quarta-feira, 10 de agosto de 2022

Vera Magalhães - Brasil enxuga gelo contra fake News

O Globo

Tentativas de regulação já nascem perdendo de 7 x 1 numa eleição em que o retrato de 2018 parece desbotado

Um evento como a “entrevista” de cinco horas e tanto de Jair Bolsonaro ao Flow Podcast e fatos das últimas semanas comprovam que as tentativas da Justiça Eleitoral e da imprensa para instituir ferramentas de combate à desinformação e à mentira pura e simples nas eleições são pequenas toalhinhas de enxugar gelo diante do iceberg de que nos aproximamos.

Se em 2018 as mensagens em aplicativos e as narrativas das redes sociais já tiveram impacto inédito no comportamento do eleitor e ajudaram a impulsionar o fenômeno Bolsonaro, agora esses mecanismos estão ainda mais disseminados e sofisticados, a ponto de qualquer carta de compromisso das plataformas responsáveis ser inócua, e outras modalidades de comunicação à prova de comprovação ocuparam espaço que não tinham antes.

É o caso desses podcasts de grande apelo junto principalmente ao público jovem, em que conversas se prolongam por horas sem qualquer tipo de contraponto dos mediadores nem produção que levante dados e informações para atestar que aquilo que é dito a um público que pode chegar a milhões de pessoas condiz com a realidade.

Não foi à toa que Bolsonaro se sentiu à vontade para ir ficando, numa entrevista enorme até para os padrões desse tipo de programa. O ambiente era tudo de que ele gosta: amigável, sob medida para piadas ao estilo tio do pavê, inclusive as homofóbicas e atentatórias, mais uma vez, à política sanitária, e distante daquela coisa incômoda para o presidente que é a imprensa querendo questioná-lo sobre coisas sérias e mentiras que ele insiste em contar.

Algumas delas, diga-se, poderiam ser facilmente confrontadas até mesmo pelo apresentador que riu de Bolsonaro usá-lo como escada para uma piada odienta quando disse que gostaria de se vacinar contra a varíola dos macacos. Foi sobre o mesmo tema, aliás. O presidente disse que não é contra a vacina, mas contra a poderosa indústria farmacêutica. Chega a ser hilário vindo de quem atrasou a compra de vacinas justamente porque ficou fazendo lobby de um medicamento sabidamente ineficaz que explodiu em vendas (até pelo próprio governo) no Brasil.

Um tipo de papo assim é sopa no mel para quem: 1) precisa atingir o eleitorado jovem, em que perde para Lula; 2) tem tempo de TV inferior ao do principal adversário no horário eleitoral; e 3) tem clara indisposição de comparecer a entrevistas nos meios de comunicação com jornalismo profissional e a debates com os demais candidatos.

Isso significa que esse tipo de programa não pode ou não deve existir? De forma alguma, pois eles estão consolidados junto a uma crescente fatia do público e são amparados pela liberdade de expressão.

Mas não está claro o impacto que esse tipo novo de comunicação de campanha terá no resultado da eleição. A capacidade que agências de checagem, jornais, TVs e mesmo o TSE têm de combater as mentiras e o negacionismo destilados num programa assim tão sem filtro — que foi visto simultaneamente, no pico, por mais de 570 mil espectadores e em um dia já era o terceiro mais visto da história do canal — é limitada.

O público submetido a cinco horas de Bolsonaro sem freio não receberá a vacina para a desinformação que ele despejou, porque não se informa pelos meios tradicionais.

A regulamentação do TSE e os compromissos das plataformas já nascem perdendo de 7 x 1 numa eleição em que o retrato de 2018 já parece desbotado e até o metaverso já está a serviço da propaganda eleitoral.

Diante de um ecossistema assim livre, com uma já anunciada batalha dos podcasts entre Lula e Bolsonaro, é uma incógnita se os candidatos ainda estarão dispostos a se submeter ao contraditório e à interpelação da imprensa, pilares do debate democrático de ideias.

4 comentários:

Anônimo disse...

O Lula já deixou claro que pretende controlar, censurar a mídia, dizer o que vocês podem ou não escrever, não tem mais dúvida

Anônimo disse...

O povo está impaciente e ele saberá disso. Esse será um freio muito grande como tem sido para as idiotices do Bolsonaro. Povo cansado e onde mora o perigo.

Anônimo disse...

O primeiro anônimo foi bem treinado pelos bolsonaristas, aquele pessoal da Nova Política (lembram?), anti-Centrão, antissistema e outras mentirinhas básicas... Depois de 2 anos de mandato, Bolsonaro = Centrão! Lula ficou 8 anos na presidência e não ameaçou a democracia e nem censurou a imprensa e a mídia.

ADEMAR AMANCIO disse...

O pior é que há os que acreditam nas mentiras de Bolsonaro,ou fingem acreditar,sei lá.Eu não acredito em político nenhum,eu não acredito em ninguém,político ou não.