domingo, 19 de outubro de 2025

A redescoberta da Amazônia, por André Gustavo Stumpf

Correio Braziliense

Belém foi escolhida porque a ONU e o Brasil quiseram destacar a Amazônia como palco central do debate climático

A realização da Conferência do Clima, a COP30, em Belém do Pará, a partir de 10 de novembro próximo significa que o mundo e os brasileiros resolveram descobrir a Amazônia, que sempre foi território encoberto por lendas fantásticas, relatos de grandes contrabandos e descobertas misteriosas de remédios que curam várias doenças. A Amazônia é apenas uma grande floresta que recobre cerca de 50% do território brasileiro e, naturalmente, esconde grandes jazidas de minérios, petróleo, ouro, além da madeira de significativo valor.

Esse vasto território só se tornou brasileiro depois da Independência do Brasil. Até então era português, dirigido diretamente de Lisboa. Os brasileiros do Norte tinham pouco contato com os do Sul. A navegação entre Belém e Lisboa era mais rápida do que a que se dirigia ao Rio de Janeiro. Sob o comado de Francisco Xavier de Mendonça Furtado, irmão do Marquês de Pombal, o território brasileiro foi divido em dois: o do Norte compreendia o Grão Pará e o Maranhão as outras províncias constituíam a colônia do Brasil. Foi ele quem deu nomes de cidades portuguesas a todos os núcleos habitacionais nas margens do Rio Amazonas. Assim, um território e outro tiveram gestões diferentes e problemas únicos. 

Após a Independência, navios do Almirante Cochrane ameaçaram bombardear Belém, em agosto de 1823, se os amazônidas não aderissem ao novo Brasil. Eles aderiram contra vontade da maioria e foram completamente esquecidos pela Monarquia e pela República. Só em 1960, o presidente Juscelino Kubitschek abriu a rodovia Belém-Brasília, que integrou o Norte ao Sul. Essa rodovia foi chamada pelo ex-presidente Jânio Quadros de estrada das onças, numa demonstração explícita de seu comportamento reacionário. Hoje, a rodovia abriga grandes cidades ao longo de seu trajeto de mais de dois mil quilômetros. 

A atual redescoberta da Amazônia, em Belém, envolve a 30ª edição da Conferência das Partes da Convenção da ONU sobre Mudança do Clima. É o principal fórum internacional para negociação climática, ocasião em que os países revisam e reforçam seus compromissos de redução de emissões, que são as Contribuições Nacionalmente Determinadas. A cúpula de líderes mundiais ocorrerá nos dias 6 e 7 de novembro.

Os objetivos principais são avançar nas negociações climáticas internacionais, monitorar o cumprimento do Acordo de Paris (manter o aquecimento global abaixo de 2°C, com esforços para limitar esse aumento a 1,5°C) e estabelecer metas mais ambiciosas para a redução do aquecimento global. O evento também busca alinhar os compromissos de países desenvolvidos e em desenvolvimento em relação ao financiamento climático, garantir que as metas de redução de emissões sejam compatíveis com a ciência climática e lidar com os impactos socioeconômicos das mudanças climáticas em populações vulneráveis.

O Brasil foi eleito país-sede da 30ª Conferência da ONU sobre Mudança do Clima durante a COP28, em Dubai, em dezembro de 2023. A proposta foi feita pelo governo brasileiro ainda em 2022, na COP27. Segundo o Ministério do Meio Ambiente, a escolha reflete o papel do país como detentor da maior parte da Amazônia, bioma considerado essencial para conter o aquecimento global.

Belém foi escolhida porque a ONU e o Brasil quiseram destacar a Amazônia como palco central do debate climático. A escolha é estratégica, simbólica e política: reforça a importância do bioma para o futuro do planeta, projeta internacionalmente o compromisso ambiental do Brasil e aproxima as negociações globais da realidade dos povos da floresta. A ministra Marina Silva afirmou que levar a conferência a Belém mostra ao mundo que a preservação da floresta é uma prioridade dentro do território amazônico.

A cidade deverá receber cerca de 50 mil pessoas, incluindo chefes de Estado, diplomatas, cientistas e ativistas. Estão em andamento obras de ampliação do aeroporto, melhorias no transporte urbano, investimentos em saneamento e na rede hoteleira. O governo federal criou uma Secretaria Extraordinária da COP30 para coordenar os preparativos. O desafio é acomodar essa multidão que deverá chegar a Belém com malas, bagagens e máquinas fotográficas. Não é sempre que se abre a oportunidade de conhecer a Floresta Amazônica.

As discussões da COP30 serão transmitidas ao vivo por plataformas digitais, canais de televisão parceiros e pela mídia oficial do evento. Belém vai viver o que nunca experimentou. Ser a capital do Brasil por alguns dias e o centro das atenções nacionais e internacionais. Haverá oportunidades para estrangeiros fotografarem macaco e jacaré, experimentar a deliciosa comida regional, mas também entender que na região vivem cerca de 20 milhões de pessoas que precisam de emprego e não de discursos de intelectuais.

 

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