Valor Econômico
A estratégia é cumprir objetivo de levar a inflação para a meta no horizonte relevante de política monetária
O Banco Central vai deixar os juros básicos
bem altos por bastante tempo para levar a inflação para a meta. A estratégia é
cumprir esse objetivo no horizonte relevante de política monetária. E o
horizonte relevante de política monetária é o período de 12 meses até dezembro
de 2026.
Essa foi talvez a mensagem mais importante da entrevista do Relatório de Política Monetária (RPM), divulgado na semana passada, e do pronunciamento feito pelo diretor de Política Econômica do Banco Central, Diogo Guillen, em um evento promovido pelo Banco Barclays, em São Paulo, na sexta.
Parte dos analistas econômicos desconfia que o Banco Central vai adiar o cumprimento da meta por prazo indefinido, diante das dificuldades de baixar a inflação em um ambiente de muita incerteza fiscal.
O ano de 2026 será particularmente difícil,
em decorrência das eleições presidenciais. A literatura econômica é farta em
apontar que, em período de eleições, há expansões fiscais. A possibilidade de
ajustes nas contas públicas é ainda menor quando há forte polarização política
e a disputa eleitoral é bastante competitiva.
Para alguns, a anunciada interrupção no ciclo
de alta da taxa Selic sem que as projeções de inflação estejam rigorosamente na
meta é um sinal de que, de fato, o Banco Central trabalha com um horizonte
prolongado para o cumprimento da meta.
Há duas semanas, quando o Comitê de Política
Monetária (Copom) do Banco Central subiu os juros em 0,25 ponto percentual,
para os 15%, foi divulgado um comunicado que contém uma projeção de inflação de
3,6% para 2026.
Ou seja, haveria recuo na inflação, que nos
12 meses até maio ficou em 5,32%, mas não chegaria a 3%, que é a meta oficial
estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
O quadro seria um pouco mais preocupante
porque as projeções divulgadas no relatório indicam inflação de 3,2% em 2027.
Assim, a inflação não cai para a meta em nenhum período projetado pelo Copom.
Um detalhe importante, porém, é que essas
projeções de inflação não representam a escolha do Copom sobre a trajetória da
taxa Selic. São, na verdade, exercícios condicionais que ilustram o que
aconteceria com a inflação se o cenário econômico se desenrolar da forma
prevista pelo Copom e os juros, hipoteticamente, tiverem a trajetória esperada
pelos participantes do mercado.
Os dados usados são as expectativas de
inflação coletadas no boletim Focus. O Copom deixa transparente, no Relatório
de Inflação, quais são esses números. Às vésperas da reunião do Copom, a aposta
mediana era que o BC fosse deixar a taxa Selic estável em 14,75% ao ano. Como o
Copom subiu para 15% ao ano, já tem um pouquinho mais de juros, o que ajuda a
baixar a projeção de inflação.
Mas não é só isso - os analistas do mercado
acham que o Banco Central vai começar a baixar os juros a partir de fevereiro,
levando a Selic para 12,5% ao ano ao fim de 2026 e para 10,5% ao ano ao fim de
2027.
Além de observar essa trajetória de juros do
Focus, os membros do Copom também examinaram, na reunião, outras. Guillen e o
presidente do BC, Diogo Guillen, têm afirmado que algumas dessas trajetórias
colocam a projeção de inflação em 3% em dezembro de 2026. O ano é importante: o
comitê está mirando 2026, que é o horizonte relevante de política monetária, e
não 2027.
Isso está de acordo com a comunicação de
política monetária, que passou a dizer que é preciso manter uma taxa
significativamente contracionista por um período “bastante” prolongado. A
palavra “bastante” foi uma das novidades do comunicado que saiu após a reunião
do Copom.
Antes do último encontro, outros membros do
Copom, como o diretor de Organização do Sistema Financeiro e Resolução do BC,
Renato Gomes, destacaram como o que importa é o integral dos juros. Ou seja, a
meta seria cumprida não apenas pelo pico dos juros, mas também pelo tempo que
esse aperto vai se estender.
O Banco Central poderia esclarecer mais sobre
isso se, a título de ilustração, divulgasse também uma projeção alternativa com
juros constantes sempre em 15% ao ano. Guillen e Galípolo foram questionados
sobre isso na entrevista do Relatório de Inflação, mas fizeram duas
ponderações.
Uma delas é que, quando o Copom divulga um
cenário alternativo, os participantes podem se apegar a ele como sendo uma
indicação firme de intenção. O correto, naturalmente, seria entender essa
projeção alternativa como uma projeção condicional, ou apenas uma ilustração.
Todos os participantes do mercado teriam que estar conscientes de que, entre o
cenário Focus e o cenário com juros constantes, há várias outras trajetórias
possíveis para a Selic.
Na coletiva, Galípolo e Guillen indicaram
que, no futuro, podem passar a divulgar essa projeção alternativa. Na última
reunião, não fazia muito sentido - e esse foi o segundo ponto levantado por
eles - porque o Copom subiu os juros e, na verdade, fez uma pausa no aperto
para verificar se os 15% ao ano são suficientes.
Esse é um recado muito importante: a política monetária está viva e pode ser ajustada para que a inflação converja para a meta.
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