- Folha de S. Paulo
Taxas negativas obedecem a tendência de mais de sete séculos, diz novo estudo
Lufadas de um mundo novo, em que o dinheiro poupado perde valor com o tempo, chegaram ao Brasil no segundo semestre de 2019. A maioria dos nossos analistas ainda acha que se trata de um período excepcional e passageiro. Será?
Nos jardins de Harvard, nos Estados Unidos, brota um esforço monumental para demonstrar que a queda dos juros e seu mergulho abaixo de zero obedecem a uma tendência multissecular que remonta no mínimo ao final da Idade Média.
Em doutorado na universidade americana, Paul Schmelzing tenta descrever 707 anos de evolução das taxas de empréstimo no conjunto dos países avançados a partir de fontes primárias. Não há registro de outro trabalho com essa envergadura.
Uma versão atualizada da pesquisa, divulgada agora pelo Banco da Inglaterra, mostra o eletrocardiograma do custo do capital de 1311 a 2018 a ziguezaguear em torno de uma rampa decrescente. Não apenas os juros reais caíram, à média de 1,6% ao ano. A faixa de oscilação se tornou mais estreita.
Há implicações para debates sobre o passado e o presente. Episódios colocados pela historiografia na origem do salto do Ocidente, caso da matança pela peste no século 14, parecem não ter tido a contundência de outros, como o da superação da escassez aguda de moeda metálica, no final do século 15.
Um pilar da tese do economista francês Thomas Piketty, de que os ganhos do capital ficaram mais ou menos constantes através dos tempos, sai abalado do novo trabalho. A taxa dos rentistas também cai e fica menor que a do crescimento econômico.
Se está correto o audacioso voo de Schmelzing, e esse é um enorme “se”, os juros negativos vieram para ficar e vão se aprofundar. Governos em tese terão condições perpétuas de sustentar dívidas crescentes, e a ideia de que se pode poupar na vida ativa para estabilizar a velhice vai cheirar a naftalina.
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