser racional, deve querer ver a justiça restabelecida e a vontade universal triunfar sobre a particular. Na visão de Hegel, anistiar Bolsonaro e livrá-lo de sua pena seria desconsiderá-lo como ser racional e livre. Equivaleria a excluí-lo da própria humanidade, compreendida como uma comunidade moral.

Hegel não é um autor fácil. Bolsonaro poderá não se deixar encantar pelas sutilezas da dialética. Nesse caso, o reeducando poderá, desde que o juiz concorde, é claro, recorrer a livros mais pé no chão, quiçá os de colorir.

Seja como for, se Bolsonaro, ainda que por autointeresse e não por adesão sincera à Razão Universal, se transformar num rato de biblioteca, a condenação já terá operado um milagre.

 

 

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